‘A proliferação de revistas de ‘divulgação científica’ seria um benefício incalculável para o povo, se elas não fossem escritas, em geral, por semi-intelectuais que melhor fariam em guardar para si suas idéias bobocas. Outro dia vi numa dessas publicações uma reportagem que, com o ar triunfante de quem esmaga o obscurantismo religioso sob as patas soberanas da ‘ciência’, explicava as curas miraculosas como efeitos da ativação de certas áreas cerebrais pela prece fervorosa, sem necessidade de mediação externa, divina, entre o pedido e a realização. Isso quer dizer que, se você pedisse o milagre a Baal, a Belzebu, ao Rei Momo, a São Lulinha ou até a São-Você-Mesmo, obteria idêntico resultado, contanto que chacoalhasse as áreas certas da sua massa cinzenta. Só que, alçado o cérebro às alturas dessa onipotência, os efeitos da mera auto-sugestão seriam indiscerníveis das curas pela fé religiosa e as igualariam ou superariam em número. E, se tamanha fosse a eficácia da auto-sugestão, ela simplesmente eliminaria a possibilidade de testar medicamentos pelo método duplo-cego com efeito placebo. Num relance, a pesquisa científica em medicina estaria abolida, e então não faria o menor sentido alegar sua autoridade contra as pretensões da religião ou até da superstição pura e simples. O autor da matéria nem de longe se dava conta dessa conseqüência imediata e incontornável do seu raciocínio. Pensar, definitivamente, não era o seu forte.
Com a mesma arrogância pueril com que investem contra a religião sem perceber que seu secularismo materialista não é uma ciência e sim apenas uma crendice pseudo-religiosa, os professores de ‘ciência popular’ se imaginam heróis libertadores ao atacar os valores e símbolos nacionais, sem notar que com isso produzem apenas um estado de desorientação geral do qual as primeiras vítimas são eles próprios.
No último número da revista Nossa História , o prof. Luis Felipe da Silva Neves declara que o desempenho do Marechal Mascarenhas de Moraes no comando da FEB na II Guerra Mundial ‘deixou muito a desejar para qualquer um que possua um mínimo de conhecimento de história militar’. A afirmativa atesta que, de fato, o prof. Silva Neves possui esse conhecimento em dose mínima. Ele entende tanto de história militar quanto eu de criação de rouxinóis. O general Geraldo Luiz Nery da Silva, coordenador do projeto de História Oral do Exército, já lhe respondeu em carta à revista:
‘Há dezenas de fontes primárias valiosas que mostram o erro palmar em que incorreu o Prof. Luis Felipe nos comentários sobre a figura de Mascarenhas de Moraes. Como Coordenador e Entrevistador do Projeto de História Oral do Exército na Segunda Guerra Mundial, ouvi, pessoalmente, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, mais de cem colaboradores, civis e militares, entre os 180 ex-combatentes entrevistados em todo o Brasil, não havendo em nenhuma entrevista qualquer referência negativa, por menor que seja, ao comandante da FEB e da 1 a Divisão de Infantaria Expedicionária’.
Se o comandante da FEB fosse tão ruim quanto a revista diz, ao menos dois ou três dentre aqueles180 soldados deveriam ter percebido isso antes do prof. Silva Neves. Mas o testemunho deles coincide em gênero, número e grau com o do general Carlos de Meira Matos, que assessorou o Marechal durante toda a Campanha da Itália, como membro de seu Estado-Maior e atesta ‘a sua capacidade de comando e sua invulgar dignidade’. Este coincide por sua vez com o dos dois comandantes operacionais a que então Mascarenhas estava submetido, os generais Clark, Truscott e Crittenberger . Uai, se um chefe militar é aprovado por seus comandados, por seus comandantes e pelo seu Estado-Maior, a quem mais ele deveria satisfações quanto ao seu desempenho? Aos iluminados acadêmicos? Aliás, como poderia esse desempenho ter sido melhor? Mascarenhas obteve no campo de batalha o máximo que um comandante pode alcançar: a vitória. E a vitória em condições precaríssimas, nas quais milhões de Silvas Neves não saberiam senão chorar e chamar a mamãe.’
UM CADÁVER AO SOL
‘O reencontro com o vício do autoritarismo’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/05/05
‘O stalinismo chegou ao Brasil antes de Stalin assumir o poder na União Soviética e iniciar o maior genocídio da História. Entre nós, a primeira vítima dos expurgos comunistas foi Antônio Bernardo Canellas, um niteroiense libertário que em 1922 foi indicado pelo recém-fundado Partido Comunista do Brasil para representá-lo no 4.º Congresso da Internacional Comunista, em Moscou. A comovente história de Canellas é contada no livro Um Cadáver ao Sol, que, segundo a autora, a jornalista Iza Salles, estimula reflexões sobre o autoritarismo marxista e sobre o Brasil atual.
O livro de Iza escancara a vocação sempre autoritária do marxismo, ao relatar em minúcias o processo kafkiano instaurado contra Canellas por ordem direta de Moscou. De acordo com ela, o vício autoritário que surpreendeu Canellas na Internacional Comunista tem muitas semelhanças com o Brasil atual e com as tentativas de estabelecer controles sobre a sociedade. O processo que marcou a expulsão e a desqualificação pública de Canellas guarda muitas semelhanças com a expulsão de militantes radicais que discordaram do PT.
Iza, que foi presa política na ditadura militar, também lembra que o regime soviético liquidou os anarquistas na União Soviética e obrigava os PCs de todo o mundo a combater os seus adversários históricos – os anarquistas e os social-democratas. ‘Mas quando o PC italiano chegou ao poder fez um governo social-democrata’, assinala a autora, ‘da mesma forma que o PT, que pregava soluções radicais até atingir o poder. Agora adota políticas liberais e processa e expulsa os radicais que tinha incorporado na sua fundação’.
