Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Adriana Chiarini

‘A convergência tecnológica de televisão, telefonia e informática já está ocorrendo e vai se ampliar. Ontem, no Rio, o diretor de tecnologia da Rede Globo, Fernando Bittencourt, previu que imagens de TV serão recebidas também em celulares e palmtops, e com boa qualidade. Só não soube prever quando isso vai ocorrer. Nas residências, a TV será também computador, com conteúdo sob demanda.

Além disso, haverá outras formas de gravação, como o DVD de alta definição, e o cinema deixará de ter cópias em película e passará a ser digital, captado na sala de exibição por parabólica, a partir de um gerador.

De acordo com Bittencourt, o modelo de negócios a partir dessas convergências ainda precisa ser discutido. ‘Com certeza, vai afetar fortemente o negócio das mídias. A convergência é interessante de um lado e desafiadora de outro’, observou.

Nos negócios que surgem da convergência tecnológica, o consumidor terá papel cada vez mais relevante. ‘Tudo vai depender das escolhas do consumidor’, considerou o presidente da Net Serviços e da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), Francisco Valim. ‘O mundo vai se dividir entre produtores e distribuidores de conteúdo’ e esses últimos em duas categorias – com fio e sem fio. ‘O grande desafio é a disputa das horas. A pessoa vai usar aparelhos e conteúdos da forma que lhe for mais conveniente.’

Segundo Valim, a NET tem capacidade para transmitir 700 canais, mas não haveria oferta de conteúdo nem público disposto a tanto. Ele lembrou também que a receita média por operadora está caindo e a diferença para essa receita crescer vai depender da qualidade do serviço, das aplicações, de informação e entretenimento.

Outra questão é o sistema regulatório, avalia o advogado Marcos Bitelli, do Instituto de Estudos da Televisão (IBTV). Ele observa que a Constituição de 1988 trata a Comunicação Social por Telecomunicação quando o suporte é de telefonia e de Radiodifusão quando a transmissão é por ondas de rádio ou TV, não prevendo a convergência tecnológica. Ele lembrou que há uma impossibilidade técnica da legislação brasileira controlar conteúdos internacionais e agora o acesso à informação não depende mais só de grandes transmissores, mas passou a ser bidirecional, dependendo muito de cada usuário.’



Tribuna da Imprensa

‘Convergência tecnológica de mídias cresce no País’, copyright Tribuna da Imprensa, 10/09/04

‘A convergência tecnológica de televisão, telefonia e informática já está ocorrendo e vai se ampliar. Ontem, o diretor de Tecnologia da Rede Globo, Fernando Bittencourt, já deu um panorama do futuro prevendo que a televisão será recebida também em celulares e palmtops com boa qualidade de vídeo.

A televisão fixa nas residências, por sua vez, será um misto de televisão e computador, com conteúdo sob demanda. No Japão e na Coréia, disse, já se faz transmissão de TV por banda larga ‘com altíssima qualidade’. Haverá outras formas de armazenagem, como o DVD de alta definição, e o cinema deverá deixar de ter cópias em película e passar a ser digital, captado na sala de exibição por parabólica a partir de um gerador para todas as salas com aquele filme.

De acordo com ele, o modelo de negócios a partir dessas convergências ainda precisa ser discutido. ‘Com certeza, vai afetar fortemente o negócio das mídias. A convergência é interessante de um lado e desafiadora de outro.’

Nos novos negócios que estão surgindo a partir da convergência tecnológica entre a televisão, o computador e as telecomunicações, o consumidor terá papel cada vez mais relevante. ‘Tudo vai depender das escolhas do consumidor’, considera o presidente da Net Serviços e da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), Francisco Valim.

A partir da convergência, disse, ‘o mundo vai se dividir entre produtores e distribuidores de conteúdo’ e esses últimos em duas categorias – com fio e sem fio. ‘O grande desafio é o desafio da disputa das horas. A pessoa vai usar aparelhos e conteúdos da forma que lhe for mais conveniente’, disse.

