Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Marcelo Coelho

‘Onze pessoas me acham confiável. Umas nove dizem que sou legal. Cinco admitem que sou sexy. Além disso, conto com um grupo de 13 fãs. Não é tão pouco, considerando que entrei no Orkut só há algumas semanas.

Funciona assim: você recebe um e-mail de algum amigo ou conhecido, convidando-o a participar do site. Você clica, se cadastra e encontra a página da pessoa que o convidou. Lá está a foto do seu amigo ou amiga, com a idade, o estado civil, as preferências políticas, religiosas, musicais etc. Além disso, na mesma página, você vê a foto de todos os amigos do seu amigo -clicando, você chega até eles também.

Mas não precisa fazer isso já. Contente-se em responder no quadradinho do ‘yes’ à pergunta: ‘Is Fulano your friend?’. E pronto! Agora você também pertence ao grupo dos amigos de Fulano. Iniciam-se as suas experiências no Orkut. Em poucos dias, outros convites irão chegar.

Até aqui, tudo parece apenas um dispositivo no gênero ‘corrente da felicidade’, servindo para troca de endereços eletrônicos. As coisas ficam um pouco mais interessantes em seguida.

É que seus amigos começam a opinar sobre você. Na sua página, aparecem algumas ‘cotações’, como as estrelas que os críticos de cinema dão para os filmes em cartaz. Que eu saiba, há três características sendo avaliadas. O item confiabilidade (que se traduz em carinhas sorridentes agregadas ao lado do seu nome), o seu grau de atratividade sexual (coraçõezinhos) e o quanto você é divertido (‘cool’, em inglês: cubinhos de gelo).

Chega o momento de dar o troco -e classificar seus amigos conforme esses quesitos também. Situações ‘quentes’ podem rolar. Como usuário do Orkut, você tem a prerrogativa de assinalar, dentre as pessoas da sua turma, aquelas com quem toparia sair para um encontro romântico; mais do que isso, pode dizer que é ‘fissurado’ em determinada pessoa (em inglês, é ‘to have a crush on someone’). Essa pessoa não saberá disso. A não ser que ela também tenha declarado o mesmo a seu respeito.

No Orkut se misturam, assim, as características do correio elegante, da confraria do elogio mútuo, dos grupos de discussão, dos fotologs e de outros mecanismos de relacionamento interpessoal possibilitados pela internet. No Brasil, virou uma febre: o país é o que reúne mais participantes no site, superando os americanos.

O sistema oferece, claro, muitas coisas legais. Encontra-se o paradeiro de pessoas queridas, conhece-se mais a respeito de nossos próprios amigos, tem-se acesso a grupos de informação sobre todo tipo de assunto; por enquanto, não há muitos anúncios, nem o número de spams em minha caixa postal aumentou significativamente.

O objetivo do Orkut, entretanto, é o mesmo de todo tipo de acontecimento em curso na internet. Explicaram-me uma vez que a principal preocupação de provedores, sites e congêneres resume-se apenas numa coisa: importa conseguir que o usuário passe cada vez mais tempo diante do computador. As salas de chat, os blogs, as enciclopédias, horóscopos on line… Tudo, enfim, que é oferecido na rede -e aqui o termo ‘rede’ é bem apropriado- destina-se a produzir um público virtual cativo, grudado ali, exposto à publicidade, pronto a consumir num clique.

O Orkut funciona melhor do que muitas outras coisas para atingir esse objetivo, pois alia o interesse das relações pessoais aos mecanismos psicológicos do jogo, do bingo ou do caça-níqueis. Quantas estrelinhas vou ganhar? Quantas pessoas eu convido? Quem tem mais pessoas no seu grupo de amigos: eu, que sou uma pessoa legal, ou o canalha X, a quem detesto? Desse modo, as relações afetivas podem terminar anabolizadas pela competitividade: constrói-se uma espécie de ibope pessoal, uma bolsa de valores na escala do indivíduo.

Não estará totalmente errado quem disser que na vida cotidiana é sempre assim, e que o Orkut simplesmente digitalizou a lógica que ordena as relações de qualquer pessoa com seus semelhantes. O problema não está no fato de que possamos agir de forma mais ou menos interesseira, mais ou menos sincera, mais ou menos vaidosa, no Orkut ou fora dele. O que mais me assusta nesses fenômenos da internet, como eu estava dizendo, é sua estrutura viciante, viscosa: como num jogo de azar, exige-se um esforço mínimo e repetitivo do usuário, que é sempre espicaçado pelo fator surpresa: ‘Será que tem alguma novidade no site? Quem mais me convidou? O que de novo escreveram no livro de recados?’ -coisas desse tipo.

Procura-se, e oferece-se, um bem real e outro imaginário. Amizades legítimas podem ser alimentadas via Orkut, como pelo telefone ou pelas cartas manuscritas; mas também se pode buscar no site apenas a estrelinha, a cifra, o distintivo -as fichas de plástico da amizade. É assim que um espírito de cordialidade brasileira -o tapinha nas costas etc.- sobrevive também no meio dessa modernidade toda e pode ser uma explicação para o sucesso do site entre nós.