Um Cadáver ao Sol é um livro para provocar polêmicas na esquerda brasileira. Primeiro, porque propõe uma reflexão profunda sobre a essência autoritária do marxismo. Segundo, porque narra a história de um homem que soube dizer ‘não’, lutando contra dirigentes que tinham por vício dizer ‘sim’. Terceiro porque demonstra que os processos de expulsão nos partidos comunistas não se circunscreviam ao debate ideológico, mas promoviam a desconstrução moral do militante a ser defenestrado – e muitas vezes terminavam em assassinatos.
Canellas era um comunista recém-egresso do anarquismo e chegou a Moscou, em 1922, acreditando que a Revolução de Outubro era generosa e democrática. No congresso da Internacional Comunista, com apenas 24 anos, ele refutou dogmas, votou contra resoluções programadas para receber aprovação unânime e aparteou o camarada Trotski para acusá-lo de fazer uma bourrage de crâne (lavagem cerebral) com os delegados. A perseguição contra ele começou ainda em Moscou; quando voltou ao Brasil foi acusado, desmoralizado e, afinal, expulso do PCB como ‘traidor’.
Já aos 17 anos, Canellas era um militante em tempo integral e viajava pelo Brasil para fundar jornais operários que pregavam a organização dos trabalhadores, no melhor estilo anarcossindicalista. Ele era filho legítimo da onda anarquista trazida pelos 3,4 milhões de imigrantes europeus que entraram no Brasil entre 1871 e 1920. Anarquistas e marxistas se batiam desde meados do século 19, mas a revolução russa entusiasmou os anarquistas brasileiros. Era emotivo: narrou compungido que os 394 delegados do 4.º Congresso se levantaram e cantaram a Internacional (o hino comunista) quando Lenin entrou.
Muitos anarquistas confundiram os rumos e aderiram ao comunismo. Na Rússia soviética as desconfianças surgiram com a repressão contra anarquistas e social-democratas, mas essas informações não chegavam ao Brasil. Logo após Canellas chegar de volta ao Brasil, chegaram também os relatórios de Moscou, falando de sua indisciplina. Questionado duramente pelo partido, ele acabou expulso, desmoralizado com dezenas de pejorativos – pedante, asno, ignorante, parlapatão, ególatra, neurótico, pessoinha, ictérico, pernóstico e, por último, desertor e traidor.
‘Canellas não traiu ninguém. Foi expulso porque queria discutir as idéias, e não aceitá-las prontas, como fizeram os comunistas a vida inteira’, defende Iza. O livro acompanha as trajetórias dos que puniram Canellas e mostra que todos, sem exceção, em algum momento da ditadura stalinista caíram em desgraça e sofreram punições bem mais graves e dolorosas que o libertário niteroiense dos jornais operários.
Anarquistas e exílio levaram autora a escrever livro
Iza Salles começou a pensar em escrever a trajetória de Canellas quando, exilada, conheceu anarquistas espanhóis. Pouco depois uma amiga, Nilda Alves, antiga militante do PCB, lhe entregou o dossiê sobre a expulsão de Canellas, O Processo de Um Traidor, editado pelo Partidão em 1924. Percebeu que aquela perseguição não tinha nenhuma sustentação ideológica ou moral.
Mais tarde, Iza descobriu que Boris Souvarine, fundador do PC francês e um dos principais acusadores de Canellas, estava vivo. Embora nunca conseguisse uma entrevista, os dois trocaram correspondências até a morte do dirigente (que, aliás, caiu em desgraça). No Brasil, os carrascos de Canellas foram os dirigentes Octavio Brandão e Astrojildo Pereira, que logo depois cairiam em desgraça no Partidão e foram obrigados a fazer várias autocríticas.
O dossiê da expulsão de Canellas perdeu-se na poeira sem glória do velho PCB, talvez pela indignidade de suas conclusões. ‘É necessário dissecar esse cadáver’, dizia o texto elaborado para condenar um jovem que só pretendia discutir idéias de forma aberta e livre. ‘Vocês querem me matar como homem e revolucionário, mas eu sou muito jovem para morrer’, respondeu Canellas. Ele resistiu bravamente ao processo de expulsão e fez jornais operários .
Quando a década de 20 terminou, o núcleo de nove fundadores do PCB estava reduzido a Astrojildo Pereira. A ‘tribo do nhô, sim’, como jocosamente ironizava Canellas, tinha sido varrida. ‘Era preciso ter coragem para dizer ‘não’ naquele tempo’, registra Iza. Um Cadáver ao Sol lembra que a Internacional Comunista foi extinta em plena guerra, em 1943, sem que nenhum partido comunista tenha chegado ao poder seguindo as suas orientações.’
Sérgio Augusto ‘Vermelho, não. Anarquista.’, copyright O Estado de S. Paulo, 1/05/05
‘Faz hoje 50 anos que os trabalhadores brasileiros comemoraram o primeiro Dia do Trabalho depois da morte de Getúlio Vargas. Muitos se sentiram como num Carnaval sem desfile de escolas de samba ou num Natal sem Papai Noel. O último 1º de maio de Getúlio, em 1954, fora uma despedida em alto estilo, que lhe custara um ministro (do Trabalho, João Goulart) e pusera em risco seu mandato. Ao anunciar um aumento de 100% no salário mínimo, enfureceu a oposição, o empresariado e alguns militares golpistas, mas as gestões para um impeachment não frutificaram no Congresso, onde o governo levou a melhor por 133 votos a 37.
