‘Há tempos eu me preocupo com o fato de as faculdades de comunicação brasileiras não convencerem seus estudantes de que eles compõem uma elite cultural. O privilégio de fazer parte desta elite traz consigo uma grande responsabilidade: no momento em que eles chegarem a um microfone não estarão apenas informando, mas formando seus ouvintes e telespectadores. Daí a necessidade de uma busca de aperfeiçoamento diário, que exige esforço e interesse de cada um no sentido de abrir um dicionário para conferir a ortografia correta de uma palavra em português – ou, se for o caso, descobrir a tradução adequada para uma expressão estrangeira, ou ligar para um consulado ou embaixada para saber uma pronúncia correta, ou perguntar aos colegas mais experientes, e assim por diante.
De tanto ouvir o sr. Galvão Bueno pronunciar ‘xin-quêine’ na manhã deste domingo, 23 de maio, ao falar dos obstáculos forçados sobre algumas retas do circuito de Mônaco, com o intuito de baixar a velocidade dos carros, fiquei triste – uma tristeza, mais tarde, apenas levemente abatida com a saída dos irmãos Metralha Schumacher da prova – porque pude ver como são acentuados os desníveis culturais no Brasil, e como tudo isso nos deixa tão distantes do resto do mundo dito civilizado. Quando deveria estar falando ‘xi-câne’, atendendo ao original francês, ou ‘xi-quêine’, se quisesse esnobar o domínio do inglês que, volta e meia, demonstra não possuir (já que falou de um elemento da F-1 atual chamado ‘controle de tração’ e referiu-se a isso como ‘control traction’, quando o certo é ‘traction control’), o sr. Galvão Bueno deixou nítida a impressão de que estamos numa espiral descendente, quando o tema é cultura de massa: é como se um cego liderasse a marcha para o abismo.
Quem entra na profissão hoje tem como parâmetros de correção essas ‘estrelas’ do jornalismo, que não se preocupam em buscar a informação correta, e acaba repetindo os mesmos erros. O resultado é o nível cada vez mais acentuado de desinformação – quando não de ignorância, pura e simples – de nossa população. O quadro me lembra, também, uma outra situação de atraso, igualmente aguda: quando eu vivia nos EUA, a preocupação de acadêmicos e governantes era com a ‘internet divide’ (expressão em inglês), que significa o abismo criado entre aqueles que possuíam internet – e que, por conseguinte, abriam inúmeras avenidas de conhecimento instantâneo – e os que ainda andavam a pé ou estavam condenados a ficar sentados à beira do caminho da informação digital. No Brasil, este ponto ainda é distante. Para nós, o abismo divide aqueles que sabem falar e escrever o idioma e aqueles que não sabem – mas que, muitas vezes, como o sr. Galvão Bueno, têm acesso a um microfone e a uma audiência de milhões de pessoas sem qualquer referência cultural.
Com a eleição de Lula, o abismo aumentou enormemente. Se por um lado sua ascensão ao poder foi cercada de um simbolismo histórico (um semi-analfabeto conseguiu ocupar o maior posto administrativo do país), o próprio presidente encarregou-se de destruir esse simbolismo quando, em vez de procurar resgatar sua própria condição incentivando a leitura e investindo pesado na educação e cultura de outros tantos intelectualmente desvalidos como ele, deixou explícita sua ojeriza a quaisquer textos escritos… dentro de uma Bienal do Livro, em São Paulo.
Por fim, a pergunta que não quer calar: depois de chutar o balde e divulgar os termos do contrato de Rubens Barrichello com a Ferrari, que o impedem de ultrapassar Michael Schumacher, que tal se Bernie Ecclestone divulgasse também os termos do contrato de puxação de saco de Galvão Bueno para com Michael Schumacher? Com certeza, o suposto texto deve incluir uma cláusula que impede Galvão Bueno de falar bem de Ayrton Senna enquanto o Metralha alemão estiver na pista. Essa condição ficou bem explícita no GP de Mônaco deste domingo. (Âncora, repórter e editor. Trabalhou na Rede Globo, Radiobrás, Voz da América, Rede Manchete, Radio JB e CBS Brasil. Foi correspondente na Casa Branca durante vários anos. Vive e trabalha atualmente em Brasília.)’
SBT
‘Silvio Santos adia contrato e frustra Ratinho’, copyright Folha de S. Paulo, 30/05/04
‘É incerto o futuro de Carlos Massa, o Ratinho, no SBT. Quarta-feira, o apresentador se reuniu com Silvio Santos. Estava crente que iria sair com as bases de um novo contrato.
Nada disso aconteceu. Silvio Santos, apesar do assédio da Record sobre Ratinho, avisou que só irá conversar sobre um novo contrato em setembro.
A notícia frustrou Ratinho. O atual contrato vence em dezembro. Normalmente, em toda rede, contratos de apresentadores são renovados seis meses antes.
O adiamento mostra que Ratinho anda mal de prestígio e atrapalha seus negócios. Até outubro, ele não poderá fechar acordos de licenciamento e merchandising.
