Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Vigília visceral

Coberto de razão está Muniz Sodré. As estatísticas reveladoras da situação econômico-social-educacional dos negros em relação aos brancos em nosso país no mínimo ensejam a pergunta: por que as coisas se passam dessa maneira? Conhecidas explicações utilizam-se principalmente de categorias sociológicas, históricas, políticas, usadas contra ou a favor de uma política de inclusão, mas não há um mergulho na esfera psicossocial. Pode parecer ingênuo, mas a palavra de minha mãe corrobora a tese de Muniz Sodré, com a qual estou de pleno acordo. Dizia ela, a respeito de algum preto que conosco se relacionasse: ‘Ele é preto, mas é bonzinho.’ Ela, plena de solidariedade cristã com as pessoas de qualquer cor, cujo pai era negro e que sofrera na própria pele – sem trocadilho – o estigma do preconceito, inconscientemente dava à luz um testemunho da visceralidade com que o lugar das pessoas numa cultura era involuntariamente definido.

Quanto a mim, tomei, ao longo dos anos, crescente consciência dessa visceralidade, dos processos através dos quais ela se mantém e se propaga – a piada, o condicionamento do olhar, os arquétipos positivos (branco) e negativos (negro) – e para seu combate adotei uma postura crítica, de autovigília, único modo de desenvolver em mim e secundariamente em meus pares uma nova visão, e modestamente contribuir para o desenvolvimento visceral de uma nova cultura de igualdade entre seres humanos diferentes, já que o conceito de raça está ultrapassado.

Como se vê, trata-se de uma tomada de consciência, e da adoção de procedimentos externos àqueles valores culturais que visceralmente me constituem, com a finalidade de dessacralizá-los, enfraquecê-los e, finalmente, substituí-los por outra ordem de valores consentâneos com a verdade da igualdade entre homens e mulheres fenotipamente diferentes, mas essencialmente iguais. Não vejo outra maneira de enfrentar o problema senão trazendo-o para o exame crítico, assim como não vejo outro modo de corrigi-los que não seja adotando-se medidas ‘externas’ de médio e longo prazo que haverão, inclusive e sobretudo, de capacitá-los para sua própria afirmação cultural.

Luiz Paulo Santana, aposentado, Belo Horizonte



Racismo existe, mas…

Que o racismo existe no Brasil não se discute. E que as cotas são instrumentos eficazes de combate a qualquer forma de exclusão também não. Apenas em relação ao ensino superior público não vejo a questão racial como fator predominante no que se refere à exclusão lá existente. Em verdade, brancos pobres e negros pobres estão excluídos do sistema instituído, que privilegia conteúdos maçantes abordados por cursinhos (caros) especializados. A política de cotas, a meu ver, deve atacar a causa da exclusão que pretende ser combatida. No caso do acesso aos meios publicitários por exemplo, não há dúvida de que o fator racial é predominante no que se refere à exclusão. Aqui, sim, cabe uma política racial de cotas.

No caso do acesso ao ensino superior público, a questão racial está abarcada pela questão econômica, vez que os critérios de seleção são impessoais, e, por isso mesmo, indiferentes no que se refere à raça do candidato. Basta ter estudado em bom cursinho, aprendido todos os macetes do vestibular e pronto. Racismo há, exclusão nem se fala. Ataquemos, pois, suas causas, sem confundi-los.

Antonio Campos



Uma hipocrisia

A política de cotas é uma hipocrisia. Aumenta a desmoralização das universidades e degrada os alunos que se beneficiarem delas. Se o governo quisesse mesmo beneficiar os negros criaria para eles escolas de primeiro e segundo graus de qualidade. Mas escolas de verdade, não isto que há por aí. Depois veria como eles encheriam as universidades sem privilégios odiosos e discriminatórios.

Luiz Salvador de Miranda Sá Jr.



A pior segregação

Sou branco azedo de classe média e fui criado no Rio de Janeiro no pé do Morro Santa Marta na década 60, jogando bola na rua com os negros (para nós, crianças da época, era preto) e nunca tínhamos diferença para as escolas (Joaquim Nabuco, Amaro Cavalcanti) ou outras atividades comuns como praia, cinema, namorados, escolas de samba etc.

Penso que essa de determinar ‘cotas para os negros’ é a pior forma de segregação racial existente, pois daqui a pouco vão querer fazer para outros tipos de exclusão. Nossos semelhantes de todas as etnias e credos deveriam participar da sociedade com suas virtudes e ideais, não ficando à mercê de leis cotistas. A época da escravidão já passou, é melhor olhar para o emprego escravo que tem por aí, que não vê cor nem coração.

Luiz Fernandes, tecnólogo, São Paulo



Que fim levou

Prezado professor Muniz Sodré, lendo seu texto no livro Racismos contemporâneos me deparei com sua fala a respeito do sociólogo L. A da Costa Pinto, e aproveito para perguntar: esse senhor já foi para o inferno?

Nedi Carlos da Rosa, São Paulo