Foi por medidas como essa que Getúlio entrou para a história como o ‘pai dos pobres’. E, sabe-se hoje, como um profeta do lulismo. Em seu derradeiro discurso às classes trabalhadoras, a certa altura vaticinou: ‘Hoje estais com o governo. Amanhã sereis governo’. Coisas surpreendentes costumam acontecer no (ou a propósito do) primeiro dia de maio.
Já houve quem acreditasse que o Dia do Trabalho fosse um feriado instituído por Getúlio. Ele, porém, tinha apenas 6 anos de idade quando, em 1889, os sindicatos do mundo inteiro acataram a decisão da Federação do Trabalho Americana e do Congresso Socialista de Paris de fazer de 1º de maio o dia internacional, não do trabalho, mas do trabalhador – razão pela qual os trabalhadores, nesse dia, não trabalham. A substituição do trabalhador pelo trabalho foi um ardil semântico para ajudar a afastar a classe operária e seus sindicatos da influência de comunistas, socialistas e outros subversivos.
O 1º de Maio como data simbólica da luta dos operários pelos seus direitos nasceu na Praça Haymarket, em Chicago, em 1886, durante uma manifestação pela redução da jornada de trabalho para oito horas. Reprimida com extrema brutalidade, resultou na prisão de dezenas de trabalhadores e na morte de 100 pessoas. Quatro militantes anarquistas, todos tipógrafos, foram condenados à forca e executados. O quinto condenado, um carpinteiro de 23 anos, suicidou-se na cela. O Dia do Trabalhador não teve como padroeiro Karl Marx, mas Alberto Parsons, Adolf Fischer, George Engel, August Spies e Ludwig Lingg, os Mártires de Chicago. A exemplo do que faria Getúlio, o governo americano, mais que depressa, instituiu o Dia do Trabalho. Para evitar problemas, agendou-o para a primeira segunda-feira de setembro.
Embora Marx já estivesse por cima da carne-seca (fora expulso do primeiro congresso da Associação Internacional Trabalhista, em 1866, mas conseguira acabar com a AIT, seis anos depois, e a ressuscitaria em 1891, como um feudo marxista), a classe operária daquele tempo fechava com os anarquistas. Com todo o respeito a Stendhal e à eufonia, mas o negro veio antes do vermelho na história dos movimentos de agitação social do século 19.
No Brasil, por exemplo, o marxismo só chegou oficialmente em 1887, num discurso do sergipano Tobias Barreto para os formandos da Faculdade de Direito do Recife. Até então – e mesmo depois, entrando pelas duas primeiras décadas do século 20 – os guias espirituais da militância operária eram Proudhon, Bakunin e Kropotkin, a subversivíssima trindade anarquista. Foi um italiano anarquista, Artur Campagnoli, quem tentou organizar o nosso primeiro 1º de Maio, em 1894, na praça certa: a fabril e febril São Paulo. A polícia não deixou. Na década seguinte, a repressão baixou a guarda e o Dia do Trabalhador entrou definitivamente para o calendário.
Quando o jovem tipógrafo, linotipista e editor de jornais alternativos Antonio Bernardo Canellas chegou a Moscou, em setembro de 1922, seus mestres eram os mesmos que haviam feito a cabeça do anarcossindicalismo então dominante. Não preferia Proudhon, Bakunin e Kropotkin a Marx e Engels por razões ideológicas, mas porque só conhecia bem o pensamento dos três primeiros. E nenhum deles confiava no comunismo, ‘a negação da liberdade’, alertara Bakunin. Canellas foi o primeiro brasileiro a entrar na Rússia depois da Revolução Soviética. Com apenas 24 anos, era um dos mais jovens dos 394 delegados credenciados para o 4º Congresso da Internacional Comunista – e o único representante do Brasil. Ou melhor, do recém-criado Partido Comunista do Brasil (depois, Brasileiro). O PCB buscava reconhecimento e integração na Internacional Comunista. Canellas melou tudo.
Condicionado por sua formação anarquista e desacostumado com o centralismo vigente na IC, o delegado do PCB ousou, durante o congresso, defender a liberdade de expressão, votar contra propostas que julgava incorretas e até um aparte fez ao camarada Trotski. Caiu em desgraça; primeiro lá, depois cá. ‘Traidor da classe operária’ foi o mínimo de que foi acusado pelos mandarins do PCB, Astrojildo Pereira e Octávio Brandão, que ainda o xingaram, por escrito, de patife, velhaco, indigno, vil, presunçoso, pernóstico, ignorante, ridículo, delirante, neurastênico – e o expulsaram do partido. Canellas foi apenas o que Iza Salles acaba de nos revelar em seu livro Um Cadáver ao Sol, lançado nesta semana pela Ediouro: um jovem idealista, coerente com suas idéias e corajoso o bastante para não se submeter às humilhantes autocríticas celebrizadas pelos partidos comunistas. Um mártir de sua classe. Como os que serviram de inspiração para o Dia do Trabalho; perdão, do Trabalhador.’
IMPRENSA NA BERLINDA
‘A relação entre a fonte e o jornalista’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 29/04/05
‘Pela primeira vez no Comunique-se, o ‘Papo na Redação’ teve três entrevistados. O bate-papo foi temático: ‘A relação entre a fonte e o jornalista’, inspirado no lançamento do livro ‘Imprensa na Berlinda’, de autoria de Carlos Chaparro, Norma Alcântara e Wilson Garcia. A obra traz entrevistas feitas por fontes com jornalistas. Os participantes foram Chaparro; Paulo Salvador, diretor geral de Marketing da Accor Hotels América do Sul; e Andréa Ciaffone, repórter da Gazeta Mercantil – os dois últimos colaboraram com o livro, ele como fonte entrevistadora, ela como jornalista entrevistada. Leia ‘Fontes e jornalistas: a inversão de papéis’.