Uma última observação. Aquilo que procuramos no varejo -nosso ibope- é aquilo que os próprios sites e provedores procuram no atacado; o indivíduo enredado no Orkut imita, sem saber, os seus manipuladores. O jogo não se equilibra com isso, mas tudo, mais uma vez, fica parecendo recíproco.’



INTERNET / BUSCADORES
Marijô Zilveti

‘Pesquisa na internet tem novos recursos’, copyright Folha de S. Paulo, 30/06/04

‘Os endereços de busca travam uma guerra sem trégua para manter o internauta fiel. Nessa batalha, as armas utilizadas pelos concorrentes são várias: a rapidez e a qualidade da resposta e a quantidade de recursos oferecidos para chegar a um resultado.

Nas últimas semanas, o líder Google (www.google.com) deu mais alguns passos para se manter no primeiro posto, anunciando facilidades para quem mantém a barra de busca em seu site.

Trata-se de um programa que permite que donos de páginas acrescentem a barra do Google em seu site para receber dinheiro a partir de textos de anúncios.

O sucesso do Google é tamanho que o mercado aguarda ansioso a abertura de capital nos EUA.

O Yahoo (search.yahoo.com), que já liderou o ranking de buscas, decidiu copiar o concorrente e criar sua barra (companion. yahoo.com) para facilitar a pesquisa. Mais: incrementou a busca com o recurso de imagens e saiu na frente do Google por permitir localizar endereços por mapas.

O Google, por outro lado, fez mudanças importantes em suas fórmulas algorítmicas para oferecer melhores resultados nas pesquisas. Na barra de atalhos (toolbar.google.com), o internauta pode ver o ranking das páginas acessadas, por exemplo.

A Microsoft, que só no final da década passada despertou para a importância mercadológica dos navegadores, também entra atrasado na área de mecanismos de busca. De olho no lucro de US$ 105,6 milhões que o Google registrou em 2003, a gigante do software investe parte de seu caixa de US$ 56 bilhões em uma nova versão de seu buscador, prometida para este ano.

Por ora, o usuário do site de buscas da Microsoft pode ter a barra de atalhos (toolbar.msn.com) em seu navegador e espiar o site latam.newsbot.msn.com para ver o que vem por aí.

Outro item que atrai a lealdade do internauta ao buscador é a quantidade de páginas indexadas. De olho em seu público, o Google acrescentou, em fevereiro, 1 bilhão de páginas ao seu mecanismo de busca, passando de 3,3 bilhões para 4,3 bilhões de páginas.

Segundo a empresa, houve também um sensível acréscimo no número de imagens indexadas: de 400 milhões para 800 milhões.

Mas isso ainda está muito longe de abarcar o conjunto da internet, que, segundo estimativas, reúne 10 bilhões de páginas.’



BLOGS NO PAPEL
Cassiano Elek Machado

‘Blogs em conserva’, copyright Folha de S. Paulo, 3/07/04

‘Nascidos com a vocação da vida breve, os textos feitos para blogs estão encontrando aos poucos um dos formatos de comunicação mais antigos criados pelo homem, o livro.

O primeiro grande exemplo brasileiro disso será ‘postado’ nas livrarias nesta segunda-feira. ‘Wunderblogs.com’, volume com a qual a editora Barracuda se lança no oceano editorial, reúne textos publicados em 11 blogs hospedados no portal que dá nome ao livro.

Em mais de 300 páginas, o livro aglutina desde divagações de páginas e páginas sobre filosofia medieval até seqüências como: ‘O CARA PAROU DE MARTELAR! por Daniel Pellizzari (10/ 09/2002 – 16h31). O CARA VOLTOU A MARTELAR! por Daniel Pellizzari (10/ 09/2002 – 16h39) Nos dos últimos posts, toda a condição humana. por Daniel Pellizzari (10/09/2002 – 16h42)’.

A série de três breves posts -ao leigo, ‘post’ é o nome que se dá a cada texto ‘publicado’ em um blog, acompanhado da data e do horário em que foi jogado na rede- exemplifica características freqüentes dos escritos do ‘Bloguistão’: polaroids do cotidiano, insights, insultos ou piadas.

O senso de humor é, na opinião dos usuários do Wunderblogs.com, o vínculo mais forte entre eles. Entrevistados por e-mail pela Folha (respondendo a um mesmo questionário, que pode ser visto na Folha Online), quase todos citaram o mesmo diapasão cômico como seu maior link.

Outra ligação entre eles, com a qual os próprios ‘wunderboys’ fazem piada, é um conservadorismo raro na jovem intelectualidade brasileira. ‘Conservador’ é algo que eu seria de bom grado, se ainda houvesse algo para ser conservado’, afirma Marcelo De Polli, idealizador e ‘chefe’ do portal e titular do blog Aqua Permanens.

