Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Luiz Garcia

‘Para prestigiar uma campanha de anunciantes nacionais – que tem como mote ‘o melhor do Brasil é o brasileiro’ – o presidente Lula fez apaixonado discurso pedindo aos brasileiros mais auto-estima e culto aos seus heróis.

Vozes mais eloqüentes, para não dizer mais sábias, já fizeram restrições ou manifestaram pasmo ante trechos do presidencial improviso. Mas o terreno é fértil, e me sobrou espaço para cavucar – no modesto objetivo de compreender.

Por exemplo, é difícil saber ao certo o que ele quis dizer neste trecho: ‘Se a sociedade, o governo e todas as instituições não oferecem a oportunidade, alguém pode oferecer, possivelmente, aquela que não seja a que estamos querendo. O certo é mais fácil, o certo é ideal.’

Em outro ponto, a coisa fica um tanto mais clara: ‘O hábito dos brasileiros de acharem que o Estado pode resolver tudo precisa ser trocado pelo resgate de valores religiosos, familiares e de amizades.’ Não sejamos implicantes: dá para entender, por mais estranho que pareça, esse peculiar escambo entre hábito e resgate. Assim como facilmente se percebe que, na opinião do presidente, seus conterrâneos depositam fé excessiva no Estado, em detrimento da religião, da família e dos amigos. Entender é uma coisa, concordar é outra: modestamente, concordo que muitos brasileiros adoram se encostar no Estado e, como já bastante se disse, mamar em suas tetas. Mas isso não parece ser a mesma coisa que confiar demais na velha máquina enferrujada.

Seja como for, essas afirmações, na opinião do presidente, conduzem à conclusão de que o Brasil é um país ‘que não cultua heróis’. Lula reforça a tese contando que em todos os países que visita é chamado para levar flores ‘ao túmulo do herói nacional’, inexistente por aqui.

Dá para apostar que seus anfitriões – pelo menos a maioria deles – levam nosso presidente para visitar o túmulo do soldado desconhecido, que não é herói, por definição, já que ninguém sabe o que ele fez na vida, exceto morrer. E um desses nós também temos: no Rio, ele está no monumento aos pracinhas, no Parque do Flamengo.

Em frente: é comum em discursos improvisados que o orador, como o personagem de velha história, parta a galope em diversas direções ao mesmo tempo. Lula tenta algo parecido com essa façanha impossível ao pregar, ao mesmo tempo, auto-estima e culto aos heróis.

Um povo que se tem em boa conta pode prezar e admirar alguns valorosos personagens históricos – mas o que certamente não fará, por desnecessário e ingênuo, será cultuá-los.

Curioso. É exatamente isso que diz o mote da campanha apadrinhada pelo presidente: o melhor do Brasil são os próprios brasileiros. E aqui tem inteira razão. São cidadãos comuns, com suas comuns virtudes e comuns defeitos – tudo produto nacional, sem o menor traço de heroísmo.’



Arthur Xexéo

‘Um presidente em busca da auto-estima perdida’, copyright O Globo, 21/07/04

‘Tenho a impressão, às vezes, que vai tudo bem no Brasil. A não ser por causa da imprensa e do povo. Isso acontece sempre que ouço discursos do presidente Lula. Antigamente, quando Lula fazia discursos, despertava uma certa ansiedade em mim. Imaginava que ele anunciaria projetos, exporia resultados de ações do governo, faria radiografias da situação do país. Agora, não. Já percebi que o presidente só faz discurso para passar carão, reclamar da imprensa e dar conselhos ao povo. Pensei que ele era um presidente. Mas ele pensa que é o pai do povo. Se a imprensa reclama, é denuncismo. Se o povo reclama, é porque precisa melhorar a auto-estima. Assim não dá.

O último discurso-carão, o último conselho, foi no lançamento da campanha O Melhor do Brasil é o Brasileiro, na segunda-feira. Em São Paulo, é claro. O pai do povo adora São Paulo. Lula disse que, em vez de achar que ‘o Estado pode resolver tudo’, o povo deve resgatar os valores religiosos, familiares e de amizades. Eu, como parte do povo, não penso que o Estado pode resolver tudo. Mas penso que o Estado pode resolver uma coisa ou outra. E esta coisa ou outra não se resolve com o resgate dos valores religiosos.

