Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nelson de Sá

‘Na bolsa de apostas sobre o próximo papa, o ‘dinheiro esperto’, escrevia ontem o britânico ‘Observer’, vai para ‘um papa terceiro-mundista’, alguém ‘do sul’.

Mas vai, antes de tudo, para ‘outro conservador’, seja de onde for. Afinal, os conservadores ‘têm a estatística do seu lado’, com 97 dos 120 cardeais indicados por João Paulo 2º.

O ‘Observer’ dá como favorito Francis Arinze, que seria o primeiro pontífice negro africano desde Gelasius, no século 6. Antes de nigeriano ou negro, ele é dado como ‘linha dura’ contra o homossexualismo, a camisinha e o aborto.

O jornal cita ainda, entre ‘os favoritos terceiro-mundistas’, o hondurenho Oscar Rodríguez e o brasileiro Cláudio Hummes, cardeal-arcebispo de São Paulo muito lembrado.

Cita também alguns europeus, mas o principal deles, um cardeal belga, é descartado como ‘muito liberal’. Em síntese, ‘a influência do papa João Paulo 2º vai se prolongar’.

Num momento de inesperada redescoberta do catolicismo brasileiro, na cobertura externa, o ‘New York Times’ enviou o correspondente Larry Rohter a Juazeiro do Norte.

Foi uma longa -e carregada de ironia- reportagem sobre o padre Cícero Romão Batista, tratado como um ‘antivírus’ ao avanço evangélico.

O correspondente registra uma suposta ‘boa vontade em Roma’ para talvez, quem sabe, canonizar o padre.

E ontem no meio da tarde a cobertura brasileira, da Folha Online à Globo News, e em seguida as agências internacionais dispararam a notícia da prisão, afinal, do suposto mandante do assassinato da freira americana Dorothy Stang.

No placar das buscas de web, a notícia derrubou de imediato o ‘papa’ d. Cláudio Hummes e o ‘santo’ padre Cícero.

‘Serial killer’

Nem bem se espalhou a boa imagem da prisão e deportação de Jesse James Hollywood e lá estava, ontem no ‘Washington Post’, a notícia do assassinato de duas turistas no Maranhão, também manchete do Jornal Nacional.

Para o jornal americano, é um ‘serial killer’ brasileiro.

Dez mais

E o Fantástico deu ontem em destaque, com locução de Cid Moreira, que o caso Jesse James Hollywood está para ser lançado em filme nos EUA, com Justin Timberlake.

As cenas finais serão no Brasil, com consultoria da namorada brasileira de um dos ‘dez mais procurados’ do FMI.

AS MELHORES RELAÇÕES

A secretária de Estado Condoleezza Rice voltou a declarar seu amor pelo ‘esquerdista’ Lula em entrevista ao ‘Washington Post’, no final de semana. Dela:

– Algumas de nossas melhores relações são realmente com governos que vêm da esquerda. Nós temos uma ótima relação com o Brasil e com o presidente Lula, por exemplo.

Foi num contexto em que voltou a criticar o venezuelano Hugo Chávez e o populismo que ele reapresenta à América Latina. Desta vez, porém, o tom de Rice foi mais contido, a ponto de estimular elogios do vice-ministro do exterior da Venezuela, em sites do país.

A inusitada concordância EUA/Venezuela aparece às vésperas da cúpula que vai reunir, na Amazônia venezuelana, os presidentes Chávez, Lula e Álvaro Uribe, da Colômbia, mais o primeiro-ministro espanhol, Jose Luis Zapatero.

É amanhã, como já anunciavam ontem os sites da Folha Online, do ‘Financial Times’ e da agência chinesa Xinhua, entre outros.

Ex-ministro do exterior do México, o escritor Jorge Castañeda surgiu ontem no ‘Miami Herald’ avisando sobre uma ‘corrida armamentista’ que estaria ‘tomando forma na América Latina’.

