Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Plínio Bortolotti

‘Na sexta-feira, recebi ligação telefônica de quatro leitores e correspondência via e-mail de outros dois, apontando graves erros na notícia ‘Ministério Público decreta prisão preventiva de juiz’, publicada na edição do mesmo dia, na página 2. A informação refere-se à prisão preventiva do juiz Antônio Leopoldo Teixeira, acusado de ter mandado matar um colega de magistratura, em março de 2003, no Espírito Santo. O erro começa no título, pois o Ministério Público não pode ‘decretar prisão’, mas apenas requerê-la à Justiça. ‘Decretar a prisão é tarefa exclusiva do Judiciário’, afirmaram os leitores, cobertos de razão.

Além disso, no texto, um desembargador é citado como se fosse integrante do Ministério Público, lugar de trabalho de procuradores e promotores. Desembargadores atuam em Tribunais de Justiça. Mais adiante, o desembargador é tratado como ‘juiz’. Ainda que desembargadores sejam juízes, assim como os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), há uma nomenclatura específica para tratá-los, que deve ser respeitada. Generais também são soldados, mas deve-se nomeá-los pela patente.

É comum a conceituação errada de termos jurídicos nas páginas dos jornais. Confunde-se sentença judicial (atribuição de juízes) com parecer (atribuição de juristas e outros profissionais da área jurídica); mandado (ordem) com mandato (delegação); erra-se constantemente o nome dos tribunais superiores, principalmente do STJ, normalmente tratado como ‘Supremo’ Tribunal de Justiça, entre outras extravagâncias. Isso torna as informações imprecisas e de difícil compreensão para os leigos e motivo de irritação ou de troça para os que atuam na área do Direito.

Milagres

Na semana passada, comentando críticas de leitores sobre a cobertura da morte do papa João Paulo II e a assunção de Bento XVI, considerei equilibrado o noticiário do O Povo. Mas, afirmava também na ocasião, estarem certos os leitores preocupados com o assunto, pois o peso da grande maioria católica no Brasil poderia constituir fator de desequilíbrio em favor dessa religião, ou por sobrestimação no noticiário, ou por suas crenças serem consideradas de validade universal.

Pois esse desvio aconteceu na edição de 24/4, mesmo dia em que foi publicada a coluna do ombudsman com as observações acima. Na reportagem ‘Chorozinho: capela dedicada ao Menino Jesus é local de romaria’, publicada na editoria Ceará. Os supostos milagres narrados pelos romeiros e por um padre, são tratados como se fatos fossem. O texto faz os seguintes registros: ‘Muitas graças foram alcançadas (pelos romeiros que visitam o santuário)´; ‘Padre Enemias ouviu então uma voz dizendo que pedisse uma graça ao Menino Jesus de Praga (…) já no terceiro dia, começou a recuperar a fala…´; ‘O povo soube do milagre e passou a freqüentar…´, entre outras expressões equivalentes.

Observei que tais afirmações deveriam ser antecedidas por expressões como ‘o padre diz ter ouvido uma voz’; ‘ele afirma que a sua recuperação foi resultado de um milagre’ e ‘o povo soube do suposto milagre’. Ainda que tenha a obrigação de respeitar todos os credos, o jornal não pode assumir como verdade o que diz respeito à fé individual, ou às crenças e dogmas das religiões. Para o diretor da Redação Carlos Ely, são procedentes as observações do ombudsman. Ele diz que vai orientar repórteres e editores a terem ‘cuidado redobrado’ ao abordar tais questões.

Tragédias

‘Por pouco não termina em tragédia uma manifestação (em que dois trabalhadores da construção civil foram baleados, um no peito e outro na perna)´, assim começa a notícia ‘Grevistas atingidos à bala durante manifestação’ (pág. 4, edição de quinta-feira). ‘A volta para casa quase terminou em tragédia para 24 estudantes (que tiveram pernas fraturadas e cortes na cabeça, quando tombou um ônibus que os transportava)´, informava-se no texto sob o título ‘Acidente em transporte escolar fere 24 estudantes’ (pág. 9, edição de 1º/3). Nas duas ocasiões, perguntei à Redação o que faltava para que tais fatos fossem considerados tragédia. Morrer alguém?

Os dicionários definem ‘tragédia’ como ‘acontecimento triste, funesto, catastrófico’. Em casos assim, acho que o jornalista tem que descrever os fatos de maneira mais clara e detalhada possível, deixando o julgamento sobre o grau de gravidade do caso para os leitores. Um homem baleado no peito pode não ser tragédia para quem não o conhece, mas certamente será para a família dele; o mesmo se dá no caso dos estudantes acidentados. Para muitos, a forma como essas crianças são transportadas já se constitui uma tragédia, pelo descaso com que são tratadas.

Jornalista

Na edição de terça-feira foi publicado um caderno especial em merecida homenagem aos 80 anos de idade do jurista Paulo Bonavides. Também jornalista, ele iniciou essa carreira no O Povo. Na entrevista, ele conta que, aos 13 anos de idade, fez uma ‘prova’ de redação para entrar no jornal, concorrendo com vários universitários. (Na fase de análise os textos eram avaliados sem que o responsável pela correção soubesse o nome do autor.) Bonavides passou em primeiro lugar, e foi admitido, ainda usando calças curtas. No comentário interno que fiz à Redação, anotei o seguinte: ‘Quantos empresários teriam hoje o descortino dos fundadores do O Povo ao acatarem o resultado do concurso por verem mérito em um menino de 13 anos? Quantos meninos, com a educação que temos hoje, teriam condição de passar em um concurso de redação concorrendo com adultos? Quantos universitários, com a educação que se tem atualmente, teriam condições de escrever como o menino Bonavides?´

Balanço

No mês de abril, o ombudsman fez 122 atendimentos, 27 a mais do que no mês passado. Os erros apontados pelos leitores subiram de 21 para 25; as críticas passaram de 15 para 34; os comentários/sugestões de pauta foram de 48 para 51; as queixas sobre assinatura de duas para 6; os elogios caíram de 9 para 3. Foram corrigidos 59 erros; no mês passado, corrigiram-se 69 (essa informação é coligida pelo Banco de Dados). Acresci neste balanço um novo item, sobre o portal No Olhar. Apesar de não acompanhar o portal, verifico e respondo as críticas que me chegam sobre o assunto.’