‘Como diria Lula, pode ter sido apenas uma urucubaca o fato de a espionagem da Brasil Telecom-Kroll ter transbordado para dentro do governo. Visto de perto, foi só mais uma prova do grau de fragilidade das instituições no país.
Uma empresa bisbilhotou a outra por três anos, inclusive gente do governo. A melhor desculpa do petismo federal para sua ignorância foi uma confissão involuntária de incompetência. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sempre tranqüilo, disse que conhecia o fato ‘desde março’. Pano rápido.
Luiz Gushiken leu e releu a reportagem de Márcio Aith, na Folha de quinta-feira. Ficou intrigado com a associação de seu nome a benefícios supostamente propiciados por duas empresas. Acabou intrigando quem presenciou suas dúvidas.
Ontem à tarde, prevalecia no governo a impressão de que o caso terá vida curta. Alguém fez figa com as duas mãos no Planalto. Concluiu-se que não há falcatruas documentadas contra integrantes da administração federal no relatório da Kroll -nem mesmo em um outro texto, mais extenso, que permanece inédito na mídia. Há controvérsia a respeito.
Quem já leu o documento integral da Kroll exagera e diz que o ‘governo cai’ com sua divulgação. Não cai. Só ficaria uma fumaça densa no ar. É um disse-que-disse danado, sem provas, mas com muitas pistas que fariam a alegria de qualquer CPI.
Não haverá CPI, não haverá documento completo da Kroll, o governo não terá o menor interesse em ir fundo nesse assunto. Ficarão as pistas a serem seguidas -por jornalistas e por agentes desgarrados dos diversos serviços de espionagem que proliferam em Brasília.
Quando e se o assunto vier à tona, de maneira integral, o governo poderá atribuir o fato a uma urucubaca. Se der sorte, faz figa e se salva. O diabo é se aparecerem provas de alguma traficância, tal qual se ouve dentro do próprio Planalto. Daí, nem mandinga brava resolverá.’
Mônica Tavares
‘Brasil Telecom admite que contratou Kroll para investigar a Telecom Italia’, copyright O Globo, 23/07/04
‘A Brasil Telecom (BrT) informou ontem que contratou a Kroll Associates para apurar a compra da Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT) e outros supostos prejuízos causados pela Telecom Italia. A BrT tem como sócios o Opportunity, a Telecom Italia e os fundos de pensão. Para o Opportunity, que tem o controle da BrT, a Telecom Italia forçou a compra da CRT por um preço elevado.
Segundo a assessoria da BrT, a Kroll foi contratada para ajudar a esclarecer o suposto superfaturamento na compra da CRT e apurar perdas causadas pela Telecom Italia. A CRT foi comprada da Telefonica por US$ 850 milhões. O Opportunity alega que o preço poderia ter sido no máximo US$ 550 milhões, porque a Brasil Telecom era a única compradora. Para a BrT, os danos chegariam a US$ 1 bilhão.
Fontes ligadas à empresa Telecom Italia rebatem a acusação, destacando que foi arquivada a representação do deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) para apurar possíveis prejuízos para a Previ, fundo de assistência do Banco do Brasil e também sócia da Brasil Telecom, com a compra da CRT.
Telecom Italia conseguiu redução de preço
A Telecom Italia informou à Justiça que na época conseguiu reduzir o preço cobrado inicialmente, que era de US$ 1,090 bilhão. A decisão de comprar a CRT por US$ 850 milhões foi aprovada pela assembléia geral extraordinária da Brasil Telecom em 7 de abril de 2000.
A assessoria da Telecom Italia informou que a empresa encaminhou no último dia 16 à Polícia Federal os documentos relativos à contratação da Kroll pela Brasil Telecom. Além disso, a Telecom Italia está avaliando as medidas legais que poderá tomar.
As novas denúncias acontecem num momento em que se acirra a briga entre a Telecom Italia e o Grupo Opportunity. No fim do mês passado, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) decidiu que o grupo italiano poderá voltar ao controle da concessionária. A Telecom Italia pode retomar o controle da Brasil Telecom S.A. indicando nomes para o conselho de administração.’
Adauri Antunes Barbosa
‘Kroll diz que não espionou governo e que nunca invadiu computadores’, copyright Folha de S. Paulo, 24/07/04
‘Em nota divulgada ontem, a empresa de investigação Kroll, contratada pela Brasil Telecom para apurar atividades da rival Telecom Italia num escândalo que acabou chegando ao primeiro escalão do governo Luiz Inácio Lula da Silva, afirma que não faz espionagem.