Citou, em destaque, o episódio em que Lula ‘foi fotografado a bordo do Tikuna’, o submarino, mais as compras de armas e aviões por Chávez e até pelo chileno Ricardo Lagos. Castañeda sugeriu trocar ‘armas’ por ‘arados’.

Por outro lado, também no ‘Miami Herald’, o colunista Andres Oppenheimer escreveu com algum estardalhaço que a ‘estratégia de combustível alternativo’ do Brasil é o caminho:

– É isso que Bush deve fazer para derrubar o preço do petróleo, resolver a crise no Oriente Médio, esquecer as tiradas de Chávez contra o ‘imperialismo’ e fazer todos os americanos mais felizes: Seguir o exemplo do Brasil.’

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‘Agradecido’, copyright Folha de S. Paulo, 24/03/05

‘Pela cobertura na Globo e sobretudo a transcrição no site do Pentágono, Donald Rumsfeld antes de mais nada queria agradecer pelo Haiti.

Na entrevista em Brasília, ele voltou repetidamente ao tema com declarações como:

– Os brasileiros podem ficar orgulhosos pela liderança que o Brasil está mostrando e pela coalizão, sem precedentes, de nações latino-americanas.

E depois:

– Meu país e, eu sei, outros países no hemisfério estão agradecidos ao Brasil, ao povo do Brasil, ao governo do Brasil, às forças militares do Brasil que estão providenciando a liderança. É exemplo do papel do Brasil no mundo e na região.

Porém, como notou a Globo, ‘o secretário não respondeu sobre a reivindicação do Brasil, de um assento no Conselho de Segurança’. Passou para a frente, para a secretária de Estado, Condoleezza Rice.

Em sites dos EUA, o que mais repercutiu não foi o Haiti, mas de novo a Venezuela.

O secretário questionou, de novo, a compra de 100 mil fuzis russos por Hugo Chávez. Foi o enunciado nos sites do ‘New York Times’ e outros.

E também, curiosamente, num sem-número de páginas como ‘Marine Corps Times’ e airforcetimes.com.

Duas passagens, na coletiva, em que o vice José Alencar ecoou visitas anteriores.

Ao responder sobre notícia na Argentina, Rumsfeld ironizou o repórter, ‘você não crê em tudo o que lê em jornal, não é?’, ao que Alencar completou:

– Se me permite, eu gostaria de recordar que o presidente Thomas Jefferson disse que nem sempre, quando lê jornais, você sai bem informado.

Depois, transferiu pergunta a Rumsfeld, dizendo que deveria ‘ser respondida pelo indivíduo mais importante aqui’.

E ainda tem FHC, que surgiu ontem no ‘Miami Herald’ com louvores ao vice de Rumsfeld, Paul Wolfowitz, indicado agora ao Banco Mundial.

Por fim, esperava-se bem mais dos pacifistas brasileiros.

Só ‘um pequeno grupo de estudantes’, segundo a Globo Online, protestou em Brasília contra ‘o visitante indesejável, expoente do governo tirânico e imperialista’. Em Manaus, deu para contar: foram 27.

Donald Rumsfeld e ‘Lula da Silva’, entre sorrisos, na home page do ‘Financial Times’

APOIO DOS EUA

John Taylor, subsecretário do Tesouro, surgiu no site do ‘Wall Street Journal’ para elogiar o Brasil, no título, ‘às vésperas de decisão sobre FMI’. O Brasil não recorre ao Fundo desde 2003 e pode não renovar. Taylor:

– Tem sido um desempenho tremendamente bom do Brasil. É importante ver que ele tem sido bem-sucedido por si mesmo; o sucesso é devido à escolha que fizeram das próprias políticas. E é deles a decisão sobre o FMI.

APOIO DA CHINA

Chong Quan, porta-voz do Ministério do Comércio da China, surgiu no site do ‘Diário do Povo’ (e depois do ‘NYT’, ‘WSJ’ etc.) anunciando apoio ao brasileiro Luiz Felipe Corrêa para a direção da Organização Mundial do Comércio. O texto no ‘NYT’ reproduzia idéia de Corrêa -de tornar o desenvolvimento dos países pobres um ‘objetivo comum’ também aos membros ricos da OMC, mas sem uma ‘perspectiva de confrontação’.