Chaparro explicou durante o chat o que significa ‘revolução das fontes’. ‘(..) é uma denominação que identifica a capacitação que as fontes adquiriram nas últimas décadas, para interferir decisivamente no processo jornalístico. Elas propõem pautas, produzem acontecimentos, desenvolvem temas, geram conteúdos irrecusáveis, dominam os segredos da linguagem jornalística – e fazem isso com enorme competência. Em muitos aspectos, uma competência mais desenvolvida que a das redações’.
Para Salvador, uma boa fonte é ‘aquela que se prende ao fato e não aquela que constrói o fato. Muitos dos meus colegas, fontes e porta-vozes de empresa confundem a produção do fato com a descrição do fato. No caso da primeira, está mais relacionado à propaganda do que a jornalismo e relações publicas. Uma outra característica de uma boa fonte tem que ser também simpática’.
Andréa afirma que a fonte deve sempre ser preservada. ‘Porque é aquela história de que é preciso ter cuidado com quem te fornece matéria-prima pra profissão. Você tem que tratar com consideração seu fornecedor se quiser continuar no negócio’.
Leia o ‘Papo na Redação’ desta sexta-feira (29/04) na íntegra:
[15:03:34] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Carlos Chaparro: Olá. Boa Tarde. Qual a sua concepção das fontes utilizadas pelo Jornal Nacional?
Carlos Chaparro responde: Boa tarde, Felipe. As fontes do Jornal Nacional são, em boa parte, as fontes oficiais – considerando-se, aí, no termo oficial, não apenas as fontes da situação, mas também da oposição. Há, porém, uma quantidade razoável de matérias nas quais as fontes permanecem ocultas, e essa é uma prática às vezes empobrecedora do jornalismo.
[15:08:03] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: E quando a fonte passa uma informação falsa, como jornalista deve agir?
Carlos Chaparro responde: O jornalista está eticamente obrigado a se assegurar da veracidade da informação. É ele, não a fonte, que perante o público assume a responsabilidade pelo que se divulga. Às vezes isso é difícil e pode implicar um adiamento da matéria. Mas considero o adiamento preferível ao apressamento que pode pôr em causa a veracidade da informação. Se preferir, poderia dizer o seguinte: a fonte pode ter até o direito de mentir; o jornalista tem o dever de demonstrar que a fonte mentiu.
[15:11:05] – Paulo Henrique Scarpa e Arantes (Assessor de Imprensa – Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo) pergunta para Carlos Chaparro: Caríssimo Chaparro, em primeiro lugar, um elogio a quem me ensinou muito no glorioso Jornal do Advogado (OAB/CAASP). Gostaria de saber até que ponto o sigilo da fonte pode diminuir a credibilidade da notícia, posto que dá margem, muitas vezes, à `criatividade` e à `imaginação` de certos colegas, que se escoram nesse recurso.
Carlos Chaparro responde: Um abraço, Paulo Henrique. O ocultamento da fonte só se justifica quando não há outra maneira de assegurar a informação. Isso faz parte dos manuais dentológicos do mundo inteiro. Acima dos manuais, entretanto, está a consciência ética do jornalista, que tem o dever de ser veraz nos seus relatos e de respeitar o compromisso com os valores do bem comum. Quando a fonte, por algum motivo, tem de ficar oculta, aumenta o dever da investigação rigorosa e detalhada, para que a veracidade da informação se torne inquestionável.
[15:13:02] – Helder Gustavo Mota da Silva (Freelancer – Freelancers) pergunta para Paulo Salvador: A bem da verdade, o que é fonte?
Paulo Salvador responde: Boa tarde a todos. Acho que fonte é o personagem do fato. É ele que é muitas vezes a testemunha da notícia. Infelizmente não são todas as fontes que conhecem seu papel.
[15:13:18] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: Quando a fonte é política, qual a melhor postura do jornalista para evitar jogos políticos?
Carlos Chaparro responde: Ana Carolina: a fonte política, como a maioria das fontes que atuam no jornalismo, são fontes organizadas e interessadas. Legitimamente interessadas. Cabe ao jornalista enriquecer o seu acervo de informantes com fontes não interessadas – fontes de aferição, fontes de referência, fontes testemunhais, fontes documentais, fontes bibliográficas…
[15:15:35] – Cristina Dissat (Diretor – Folha da SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – RJ) pergunta para Andréa Ciaffone: Acho que a expressão `fonte` na Internet anda mudando. Muita gente copia textos e no final escreve `fonte`. Qual a sua opinião sobre isso?
Andréa Ciaffone responde: Um absurdo. Se alguém faz isso não merece estar na categoria jornalística. Na verdade, você tem duas questões. Além disso, você tem que pensar que uma chefia que permite isso tem que dar ajustada, e atitudes desse tipo comprometem a credibilidade da profissão.
[15:17:08] – Beth Guaraldo (Diretora – Portal Press – SP) pergunta para Carlos Chaparro: Professor, o Sr. fala em revolução das fontes. O que é isto exatamente?
Carlos Chaparro responde: A revolução das fontes é uma denominação que identifica a capacitação que as fontes adquiriram nas últimas décadas, para interferir decisivamente no processo jornalístico. Elas propõem pautas, produzem acontecimentos, desenvolvem temas, geram conteúdos irrecusáveis, dominam os segredos da linguagem jornalística – e fazem isso com enorme competência. Em muitos aspectos, uma competência mais desenvolvida que a das redações.
