O Observatório da Imprensa na TV mudou o seu formato habitual na edição desta semana (edição 356, exibido na terça-feira, 6/12) e realizou uma entrevista com o ex-ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, que teve o seu mandato de deputado federal pelo PT de São Paulo cassado na quarta-feira passada (30/11). Além de Alberto Dines, apresentador do programa, participaram da sabatina os jornalistas Caio Túlio Costa, ex-ombudsman da Folha de S. Paulo, e Aluizio Maranhão, editor de opinião do jornal O Globo.
O programa começou com a apresentação de reportagem mostrando a trajetória de Dirceu desde a campanha vitoriosa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva até a cassação do mandato, passando por episódios como a montagem do governo, o Caso Waldomiro Diniz e a demissão do cargo de ministro, já em decorrência das denúncias feitas pelo ex-deputado, também cassado, Roberto Jefferson (PTB-RJ).
Crítico contumaz do comportamento da imprensa brasileira, Dirceu assistiu a um trecho de entrevista concedida pouco antes de Lula tomar posse, em outubro de 2002, ao programa Roda Viva, na qual defendia medidas de auxílio às empresas brasileiras de mídia, que então se encontravam em difícil situação financeira, endividadas e reclamando por algum tipo de ajuda governamental. Em seguida, na primeira questão do programa, feita por Alberto Dines, o ex-ministro foi confrontado com este discurso do passado à luz de uma recente declaração sobre a relação entre a partidarização da imprensa e as dívidas e problemas financeiros das empresas de comunicação. Dirceu reafirmou a sua crença na necessidade de uma política específica para os órgãos de comunicação, postura esta que foi aprofundada ao longo do programa, quando ele revelou ter defendido, no âmbito do governo, o projeto de ajudar os veículos mais endividados em dólar e disse ser contra a participação majoritária do capital estrangeiro nas empresas nacionais.
A questão da partidarização foi retomada em seguida por Caio Túlio, que perguntou a Dirceu por que a imprensa não poderia fazer política. O ex-deputado de imediato rebateu que a mídia pode, sim, se posicionar politicamente, mas com transparência. José Dirceu defendeu o modelo norte-americano, no qual os veículos se posicionam em editoriais, apoiando candidaturas, mas preservando o noticiário das preferências partidárias. Ele lembrou que em 2002 diversos veículos apoiaram a candidatura de José Serra (PSDB) e também o fizeram na eleição municipal de 2004, mas sem deixar a opção clara para os leitores.
O jornalista Aluizio Maranhão também insistiu com o ministro na questão da ‘politização’ do noticiário, questionando a alegação freqüente entre petistas de que está em curso uma conspiração das elites, aliadas à imprensa, contra o governo Lula. Dirceu foi rápido em negar a existência de tal conspiração, mas argumentou que o que se vê não mídia não é só a apuração de denúncias de corrupção no governo. ‘A oposição subiu no cavalo que passou selado e iniciou uma campanha de desestabilização do governo’, afirmou ele, deixando claro que alguns veículos estão participando ativamente deste processo.
Respondendo a Dines, Dirceu também negou que a origem da atual crise política esteja na gravação realizada por um ex-araponga da Agência Brasileira de Informação (Abin). Segundo o ex-ministro, existe hoje uma verdadeira ‘indústria da gravação de depoimentos’ no país, a serviço de interesses diversos. E negou que tivesse qualquer ascendência sobre a Abin ou a Polícia Federal, conforme acusação da oposição.
Fogo amigo
A entrevista esquentou na seqüência, quando Caio Túlio e Aluizio introduziram o tema do ‘fogo amigo’ no governo, do qual Dirceu é freqüentemente apontado como, no mínimo, um incentivador. Perguntado se achava que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, era mais bem tratado pela imprensa do que ele mesmo foi, Dirceu discordou e disse que, nos últimos 45 dias, Palocci tem recebido tratamento semelhante ao que lhe foi dispensado. E defendeu a tese de que o debate interno sobre o ajuste fiscal e monetário é saudável e natural.
Questionado sobre a correção da postura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, neste debate, Dirceu afirmou que o julgamento cabe ao presidente Lula, mas ressaltou que Dilma, como os ministros da Agricultura, da Indústria e Comércio e outros, expressam as pressões da sociedade e que, portanto, o debate sobre os rumos da política econômica é saudável. Ao fim, defendeu o ministro Palocci, contra o qual pesariam denúncias ‘requentadas’.
Direita critica a imprensa
O apresentador Alberto Dines retomou então uma questão abordada no início do programa, em seu editorial, e perguntou ao ex-deputado o que ele achava das críticas que vêm sendo feitas à imprensa com viés de direita, denunciando os jornalistas supostamente ‘lulistas’ ou ‘dirceuzistas’, em alusão a artigo de colunista da revista Veja em que ele próprio, Alberto Dines, foi acusado de ‘dirceuzismo’. O ex-ministro respondeu que não poderia ser juiz da imprensa, mas que podia, sim, observar um movimento para calar nas redações aqueles que têm se portado de acordo com os manuais de redação, dando voz aos acusados. Dirceu lembrou que todos os grandes jornais nacionais pediram a sua cassação, ressaltando que ainda que vai provar a inocência, apesar da ‘unanimidade’ da condenação na imprensa. Pouco depois, respondendo a outra questão de Dines, Dirceu voltou ao assunto: segundo ele, a imprensa deve ter papel investigativo, mas há momentos em que este papel é extrapolado, descambando para o macartismo e para o linchamento político, do qual ele defende ter sido vítima.
Ao fim do programa, o ex-ministro revelou ter sido contrário à apresentação ao Congresso do Conselho Federal de Jornalismo, que, em sua opinião, não havia sido devidamente debatido com a sociedade, comentou o episódio envolvendo o PT e a empresa do vice-presidente José Alencar, Coteminas, e reafirmou sua crença nas medidas tomadas por seu partido para sanar os desvios já revelados pela apuração das denúncias e na sua própria inocência. ‘Eu sei o que fiz. E do que estão me acusando, eu não fiz’, afirmou.