Diz o presidente que a gente precisa melhorar a auto-estima. Que a gente precisa valorizar o que tem. Olha o que ele disse:

‘Se eu só tenho um par de sapatos, eu tenho que valorizar aquele par de sapatos; se eu tenho um terno, eu tenho que valorizar aquele; se eu não tenho um carro novo e tenho um fusquinha, eu tenho que valorizar aquilo; ou se tenho um carro da Ford, um Fiesta, sei lá, nós temos que valorizar aquele.’ Quer dizer, se eu tenho um sapato velho e não tenho dinheiro para comprar outro, devo me orgulhar do sapato velho.

Pois é, pensando bem, acho que quem tem que melhorar a auto-estima é o presidente Lula – eu também sei dar conselhos. Indo pelo raciocínio do próprio presidente, ele deveria valorizar, por exemplo, o Sucatão. É o avião que ele tem, não é? E o Brasil não tem dinheiro para comprar outro. Por que então gastar US$ 55 milhões com um avião novo? O presidente deveria valorizar o Palácio da Alvorada. É o que ele tem, não é? Por que então gastar US$ 16 milhões numa reforma? Mais auto-estima, presidente!

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Se alguém achou o raciocínio confuso, então que preste atenção em outro trecho do discurso do presidente, o trecho em que ele se refere ao filme ‘Cazuza – O tempo não pára’. Vamos lá:

‘Ontem ( domingo ), eu estava assistindo ao filme do Cazuza e estava pensando que não é apenas a questão financeira que leva um jovem a fazer isso ou a fazer aquilo. Eu acho que as coisas estão muito mais ligadas à família, ao meio ambiente em que a pessoa vive, mas a família é a célula principal. Se o pai não servir como referência, se a mãe não servir como referência, se o presidente da República não servir como referência, se o governador não servir como referência, se o prefeito ou a prefeita não servirem como referência, se os deputados não servirem como referência, se os juízes não servirem como referência, em quem esse jovem vai se apegar para dizer: eu posso, eu acho que eu posso. E, a partir do ‘eu acho que eu posso’, ele chega lá.’

O que o presidente Lula quis dizer mesmo? Ele gostou do filme? Ele acha que Cazuza é um bom exemplo? Cazuza utilizou a família como referência para chegar lá? Ou o filme é ruim? Cazuza é um mau exemplo? Cazuza não chegou lá porque não seguiu a família como rerência?

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Como todo mundo sabe, eu não via mais novela. Até que me fizeram uma entrega em domicílio de ‘Senhora do destino’. Estou vendo, mas também vou pegar no pé. O Aguinaldo Silva não disse que a trama se passava em 1992/1993? Então, como é que o bicheiro que está atrás da Lindalva deu uma nota de R$ 10 para Angélica voltar para casa? O real só foi criado em 1994!!! Não é o bastante para se descobrir a idade do personagem de Suzana Vieira, mas já dá para saber que ela é um ano mais velha do que querem nos vender.

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Para os que se assustaram com o preço de R$ 100 por um ingresso do show de Caetano Veloso no Teatro Municipal, os correspondentes estrangeiros da coluna mostram que o cantor está mais valorizado ainda no resto do mundo. Em Amsterdã, onde Caetano se apresenta em outubro, a entrada está custando 47,5 euros, algo próximo de R$ 150!. Ultrapassou os limites do que foi cobrado na mesma cidade por estrelas como Norah Jones, Diana Krall e Robbie Williams. No mesmo mês, Caetano faz show em Miami com ingressos a… US$ 77 (mais ou menos R$ 230). O cara tá podendo.

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Fazendo as contas, com a grana que o presidente Lula vai gastar no tal avião novo – já que, com a auto-estima lá embaixo, ele não se orgulha do avião que tem – dava para comprar mais de 650 mil ingressos para o show de Caetano em Miami. Tá certo, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Nada a ver.’



Folha de S. Paulo

‘Empresa investigada estuda ir à Justiça’, copyright Folha de S. Paulo, 23/07/04

‘A Telecom Itália, alvo de investigação da Kroll Associates, estuda medidas judiciais cabíveis frente às acusações levantadas contra ela no relatório da empresa de investigação, uma das maiores do mundo.

‘Recebemos uma cópia do documento e o encaminhamos à Polícia Federal na sexta-feira. Confiamos nas investigações da PF e vamos estudar medidas legais cabíveis’, disse Eduardo Octaviano, diretor de comunicação corporativa da Telecom Itália.

A Folha revelou ontem que a investigação foi contratada em nome da Brasil Telecom por meio da presidente da empresa, a executiva Carla Cico. A Brasil Telecom é controlada pelo banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.

Ao menos formalmente, o objetivo do contrato era investigar as operações no Brasil da Telecom Itália, companhia com a qual o Opportunity disputa judicial e administrativamente o controle da Brasil Telecom.

No entanto, a investigação extrapolou o mundo empresarial e atingiu o governo petista e administrações municipais do PT.

A Brasil Telecom informou, por meio de sua assessoria, ter contratado a ‘Kroll, empresa internacional que presta consultoria investigativa, com o objetivo de ajudar a esclarecer o superfaturamento decorrente da aquisição da Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT), apurar as perdas causados pela Telecom Itália’.

A Brasil Telecom diz ainda que o objetivo da contratação da Kroll foi o de dar ‘suporte às ações judiciais em curso e por vir. O objetivo é proteger seus acionistas minoritários e recuperar danos causados pela Telecom Itália’. Esses danos, segundo a Brasil Telecom, chegariam a US$ 1 bilhão.

Já a Telecom Itália diz que o caso da CRT já foi apreciado na Justiça e arquivado pela Procuradoria da República. Segundo o procurador José Alfredo de Paula Silva, que determinou o arquivamento da representação, ‘o inquérito administrativo aberto carece de mínimo fundamento, trata-se de disputa entre sócios a ser resolvida pela Justiça Comum em ações que se desenvolvem há mais de dois anos’. A CRT foi vendida pela Telefônica à Brasil Telecom em 2000, em meio a denúncias de superfaturamento que teria prejudicado os acionistas minoritários da Brasil Telecom.

Em nota divulgada ontem, a Kroll disse ‘desconhecer a procedência do material que deu origem à citada reportagem da Folha. Segundo a empresa, ‘é de se supor que que várias peças reproduzidas pelo jornal foram adulteradas.’’

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‘MULTIMÍDIA’, copyright Folha de S. Paulo, 23/07/04

‘Financial Times

Episódio sucede caso Waldomiro

O jornal britânico reproduz em reportagem na edição de hoje os detalhes do caso de espionagem que atingiu o alto escalão do governo Lula. O ‘FT’ lembra que o episódio ocorre depois do caso Waldomiro, ‘escândalo no início deste ano envolvendo também um funcionário importante do governo’. O jornal rememora que Waldomiro Diniz acabou afastado e que o escândalo atingiu o governo e o mercado financeiro de forma negativa. O embate corporativo entre a Telecom Italia e o grupo Opportunity, ‘que dura anos’, também é destacado.

The New York Times

Caso é capítulo de longa disputa

O episódio de espionagem é o mais recente na longa disputa entre a Brasil Telecom e a ‘gigante italiana de telecomunicações’ pelo controle da operadora, destaca reportagem do correspondente do jornal no Brasil. Carla Cico, presidente da Brasil Telecom, foi entrevistada por telefone e disse que ‘nunca, nunca, nunca pedimos à Kroll para investigar o governo’. O jornal menciona ainda que o caso atingiu o americano Citigroup, devido à ligação da instituição financeira com Daniel Dantas, do grupo Opportunity.

Bloomberg

Governo estuda ação na Justiça

A agência de notícias relata que o governo brasileiro considera a possibilidade de entrar com uma ação na Justiça contra a Brasil Telecom, citando Armando Medeiros, porta-voz do secretário de Comunicação, Luiz Gushiken. A Bloomberg, que entrevistou Medeiros por telefone, também repercute o caso com analistas, para quem o episódio e a disputa pelo controle podem prejudicar a Brasil Telecom. A agência cita ainda a queda de 1,3% das ações da Telecom Italia na Bolsa de Milão.’

