Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Sindicato finge de vítima e agride
todos os princípios profissionais

A alegre rapaziada que compõe a diretoria do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) continua desnorteada: não sabe escrever releases, passou quase duas semanas sem coragem de assinar suas manifestações e sequer consegue entender uma questão comezinha de direito: não cabe às partes definir o que é opinião ou difamação – essa questão será dirimida pelo magistrado competente.


Enquanto isto, importa o repúdio do Committee to Protect Journalists às ameaças a jornalistas que participam de debates públicos. Um sindicato cuja função primordial é defender o direito dos jornalistas não pode pretender silenciar uma voz discordante. Isso nos remete às ditaduras, aqui e alhures, antigas e recentes. Em plena temporada eleitoral, esta tentativa de censura legal ofende a idéia republicana.


A Ordem do Dia do SJPDF, emitida no dia 24/8/06 às 19h32 – finalmente assinada! –, é um amontoado de armações. Como as anteriores, essencialmente enganosa. O cerne da questão foi manipulado de forma grosseira como sói acontecer em ambientes profissionais desatentos à busca da verdade e ao esclarecimento.


Histórico da polêmica


Tudo começou quando o SJPDF, no boletim 164 de 12 de agosto, convocou os jornalistas brasilienses para um encontro no dia seguinte (13/8) em defesa dos povos libanês e palestino, a fim de iniciar a mobilização para ‘uma grande manifestação a ser realizada no próximo dia 20 de agosto, em frente à Embaixada de Israel, em defesa da vida e da autodeterminação dos libaneses e palestinos’.


Não era convite para um debate nem apelo para o fim das hostilidades. Não se pretendia discutir os problemas do Oriente Médio ou as formas de encerrar os quase 60 anos de guerras naquele pedaço do mundo, como seria de se esperar de jornalistas teoricamente isentos e comprometidos com as causas humanitárias.


Ao contrário: tratava-se de uma ação deliberada e preconceituosa de um grupo de militantes em favor de uma das partes do conflito. Como não confiam na validade de seus argumentos nem em sua capacidade de expô-los no papel, preferem fatos consumados, iniciativas de rua.


A pretendida solidariedade às vítimas dos bombardeios omitiu ostensivamente os israelenses mortos pelos katiushas iranianos disparados pelo Hezbollah, a maioria (àquela altura) constituída de árabes israelenses. Quando este observador reclamou contra a desumana omissão, os lobistas organizadores da passeata-carreata-convescote alegaram que a expressão ‘árabes israelenses’ era imprópria, estes mortos eram palestinos. Erraram mais uma vez: grande parte dos mortos pelos katiushas é árabe – cristãos ou muçulmanos, não importa –, mas há 58 anos cidadãos de Israel, com direito a voz e voto.


Diante do protesto deste observador, no release emitido pelos assessores de imprensa do DF finalmente foi reconhecido ‘o direito do povo israelense de construir o seu Estado democrático em paz nos limites definidos pela ONU em 1947’.


E, para justificar a omissão das vítimas dos katiushas, os lobistas recorreram à tenebrosa objetividade estatística: ‘Dos quase 160 mortos em Israel, 120 eram soldados’. Digamos que a conta estivesse certa: os 40 civis não merecem solidariedade? Quantas mortes israelenses serão necessárias para comover os corajosos pacifistas do SJPDF a organizar uma manifestação verdadeiramente humanitária?


O mais curioso é que nem a opinião pública brasiliense nem a brasileira foi informada a respeito das intervenções encomendadas pela diretoria do sindicato de jornalistas do DF por ordem da CUT. Na primeira, dia 13/8, num restaurante, aparecem três pessoas sentadas numa mesa e, ao fundo, um militante do MST com a respectiva camiseta e bandeira.


Domingo seguinte, na rua, uma verdadeira multidão: cerca de 30 pessoas, seis delas com a camiseta do MST. Numa das faixas, ‘EUA e Israel, parem de matar!’, em outra, ‘Basta de matança no Líbano e Palestina’. Nenhuma referência às mortes em Israel, nenhum apelo pelo fim das hostilidades, nenhuma convocação à paz. Nenhum debate, nenhum esforço jornalístico para informar corretamente. Apenas preconceitos e ressentimentos.


Apropriação indébita


Os dois eventos são exemplos de um comportamento incompatível com os procedimentos jornalísticos mais elementares. Os marechais do SJPDF gastaram sua parca retórica ao tentar apropriar-se do nome do jornalista Carlos Castelo Branco, presidente do Sindicato em 1977. Naquela época o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal estava na vanguarda das lutas pela democracia. Hoje, arrepiou carreira, passou para o outro lado. Naquela época, o sindicato não fora invadido pelos assessores de imprensa e muito menos pelos assessores de imprensa dos três poderes e entidades chapa-branca. Tinha autonomia e galhardia.


Carlos Castelo Branco, se vivo fosse, não permitiria que um sindicato de jornalistas embarcasse na louca aventura do Conselho Federal de Jornalismo, um dos maiores vexames já sofridos pela categoria em toda a sua história.


Se vivo fosse, Carlos Castelo Branco não entregaria a um deputado-sanguessuga um projeto de regulamentação da profissão inspirado no modelo corporativo de Benito Mussolini.


Carlos Castelo Branco, se vivo fosse, já estaria à frente de uma cruzada para separar organicamente as entidades sindicais de jornalistas das de assessores de imprensa para evitar o gigantesco conflito de interesses a céu aberto que compromete, diminui e desqualifica a circulação de informações na capital federal.


Injuriado primeiramente foi este observador quando a diretoria do SJPDF tentou classificá-lo de ‘crítico da imprensa marrom’, ignorando a sua folha de serviços como jornalista profissional à frente de jornais, revistas, formação profissional e experiências democráticas como o Observatório da Imprensa, que agora completou a sua primeira década de vida.


Desrespeitado na sua dignidade foi um jornalista que assume o que diz e assina o que escreve. Um sindicato que se arvora em defensor das liberdades democráticas não pode enfiar-se num bunker para disparar em notas oficiais suas tacanhas aleivosias.


Ofendido como ser humano, desrespeitado como intelectual foi este defensor da causa da paz. Agredido publicamente foi este jornalista que reclama um mínimo de isenção daqueles que pretendem apossar-se de uma profissão honrada e colocá-la a serviço de jogadas partidárias e interesses escusos.


Humilhado foi este cidadão brasileiro, judeu de formação, comparado de forma perversa, nazistóide, a um comandante de tanque israelense. Isso não é discriminação racial, é discriminação étnica, ilícito igualmente grave, como já o considerou o STF.


Este será um bom combate para um jornalista que recebeu a sua carteira profissional exatamente há 54 anos, no dia 25 de agosto de 1952.