Valim disse que a NET tem capacidade para transmitir 700 canais, mas não haveria oferta de conteúdo nem público disposto a tanto. Valim observou também que a receita média por operadora está caindo e disse que a diferença para essa receita crescer vai depender da qualidade do serviço, das aplicações, de informação e entretenimento.

Para Bittencourt, da TV Globo, ‘difícil não é prever o futuro, mas quando’ as mudanças vão ocorrer’. Ele exibiu um anúncio inglês de 1945 em que uma mulher compra flores pela televisão de tela plana por uma videoconferência e comentou que isso é possível hoje, mas, se a empresa anunciante recomendou que as pessoas aguardassem a chegada desse tipo de televisão, errou por 60 anos e deve ter tido prejuízo.

Para ele, o ‘quando’, no Brasil, principalmente, é difícil de prever porque depende da regulação e da economia em geral. Outra questão é o sistema regulatório, avalia o advogado Marcos Bitelli, do Instituto de Estudos da Televisão (IBTV). Ele observa que a Constituição trata a comunicação social por telecomunicação quando o suporte é de telefonia e por radiodifusão quando a transmissão é por ondas de rádio ou TV, não prevendo a convergência tecnológica.

Ele lembrou que é uma impossibilidade técnica a legislação controlar conteúdos internacionais e que agora o acesso à informação não depende mais só de grandes transmissores, mas passou a ser bidirecional, dependendo muito de cada usuário. Para Bateli, o grande desafio está na geração nascida a partir de 1995, já com internet e celulares, que ele considera ‘hiper-informada’. ‘Não adianta fazer lei de que essas crianças nascidas depois de 1995 não podem acessar isso e aquilo porque elas vão acessar’, disse.’



AMAZON.COM NA CHINA
Gilberto Scofield Jr.

‘Amazon.com entra na China’, copyright O Globo, 11/09/04

‘Não adiantou a porta-voz da Amazon.com, Patty Smith, dizer que não comentaria sobre ‘boatos e especulações’. A agência de notícias estatal chinesa Xinhua divulgou com estardalhaço a oferta de compra do Joyo.com, o maior portal de vendas de livros, música, DVDs, brinquedos e fitas de vídeo da China, feita pela Amazon.com por US$ 75 milhões.

O negócio deve ser fechado em apenas três meses, depois que receber o sinal verde das autoridades americanas e chinesas, mas já vem sendo comemorado como uma das grandes tacadas da Amazon.com, que coloca um pé no varejo on-line da China sem pagar uma fortuna e através da aquisição de uma marca já conhecida entre os cerca de 87,5 milhões de internautas chineses (mais da metade da população do Brasil).

Em 2006, 170 milhões de usuários de internet

Mas as estatísticas do China Internet Network Information Center – CNNIC, uma organização de pesquisas e estatísticas sob controle estatal – são ainda mais promissoras. Segundo o CNNIC, mais da metade dos atuais usuários chineses de internet compram pela rede e, em 2006 (ou seja, em apenas dois anos), a quantidade de usuários de internet na China vai pular para 170 milhões de pessoas, um Brasil inteiro. E as vendas on-line crescerão inacreditáveis 190%.

Segundo notas em publicações especializadas no varejo on-line, a Amazon.com já vinha disposta a entrar no mais promissor mercado virtual do mundo há meses. O portal teria feito uma oferta por outro site de vendas on-line chinês, o Dangdang.com, sem sucesso. Agora, com a aquisição do Joyo.com, uma guerra entre os dois portais pela preferência dos internautas deve se acirrar.

A compra do Joyo.com – fundado em 2000 pelo executivo chinês Lei Sun nas Ilhas Virgens Britânicas – põe a Amazon.com no melhor momento para a venda de um produto cujas vendas são estimuladas pelo governo: a dos livros. O governo de Pequim acaba de abrir o setor de distribuição de livros e revistas para o capital estrangeiro.