Outro tipo de ‘conservadorismo’, o de textos efêmeros, também causa polêmica. Na própria apresentação do livro, o veterano escritor e jornalista Ivan Lessa provoca: ‘Blog tem que ser espontâneo e passado de boca em boca. Não vale tacar bandeirinha nele ou anunciar em outros veículos de comunicação (…). Este livro é uma contradição em termos’.

‘Blogueiro’ de fora da comunidade Wunderblogs, que usou seu www.carmencarmen.blog ger.com.br como espaço de fermentação de seu primeiro romance (‘Corpo Presente’, editora Planeta 2003), o escritor João Paulo Cuenca também questiona a transformação de posts em livro. ‘Se já está publicado na internet, pra que editar um livro? Na minha opinião, não faz o menor sentido livro de coletânea de post’, diz à Folha.

Joca Reiners Terron, escritor também não-Wunder, que usou seu blog (hellhotel.blogger.com.br) para produzir seu romance ‘Hotel Hell’ (Livros do Mal, 2003), contra-argumenta. ‘A internet é um meio muito volátil e não significa que blogs que estão no ar hoje ainda estarão amanhã. Por isso o valor da permanência da publicação em livro.’

Os autores de ‘Wunderblogs.com’, que têm amostras de alguns de seus posts mais breves ao lado, dizem em uníssono que não escreveram seus textos de blogs pensando em publicá-los em papel. Na seleção do material que entraria no livro, assim, tiveram de eliminar boa parte do material, como os textos relacionados a fatos específicos do dia.

Dos 11 autores, poucos já publicaram livros. Entre os já ‘bibliografados’ estão Alexandre Soares Silva, que publicou no início do ano o romance ‘Morte e Vida Celestina’, e Daniel ‘Mojo’ Pellizzari, que tem dois volumes de narrativas breves lançados (pela sua própria editora, a Livros do Mal, de Porto Alegre).

Dos nove restantes do ‘time’, são poucos os que dizem ter projetos literários em curso. ‘Afora o blog, só escrevo cartões de Natal e anoto recados telefônicos’, brinca Radamanto, com humor tipicamente ‘wunderbloguês’.

WUNDERBLOGS.COM. Autores: vários. Editora: Barracuda (tel. 0/xx/11/3237-3269). Quando: segunda, às 19h. Onde: livraria Cultura – shopping Villa-Lobos (av. Nações Unidas, 4.777, São Paulo, tel. 0/xx/11/3024-3599, SP). Quanto: R$ 37 (300 págs.).’

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‘Blogueiros dizem não ser ‘de direita’’, copyright Folha de S. Paulo, 3/07/04

‘Em um debate nesta semana no Sesc-Anchieta, o escritor Marçal Aquino disse que sua literatura não tem nenhum engajamento político, mas, como pessoa física, disse que era de esquerda. ‘Todos os escritores brasileiros são de esquerda’, disse.

Os 11 autores da coletânea ‘Wunderblogs.com’ não vestem a camisa ‘Eu sou de direita’, mas não concordam com a afirmação do romancista.

Chamados a torto e a ‘direito’ de reacionários, direitistas e outras variantes do gênero, os blogueiros fazem piada com isso, mas afirmam, na maioria, que são conservadores.

Com perfis bem diferentes, trabalhando em profissões distintas (o grupo tem de bancários a tradutores), moradores de diferentes cidades (Brasília, Porto Alegre, Niterói, Ribeirão Preto e São Caetano do Sul), os ‘wunder’ se encontram em alguns pontos de vista, como a defesa (pela maior parte deles) do liberalismo.

Escapando do estereótipo de que o conservadorismo é exclusivo dos mais velhos, os blogueiros têm todos entre 25 e 37 anos.

Questionados pela Folha se existe direita inteligente no país, boa parte dos autores reunidos no livro (o site wunderblogs.com teve recentemente adesão de novos blogs não representados no volume) citou como exemplos disso os ensaístas Olavo de Carvalho e J.O. de Meira Penna.

Donos de blogs que recebem em média 150 mil acessos (‘pageviews’) por mês, sendo os líderes de ‘ibope’ Alexandre Soares Silva, Ruy Goiaba, Felipe Ortiz e Dante Gabriel Rossetti, os ‘wunder’ ‘não ligam’ para os que criticam seu conservadorismo.

Miss Veen, única mulher no livro, resume: ‘É engraçado: você tem uma opinião levemente mais para a direita, e todos começam a dizer que você é intolerante, fanático religioso, conservador (que hoje em dia é palavrão). Parece até piada’.

E piada é o que não falta nunca no portal. Se por um lado os blogueiros citam como ‘modelos’ intelectuais nomes que vão de Aristóteles a Chesterton, de Montaigne a Paulo Francis, não se furtam de alinhavar também como mentores intelectuais nomes como Didi, Dedé, Mussum e Zacarias, Genival Lacerda e Agnaldo Timóteo. ‘A maioria de nós vê a vida com a seriedade que ela merece, ou seja, nenhuma’, diz Fabio Danesi Rossi.’