‘Não somos uma empresa de espionagem, nunca fizemos grampos telefônicos nem invadimos computadores de ninguém. A Kroll é uma empresa especializada em gerenciamento de riscos’, diz a nota.
Reportagem da ‘Folha de S.Paulo’ informou que autoridades como o ministro Luiz Gushiken também tiveram e-mails monitorados pela Kroll antes de chegar ao governo. A empresa também seguiu os passos do presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, numa viagem a Portugal. Na nota, porém, a empresa diz que trabalhou dentro das leis e que nunca investigou autoridade do governo.
O vice-presidente mundial da Kroll, Frank Holder, acusou a Telecom Italia de tentar jogar o governo brasileiro contra a Brasil Telecom (BrT), sua cliente, ao dizer que as investigações encomendadas pela BrT tinham como alvo autoridades do governo federal.
Holder disse que o trabalho da Kroll é lícito e não vai desestabilizar o governo. Disse, porém, que entre as informações divulgadas há ‘algumas verdades’, como a viagem do presidente do Banco do Brasil a Portugal. Ele observou que o objeto da investigação não era qualquer autoridade do governo, mas possíveis irregularidades da Telecom Italia que pudessem prejudicar a Brasil Telecom:
– A divulgação das informações tem o objetivo de tentar jogar o governo contra a Brasil Telecom por meio do medo e da incerteza. A investigação que fizemos não vai desestabilizar nenhum governo.’
Eduardo Scolese
‘Governo Lula pretende processar espiões’, copyright Folha de S. Paulo, 23/07/04
‘Após um dia de intensas negociações, o governo Luiz Inácio Lula da Silva decidiu pedir que a AGU (Advocacia Geral da União) encontre os meios jurídicos adequados para processar tanto a empresa de investigação norte-americana Kroll Associates como a companhia Brasil Telecom.
Reportagem de ontem da Folha revelou que, sob encomenda da Brasil Telecom, a Kroll Associates teve acesso a e-mails do ministro Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica) antes de ele tomar posse no governo, em 2003.
O objetivo formal da Brasil Telecom (controlada pelo banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity) era investigar a Telecom Italia -as empresas protagonizam uma batalha judicial. A investigação da Kroll, porém, resvalou tanto em Gushiken como no presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, que teve monitorados seus encontros com executivos da Telecom Italia.
O pedido formal do governo, por meio de um documento elaborado pela Secom (Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica), deve chegar hoje às mãos do advogado-geral da União, Álvaro Augusto Ribeiro Costa. Não há prazo para que ele conclua os estudos, que podem ser encaminhados diretamente à Justiça ou, numa terceira etapa, ao Ministério Público Federal.
Ontem, em nota, Gushiken disse que ‘considera ilegais os procedimentos de espionagem noticiados e irá adotar as medidas jurídicas pertinentes’.
No relatório da Kroll aparecem mensagens eletrônicas trocadas entre Gushiken e o empresário Luiz Roberto Demarco, ex-sócio de Dantas no Opportunity. Em entrevista anteontem, o ministro confirma a troca de e-mails com Demarco entre 2000 e 2001, mas nega irregularidades. Diz que, por atuar à época na área da previdência, buscava informações sobre Dantas em tal questão.
Ontem, pela manhã, Gushiken conversou longamente por telefone com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Encontrou-se ainda com o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Jorge Félix, e com Mauro Marcelo de Lima e Silva, diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência). A eles, disse que há anos desconfiava que poderia estar na rota de espionagem, mas só tomou conhecimento de que há documentos a respeito quando foi procurado pela reportagem da Folha para tratar do tema.
Concluíram que, neste momento, o melhor caminho é entregar o caso à AGU. ‘No âmbito do governo, o assunto vem sendo acompanhado pela Polícia Federal e pelo Ministério da Justiça’, afirmou ontem Gushiken, em nota. O ministro da Secom, por ora, não pretende estender o caso ao presidente Lula, que viajou ontem para a região Sul do país e embarca, neste domingo, para quatro dias de visita a países do continente africano.
O ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, disse que sua pasta está fora do caso. ‘É uma disputa entre duas empresas privadas. O governo fará o que determina a lei: os atos ilegais serão punidos. É tudo caso para a polícia, não para o Ministério das Comunicações’, declarou.’