Liberdade para fazer promoções agressivas

Neste caso, a Amazon.com, que em tese poderia ser obrigada a cancelar suas vendas on-line de publicações por restrições legais, agora está livre não apenas para fazê-lo, mas também para fazer promoções de uma maneira agressiva ainda desconhecida dos chineses.

– Nós estamos muito felizes de entrar no mercado chinês através do Joyo.com – afirmou Jeff Bezos depois que a própria China tratou de divulgar o negócio. – Estamos orgulhosos de fazer parte de um portal que cresceu em pouco tempo e hoje é líder de venda no varejo on-line da China.

Bezos tem mesmo o que comemorar. O mercado editorial chinês ainda é um monopólio estatal quando se fala na publicação de livros, mas o setor é tão lucrativo (com margens que não raro chegam a 20% do valor de venda dos livros) que muitas editoras estatais se lançaram numa sôfrega concorrência pelos melhores autores e pelos melhores livros. A capacidade de negociação da equipe de Bezos com seus fornecedores – e seu talento para usar esta concorrência a seu favor – vai determinar sua fatia da distribuição on-line.

Mas a Amazon.com deve saborear o melhor da fruta justamente na hora em que está sendo colhida do pé. Até então, a rede de livrarias estatal Xinghua, a maior do país, com cerca de 50% do mercado total, ainda possui o quase monopólio da venda dos livros didáticos do ensino básico e intermediário, um filão que representa cerca de 60% das vendas da indústria de livros na China. Mas o governo chinês, abrindo o mercado de distribuição, quer exatamente reduzir esse monopólio diminuindo os preços dos livros para os leitores.

A maior dificuldade para a Amazon.com na China, que seria montar um rede de distribuição para apoiar as vendas on-line, não será necessária porque a Joyo.com já possui uma das maiores estruturas do país. Recente estudo feito pela Feira do Livro de Frankfurt mostra que, em 2000, ler era a quarta atividade de lazer do chinês médio, ultrapassada somente pela televisão, jornais e revistas. Mas avisou que o hábito poderia estar em declínio por conta da competição de outro meio em crescimento no país: a internet. Pelo visto, Jeff Bezos terá ainda muito o que faturar na China.’



BLOGS & EGOCENTRISMO
Arthur Dapieve

‘A primeira pessoa’, copyright O Globo, 10/09/04

‘Nos últimos duzentos anos, aproximadamente, a porção individualista do homem ocidental foi sendo refinada por coisas tão díspares quanto o capitalismo, o Romantismo, a psicanálise, o automóvel, a disseminação do uso da cocaína e o computador pessoal. Todas elas, porém, reforçando uma celebração desmedida do Eu, da primeira pessoa do singular.

No campo da comunicação, essa hipertrofia apresenta uma série de características tão interessantes quanto, em alguns casos, potencialmente preocupantes. São facetas do mesmo fenômeno o Orkut, os blogs, as revistas na linha ‘Caras’, a substantivação do adjetivo famoso, a vigorosa reaparição do sujeito enunciador nos textos jornalísticos.

Orkut e congêneres, conquanto agrupem seus membros em comunidades ligadas por interesses culturais (artísticos, políticos, sexuais), têm como cerne uma espécie de prova dos noves do ego: dize-nos quantos amigos tens e te diremos quem és. Portanto, pessoas com baixa auto-estima devem permanecer fora do clube para evitar dissabores. Pior ainda, trauma severo, é simplesmente não se conseguir um convite de acesso ao Orkut.

Entre os blogs, decerto há endereços com textos de alta qualidade literária, endereços com apurado senso crítico e endereços com o desejo social sincero de trocar figurinhas culturais. Na maior parte dos casos, no entanto, os blogs são apenas versões despudoradas (porque abertas a todos os internautas) do ‘Meu querido diário’: bebi, fiquei, dormi, levantei, tomei café, fiz cocô. Nestes, a escritura nada transcende.