Ninho
Fernando (Marcos Palmeira) saberá que é pai de Nina, filha de Maria Clara (Malu Mader), no capítulo de ‘Celebridade’ do próximo dia 12. Suspeito de ter matado Lineu (Hugo Carvana), ele se esconderá justamente em um quartinho do Sobradinho.
Filósofo
O ex-craque Sócrates participará dos especiais olímpicos do ‘Casseta & Planeta’. Será entrevistado por Vopoulos Nopopoulos (Marcelo ‘olha o trocadilho’ Madureira) no ‘noticiário’ ‘Qual É a Grécia?’.
Insônia
O Comedy Central (canal dos EUA que exibe ‘South Park’) mostra amanhã um especial sobre a noite e o Carnaval do Rio, no programa ‘Insomniac’. A produção no Brasil foi feita pela Giros.’
CELEBRIDADE
‘A bunda metalingüística de ‘Celebridade’’, copyright Folha de S. Paulo, 30/05/04
‘Quando havia arte, se dizia que, vez por outra, a vida a imitava, mas, nos tempos que correm, a vida tem imitado é a TV mesmo. E, o que é pior, naquilo que ela (a TV) tem de mais artificial e cretino.
Nesta semana, um pequeno experimento metalingüístico da novela ‘Celebridade’ mostrou, além da bunda de Juliana Paes em toda a sua exuberância, muitas outras coisas interessantes e iluminadoras sobre as relações entre a ficção, o marketing e a vida, digamos, real.
Recapitulando, no novelão das oito, a atriz interpreta Jaqueline Joy, uma manicure que galgou rapidamente os degraus da fama e agora vê seu status de celebridade ameaçado pelo namorado e pela melhor amiga.
Num esforço de recuperar o terreno perdido, seu agente Nelito (vivido por Taumaturgo Ferreira) arma um assalto na praia e chama a ‘imprensa’ para flagrar a nudez da moça. (Aliás, é o segundo falso assalto na praia de ‘Celebridade’. Além de ser repetitiva, a piada é de mau gosto e sem graça, lembrando que a novela se passa no Rio de Janeiro.)
No dia seguinte, decepção: uma única fotografia, pequena e escondida, é o que rende o golpe de marketing. O tiro sai pela culatra, e o exibicionismo desmedido é punido com o silêncio e a indiferença.
Isso na ficção. Na vida, digamos, real, o negócio foi bem melhor. A armação da trama transmuta-se em um daqueles factóides amplamente anunciados, divulgados e de repercussão mais do que garantida.
O truque, ao que parece, veio mesmo para ficar: mesmo que a novela esteja indo bem de público, às tantas, inventa-se uma cena de impacto, em geral com uma relação apenas tangencial com a trama, de forma que se eleve ainda um pouco mais a quantidade de aparelhos ligados na emissora.
Para a Rede Globo, a anunciadíssima exibição das nádegas da moça levantou a audiência média para 51 pontos do Ibope. Não chegou a ser tão impressionante quanto os picos de 58 pontos conquistados no capítulo em que Maria Clara (Malu Mader) desancou Laura (Cláudia Abreu), mas, ainda assim, foi suficiente para render notinhas e fotos, antes e depois, e manter as atenções voltadas para a novela.
Para a dona das nádegas, a visibilidade conferida pelo episódio evidentemente não é de jogar fora. Juliana é a bola da vez no circo das vaidades: capa da edição de maio da ‘Playboy’, contrato recente como garota-propaganda de uma marca de cerveja, estrela global em movimento ascendente etc. etc.
Ou seja, na ficção, o episódio pode ter um desfecho moral em que o tiro sai pela culatra. Já aqui fora, sem um autor para reparar os desvios do mundo, são outros quinhentos. O engodo vence, as caixas registradoras tilintam e o espectador, goste ou não, segue sendo submetido aos caprichos do deus marketing.’
REALITY SHOWS
‘Público ‘toma controle’ de ‘American Idol’’, copyright Folha de S. Paulo / The New York Times, 30/05/04
‘Como se precisássemos de um lembrete de que o sistema eleitoral norte-americano é imperfeito. Milhões de espectadores de ‘American Idol’ votam, por telefone e mensagens de texto, nos seus concorrentes favoritos. Mas na presente temporada as votações foram tão volúveis e empurraram o programa para tão longe de seu propósito de encontrar o melhor cantor ou cantora desconhecido/a e fazer dele/a um astro, que até mesmo os jurados criticaram os resultados.
Quando La Toya London, 25, uma cantora de estilo parecido com o de Anita Baker, foi eliminada da competição em 12 de maio, o jurado Randy Jackson classificou o resultado como ‘farsa’.
Em abril, Simon Cowell, o mais desbocado dos três jurados (que selecionam o conjunto inicial de concorrentes, mas não controlam a escolha do vencedor), disse: ‘Não me importo mais com o programa deste ano’. E até mesmo Paula Abdul, a jurada que nunca tem algo de negativo a dizer, disse em entrevista que não seria capaz de prever quem sairia vitorioso no programa final da temporada, na quarta-feira, ‘porque jogaram a lógica pela janela’. A candidata Fantasia Barrino foi a vencedora dessa edição.
