Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Sem “olhos” e sem “dentes”, autorregulação fracassa

Três meses atrás, a escritora J.K. Rowling, da série Harry Potter, ao testemunhar no inquérito Leveson sobre o escândalo do tabloide News of the World, do qual é uma das supostas vítimas, questionou a PCC como um órgão “sem dentes”. Agora, com o anúncio de que ela será fechada e substituída por outra em um ou dois anos, a desconfiança é que a comissão de autorregulação da imprensa inglesa esteja sendo apenas tirada do foco para escapar das revelações que o inquérito Leveson fará até o final do ano. E para evitar que suas revelações estimulem uma regulação estatal da imprensa – seguindo os modelos da Europa continental.

Desde o início do escândalo, com a evidência de que os crimes cometidos pelo News foram tratados com leniência pela PCC, não faltaram pedidos por sua extinção. E ao menos um parlamentar trabalhista defendeu que uma nova comissão tivesse o poder de “excluir” jornalistas da profissão. Diante da confirmação de uma substituta para a PCC, outro trabalhista, que está à frente das investigações, Tom Watson, não conteve a ironia ao reagir ontem (8?03), via Twitter: “A PCC vai fechar e começar outra vez com novo nome. Presume-se que o novo logo terá três macacos.”

Para alguns, como a inglesa The Economist, o problema da PCC não foi a falta de “dentes”, de mecanismos para punir, e sim, de “olhos”. Mas o que está sendo negociado, para o novo órgão de autorregulação, é que os grupos de comunicação aceitem sanções. Com poder de arbitrar e punir, a substituta da PCC teria “dentes”.

A imprensa inglesa está dividida, temendo que com tal configuração, em vez de conter a intervenção estatal, estaria na verdade abrindo o caminho para ela. Para Jack Shafer, analista de mídia da agência Reuters, se for dada à nova comissão o poder de “policiar a imprensa, será um crime maior do que todos os grampos de telefone juntos”. Argumenta que não faltam leis para combater os desvios e que os jornalistas não devem ter tratamento especial. Nem regulação “voluntária”.

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A crise do grampo

Nov. 2005 – News of the World publica reportagem sobre problemas no joelho do príncipe William. Caso era tratado em segredo; realeza pede investigação policial sobre vazamento.

Jan. 2007 – Jornalista e detetive contratados pelo jornal são condenados e presos por escuta ilegal de caixa postal de funcionário do palácio; Andy Coulson, editor do NoW, se demite.

Mai. 2010 – Coulson é nomeado diretor de Comunicações do governo britânico.

Jan. 2011 – Aparecem mais evidências de grampos; NoW demite editor envolvido com escutas; Coulson se demite; polícia reabre investigações, que provariam que escutas atingiram celebridades e vítimas de crimes.

Jul. 2011 – Em reação à indignação popular, Murdoch fecha o NoW.

Nov. 2011 – Governo cria comissão judicial sobre escândalo.

Fev. 2012 – Murdoch lança novo tabloide dominical, The Sun on Sunday.

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[Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo]