Talvez nunca se tenha assistido a uma disputa eleitoral presidencial tão anódina quanto a deste ano, embora os ânimos comecem a acirrar-se com a instigação a ataques diretos (do tucanato) a figura do presidente Lula, até o momento em confortável situação nas pesquisas – a reta final da campanha promete, por assim dizer, solavancos.
Por enquanto predomina a pasmaceira do lugar-comum, um vazio discursivo admirável, ainda que o eleitorado demonstre cansaço e indignação diante desse cenário político – um paradoxo que nem a imprensa parece compreender, talvez ela própria envolta numa crise discursiva ou identitária (para não se dizer de credibilidade), uma vez que não consegue romper a inércia da sociedade, menos afeita a aceitar manipulações motivadas por interesses privados.
Os discursos diluem-se em estratagemas mercadológicos – e a arte política parece ser a de adequar minimamente as ações aos discursos, o que não é fácil, já que segundo o presidente, política se faz com o que se tem à mão, e nem sempre é possível sair de mãos limpas de tal prática – pode-se concluir. Por outro lado, chega a ser risível a declaração dos tucanos de que é preciso expulsar ‘os vendilhões da pátria’ – justamente eles que ostentam as bandeiras neoliberais e praticaram toda sorte de privatizações para cumprir o ideário de um Estado mínimo (também em políticas sociais).
Por mais que os políticos se esforcem é difícil escapar à máxima popular que diz serem todos iguais – com algumas nuanças talvez divirjam nos fins, os meios parecem ser os mesmos.
Relativismos
E em se permitindo arriscar uma observação, pode-se dizer que o PT e o PSDB lançaram mãos de esquemas similares (até herdando alguns, no caso do PT), com a diferença que enquanto um sempre buscou satisfazer os próprios interesses e as ambições globalizadas de sua elite representativa, de acordo com os ideais neoliberais, o outro ousou forjar um plano de poder (expropriando os seculares mandatários), ainda que também não tenha se recusado a receber as benesses do capitalismo – pelo menos se desculpam afirmando que há mais gente comendo no país (o que não é pouco), embora as desigualdades ainda sejam assustadoras.
Nesse contexto a classe média vive assombrada pela miséria e deslumbrada por uma suposta elite, num vazio discursivo permeado pelo senso comum (entre a esperança, o medo e a apatia), – num arremedo de nação, sem a criticidade necessária para a construção permanente da liberdade democrática.
As palavras parecem perder a profundidade semântica, com a conseqüente diluição dos valores, inclusive democráticos, abrindo campo para relativismos de toda ordem e discursos totalizadores. À imprensa não cabe somente reportar esse cenário, mas sim analisá-lo com alguma perspicácia e profundidade, distinguindo as verdades e ficções de nossos homens públicos – que também precisam aprender a respeitar a veracidade das próprias palavras.
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Funcionário público, Jaú, SP