Os dois episódios semanais do programa ainda foram líderes em audiência, mas os índices são apenas parte da fórmula. Mais do que um programa de calouros, a idéia é que a série funcione como o grupo de discussão mais público do mundo, espécie de teste para descobrir que cantores se saem melhor junto à audiência.
O método funcionou, no passado. Kelly Clarkson, vencedora da primeira temporada, Ruben Studdard, vencedor da segunda, e até mesmo Clay Aiken, derrotado por Studdard, venderam milhões de discos. Mas neste ano diversos cantores excelentes e adaptados ao formato comercial das rádios foram eliminados nas votações. Em seus lugares, gente desafinada e exagerada avançou.
Se os finalistas de ‘American Idol’ não tiveram talento, o que isso significa para a premissa do programa e para o seu futuro?
Consideremos um procedimento adotado nos demais ‘reality shows’: ‘Big Brother’ começou permitindo que os telespectadores decidissem o destino dos concorrentes, mas mudou de idéia depois de uma primeira temporada desastrosa, em que qualquer candidato com personalidade era eliminado. Em ‘The Apprentice’, os produtores Mark Burnett e Donald Trump não deixaram nada ao acaso -demitiam participantes a torto e a direito, de acordo com o que consideravam ser melhor para o programa.
Assim, por que ‘American Idol’ deixa seu destino nas mãos do público? Quem são essas pessoas, e em que baseiam seus votos? Serão conhecedores de música? Fãs votando pelo participante com quem compartilham uma cidade natal? Meninas de 12 anos encantadas com um concorrente?
Mas nem tudo foi ruim. A temporada teve pontos altos, tanto em termos de coisas tão ruins que se tornam boas quanto em termos de qualidade genuína. Assistir a John Stevens, 16, com um comportamento e voz anacrônicos inspirados pelo ‘Rat Pack’ de Frank Sinatra, cantar acompanhado pelo Miami Sound Machine foi mais engraçado do que qualquer episódio de ‘Friends’.
‘American Idol’ não pára de crescer em popularidade, e já que o formato do programa é simples seria fácil alterar a fórmula para a próxima edição: talvez uma mudança de pessoal entre os jurados? Ou dar aos jurados o poder de proteger concorrentes contra o voto popular, ocasionalmente?
‘American Idol’ costumava exibir grande senso de justiça em termos de cultura pop. Mas o programa perdeu essa inocência. Tradução Paulo Migliacci’
Bruno Yutaka Saito
‘Especial mostra vida após ‘reality show’’, copyright Folha de S. Paulo, 28/05/04
‘Imagine a seguinte situação. Não agüentando mais as chatices de seu emprego, um dia você simplesmente surta e joga tudo para o alto. Resolve, então, tentar uma nova carreira, de preferência um emprego do qual você seja um completo leigo -e tudo dá certo.
A cena, típica de comerciais de faculdades particulares ou escolas de arte, serve de enredo para o ‘reality show’ ‘Tudo É Possível’, exibido no Brasil pelo GNT.
Sucesso na Inglaterra, ‘Faking It’ (o nome original) ganhou versão norte-americana. Nele, um participante tem quatro semanas para adquirir novas habilidades.
O especial que o GNT exibe hoje responde às perguntas de muitos telespectadores. Afinal, o que realmente mudou na vida dessas pessoas? Muita coisa, a julgar pelo programa de hoje.
A mudança mais radical foi aquela sofrida pelo web designer Stuart Matheson, 27. Quando participou do programa, ele topou tomar lições de surfe. Apesar de ser um desastre total -ele foi reprovado pelo júri-, ele garante que a mudança foi para melhor. Deixou de lado sua vida burocrática, em que só trabalhava para juntar dinheiro e comprar uma casa, e se mudou para a Austrália, para se dedicar ao esporte. Desapegado, o moço inclusive dá um pé-na-bunda na namorada com quem estava há dois anos e meio.
História parecida é a do corretor de seguros Matt Davis, que ‘fingiu’ ser um dublê de filmes de ação. ‘Vi que não queria ficar atrás de uma mesa em nenhum emprego.’ Enquanto não descobre exatamente o que quer fazer, Davis embarca para a Tailândia para praticar mergulho.
Já Chris Sweeney, vocalista de uma banda punk, não chegou a largar o cabelo tingido. Enquanto treinava para aprender como ser um maestro, ele resolveu incluir a participação do quarteto de cordas -formado pelos filhos de seu instrutor- na gravação de uma música de sua banda.
O especial, no entanto, não cai na tentação fácil de mostrar como é simples mudar a vida das pessoas. Uma das participantes, uma lutadora de kick boxe, por exemplo, tenta virar dançarina. Vê que não é aquilo que queria e volta rapidinho para as lutas. A vida real tem percalços bem mais imprevistos que um programa de TV. COMO ‘TUDO É POSSÍVEL’ MUDOU MINHA VIDA. Quando: hoje, às 20h, no GNT.’