Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O peso da “revelação” de Anderson Cooper

O jornalista americano Anderson Cooper, hoje a maior estrela da rede de notícias CNN, anunciou na segunda-feira [2/7] que é gay. Não foi bem um anúncio formal, e não se trata exatamente de uma novidade, mas o âncora nunca havia tocado publicamente no assunto e sempre foi discreto sobre sua vida pessoal. Cooper fez a revelação em um email ao blogueiro – assumidamente gay – Andrew Sullivan, do site Daily Beast. Sullivan, por sua vez, publicou – com autorização do jornalista – a mensagem na íntegra.

Cooper afirmou que temia que seu longo silêncio sobre o assunto pudesse levar as pessoas a acreditar que ele não se sentia confortável ou tinha vergonha de sua sexualidade. Mas disse que, por seu trabalho o colocar em evidência, tentava manter certo nível de privacidade em sua vida. O jornalista contou que optou por manter a discrição, em parte, por motivos profissionais. “Eu sinto que, às vezes, quanto menos um entrevistado sabe sobre mim, mais eu posso fazer efetivamente e de forma segura meu trabalho como jornalista”.

Cooper escreveu, no entanto, que recentemente começou a se perguntar se os efeitos involuntários de seu esforço para manter a privacidade começaram a pesar mais do que a questão em si. “Ficou claro para mim que, ao permanecer em silêncio sobre certos aspectos da minha vida pessoal por tanto tempo, eu dei a alguns a impressão errada de que estou tentando esconder alguma coisa – algo que me deixa desconfortável, com vergonha ou até com medo. E isso é triste porque simplesmente não é verdade”. Continua ele no email a Sullivan: “O fato é que eu sou gay, sempre fui, sempre serei, e não poderia ser mais feliz, confortável comigo mesmo, e orgulhoso”.

Debate do momento

Sullivan, que é amigo de Cooper, havia pedido ao jornalista um comentário sobre uma capa da revista Entertainment Weekly, intitulada “A nova arte de sair do armário”, sobre as maneiras discretas como algumas celebridades têm se identificado como gays. “Eu pedi o feedback dele sobre este assunto por razões que são provavelmente óbvias para muitos”, escreveu o blogueiro.

O tema está em alta. Semanas antes, o New York Times havia publicado matéria descrevendo como o ator Jim Parsons, do seriado The Big Bang Theory, havia casualmente se identificado como gay em uma entrevista – segundo o jornal, “mostrando como, para algumas estrelas gays, existe um novo estado normal que evita o coreografado número de sapateado para sair do armário”. No mês passado, uma matéria de capa do New York Observer listava Cooper entre celebridades que não escondiam ser gays, mas se negavam a discutir publicamente suas vidas pessoais.

O âncora gay

A orientação sexual do âncora sempre foi conhecida por seus colegas e amigos no meio jornalístico. Assessores da CNN por vezes tentavam impor algumas regras quando o jornalista era entrevistado para evitar perguntas sobre o assunto. Elas até surgiam, mas ele não respondia abertamente. “Ele me disse, muitos anos atrás, que não queria ser conhecido como ‘o âncora gay’”, afirma Gail Shister, colunista do TVNewser.com. “Ele não queria que sua sexualidade ficasse ligada a sua profissão”.

Desta forma, Cooper, que ancora o programa Anderson Cooper 360 no horário nobre da CNN e contribui com matérias para o 60 Minutes, da CBS, nunca pensou em anunciar sua sexualidade na TV, de acordo com diversos colegas de trabalho. Ele se importava bastante, no entanto, com notícias de ataques e outras formas de discriminação a gays, temas que sempre cobriu amplamente em seus programas. Por causa de sua posição de destaque no telejornalismo americano, afirmou um ex-produtor, Cooper passou a sentir que podia fazer alguma diferença – ele se torna, com o anúncio, o mais famoso jornalista abertamente gay da TV americana.

TV, política e sociedade

Muitas das reações imediatas ao anúncio nas redes sociais e blogs sobre jornalismo foram do tipo “eu já sabia”, “era óbvio”, etc. Mas houve quem avaliasse que a declaração pública do âncora poderá, mais para frente, impulsionar o processo de aceitação de homossexuais na sociedade americana, tendência que tem ficado evidente em pesquisas ao longo das últimas décadas. Nos últimos 20 anos, a TV nos EUA passou a refletir essa aceitação crescente, e a estimulá-la – muitas vezes em seriados com personagens gays como Ellen e Modern Family.

Há dois meses, o presidente Barack Obama afirmou seu apoio ao casamento gay, elevando os direitos legais entre parceiros do mesmo sexo a um tema a ser debatido na campanha presidencial deste ano. Naquela mesma noite, Cooper começou seu programa na CNN afirmando que a mais recente pesquisa do instituto Gallup dizia que 50% dos americanos concordam que o casamento entre pessoas do mesmo sexo devia ser legal; e 48% dizem que não. “Então metade do país apoia o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e esta noite esta metade inclui o presidente dos EUA”, concluiu.

“A visibilidade dos gays é um dos principais meios para nossa igualdade”, escreveu Sullivan no post que trazia o email de Cooper. O jornalista concorda: ainda que pretenda continuar a preservar sua privacidade, ele diz que “a visibilidade é importante, mais importante do que preservar meu escudo de privacidade de jornalista”. Com informações de Brian Stelter [The New York Times, 2/7/12].