O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) informou no último dia 14 de fevereiro que vai requerer ao Google que explique, no Congresso, a sua “nova política de privacidade”. O pedido do parlamentar está em perfeita consonância com as necessidades da sociedade. No caso do Google, a “nova política de privacidade” foi apresentada como um avanço no sentido de ampliar a transparência sobre os serviços do buscador. No entanto, a nova política visa apenas a deixar claro que o usuário será totalmente monitorado pelo próprio Google.
Apesar de o Google partir do princípio de que o usuário concorda com o armazenamento de dados para fins de recebimento de resultados personalizados nas pesquisas, creio que a maioria dos internautas gostaria de utilizar a rede mundial sem uma “câmera embutida” em seu computador que possa revelar para terceiros o que foi acessado, em que data e por quanto tempo. Deseja-se muito menos que o Google crie um perfil de cada usuário, supostamente para aperfeiçoamento do sistema. Sem escolha, o que ocorre na prática é a submissão dos usuários às regras impostas unilateralmente.
O próprio Google informa que coleta informações “para fornecer serviços melhores a todos nossos usuários” e que “pode coletar informações específicas do dispositivo (como seu modelo de hardware, versão do sistema operacional, identificadores exclusivos de produtos e informações de rede móvel, inclusive número de telefone)”. O buscador também avisa que poderá coletar “informações de registro de telefonia, como o número de seu telefone, número de quem chama, números de encaminhamentos, horário e data de chamadas, duração das chamadas, informações de identificador de SMS e tipos de chamadas”.
Sociedade monitorada
O direito à privacidade é uma garantia fundamental, expressa no do artigo 5º da Constituição (“são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”). O Código Civil (artigo 21) e o Código de Defesa do Consumidor também não permitem a nova política do Google. Ora, se é tão fácil concluir que o uso indevido de imagem constitui ilicitude, é difícil entender a razão pela qual a utilização indevida de informações pessoais (ou a proibição de acesso a determinados produtos e serviços sem que a privacidade seja invadida) não seja vista, até o momento, como um ato contrário ao direito.
Na Espanha, o problema da captura de dados é tão grave que foi criada a Agência Espanhola de Proteção de Dados, órgão que auxilia o cidadão na proteção de sua privacidade. Ele disponibiliza formulários e auxílio para aqueles que querem ter acesso a um serviço essencial, a internet, sem que a sua privacidade seja violada.
É impossível para o usuário monitorar o buscador para saber se a suas informações detalhadas não estejam sendo utilizadas para finalidades que não sejam a declarada. Pode-se afirmar que o usuário concordou com a “nova política de privacidade”. Será que ele concordou mesmo ou ele se viu acuado por saber que, se não aceitasse as regras, perderia, por exemplo, o acesso ao seu Gmail e, assim, a todos os seus contatos e informações? Exigir que o consumidor aceite as regras invasivas para ter acesso ao produto ou serviço é prática comercial abusiva.
Admitindo-se um verdadeiro “vale-tudo” na internet, nos transformaremos, em pouco tempo, em uma sociedade que se desenvolverá com mentes manipuladas e sem a mínima liberdade de escolha. Uma sociedade monitorada jamais será uma sociedade livre.
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[Fabíola Meira de Almeida Santos, mestre em Direito, é advogada e professora da PUC-SP]