Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mariângela Gallucci

‘Se for aprovado pelo Congresso Nacional, o Conselho Federal Jornalismo (CFJ) corre o risco de ser declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ministros do STF afirmaram ontem em caráter reservado que o projeto de lei que propõe a criação do CFJ é questionável porque dentre as atribuições do órgão está a de orientar, disciplinar e fiscalizar a atividade jornalística.

De acordo com os ministros consultados, essas competências contrastam com o que estabelecem a Constituição Federal e outras legislações que garantem a liberdade de imprensa no País. Citado pelos ministros do STF, o parágrafo 1º do artigo 220 do texto constitucional brasileiro é claro: ‘Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social.’

Caso o Congresso aprove o projeto de lei encaminhado ao Congresso nesta semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, caberá aos inconformados propor ações diretas de inconstitucionalidade (adins) contra as regras que estabelecerem o Conselho.

Esse tipo de ação pode ser proposto por partidos políticos, confederações sindicais e entidades de âmbito nacional e autoridades como o procurador-geral da República e governadores de Estado.’



Lilian Christofoletti

‘Fenaj apóia conselho de jornalismo; ABI veta’, copyright Folha de S. Paulo, 7/08/04

‘O projeto para a criação do Conselho Federal de Jornalismo divide duas das principais entidades da categoria. Enquanto a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) defende a íntegra do texto como um caminho para o aperfeiçoamento da profissão, a ABI (Associação Brasileira de Imprensa) classifica a proposta de inconstitucional e perigosa.

A discussão cresceu nesta semana, após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encaminhar o projeto de lei ao Congresso Nacional.

‘Esse projeto não é do governo federal, é do movimento de jornalistas. Estamos construindo esse projeto há sete anos. A primeira proposta de criação de um conselho federal de jornalistas foi em 1997, durante um congresso em Vila Velha, no Espírito Santo’, disse a presidente da Fenaj, Elisabeth Villela da Costa.

O presidente da ABI, Maurício Azêdo, não concorda. Ele disse nunca ter discutido o texto e afirmou, após ler a íntegra, estar convicto da necessidade de pedir ao Congresso Nacional a rejeição do projeto de lei.

‘O texto tem um teor repressivo e é inconstitucional. A própria Constituição, em seu artigo 220, garante que nenhuma lei poderá criar embaraços à liberdade de informação jornalística.’

Fiscalização

Para Elisabeth, a função do conselho será regulamentar e fiscalizar a categoria, atribuição que seria do Ministério do Trabalho. Em nenhum momento, disse ela, o órgão poderá interferir na liberdade de imprensa.

‘O conselho apenas cumpriria um vazio que existe hoje, até porque o Ministério do Trabalho não quer mais fiscalizar as profissões. O órgão atuaria em casos de abuso ou como uma alternativa para quem se sentisse ofendido ou incomodado com alguma reportagem. Poderia evitar ainda que pessoas não-qualificadas entrassem no mercado.’

Para Azêdo, o texto enviado ao Congresso não esclarece nem define as atribuições do conselho. ‘Fala-se em fiscalização, mas fiscalização em que aspecto? O texto é muito abrangente e, por isso, perigoso à liberdade de imprensa. A Fenaj pariu mal esse projeto. Vamos pedir ao Congresso a rejeição total da proposta.’

Por meio da assessoria de imprensa da ANJ (Associação Nacional de Jornais), o diretor-executivo Fernando Martins informou que a entidade somente irá se manifestar sobre o projeto de lei após o texto ser analisado pelo comitê de assuntos jurídicos da associação.’



Ricardo Westin e Frederico Vasconcelos

‘Presidente da ABI se diz contra criação de órgão’, copyright Folha de S. Paulo, 6/08/04

‘O presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), Maurício Azêdo, afirmou ontem temer que a criação do CFJ (Conselho Federal de Jornalismo) represente ‘uma violação da ordem democrática definida pela Constituição Federal’.

‘Vamos examinar a questão muito atentos ao teor punitivo’, disse ele, que levará a projeto de lei para ser analisado pelos diretores da ABI.

Para Azêdo, o governo se equivoca porque trata os jornalistas como profissionais liberais: ‘Conselhos federais são feitos para fiscalizar profissionais liberais. Não é o caso dos jornalistas, que, a meu ver, continuam sendo assalariados’.

O vice-presidente da ABI, Milton Temer, também reprova a criação do CFJ. Para ele, a fiscalização do exercício do jornalismo já é feita pelas comissões de ética da ABI, da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e dos sindicatos. ‘Isso é uma burocratização que não tem que existir’, afirmou.

A Fenaj defende o CFJ argumentando que a fiscalização do exercício do jornalismo não é feita de maneira satisfatória pelo Ministério do Trabalho. Em abril, representantes da federação se reuniram com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e cobraram que o projeto, então recém-elaborado, fosse logo enviado ao Congresso Nacional.

O presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, Tales Castelo Branco, afirmou que é favorável à criação do CFJ desde que ele cuide da ética no jornalismo e seja um órgão independente.

‘Como o conselho vai ter poderes de sancionar jornalistas, é preciso concentrar absoluta independência. Para ser independente, precisa ser comandado exclusivamente por jornalistas, sem vinculação com nenhum órgão do governo, como o Ministério do Trabalho’, afirmou.’



Leonardo Souza

‘Conselho vai coibir excessos, diz Berzoini’, copyright Folha de S. Paulo, 7/08/04

‘O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, declarou ontem que o Conselho Federal de Jornalismo vai permitir que a própria categoria estabeleça ‘mecanismos de controle ético’, uma vez que as denúncias irresponsáveis afetam ‘negativamente o país, a economia, o clima social’, gerando ‘instabilidade’.

Para exemplificar, o ministro citou recentes acusações contra o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. ‘Ontem [anteontem], por exemplo, em cima de uma notícia que, aparentemente, foi precipitada, porque não propiciou o contraditório antes de ser divulgada, nós tivemos uma variação na Bolsa que chegou a quase 5%’, disse ele, referindo-se à reportagem veiculada na internet pela revista ‘Veja’, na quinta-feira, segundo a qual o presidente do Banco Central teria feito operações financeiras irregulares no exterior.

O governo federal encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei elaborado pelo Ministério do Trabalho que prevê a criação do conselho federal e de seções estaduais. O conselho teria poderes até mesmo para cassar o registro profissional de jornalistas. Leia a seguir trechos da entrevista:

Folha – De quem foi a idéia no governo de criar o conselho?

Ricardo Berzoini – Esse projeto está parado no Ministério do Trabalho há uns dez anos. Recentemente [há cerca de três meses], no Dia do Jornalista, a Fenaj [Federação Nacional dos Jornalistas Profissionais] pediu que nós déssemos uma resposta objetiva [sobre a criação ou não do conselho].

Nós avaliamos que havia razões para criar, pela natureza da função do jornalista, pela importância social […] de ser o mediador das informações do Estado para a opinião pública e, ao mesmo tempo, porque é uma atividade que, se exercida de maneira irresponsável, pode produzir danos extremamente graves para empresas, para pessoas, para o país. Nossa preocupação é ter a própria categoria estabelecendo mecanismos de controle ético e de debates sobre a natureza da profissão.

Folha – A decisão de criar esse conselho vem depois do caso Larry Rohter [jornalista americano que chegou a ter seu visto revogado pelo governo] e, agora, da afirmação do ministro José Dirceu de que as acusações contra Cássio Casseb [presidente do Banco do Brasil] e Meirelles beiram o denuncismo.

Berzoini – Não tem nenhuma relação entre uma coisa e outra. Nós só atendemos à federação nacional de uma categoria.

Folha – O conselho poderia disciplinar, coibir matérias caracterizadas como simples denuncismo?

Berzoini – Quem vai determinar como o conselho vai funcionar, qual será o critério ético para tomar qualquer tipo de medida será a própria categoria. Portanto o governo não irá interferir. Obviamente, quando falamos de denuncismo, não estamos falando só da imprensa, estamos falando do jogo político. Nós entendemos que é preciso garantir toda a liberdade de expressão, de opinião e de comunicação. Agora, também chamamos a atenção para que, se houver irresponsabilidade em denúncias, obviamente isso pode afetar negativamente o país, a economia, o clima social do país, porque isso cria instabilidade.

Ontem [anteontem], por exemplo, em cima de uma notícia [contra Meirelles] que, aparentemente, foi precipitada, porque não propiciou o contraditório antes de ser divulgada, nós tivemos uma variação na Bolsa que chegou a quase 5%. Uma notícia que não havia, no meu entendimento, elementos suficientes para caracterizar irregularidade de uma pessoa que morou no exterior […]. O nosso governo não tem nada contra a prática livre de denúncias. Ao contrário, achamos que é forma de exercer a democracia. Mas é preciso, ao mesmo tempo, ter responsabilidade.

Folha – Pelo texto do projeto, o conselho terá poderes para ‘orientar, disciplinar e fiscalizar’ o exercício da profissão. Haveria algum tipo de punição aos jornalistas?

Berzoini – O texto é claro. Como todo conselho profissional, como o de medicina, pode determinar uma advertência e até a cassação de registro profissional. É um tratamento típico de conselho profissional.

Folha – Um médico, para exercer a profissão, tem de ter graduação. O conselho de medicina só pode cassar seu registro porque o médico tem um registro. Como o conselho de jornalismo cassaria o registro de um profissional que não tem graduação?

Berzoini – Aí você entra num outro campo que não está na órbita do projeto. Hoje, no Brasil, o ordenamento legal vigente obriga o diploma. Se tem alguém exercendo sem ter, em tese, está exercendo ilegalmente a profissão. Eu tendo mais a ser favorável a não exigir o diploma do que exigir.’