[15:17:11] – Helder Gustavo Mota da Silva (Freelancer – Freelancers) pergunta para Andréa Ciaffone: Até que ponto as fontes devem ou não ser resguardadas?
Andréa Ciaffone responde: Sempre, sempre. Porque é aquela história de que é preciso ter cuidado com quem te fornece matéria-prima pra profissão. Você tem que tratar com consideração seu fornecedor se quiser continuar no negócio.
[15:17:48] – Beth Guaraldo (Diretora – Portal Press – SP) pergunta para Paulo Salvador: Paulo, qual foi a sua melhor experiência como fonte?
Paulo Salvador responde: Acho que a minha grande experiência como fonte foi na ocasião da morte do Ayrton Senna. Trabalhava na equipe de marketing do Banco Nacional e fui nomeado como uma das fontes. O clima de consternação era enorme dentro e fora do banco e tudo que eu pudesse dizer tinha um componente emocional muito grande que não poderia ser avaliado se seria bom ou ruim para a imagem do banco.
[15:20:37] – Thais Vido de Moura (Estagiário – Saned, Companhia de Saneamento de Diadema) pergunta para Andréa Ciaffone: Minha pergunta também é sobre a fonte na Internet. A atividade de `empacotamento` acaba substituindo a fonte dos jornalistas mais preguiçosos, mesmo que o conteúdo na Internet não seja suficiente para produzir o texto. A matéria vira uma colcha de retalhos composta por trechos de outras matérias. Qual é a melhor maneira de lidarmos com a questão da fonte na Internet?
Andréa Ciaffone responde: Primeiro que ela não deve existir. Internet é fonte de consulta e pesquisa, mas o trabalho de apuração jornalística é muito maior. Exige especialização de quem faz o texto, exige fontes confiáveis especializadas, reflexão e bom texto. A colcha acontece quando se faz ctrl C ctrl V. Jornalista preguiçoso tem vida curta porque essa é uma profissão em que seu trabalho nunca está pronto.
[15:20:47] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Carlos Chaparro: Como você considera que é a percepção dos receptores com relação ao uso dessas fontes oficiais?
Carlos Chaparro responde: Felipe: exige-se do jornalismo que seja uma linguagem clara, precisa e veraz, para que não haja dúvidas quanto à significação preponderante das informações e das falas que recheiam as matérias. A ‘oficialidade’ das fontes jamais deve ser escondida. O que não priva o receptor de atribuir aos fatos o seu próprio entendimento. Interpretação é isso: uma estratégia dialética em que o destinatário final tem a última palavra.
[15:21:57] – Edson Sardinha (Editor – Congresso em Foco – DF) pergunta para Paulo Salvador: Boa tarde, Paulo. Como estabelecer um limite `saudável` entre jornalista e fonte? O que pode contaminar essa relação, por exemplo?
Paulo Salvador responde: O limite saudável entre jornalista e fonte é o mesmo de qualquer relação profissional: respeito mútuo pelo papel de cada um. O primeiro de perguntar e duvidar. O segundo de se ater aos fatos.
[15:22:26] – Helder Gustavo Mota da Silva (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: Até que ponto as fontes devem ou não ser resguardadas?
Carlos Chaparro responde: Até ao ponto em que esse seja um preço justo para se conseguir e divulgar uma informação de interesse da sociedade. Mas, como já disse antes, quando assim tem de ser, aumenta o dever de dar sustentação ao que se divulga.
[15:23:35] – Cristina Dissat (Diretor – Folha da SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – RJ) pergunta para Andréa Ciaffone: Isso vem acontecendo freqüentemente com o site da Sociedade Brasileira de Diabetes. Em princípio, estamos acionando os responsáveis e tem dado certo. A maioria que faz isso não tem equipe de conteúdo.
Andréa Ciaffone responde: É verdade. A mídia Internet acabou banalizando a atividade jornalística em função da facilidade de encontrar informação. As pessoas passam a publicar coisas sem cuidado e controle ético que o jornalista teria. É por isso que há informação inconseqüente.
[15:24:08] – Helder Gustavo Mota da Silva (Freelancer – Freelancers) pergunta para Paulo Salvador: As assessorias de imprensa podem ser tomadas como fontes `totalmente` legítimas?
Paulo Salvador responde: Acho que as assessorias de imprensa não podem ser consideradas fontes mas sim facilitadores do trabalho dos jornalistas e das fontes. Além é claro de auxiliadores na estratégia de posicionamento e comunicação da imagem da empresa e de seus clientes. Quando uma assessoria de imprensa começa a falar como fonte, ou o cliente é irresponsável em ‘terceirizar’ sua imagem e os fatos que concernem a seu negócio, ou a assessoria está avançando o sinal.
[15:24:31] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: Qual maior problema que você enfrentou com uma fonte?
Carlos Chaparro responde: Carolina: o percurso é longo demais para conseguir precisar um caso. Mas penso que o maior problema que se coloca ao jornalista, quando se trata de fonte interessada, é sempre o de vislumbrar com segurança a verdadeira ação que a fonte está querendo realizar.
[15:25:48] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Paulo Salvador: Quando deu entrevistas, como foi a sua percepção da matéria, ao vê-la pronta, no jornal?
Paulo Salvador responde: Eu adoro ver o resultado de minhas entrevistas no veículo. É uma forma de me auto-avaliar constantemente como fonte. Se algo sai muito distante do fato, penso que não fui uma boa fonte.
[15:26:19] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Carlos Chaparro: Você disse que `o jornalista tem o dever de demonstrar que a fonte mentiu`. Como ele pode fazer isso?
Carlos Chaparro responde: Com investigação, aferições, comparações, documentos, observações – com método e honestidade, principalmente honestidade, que no caso do jornalismo é a construção da certeza de que o leitor não está sendo enganado. Só que dá trabalho, muito trabalho.