‘ATALHO’

A ‘Economist’ foi ao extremo oeste do Acre e do Brasil para anunciar que, em um ano, São Paulo e principalmente o Mato Grosso da soja estarão ligados ‘aos portos do Pacífico por uma estrada asfaltada’. E de lá para a China.’

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‘‘Surpresa’’, copyright Folha de S. Paulo, 23/03/05

‘A sombra de ‘uma possível retaliação’ de Severino Cavalcanti ‘por ter ficado fora’ apareceu na Globo News.

‘Para se defenderem’ dela, os líderes aliados já querem que ‘a pauta seja decidida pelo colégio de líderes e não só pelo presidente da mesa’.

A sombra surgiu com as entrevistas de Severino. Dele, na Globo, sobre sua influência no engavetamento da reforma:

– Eu não vivo lá no palácio.

Sobre sua ‘frustração’:

– Quem tem a caneta é ele, não eu. Não tem frustração.

Se a ironia severina não bastasse, veio o líder do PP José Janene, na Globo News:

– [No Paraná, Severino] fez trocadilho. Se levar a sério, o governo tem que analisar que as declarações [de Lula] no Espírito Santo foram mais sérias.

À Folha Online, Janene acrescentou que ‘as declarações de Severino não atrapalham’ e sim ‘quem faz as negociações’:

– O palácio foi vacilante.

Depois de tudo, no fim do dia vem Severino e diz, ao ser questionado se caminhava para a oposição, na Folha Online:

– Eu gosto é de governo.

E Janene mudou de conversa:

– O presidente Lula tomou uma posição sensata [na reforma]. Não tem problema nenhum em ficar desta maneira.

Disse que o PP é da base aliada desde o começo e ‘não vai mudar’ agora por ‘um ministério a mais ou a menos’.

Arriscou então o blogueiro Ricardo Noblat, em síntese:

– Severino é doido, mas ainda não a ponto de rasgar dinheiro. O PP vive à sombra do governo, qualquer governo. Se baixar a crista e der provas de bom comportamento, poderá mais tarde ser admitido.

O Jornal Nacional, na manchete, falou em ‘surpresa’ com ‘só dois’ novos ministros.

Mas, no site do ‘Wall Street Journal’, uma reportagem expressou estranheza, ‘quando analistas, líderes políticos e cobertura local especularam durante semanas que as mudanças seriam extensas’.

Na mesma direção, o site Agência Carta Maior opinou que ‘a bolsa de especulações e boatos sofreu um baque’.

ATAQUE À CÂMARA

Ainda não se tem idéia do desgaste que Severino vai impondo à democracia. Mas ontem, nos telejornais da Globo, se viam cenas de violência numa pequena cidade a 40 quilômetros de Brasília. ‘Os eleitores tentaram invadir a Câmara Municipal, alguns tentaram agredir os vereadores, houve feridos.’ Era um protesto contra a aprovação de um aumento de salários para o prefeito e a vice

Haiti e Iraque

Na BBC Brasil e na transcrição do site do Pentágono, o secretário de Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, que se encontra hoje cedo com Lula e José Alencar, voltou a tratar do Haiti:

– Não há dúvida de que, conforme você caminha para a eleição, pode haver pessoas que gostariam de intervir para evitar que ela seja bem-sucedida. Nós com certeza vimos isso em outras partes do mundo.

A ‘lição’ de Iraque e Afeganistão, segundo Rumsfeld, é estar ‘preparado do ponto de vista da segurança’ -o que os países ‘que vêm sendo de tanta ajuda no Haiti já têm na agenda’.

‘Sob controle’

Também na BBC Brasil, o chefe da missão militar da ONU, o general brasileiro Augusto Heleno Ribeiro, disse ontem que o Haiti está ‘sob controle’:

– De vez em quando há impaciência e eles querem que resolvamos um problema que se arrasta há 200 anos. Mas tudo o que está acontecendo foi previsto e está sob controle.