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‘Favre diz que informação é falsa e que pretende processar a Folha’, copyright Folha de S. Paulo, 21/07/04

‘O marido da prefeita Marta Suplicy (PT), Luis Favre, pretende processar a Folha pela reportagem ‘Empresa espiona alto escalão do governo Lula’, publicada ontem com exclusividade.

O texto informava que a empresa de investigações Kroll buscava ‘eventuais relações’ entre Naji Nahas e Favre em uma ‘suposta atuação conjunta de ambos para obter contrato de coleta de lixo para a Vega Ambiental’. A reportagem se limitava a reproduzir teor de relatório sigiloso da empresa. Além disso, dizia que não havia provas de corrupção.

Procurado ontem pela Folha, Favre falou que tudo o que tinha a dizer estava em carta enviada ao jornal. No texto, o marido de Marta afirma que a reportagem ‘contém informações falsas’, que são ‘invencionices’ para atingir sua honra e ‘constituem uma calúnia e uma mentira’. Favre afirma na carta que não conhece Nahas e que não tem nem nunca teve ‘nenhum negócio com a empresa Vega e ou a Lyonnaise des Eaux’.

O advogado do PT em São Paulo, Hélio Silveira, que deve propor a ação, disse que está estudando o caso. Questionado se o processo será por injúria, calúnia, difamação ou um pedido de resposta, Silveira afirmou que vai entrar com a ‘melhor medida’. De acordo com ele, a reportagem publicada pela Folha despertou sentimento de ‘repulsa’ em Favre.

Segundo o advogado, a ação será proposta nos próximos dias. Sobre eventuais medidas em relação à Kroll e à Brasil Telecom, Silveira foi lacônico e inconclusivo: ‘Vamos ver, provavelmente’.

Já o comando da comunicação da campanha de Marta afirmou que a via judicial será usada apenas contra o jornal. ‘Por enquanto, [será tomada a medida] em relação a quem divulgou a mentira’, disse Lino Bocchini.’

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‘Viegas recebe repórter do ‘NYT’ que acusou Lula’, copyright Folha de S. Paulo, 24/07/04

‘O jornalista Larry Rohter, que publicou uma reportagem no diário americano ‘New York Times’ sobre supostos abusos alcoólicos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, esteve anteontem em Brasília para entrevistar o ministro José Viegas (Defesa) sobre a publicação da Lei do Abate.

Rohter não quis falar com a Folha. Segundo uma funcionária do jornal que não se identificou, ele afirmou que não gostaria de ser entrevistado. Para ele, disse a funcionária, a função de um jornalista é escrever reportagens e não dar entrevistas. Ontem, Rohter já estava no Rio, onde fica o escritório do jornal no Brasil.

O jornalista americano teve seu visto cancelado pelo Ministério da Justiça em maio, dois dias depois da publicação da reportagem sobre o suposto hábito de beber de Lula, que, segundo o texto, estaria preocupando o país.

O cancelamento do visto ganhou repercussão nacional e até internacional. Três dias depois, quando o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça) obteve uma carta em que o jornalista lamentava os constrangimentos causados pelo artigo, Lula decidiu anular a decisão de cancelar o visto, declarando o episódio encerrado. O governo viu a carta como retratação, o que foi negado pelo ‘New York Times’.

Sem constrangimento

Segundo a funcionária do jornal, Rohter foi bem recebido pelo governo e a conversa com o ministro foi tranqüila. A assessoria de imprensa do Ministério da Defesa informou que a entrevista correu normalmente, sem nenhum constrangimento.

A reportagem foi sobre a Lei do Abate, publicada no ‘Diário Oficial’ nesta semana. A lei trata da derrubada de aviões de tráfico de drogas que cruzarem o espaço aéreo brasileiro.

A pressão dos Estados Unidos -inclusive com ameaças de cortes de repasses de verbas a programas assistenciais- foi um dos fatores que dificultou a regulamentação da Lei do Abate por anos. Daí o interesse do correspondente internacional do ‘New York Times’ nesse assunto.’