[15:28:10] – Cristina Dissat (Diretor – Folha da SBEM – Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia – RJ) pergunta para Carlos Chaparro: Em pesquisa apresentada no último Comsaúde (evento de jornalismo e medicina), em Recife, um dos participantes mencionou que em um ano (nos principais jornais), 70% das notícias sobre saúde tinham fonte genéricas. Vc acha que esse percentual tão alto acontece mais na área de saúde?
Carlos Chaparro responde: Não se eu responder objetivamente à sua pergunta. Quando as fontes são genéricas, cresce o risco de a especulação suplantar a informação. E penso que, em política, provavelmente, especula-se mais do que na saúde. Mas é só um palpite…
[15:28:36] – Edson Sardinha (Editor – Congresso em Foco – DF) pergunta para Paulo Salvador: Paulo, os jornalistas têm, em geral, boa vontade quando aparecem na condição de fontes? Não costuma haver uma certa resistência quando o jornalista vira entrevistado?
Paulo Salvador responde: Certamente todos nós ficamos numa posição desconfortável pelo simples fato de passarmos para o outro lado do balcão. Além do mais esse trabalho do livro ‘Imprensa na Berlinda’ era novo para todos e tenho certeza de que houve desconforto de ambos os lados.
[15:30:07] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: Quais as dificuldades do seu início de carreira, o chefe, as fontes ou seu receio?
Carlos Chaparro responde: Nunca liguei muito para chefes, olhei sempre mais para os leitores, na medida em que vi neles os interlocutores fundamentais. Quando assim é, as maiores dificuldades são sempre em alcançar o âmago dos conteúdos, com a certeza de que não estamos sendo enganados pelas aparências.
[15:32:16] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Andréa Ciaffone: É senso comum que o jornalista deve perguntar `o que o público quer saber`, mas essa é uma concepção um pouco generalista. Como os jornalistas descobrem, identificam `o que o público quer saber`?
Andréa Ciaffone responde: Cada jornalista em cada veículo tem que saber qual o público a quem ele se dirige. A partir daí, ele passa a considerar as prioridades, questionamentos, modo de pensar e estilo de vida do seu público. Então você atende seu público com mais eficiência. Se eu trabalho na GZM eu tenho que pensar como esse público, não posso escrever como que trabalhasse pra revista Elle. Mesmo que a mesma pessoa leia a GZM e Elle a abordagem que ela espera de cada veículo é diferente. O que o leitor quer saber é diferente. Para ficar mais claro: se vc tem um lançamento de um shampoo da L’Oreal na GZM, o foco será no que esse produto vai impactar no market share da empresa, quanto custou o desenvolvimento, qual investimento em mkt, qual expectativa em relação a esse produto. É isso que o público da GZM quer saber. Agora, o público da Elle quer saber qual o benefício que ele vai gerar, o que tem de novo, colher testemunhais de pessoas que testaram e como esse produto se insere em termos de comportamento.
[15:34:24] – Beth Guaraldo (Diretora – Portal Press – SP) pergunta para Carlos Chaparro: Em que aspectos, na sua opinião, as fontes têm uma competência mais desenvolvidas que a das redações?
Carlos Chaparro responde: Em muitos aspetos. No uso dos mecanismos da Internet, por exemplo. E na percepção dos atributos que interessam a uma boa pauta. Considero até lamentável que os pauteiros dependam tanto das fontes para fazer o seu trabalho. É também notável como as boas fontes profissionalizaram as suas relações com as redações. E, apesar de todas as críticas que ainda hoje se podem fazer aos textos que saem das assessorias de imprensa, nota-se uma crescente criatividade nas abordagens e angulações das propostas encaminhadas às redações. Outra competência desenvolvida é a de pensar os acontecimentos e as falas como conteúdos jornalísticos – tanto na materialidade dos fatos quanto nos recheios discursivos.
[15:34:31] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Andréa Ciaffone: E quando o editor não entende essa posição, e quer a matéria de qualquer jeito?
Andréa Ciaffone responde: Depende da prioridade do veículo. Se for qualidade o editor vai entender. Vai ter outra matéria no lugar ou instruir melhor seus repórteres. Ou então deixar publicar. A opção vai de acordo com a consciência de cada um. Eu prefiro derrubar. Se não está bom, eu termino.Eu não edito pra cumprir tabela.
[15:34:32] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Paulo Salvador: Paulo, você já divulgou alguma informação em `off` e foi surpreendido vendo-a publicada?
Paulo Salvador responde: Ana, esse assunto de fonte versus off me parece um princípio universal. Aliás, certa vez eu dei uma notícia em off sobre uma situação de mercado que ia acontecer com uma empresa que estava abrindo mão de práticas não éticas. O jornalista publicou. Logo depois foi ameaçado de processo pela empresa. O jornalista jamais mencionou a fonte. Felizmente o que havia dito sobre a empresa realmente aconteceu e ela foi a pique.
[15:36:59] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Andréa Ciaffone: Existe pluralismo de vozes no Jornal Nacional?
Andréa Ciaffone responde: Olha, o JN ele tem uma linha editorial que deve ser respeitada. Considerando as limitações do formato, eu o considero suficientemente ecumênico. Acho que em termos de variedade de assunto ele faz seu trabalho. Ninguém pode esperar que em um formato de meia hora de TV você vá discutir matérias com profundidade. O formato não permite.
[15:37:36] – Helder Gustavo Mota da Silva (Freelancer – Freelancers) pergunta para Paulo Salvador: Sendo assim, o que vc acha dos jornais, principalmente de pequenas cidades que publicam releases tal qual chegam nas redações? Há algo possa ser feito para estes pseudo-jornalistas, que por preguiça ou falta de compromisso mesmo fazem esse tipo de coisa?