Sobre a ‘convocação’ de ações de guerrilha contra as forças da ONU, feita por ex-militares, disse que é preciso distingui-los dos rebeldes. Os ex-militares, segundo ele, querem ‘o pagamento de soldos atrasados’ e, portanto, serão ‘tratados por diálogo’.’



FSP CONTESTADA
Painel do Leitor, Folha de S. Paulo

‘Bolshoi’, copyright Folha de S. Paulo, 25/03/05

‘‘Na mais recente reportagem sobre as investigações do Ministério Público Federal em Joinville (SC) acerca do destino de verbas públicas aplicadas no projeto da Escola do Teatro Bolshoi (‘Joinville se mobiliza para manter filial’, Ilustrada, 13/3), mais uma vez a reportagem da Folha foi parcial ao não abordar um fato de alta relevância jornalística, presenciado pelo repórter Frederico Vasconcelos. Refiro-me à manifestação de 300 pais, mães e alunos do Bolshoi que, no desfile comemorativo ao aniversário de Joinville, ocuparam a avenida com faixas e cartazes pedindo apoio à manutenção do projeto, que atende a mais de 250 crianças (94% dos quais bolsistas, pois são de famílias carentes). Além disso, a reportagem afirma que os alunos da escola ‘foram convocados na semana passada a deixar de lado as sapatilhas e os ensaios para colher assinaturas em um documento que será enviado ao presidente Lula e ao procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, pedindo a manutenção da única filial do famoso balé russo’. Ninguém foi convocado como se fosse uma operação orquestrada por um poderoso sujeito oculto. Pais e mães de alunos, mobilizados diante da possibilidade de fechamento da escola, se organizaram espontaneamente. Além do mais, ninguém teve de deixar as sapatilhas de lado, pois o dia da citada coleta, 9 de março, é feriado municipal e não houve aula.’ José Augusto Gayoso Neves, diretor de imprensa do governo do Estado de Santa Catarina (Florianópolis, SC)

Resposta do jornalista Frederico Vasconcelos – Este repórter não estava em Joinville no dia da manifestação. A carta omite trecho da reportagem: ‘Pais e mães de alunos participaram de um ‘abraço’ à sede da escola’. A coleta de assinaturas, em shoppings e em praças, com funcionários, crianças e alunos da escola, ocorreu antes do feriado, fato relatado ao juiz de Infância e Juventude.’



MERCADO DE TRABALHO
Carlos Alberto Sardenberg

‘‘Frila fixo’ ou desempregado?’, copyright O Estado de S. Paulo, 28/03/05

‘Quem não trabalha no setor de comunicação – imprensa, propaganda, editoras, comunicação empresarial, produtoras de audiovisual, etc. – talvez não saiba o que é um ‘frila fixo’. ‘Frila’ vem de free lance, aquele profissional sem emprego fixo que trabalha por serviço. Ganha por hora, por dia ou por tarefa. ‘Frila fixo’, portanto, é uma contradição, mas existe. É o profissional que trabalha numa determinada empresa – como redator, fotógrafo, desenhista, etc. -, recebe remuneração regular, geralmente mensal, mas não tem carteira assinada.

Isso sempre funcionou em pequena escala, em situações variadas. Na mais comum, a pessoa faz diversos ‘frilas’ para uma empresa, esta resolve contratá-lo, mas o departamento de pessoal ainda não liberou a vaga. O profissional fica, então, como ‘frila fixo’, porque existe alguma verba para isso, até surgir a vaga formal. Também era costume colocar um ‘frila fixo’ como uma espécie de teste ou estágio. Dando certo, assinava-se a carteira.

De uns anos para cá, surgiu a onda da pessoa jurídica (PJ) em todos os setores da economia brasileira. As companhias estimularam e/ou obrigaram funcionários de um nível médio para cima a se constituírem como PJs, empresas prestadoras de serviços. Assim, em vez de assinar carteira profissional, as companhias passaram a contratar serviços de outras empresas, as PJs, quase sempre firmas de um dono só, sem empregados, sede em casa.

