É grave o que está acontecendo com a Associação Brasileira de Imprensa Internacional (ABI-Inter), instituição fundada em 2007 por brasileiros nos Estados Unidos, inspirada nos princípios da congênere Associação Brasileira de Imprensa (ABI) no Brasil. Quase cinco anos após sua criação, hoje não passa de um instrumento a serviço dos interesses de um pequeno grupo de pessoas, algumas com pouca ou nenhuma intimidade com o ofício de jornalista.
Idealizada para regulamentar a atividade, representar os interesses da classe jornalística brasileira no exterior e zelar pelo comportamento ético dos profissionais que atuam na mídia comunitária fora do Brasil, a ABI-Inter desviou-se desses objetivos e agora serve apenas como mecanismo de promoção pessoal.
A Ata da Fundação da ABI-Inter foi lavrada em 13 de abril de 2007, em Fort Lauderdale (Flórida), ao fim de uma reunião onde tivemos a a presença de Maurício Azêdo, presidente da centenária Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que ali nos deu aval e incentivo. Fui escolhido um dos conselheiros de ética e como prova da nossa confiança no futuro da ABI-Inter, ainda na cerimônia de posse da diretoria em Nova York requisitei a emissão de carteiras de associados para os funcionários do AcheiUSA, pagando por elas a taxa de 300 dólares, com um cheque emitido à ABI-Inter, entregue diretamente ao seu tesoureiro na época, Paulo Monauer. As carteiras jamais chegaram às nossas mãos. O cheque, no entanto, já havia sido compensado.
Logo em seguida à cerimônia no consulado, e antes de qualquer assembleia que decidisse os caminhos que seriam tomados dali em diante, a ABI-Inter aproximou-se do prêmio organizado anualmente pelo produtor de eventos Carlos Borges, o Press Award.
Press Award, como o próprio nome diz, pretende ser uma honraria concedida pela imprensa a certos notáveis da comunidade, mas na verdade é controlado pela Plus Media Marketing, a empresa de Carlos Borges responsável pela sua realização, e como tal com a flexibilidade na escolha dos laureados típica dos eventos do gênero.
Renúncia aceita na hora
A proposta era a de que a ABI-Inter, a partir de então, seria responsável pelo julgamento e premiação dos trabalhos submetidos ao Press Award da PMM, dentro das categorias relacionadas ao jornalismo que faziam parte do prêmio.
Discordei dessa parceria, argumentando que a ABI-Inter deveria manter-se independente e dissociada de qualquer iniciativa comercial ou empresarial, que geralmente visa o lucro ou algum interesse particular. Liguei para o presidente Roberto Lima, que não aceitou meus argumentos, sem nenhuma aparente justificativa, e a parceria se concretizou. Depois da premiação, intrigado com alguns resultados do Press Award atribuídos ao julgamento da ABI-Inter, liguei de novo para Roberto Lima e perguntei-lhe sobre os critérios de avaliação dos trabalhos, e o nome dos jurados da ABI-Inter que apontaram os premiados. Para minha surpresa, ele me disse que não responderia a essa pergunta e nem falaria sobre o assunto.
Ora, se o presidente da ABI-Inter não responde à indagação de um conselheiro de ética sobre um procedimento interno, para que serve então esse conselheiro? Coerente com esse pensamento, disse a ele que nesse caso não só renunciaria à minha posição de conselheiro, como também deixaria de fazer parte da ABI-Inter imediatamente. Lima não insistiu na minha permanência e aceitou minha renúncia na hora.
Privilégios, honrarias e benesses
Desde então, afastei-me da ABI-Inter, enquanto ela progressivamente aumentava sua simbiose com o tal Press Award. Com o tempo, a ABI-Inter passou a agir apenas como um instrumento de suposta legitimação para o prêmio da PMM. Por fim, a integração consolidou-se de tal forma que ficou difícil separar as atividades de uma e de outra. Por exemplo, no exato momento em que este artigo é escrito, em fevereiro de 2012, as duas informações mais relevantes no website da ABI-Inter são a realização dos próximos Press Award e Focus Brasil, dois eventos promovidos pela PMM.
Lamentei que as discussões entusiasmadas e as deliberações cheias de esperança que originaram a associação em 2007 tivessem sido em vão. Lamentei também a falta dos 300 dólares para as carteiras que requisitamos à ABI-Inter e que nunca chegaram. Nem as carteiras vieram, nem os dólares retornaram.
Só voltei a me preocupar novamente com a ABI-Inter em janeiro de 2010, quando foi empossado (depois de eleito por “aclamação”) como presidente, no lugar de Roberto Lima, Zigomar Vuelma, proprietário do jornal Gazeta Brazilian News, que circula na Flórida.
Não me preocupei muito com o fato de que, mesmo depois de treze anos morando na Flórida, jamais tivesse visto coisa alguma escrita por Zigomar, nem mesmo em seu próprio jornal. Preocupou-me o fato de Zigomar, assim que foi empossado presidente, durante um dos eventos de Carlos Borges, entregar a a ABI-Inter a um grupo bem delineado, com interesses comuns e afinados. O grupo pôde assim trocar com menos escrúpulos todos os privilégios, honrarias e benesses que já vinha trocando entre si, afastando ainda mais os que não recitavam pela sua cartilha.
Importância histórica
Hoje, carteiras da ABI-Inter são fornecidas a qualquer um que a sua diretoria queira agradar, sem nenhum critério ou escrúpulos. As facilidades são obviamente maiores para os mais chegados à publicação do seu atual presidente, como amigos, colaboradores e pseudocolunistas de ocasião, que exibem em fotos a carteira da associação sem qualquer pudor ou consideração pelos verdadeiros profissionais que mereceriam uma devida identificação de classe.
Felizmente, não são todos os associados e atuais diretores da ABI-Inter que compartilham da política do pequeno grupo que a domina agora, entretanto. Ainda há gente boa em seus quadros, e é nessas pessoas que depositamos a esperança de que o sonho de ter uma associação comprometida com os ideais das nossas primeiras reuniões possa voltar um dia. E também não são poucos os que compartilham do nosso pensamento fora dos seus quadros. Vamos torcer para que não seja necessária a criação de uma alternativa à ABI-Inter para que nosso sonho se torne realidade, mas também não vamos hesitar se isto se transformar na única opção que restar.
É triste que os verdadeiros jornalistas e profissionais de mídia que praticam com paixão e dedicação a sua atividade vejam decompor-se em tão pouco tempo uma iniciativa que tinha tudo para dar certo. A ABI-Inter poderia ter sido e ainda pode vir a ser um grande auxílio para a consolidação e para a profissionalização da mídia comunitária em português fora do Brasil. Em vez disso, tornou-se apenas um instrumento de marketing a serviço de um grupo descompromissado com sua filosofia original, que visa apenas a manutenção de privilégios e da troca de benesses entre seus participantes.
Uma vergonha para qualquer um que, jornalista ou não, compreenda a importância histórica e a responsabilidade que há numa instituição que traz a sigla ABI em seu nome.
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[Jorge Moreira Nunes é publisher do AcheiUSA Newspaper]