Paulo Salvador responde: Esse prática realmente é um absurdo. Sabe o que eu acho que vai acontecer: ou esses jornais vão encontrar formas de se diferenciarem na informação que dão para seus clientes ou vão desaparecer engolidos pela Internet. O leitor não precisa ir muito longe para detectar o que é notícia do que é release.
[15:38:04] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Carlos Chaparro: A fonte pode ser considerada como um recurso legitimador do jornalismo?
Carlos Chaparro responde: O jornalismo sempre dependeu das fontes. Por isso, o jornalismo não é nem nunca foi um discurso autônomo. Só há notícia boa se a fonte for boa – e, a essa virtude, um jornalista inglês, o genial Samuel Buckley (em 1710, mais ou menos) chamou de acurácia, que vem a ser a certeza de que, se os procedimentos preliminares forem corretos, os resultados serão inevitavelmente bons.
[15:38:31] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Paulo Salvador: Você já questionou o porquê do jornalista ter escolhido determinada frase ou opinião sua para colocar na matéria?
Paulo Salvador responde: Eu só questionaria se ele escolhesse uma frase ou opinião dele para colocar na matéria. Matéria é matéria. Opinião é opinião.
[15:39:44] – Érika Soós Sposito (Editor-Chefe / Coordenador de Conteúdo – Arroio Editorial) pergunta para Andréa Ciaffone: O que você acha que o jornalista deve fazer quando não consegue indicações de fontes para produzir uma matéria?
Andréa Ciaffone responde: Pesquisar mais. Se não tem ninguém para falar sobre esse assunto, você tem que pensar na validade da pauta ou assumir aquela informação e publicar como editorial. É uma saída. Acho difícil vc ter um assunto que não tenha fonte nenhuma. Sempre tem um especialista em alguma universidade.
[15:41:09] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Carlos Chaparro: O que vc acha de matérias `plantadas`, com câmeras escondidas e tal. Que praticamente não utilizam fonte?
Carlos Chaparro responde: Em princípio sou contra, porque se trata de práticas fraudulentas. Como linguagem veraz, o Jornalismo deve ser o resultado de práticas honestas. Mas admito que, em certos casos, os ganhos sociais podem justificar tais práticas. Em boa parte dos casos, porém, as ‘câmaras ocultas’ e outras coisas do gênero, estão vinculadas, apenas, ao interesse pela audiência.
[15:41:41] – Beth Guaraldo (Diretora – Portal Press – SP) pergunta para Paulo Salvador: O que é ser uma boa fonte?
Paulo Salvador responde: Uma boa fonte é aquela que se prende ao fato e não aquela que constrói o fato. Muitos dos meus colegas, fontes e porta-vozes de empresa confundem a produção do fato com a descrição do fato. No caso da primeira, está mais relacionado à propaganda do que a jornalismo e relações publicas. Uma outra característica de uma boa fonte tem que ser também simpática.
[15:42:30] – Ana Carolina Olivar González (Freelancer – Freelancers) pergunta para Andréa Ciaffone: Você já correu atrás de uma matéria, pensando que renderia lago, e no final ela nem foi publicada?
Andréa Ciaffone responde: Já aconteceu e na verdade foi uma decisão editorial. Era uma matéria pra um caderno semanal e que entre a data de fechamento do caderno e o dia de circulação poderia acontecer um fato novo sobre aquele assunto. Para não prejudicar a credibilidade, não entregar uma coisa ruim, decidimos derrubar a matéria. Foram horas de trabalho perdidas, mas que resultaram na credibilidade do veículo. Então, vale a pena.
[15:44:28] – Felipe Harmata Marinho’ (Estudante) pergunta para Andréa Ciaffone: Que tipos de análises são feitas para enquadrar o receptor em determinado público, para `saber qual o público a quem ele se dirige`?
Andréa Ciaffone responde: Os veículos de comunicação orientam quem é seu público. Toda empresa jornalística busca parâmetros para esse público. A partir daí, você desenvolve seu trabalho. Se descobrirmos que as adolescente trocam a Capricho pela Forbes, eu vou pensar em algo para elas.
[15:50:54] – Luciana Pansani (Coordenador / Chefe de Produção – Unimagem) pergunta para Paulo Salvador: Vc acredita mesmo que seja culpa do profissional o fato de a empresa publicar matérias de agências de notícias na íntegra, ou seria uma estratégia das empresas para economizar, no quadro de funcionários, etc?
Paulo Salvador responde: Não posso avaliar o que se passa dentro da gestão das empresas de mídia, mas o que posso dizer é que se vc trabalha com conteúdo, tem que se preocupar com a forma dele e matérias simplesmente publicadas como transcrição de release – em geral – é a mesma coisa que spam para o leitor.
[15:50:47] – Andréa Ciaffone (ENTREVISTADO) FALA COM TODOS: Gostaria de finalizar o chat dizendo que o jornalismo é baseado em ética e equilíbrio. Muito mais do que em obsessão pela velocidade ou a pressa de publicar. Instantaneidade a Internet te dá, o que o jornalismo tem que dar é o passo além. Reflexão, apontar caminhos, analisar situações… Se ele tiver tudo isso será um bom jornalismo. Não terá colcha de retalhos, por exemplo.’