O objetivo óbvio é fugir da custosa legislação trabalhista. E para profissionais de melhor remuneração é também um meio de pagar menos impostos. Verdade que esses profissionais, não tendo FGTS, nem INSS, nem plano de saúde da empregadora, têm eles mesmos de pagar por isso tudo, inclusive fundo de pensão. De todo modo, parece vantajoso para os que ganham mais.

Já profissionais de nível médio não gostaram. Claramente, preferiam ser contratados pela CLT, mas essa opção não existia. Ou eram PJs ou não tinham emprego.

E, assim, no ramo da comunicação se generalizou o ‘frila fixo’. É a mesma coisa que, por exemplo, o advogado de um banco transformado de empregado CLT em PJ prestador de serviço.

Não se trata de informalidade. A PJ é legal e assina contrato com a companhia, tudo registrado. Mas é evidente que, na maior parte dos casos, se trata de uma ilegalidade, algo proibido pela legislação trabalhista.

E o mercado se acomodou assim. Até que veio o governo Lula. Os sindicatos de trabalhadores sempre foram contrários a essa prática. E sempre reclamavam da falta de fiscalização pelas Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs). Na verdade, existia uma espécie de acordo tácito: melhor não mexer em algo que de algum modo estava funcionando e que era fonte potencial de conflitos. Com a vitória de Lula e a presença de sindicalistas no governo e, especialmente, no Ministério do Trabalho, os sindicatos começaram a pressionar por mais fiscalização. As DRTs foram a campo e, claro, apanharam o que tinham de apanhar.

Diversas empresas de comunicação foram multadas e/ou advertidas. Algumas, para evitar maiores disputas judiciais, decidiram eliminar de vez as PJs e os ‘frilas fixos’, contratando apenas pela CLT. Aparentemente, pois, o objetivo da fiscalização foi atingido. Mas é preciso discutir as conseqüências. E a principal delas é que muita gente simplesmente perdeu o emprego. E os que tiveram sua carteira finalmente assinada – como desejavam – estão trabalhando mais e, não raro, ganhando menos.

Considere uma editoria de um jornal ou o departamento de arte de uma agência funcionando com cinco ‘frilas fixos’, cada um ganhando R$ 5 mil por mês, gastando, portanto, uma verba de R$ 25 mil. Esse era o custo total para o contratante. Cada ‘frila’ dava um recibo ou uma nota fiscal de R$ 5 mil e recebia um pouco menos, pois a empresa já descontava na nota 6,15% de Imposto de Renda, PIS, Cofins e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). O ‘frila’ ou PJ tinha ainda de pagar o ISS (para a Prefeitura) e acertar contas com a Receita pelo sistema Simples ou lucro presumido, mas isso era lá com seu contador. Para a empresa contratante o custo era R$ 5 mil e ponto final.

Depois da fiscalização, algumas empresas de São Paulo determinaram que todo mundo precisa estar na CLT – mas cada departamento tem exatamente a mesma verba para pessoal. No nosso exemplo acima, os mesmos R$ 25 mil mensais. Ora, isso dá para, no máximo, três CLTs, se registrados com o salário de R$ 5 mil.

Sobre esse salário a empresa fica com os seguintes custos:

1/12 de provisão para férias – R$ 416,67;

1/3 do salário de férias – R$ 138,89;

FGTS, 8,5% – R$ 425;

INSS, 20% (empresa) + 5,8% (Senac, Sesi, etc.) + 3% de seguro acidente de trabalho (SAT) = 28,8% – R$ 1.440;

13.º salário (provisão de 1/12) – R$ 416,67;

Vale-Transporte (duas conduções e 20 dias) – R$ 80;

e Vale-Alimentação (R$ 8 por dia) – R$ 160.

