Dois dos maiores ícones da imprensa mundial, o The New York Times e o The Washington Post, acabam de jogar a toalha no ringue da internet. Depois de muita desconfiança e velada animosidade, os dois jornalões americanos aderiram à moda dos blogs, seguindo uma tendência na qual o jornal carioca O Globo foi um dos precursores.
A decisão do Times foi divulgada na semana passada pelo subeditor-executivo Jonathan Landman, que anunciou o lançamento nos próximos três meses de vários blogs produzidos por jornalistas e que serão reunidos numa seção chamada Red Carpet (Tapete Vermelho) . O primeiro será editado pelo polêmico jornalista David Carr, se chamará Carpetbagger e terá como tema os filmes concorrentes ao próximo Oscar.
Também está previsto um blog sobre mercado imobiliário, mas os demais ainda não foram oficialmente anunciados pelo jornal que os nova-iorquinos apelidaram de Gray Lady (Senhora Grisalha).
A mesma inspiração
Ao divulgar sua adesão a um estilo personalizado de página web, antes visto como símbolo da inconseqüência juvenil, o Times qualificou os blogs como uma tecnologia e afirmou que vai usá-la do seu jeito, mostrando que não perdeu sua tradicional auto-suficiência.
O jeito do jornal será submeter todos os textos dos seus blogs à edição prévia pela chefia de redação, contrariando a publicação direta pelo autor adotada pela esmagadora maioria dos quase 20 milhões de blogs existentes no mundo.
A mudança de estratégia editorial adotada pelo Times tornou-se pública duas semanas depois do também tradicionalíssimo Wall Street Journal ter admitido que ‘nenhuma empresa de respeito atualmente pode se dar ao luxo de não ter um blog’.
No mesmo texto, mais importante jornal financeiro do mundo organizou uma lista dos blogs que considera os mais confiáveis e informativos no mercado de ações, jornalismo, na web, cinema, câmbio, seguros, contabilidade, macroeconomia, impostos, teatro, televisão e saúde pessoal.
O Wall Street Journal mantém há quase dois anos uma página na web chamada OpinionJournal, na qual publica material de seus editorialistas e comentaristas especializados num formato editorial inspirado nos blogs.
Declaração bombástica
O The Washington Post vem experimentando blogs há quase seis meses, quando criou um sobre tecnologia e logo depois outro do cronista Joel Achenbach, que escreve sobre esportes, modismos, ciência e – como não podia deixar de ser, em se tratando de Washington – também sobre política.
Mas foi o presidente do jornal que rompeu vários tabus ao mesmo tempo, quando surpreendeu os participantes da reunião anual de executivos chefes da imprensa norte-americana com a bombástica declaração de que ‘o futuro do noticiário está na internet e não nos jornais’.
Até mesmo os responsáveis pelo Prêmio Pulitzer cederam aos encantos da web e aceitarão candidaturas de reportagens, fotos e coberturas especiais publicadas nas edições online de veículos de comunicação. Segundo críticos da mídia americana como Howard Kurtz (da rede CNN), o próximo passo será estender a premiação aos blogs, já em 2007.
Chamadas para o blog
No Brasil, o jornal O Globo entrou de cabeça na moda dos blogs já há algum tempo, enquanto os seus principais concorrentes (Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo) esperaram bastante antes de ver para que lado o vento estava soprando em matéria de tendências na internet.
O site do Globo hospeda hoje 29 blogs sobre 15 temas diferentes. Política internacional e política nacional são as áreas que têm mais jornalistas blogando, com quatro cada uma. Destaque para Gilberto Scofield, que escreve desde Pequim contando como é o dia-a-dia dos chineses. Há três autores publicando sobre gastronomia e bares, bem como outros três blogs voltados para adolescentes e crianças. No esporte, os blogueiros globais são José Luis Rodrigues e Lédio Carmona. Os demais blogs cobrem áreas como música, tecnologia, televisão, economia, blogs, curiosidades e moda. Há um blog sobre a vida em São Paulo e outro sobre Rio de Janeiro.
A área de blogs no Globo tinha pouca visibilidade editorial até o início do escândalo mensalão, quando o blog de Ricardo Noblat passou a ser uma referência obrigatória em matéria de noticiário político. A reação global foi valorizar o blog do repórter político Jorge Bastos Moreno, que passou a freqüentar a página de abertura do portal Globo Online com razoável assiduidade, e até mesmo a primeira página do jornal impresso.
A partir daí o portal passou a distribuir as chamadas para os blogs nas páginas relacionadas ao tema, com o objetivo de vincular cada vez mais as matérias da Redação e os weblogs individuais. Os blogs internacionais, por exemplo, têm uma função quase idêntica a dos correspondentes convencionais, com a vantagem de que podem ser atualizados com mais freqüência.
Embora o Globo seja o jornal brasileiro que mais valoriza os blogs, o índice de atualização ainda não é diário. A média de atraso girava em torno dos dois dias no final de semana analisado (10 e 11/12).
Temática local
A Folha de S.Paulo tem apenas um blog apoiado ostensivamente pelo jornal. É o Nos Bastidores do Poder, produzido pelo comentarista político Josias de Souza. Antes de Josias, o repórter Fernando Rodrigues, também da Folha e igualmente baseado em Brasília, havia criado o seu blog Últimas Notícias sem, no entanto, contar com o mesmo apoio editorial da redação em São Paulo.
O Estado de S. Paulo foi o último dos três maiores jornais brasileiros a incorporar um blog em seu portal na web. Em outubro passado, Ricardo Noblat transferiu-se de armas e bagagens para o portal do Estadão, na primeira grande contratação de um blogueiro no Brasil. A mudança ainda é muito recente para ser avaliada, mas o número de comentários feitos aos textos de Noblat não mudou significativamente, indicando que provavelmente os leitores continuaram fiéis ao pioneiro dos blogs políticos no país.
Com exceção do Globo, a grande imprensa brasileira ainda continua desconfiada e reticente em relação aos blogs, ao contrário do que acontece nos Estados Unidos e na Europa, onde o jornal inglês The Guardian, por exemplo, tem, há três anos, um dos melhores blogs jornalísticos da imprensa mundial.
Nos Estados Unidos, vários jornais regionais já estão usando intensivamente os blogs na cobertura de temas especializados – e principalmente no noticiário local e micro-local. É o caso do premiado The New West, cujo material editorial é feito basicamente por blogueiros jornalistas. O The New West é um portal de notícias locais que cobre dez cidades do meio-oeste americano.
A Online News Association, organização que reúne os editores de páginas jornalísticas na internet, garante que os blogs são a forma mais barata de cobrir intensivamente os temas locais.
******
Jornalista e responsável pelo blog Código Aberto