JORNALISMO ESPORTIVO
‘Um repórter que viaja a cada quinze dias’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 29/04/05
‘Flavio Gomes exerce uma profissão invejável. O sonho fica mais nítido quando deixamos a rotina e o sacrifício de lado. É mais fácil. Melhor do que dizer o que acontece na Fórmula 1 seria sentar-se no cockpit, acelerar e jogar champanhe naqueles dois caras ali debaixo. Mas aí já é demais. Pensando bem, o Flavio Gomes não é tão sortudo assim (aqui a inveja ganhou o pódio).
O editor da agência Warm Up e comentarista da Rádio Bandeirantes cobriu mais de duzentos GPs de F-1. Trabalhou na Folha de S. Paulo, na Placar, na Jovem Pan… Esqueça os dias longe de casa, a saudade dos filhos, a labuta árdua… Ser ascensorista deve ser pior… Imagina, o dia inteiro dizendo ‘sobe!’, ‘desce!’ e, para variar, subir e descer… o dia inteiro. De ascensorista a ‘descensorista’ em questão de segundos, e vice-versa. É duro.
Melhor fazer como ele. ‘Fui para a China via Amsterdam. O aeroporto se chama Schiphol. Gosto de nomes de aeroportos, e me refiro a eles pelo nome, não pela cidade. É uma forma de arrotar intimidade com essa coisa de viajar muito, fazendo tipo, oh, para mim é tão comum que às vezes nem me dou conta e digo Schiphol em vez de Amsterdam. Digo também La Guardia, Zaventem, O’Hare, JFK (jêi-éf-quêi), Charles de Gaulle, Linate, Orly, Heathrow, Malpensa, Mirabel, Gatwick, Barajas, Ezeiza, Dorval, Tegel e Fiumicino. As pessoas não sabem do que se trata e você, então, under request, diz a cidade e todos o admiram’.
O seu livro ‘O Boto do Reno- As Histórias de um Repórter de Fórmula 1 pelo Mundo’ (LetraDelta Editora) tem várias dessas, irônicas e ‘autoconscientes’. Flavio Gomes tem um quê de ‘arrogante gente-boa’. ‘Eu adoro o Flavinho’, me disse a Soninha Francine reiteradamente outro dia.
Nas crônicas do ‘Boto’, nós vários e a Soninha temos lido as entrelinhas das viagens e todas aquelas impressões subjetivas. A obra começa com uma transcrição: ‘As pessoas que viajam sozinhas têm um sexto sentido, uma espécie de facilidade ou capacidade de percepção muito superior àquelas que viajam acompanhadas e ficam o tempo todo falando como maritacas e nada percebem’. A assinatura da reflexão é de Enrique Vila-Matas, em seu A Viagem Vertical (Cosac & Naify, 2004).
Dito isso, fica mais fácil classificar o repórter, cá em minha própria viagem, de ‘arrogante gente-boa’. É o que se depreende deste outro trecho sobre a China: ‘No domingo de manhã deu-me claustrofobia. Numa van igual, indo para o autódromo, fiquei com medo de o cara se perder também e irmos parar no Vietnã. Tinha um monte de inglês no carro. Todos hospedados no mesmo hotel, o mais barato que nos arrumaram. Escancarei a janela e meti a cara para fora. Reclamaram do vento, mas eu gosto de vento na cara, eles que se fodam. A cara é minha, vocês que se fodam. Sou muito invocado. Os ingleses me xingaram e ficou por isso mesmo. São meus amigos, afinal, que se fodam.’.
Se você abomina palavrões, fique longe do ‘Boto’. Nesse quesito, Flavio Gomes é um barra-pesada. Mas o que ele faz mesmo é papear, como se estivesse sentado em algum muro dos tempos de adolescente. Vocês (homens, sobretudo) nunca ficaram sentados em algum desses muros da vizinhança, balançando as pernas? Fala-se de tudo. E ‘tudo’ com palavrões garante a ênfase. Quase sempre é melhor do que isso, é um mero acento de informalidade. Como nesta referência: ‘No trem-bala, e deve ser assim em qualquer trem, há mocinhas empurrando carrinhos com comida e bebida. Japonês come em qualquer lugar e de qualquer jeito, sem muita cerimônia. Não arrisco acepipes desconhecidos e vou no pãozinho de fôrma sortido, sanduíche sem erro. Tomo chá gelado sem gosto. Ótimo. Elas, as mocinhas, vão de vagão em vagão, e à abertura da porta automática, mesmo que ninguém esteja olhando para elas, fazem uma mesura e dizem bom-dia a todos. Creio que é bom-dia, pode ser outra coisa, como ‘e aí putada, o que vai ser hoje?’, mas desconfio que é bom-dia. São muito educadas e delicadas; se o vagão estiver vazio elas cumprimentam o vagão’.
Boas histórias, isso há de sobra nesses relatos. Antes que alguém dê por falta: não vou explicar o título do livro. Como disse Moisés, certa tarde modorrenta, ao empunhar o tijolão das leis: ‘Leia-o e tudo se aclarará!’ (reconheço, não está na Bíblia). Aí vai uma passagem de lambuja (este, sim, um termo tão antigo quanto os Evangelhos): ‘Não entendemos nada. O táxi chegou, e o motorista, percebendo nossa cara de espanto, explicou: ‘É o Dia do Alarme’. Treinamento. Na Suíça toda, pontualmente às treze horas e trinta minutos, os alarmes seriam testados. Meia hora depois, de novo. ‘Alarme para quê?’, perguntamos. ‘Sei lá’, disse o motorista. Guerra, furacão, incêndio, desastre nuclear, chegada das Spice Girls, desembarque da Xuxa, tragédias dessa magnitude. País engraçado, a Suíça. Você pede um táxi e a mocinha do hotel diz que ele chega em doze minutos. Nem dez, nem quinze. Doze. E ele chega em doze minutos. E todo ano tem o Dia do Alarme’.’