Wednesday, 13 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

A notícia, ora a notícia!

Mino Carta, há uns bons 40 anos, escreveu um poemeto para Renato Ribeiro Pompeu, o grande redator que se queixava das matérias imprecisas que os repórteres lhe entregavam para copidescar. Cito de memória (pode haver erros, portanto) a primeira estrofe: ‘Renato Pompeu, dos Ribeiros/ Senhor do texto preciso/ Escreve ao deus dos pauteiros/ Pede um repórter preciso’.

Então, companheiros, vamos acabar com essa história de que antigamente, sim, é que havia bons repórteres. Havia, sim; como os há hoje. E havia pernas-de-pau, havia medíocres, havia aqueles que só davam para o gasto (desculpem o duplo sentido, colegas do Jornal da Tarde!). Os problemas não mudaram; e a imprecisão continua sendo um dos maiores inimigos do jornalismo. Quando o general Juan Velazco Alvarado tomou o poder no Peru, lá por volta de 1968, um jornal o apontou como gorila e direitista. Gorila ele era, mas de esquerda.

Hoje, se um leitor quiser evitar confusões, deve ter uma só fonte de notícias. Ficará mal informado, mas pelo menos não terá informações conflitantes (no mesmo dia: no dia seguinte, ninguém garante). Caso queira ficar bem informado, verá num veículo que o cavalheiro que irá depor na CPI é office-boy de uma empresa, e no veículo seguinte que o mesmo cavalheiro é diretor de outra empresa. O mais curioso é que parágrafos inteiros são idênticos, denunciando a fonte comum (em geral, uma agência de notícias estatal); o que varia é a informação.

Esta é a primeira edição do ano. Quem sabe o deus dos repórteres intervém e, em 2006, teremos textos precisos, como aqueles que o Renato Pompeu queria?



Mea maxima culpa

Que ninguém diga que este colunista só gosta de falar mal dos outros: ele também comete suas imprecisões. Na última coluna, por exemplo, foram citados Vladimir Sacheta e Vergniaud Gonçalves como pioneiros paulistas do lead informativo, no jornal O Tempo. Vieram três correções imediatas, de três grandes jornalistas: Luiz Carlos Cardoso, Júlio Abramczyk e Wladir Dupont. O secretário de Redação de O Tempo não era Vladimir, e sim seu pai, Hermínio Sacheta.

Corrigido! Mas sobrou uma dúvida: para Júlio Abramczyk, era Hermínio Saccheta, com dois ‘c’ e um ‘t’. Para Wladir Dupont, era Hermínio Sachetta, com um ‘c’ e dois ‘t’. Os dois foram focas em O Tempo. Talvez Wladir esteja com a razão: está preparando um livro sobre O Tempo, onde iniciou sua carreira.



Histórias da história

Mas Júlio Abramczyk também tem histórias saborosas sobre o jornal. Lembra que Vergniaud Gonçalves patrocinava uma grande feijoada aos sábados. Dirigindo-se a este colunista, diz que ele era ‘mais gordo do que nós dois juntos’. Lembra que o diretor do jornal era Sílvio Pereira – pai do futuro ministro, e então crítico de cinema, Luís Carlos Bresser Pereira.

Como jornalista que é, Júlio Abramczyk também comete suas imprecisões. Este colunista, por exemplo, não é gordo: é baixo. Caso tivesse 2m44, seu peso seria rigorosamente proporcional à altura.



Bom debate

Fernando Molica, excelente jornalista, faz excelente contribuição ao debate que se trava na Abraji, Associação Brasileira do Jornalismo Investigativo, sobre os limites da reportagem policial. Molica acha desnecessário (e errado) publicar detalhes sobre operações que levaram à prisão de bandidos: para que ensinar-lhes onde erraram? Para que possam aperfeiçoar suas futuras ações e escapar da polícia? É claro que a imprensa só pode divulgar esses detalhes porque os policiais a informaram. Mas, pergunta Molica, se há policiais irresponsáveis, a imprensa também deverá ser irresponsável?



Cadê a gente?

O jornalista brasileiro Rui Martins e o suíço Jean-Noel Cuénod, autores do livro Por que a Suíça entregou Maluf, promoveram um grande encontro de imprensa no Clube de Imprensa de Genebra. Só faltaram os brasileiros: não havia nenhum correspondente por lá, como se Paulo Maluf e as acusações contra ele não fossem notícia. Martins lembra que, se Maluf se eleger deputado, passará a gozar de imunidades parlamentares e o processo contra ele terá de ser reformulado. ‘Nesse caso, como o dinheiro de suas contas não irá para o Fisco, reiteraremos nosso pedido para que cumpra sua promessa, assinada em cartório, de doação do dinheiro encontrado na Suíça.’

Uma dúvida: um livro brasileiro que provoca encontro internacional de jornalistas em Genebra pode ser ignorado pela imprensa de nosso país?



Delícias da imprensa

1. Está num grande portal: ‘Surfista se livra de tubarão com um soco nos EUA’. Estarão os EUA do tubarão no focinho, no baixo ventre, no baixíssimo ventre? A notícia não esclarece este fato. Mas isso lembra um velho cacoete do jornalismo esportivo: o jogador leva a bolada num lugar inequívoco, dobra-se de dor, fica estendido no chão enquanto o massagista dobra suas pernas. E o locutor informa que ele recebeu uma bolada no tórax.

2. De outro grande portal: ‘Caçador confunde homem com peru e atira nos EUA’. Aqui a notícia é mais precisa: o tal de EUA não deve ser nenhum órgão vital, já que o cavalheiro que recebeu o tiro não morreu. Mas, se não é vital, deve ser muito fácil de atingir: um caçador que confunde um homem com um peru não deve ser lá muito bom da vista.

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados