O governo do Irã se ofereceu para ajudar o sistema judiciário no caso da fotojornalista Zahra Kazemi, morta há um ano na penitenciária de Evin. Zahra foi levada ao hospital com hemorragia cerebral depois de ser presa e violentamente interrogada por fotografar famílias de detentos do lado de fora do presídio.
O julgamento do agente Mohammad Reza Aghdam Ahmadi, acusado de ter desferido o golpe fatal que provocou a ruptura na caixa craniana da fotojornalista, terminou abruptamente há duas semanas, e ele foi inocentado. Os advogados que representam a família de Zahra, liderados pela ganhadora do Prêmio Nobel da Paz Shirin Ebadi, pedem a reabertura do caso.
Assim como o governo iraniano, o governo canadense e grupos defensores dos direitos humanos, eles acreditam que a acusação do agente teria servido para acobertar oficiais do sistema judiciário possivelmente envolvidos no assassinato. Para algumas autoridades canadenses o procurador-chefe de Teerã, Said Mortazavi, que supervisionou os interrogatórios sofridos por Zahra na prisão, poderia estar envolvido no crime. Uma investigação revelou que ele teria ordenado que oficiais iranianos anunciassem que a fotojornalista morrera de causas naturais.
Greve de fome?
O judiciário já mostrou sinais de que gostaria de encerrar de vez o caso. Logo depois do término do julgamento, anunciou rapidamente que, como o acusado não foi condenado, o Estado deveria pagar o ‘dinheiro de sangue’ (indenização) para a família da vítima. Já na quarta-feira, 28/7, mais um anúncio do judiciário chocou as autoridades e os grupos em defesa dos direitos humanos. A nova versão é a de que, depois de presa, Zahra teria feito greve de fome e caído porque ficou debilitada. A organização Repórteres Sem Fronteiras [AFP, 29/7/04] disse que a justificativa ‘vai além do ridículo e é uma afronta’.
O governo do presidente Mohammad Khatami tenta reabrir o caso, e se colocou à disposição para isso. ‘O Ministério da Inteligência está pronto e, se o judiciário permitir e quiser uma investigação completa e transparente, tomaremos medidas para identificar a verdade sobre essa questão’, anunciou o porta-voz do governo, Abdollah Ramazanzadeh.
O caso de Zahra Kazemi colocou o processo judicial iraniano e os abusos aos direitos humanos cometidos no país sob escrutínio internacional e enfraqueceu suas relações com o Canadá. A advogada Shirin Ebadi ameaça levar o caso a tribunais internacionais.
Protesto reúne centenas de jornalistas
Mais de 300 jornalistas iranianos participaram de um protesto contra o fechamento dos jornais Vaghayeh Ettefaghieh e Jomhouriat, ordenado por Mortazavi. Os dois jornais haviam publicado artigos sobre o julgamento, contra a vontade do procurador – que há duas semanas ligou pessoalmente para as redações e ameaçou os jornalistas que cobrissem o evento.
‘Isso mostra como Mortazavi fez de tudo para esconder e acobertar provas’, afirmou Stephan Hachemi, filho de Zahra. ‘Não há esperança. Eles mostraram que o Irã não tem intenções de trazer justiça ao caso de minha mãe’, desabafou ele.
O protesto foi feito no dia 26/7 em frente à Associação dos Jornalistas Iranianos e contou com a presença de Shirin Ebadi e de familiares de jornalistas encarcerados. Uma carta aberta, enviada aos ministros da Cultura, Ahmad Masjed, e do Trabalho, Nasser Khaleghi, afirmava que os esforços do judiciário para calar a imprensa violavam os artigos 22, 28 e 43 da constituição nacional, assim como o direito ao trabalho e a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Nos últimos quatro anos, mais de 120 jornais foram fechados no Irã. Com informações de Parinoosh Arami [Reuters, 26/7/04], Reporters Without Borders [27/7/04] e Karl Vick [The Washington Post, 27/7/04].