Sem considerar provisão para multa e indenização em caso de demissão sem justa causa, incluindo 40% sobre o FGTS, o empregado CLT sai para a empresa por pouco mais de R$ 8 mil por mês. Ou seja, onde cabiam cinco ‘frilas fixos’ cabem três com carteira assinada.

É o que está acontecendo no ramo da comunicação. Os que ficam certamente estão mais seguros, embora talvez ganhem um pouco menos. Sobre os R$ 5 mil descontam Imposto de Renda de R$ 833,75 e INSS de R$ 275,99. Também trabalham mais, por certo, e a qualidade do serviço obviamente cai.

Tudo considerado, o resultado – e isso está de fato acontecendo em diversas empresas – é de três profissionais no bom abrigo da CLT (especialmente para as mulheres, que ganham acesso à muito especial licença-maternidade, aliás, não contada no custo acima) e dois ‘frilas fixos’ desempregados.

E aí, tudo bem?

É claro que a situação ideal seria que as empresas assinassem a carteira de todos os ‘frilas’ e PJs, como querem os sindicatos. Mas isso não vai acontecer, dado o enorme custo do emprego formal. De modo que se pode levantar a questão ética e profissional: faz sentido impor uma legislação que gera ao mesmo tempo vantagens e desemprego? Observando o conjunto da economia, verifica-se que a maior parte dos trabalhadores hoje não está nem na CLT nem na PJ, mas na completa informalidade. Ora, está na cara que há algo de errado com uma legislação que divide os trabalhadores entre uma minoria de privilegiados, na ampla segurança da CLT, e uma maioria de sem-direitos, sem-previdência e/ou sem-emprego. Carlos Alberto Sardenberg é jornalista. Home page: www.sardenberg.com.br’



Eduardo Ribeiro

‘Quem estará com a razão?’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 23/03/05

‘Presenciamos, dias atrás, um momento histórico para os sindicatos dos jornalistas do País, quando os fiscais da DRT – Delegacia Regional do Trabalho, de São Paulo, saíram às ruas num mutirão de fiscalização sobre um grupo de empresas jornalísticas.

Me lembro bem quanto aspiramos, em diretorias passadas, por um momento desses, sem que ele nunca chegasse. Esperneávamos a valer denunciando inúmeras situações irregulares, apontávamos onde essas irregularidades ocorriam, dávamos nomes aos bois, mas nunca víamos as empresas ‘fiscalizadas’ serem punidas de forma exemplar por descumprir e até mesmo afrontar a lei. Ao contrário, a cada investida fracassada, maior era a desmoralização do Sindicato e de seus dirigentes, que além de tudo sofriam na pele as constantes manifestações de descontentamento da categoria por não conseguir fazer com que a lei fosse cumprida. Sem poder de fiscalização e autuação e totalmente dependente de uma DRT desinteressada nesse tipo de ação, restava aos sindicatos buscar outras formas de ação e de organização. Tentativas de paralisação quase nunca deram certo – aliás, algumas, como a de 1979, foram catastróficas. Pressão nas bases muito menos, pois ao primeiro levante cabeças sempre foram cortadas sem dó nem piedade.

Por que, então, não criar um Conselho Federal de Jornalistas, a exemplo dos que existem em outras categorias, que tivesse o poder de fiscalizar e multar os infratores?

Bem, o resultado todos conhecem, tal o massacre que esta proposta sofreu das empresas e de próceres da categoria, movimento que se mostrou decisivo para que se jogasse uma pá de cal no projeto. Como não é todo o mal que vem para fazer mal, a derrota do Conselho pode ter aberto outros caminhos, entre eles o de que finalmente se criasse no ambiente da Justiça do Trabalho motivação para uma fiscalização mais rigorosa nas empresas. É o que estamos vendo, embora sem a certeza de que vá durar e de que seja pra valer. Mas não deixa de ser efetivamente uma vitória do Sindicato contra as empresas que sistematicamente se recusam a regularizar a situação trabalhista de seus profissionais e também da própria categoria, que, mesmo sofrendo alguns reveses momentâneos, deverá ser beneficiada a médio e longo prazo, por recuperar os empregos informais para a formalidade, com todos os benefícios daí advindos. Certo? Nem tanto! Esse é apenas um dos lados da moeda.