Há quem tenha uma visão mais ácida sobre todo o conjunto de blogs. Num artigo da edição de dezembro 2003/janeiro 2004 da revista ‘Argumento’, a jornalista Lúcia Guimarães, do ‘Manhattan Connection’, descreveu-o num texto hilariante: ‘O blog parece o novo trenzinho elétrico do ego. É um brinquedo elaborado, auto-indulgente e interessa acima de tudo a quem batuca o teclado numa incontinência verbal sem precedente desde que Rui Barbosa passou por Haia. Assim como os couch potatoes obesos que povoam as salas de estar contemporâneas são consumidores vicários do narcisismo alheio pela TV, os blogaditos (dependentes de acessar blogs) contribuem para este novo umbiguismo.’

Este umbiguismo tem nas revistas da linha ‘Caras’ – e nos programas de TV que as emulam – a sua linha de frente. Gilberto Braga acaba de flagrar a situação na telenovela ‘Celebridade’. A sua voracidade, contudo, é tamanha que cria um novo ardil 22: falar mal dela é, ainda assim, falar dela, o que, para efeito de propaganda pessoal, dá quase no mesmo. Favor lembrar da Lei de Mick Jagger: ‘Desde que a minha foto esteja na capa, não ligo a mínima para o que está escrito na página 37 ou na 94.’ Tal declaração precede em muito a sua noitada com Luciana Gimenez, ou seja, é de um tempo em que as pessoas só se contentavam com a capa. Hoje, luta-se pela foto no canto inferior esquerdo da página par.

Tanto nas revistas quanto nos programas de TV, sem falar em algumas alarmantes incursões no jornalismo, busca-se substantivar o adjetivo famoso. A pessoa não é mais uma artista famosa, um médico famoso, um advogado famoso. Ela é famosa. Ponto. Ela se acha. Ponto. Há não muitos anos ainda era necessário fazer alguma coisa para merecer o adjetivo. Carla Perez, por exemplo, e sua exuberância calipígia. Hoje não se precisa nem rebolar.

A predominância da televisão como fonte de informação (inclusive dos profissionais da comunicação em outros meios) tem tido um impacto notável no modo de se escrever para jornalismo. Na TV, a presença física dos repórteres é imanente ao trabalho: ouvimos suas vozes, vemos suas imagens – eles se dirigem a nós, como pessoas. Querendo ou não, eles se confundem com a notícia. Nos jornais e revistas, a coisa não tem de ser assim. Um texto pessoal não passa necessariamente pelo uso da primeira pessoa. Leia-se, por exemplo, os grandes textos de Dorrit Harazim, hoje colaboradora do GLOBO. Ela esteve na Guerra do Vietnã, no golpe de Pinochet no Chile, no Onze de Setembro, em sete Olimpíadas, sem a menor vaidade de usar o Eu para ‘assinar’ suas reportagens.

De maneira geral, o Eu havia sido expurgado de determinado período da história da imprensa em nome da imparcialidade que nunca existiu, a não ser nas segundas intenções dos sectários do Conselho Federal de Jornalismo. Sem o Eu, em tese, a subjetividade estaria banida, permitindo a cobertura objetiva dos fatos. Todavia, sabemos hoje, nenhum jornalista pode se acovardar numa impossível neutralidade, ludibriando o próximo.

Colunistas sempre tiveram a permissão tácita do leitor para opinar e, se necessário, lançar mão da primeira do singular. Para os cronistas, o recurso ao Eu é não só aceitável como quase obrigatório, na medida em que a personalização do discurso trabalha em favor da empatia e da leveza associada a seu trabalho. Entretanto, diante da abundância de Eus na teia da comunicação, talvez seja o caso de, mais que nunca, subentendê-lo.’