Parcialmente vitorioso, o Sindicato tem também de encarar uma outra situação difícil e penosa: a demissão de um grupo de profissionais em decorrência da ação que foi desencadeada pela DRT. Na prática, fechamento de vagas. Temos aí o caso específico da Folha de S.Paulo, que, por conta da fiscalização, decidiu pôr fim aos frilas fixos, ficando apenas com profissionais contratados pela CLT. Alguma coisa de diferente aconteceu no Grupo Folha para, dessa vez, tomar uma decisão tão drástica e legalista. Talvez convencido de que dessa vez seria pra valer e que os riscos trabalhistas mostravam-se demasiadamente grandes. Talvez pela presença de um sócio internacional que não está acostumado a esse tipo de conflito e de confronto. O fato é que a empresa assimilou o golpe e imediatamente pôs em prática a estratégia de regularizar a situação trabalhista em todos os núcleos da empresa, eliminado a vulnerabilidade até então existente.

Como o dinheiro disponível não era suficiente para contratar todos os frilas, muitos foram demitidos – aproximadamente 1/3 ou cerca de 20 pessoas. Culpados? Para uns o Sindicato, que forçou a barra e errou na dosagem e nos métodos. Para outros a empresa, que tinha todo o tempo do mundo para regularizar a situação de seus jornalistas e não o fez. E para todos a legislação trabalhista que penaliza sobremaneira quem emprega com carteira assinada. Fred Ghedini, presidente da entidade, diz que considera lamentável que algumas dispensas tenham sido motivadas pela fiscalização, sobretudo porque a ação é para proteger os profissionais, e não o contrário. Mas lembra que ‘se há perdas no plano individual, ganhos substanciais surgirão no plano coletivo, sobretudo em relação à moralização da atividade jornalística no Estado’. Ele diz que a campanha de fiscalização continuará, acrescida de outros instrumentos que por enquanto prefere não revelar, até por conta do elemento surpresa. Mas frisa: ‘O Sindicato não é movido por vingança ou perseguição a quem quer que seja, e sim pelo sentimento da defesa da atividade profissional’.

Por outro lado, não dá para ignorar o sentimento de tristeza, frustração e revolta que tomou conta daqueles que perderam o ‘emprego’ ou foram obrigados a demitir. Quem precisa trabalhar nem sempre tem condições de fazer exigências e acaba se submetendo a situações adversas. O profissional e a empresa sabem que isso não é correto, mas acabam fazendo um pacto em nome da sobrevivência, driblando a legislação – os empregados por falta de alternativa ou, em alguns casos, para embolsar parte do que seria pago pela empresa a título de encargos sociais; e as empresas exatamente para diminuírem os tais encargos que representam um custo superior a 100% da folha de pagamento. Especificamente sobre os ajustes na Folha, um dos colegas do jornal, revoltado com o Sindicato, enviou seu desabafo: ‘Parece ser legal o fato de tanta gente ter sido contratada. Mas não é. A quantidade de demissões de frilas foi muito grande. E quem foi contratado ganha o piso profissional. Isso sem falar nos muitos colegas demitidos, que ganhavam seu suado dinheiro mesmo sendo frilas. Eles não estavam infelizes, não! São esses os grandes prejudicados. Esses estão na rua agora, sem nada para viver. E os que ficaram terão de trabalhar ainda mais do que trabalhavam antes. Pergunto: valeu a pena isso? Que raio de sindicato é esse que prefere ver gente na rua do que flexibilizar seus dogmas trabalhistas?

Desculpe o desabafo, mas é que vi um monte de gente feliz, mas também um monte com os olhos cheios de lágrimas, pais e mães e filhos que sustentam suas casas… Que prevaleça o bom senso e que os eventuais sacrifícios não sejam em vão.’