Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Liésio Pereira

‘O novo presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Nelson Sirotsky, tomou posse hoje criticando o projeto do Conselho Federal de Jornalismo. A cerimônia contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dos ministros Luiz Gushiken (Comunicação de Governo e Gestão Estratégica), Aldo Rebelo (Coordenação Política) e Eunício Oliveira (Comunicações).

‘A ANJ será intransigente na defesa do direito conquistado pela sociedade brasileira de receber informação livre, independente e necessária. É por isso que os jornais associados à ANJ, que diariamente constroem a cidadania desse país, são, responsável e democraticamente, contrários à criação do Conselho Federal de Jornalismo’, afirmou Sirotsky em seu discurso de posse.

‘Temos convicção de que o seu governo e o Congresso Nacional não serão protagonistas de qualquer ação que possa representar um retrocesso a essa conquista do povo brasileiro’, acrescentou.

Apesar de criticar o projeto, Sirotsky observou que a participação do presidente Lula na cerimônia demonstrava a posição democrática do Governo. ‘A presença de Vossa Excelência nesse ato, em um momento em que se discutem tantos temas relacionados ao exercício da nossa atividade, é compreendida por nós como uma reafirmação de seus compromissos históricos com a liberdade de expressão e com a democracia’, afirmou, dirigindo-se ao presidente.

Antes, o ex-presidente da ANJ, Júlio Mesquita Neto, também criticou o CFJ em seu discurso. Segundo disse, ‘na visão da ANJ, a liberdade de imprensa constitui direito inalienável e fundamental do ser humano, além de condição essencial para o exercício da cidadania’. Foi com essa determinação, ressaltou, que enfrentou os desafios de seus quatro anos de mandato à frente da Associação. Entre as conquistas, Mesquita Neto destacou ‘a vigilância permanente contra a tentativa de cercear ou bloquear o exercício livre do jornalismo, tanto do ponto de vista editorial quanto empresarial’.

Nélson Sirotsky defendeu a valorização do Código de Ética para aumentar a credibilidade dos jornais, por um processo de auto-regulamentação do setor. ‘Pretendemos estimular, em um processo de auto-regulamentação, a existência de normas e princípios éticos em cada um de nossos veículos e a divulgação dos mesmos para o público de maneira transparente’, disse.

‘Devemos apoiar e participar de todas as iniciativas que possam aperfeiçoar o desempenho de nossa atividade, sempre que isto não represente qualquer violação ao direito conquistado pela sociedade brasileira da liberdade de expressão’, observou.

Segundo Sirotsky, a nova diretoria da ANJ tem como metas aumentar a circulação, penetração e receita publicitária. Ele explicou que o Brasil possui 529 dos 6.649 jornais diários do mundo. ‘Nós, brasileiros, editamos cerca de oito por cento de todos os jornais diários em circulação no mundo e somos o segundo país do planeta em número de jornais diários’, disse. Apesar disso, ressaltou que no país circula cerca de 6,5 milhões de exemplares/dia, pouco se comparado aos 390 milhões consumidos diariamente no mundo.

‘A penetração dos jornais no Brasil, na população adulta, ainda é muito baixa, com 52 exemplares por mil adultos, o que nos coloca na 55ª posição, atrás de países como a Grécia, o Equador, a Bulgária e a Hungria’, observou.’



Gilberto de Mello Kujawski

‘Autoridade e autoritarismo’, copyright O Estado de S. Paulo, 16/09/04

‘Demorou, mas deu para entender. Os chefões do PT devem achar o cúmulo do ridículo as reclamações insistentes sobre a falta de planejamento do governo Lula. ‘Mas que ingenuidade e que impertinência, meus senhores. Que significa um plano de governo por meros quatro anos, se temos um plano de poder para 30 anos? Um plano de governo é pouco para o Brasil. Só um robusto projeto de poder que assegure a permanência do PT no comando por 30 anos, ou mais, irá garantir a reforma radical das leis e das instituições, a ‘mudança das estruturas’ e a refundação em novas bases deste país.’ Assim raciocinam os José Dirceus, Genoinos, Gushikens, sem esquecer os Professores Luizinhos da vida. Lula vai na onda.

Essa primazia do projeto de poder sustentado (continuado) a longo prazo talvez explique a lentidão, a frouxidão, o faz-de-conta, as voltas atrás, as contradições, em suma, a descoordenação do governo Lula, inclusive e principalmente na área social, eleita como prioritária pelo presidente.

Afinal, há tanto tempo pela frente…

O projeto de poder do PT já se esboça o suficiente para mostrar as garras: a máxima centralização, o intervencionismo sufocante na vida econômica e social e a fiscalização estreita das instituições (Judiciário, Ministério Público, funcionalismo, arte e imprensa). Centralização, intervencionismo e fiscalização formam o tripé autoritário do governo petista, ao qual se acrescenta mais um pé, até agora inadvertido: o culto da personalidade, marca inconfundível dos governos autoritários e totalitários. Aquele tão decantado ‘carisma’ de Lula, orquestrado pelos marqueteiros, se transforma, sutilmente, no culto da personalidade do grande condutor dos povos, pairando acima do bem e do mal, a exemplo do que vemos em Fidel Castro e Hugo Chávez, para não lembrar figuras bem mais sinistras. Portanto, um autoritarismo de quatro pés.

A primeira nota a salientar é a seguinte: nenhum partido permanece no poder por longo período, por mais de uma geração, sem se apropriar do Estado como coisa sua. Para evitar essa apropriação do Estado por um partido, um grupo ou um homem é que se inventou a rotatividade ou alternância no poder. Caso contrário, o Estado e as instituições serão sugados pela força centrípeta do grupo dominante, amesquinhados em simples apêndices do partido hegemônico, proclamando: ‘O Estado é meu e não o divido com ninguém.’ Só o que foi dito até aqui bastaria para evidenciar o perfil autoritário do governo petista, negado por má-fé ou ingenuidade. Mas há muito mais.

O experimentado jornalista Marco Antonio Rocha desmascara as juras de amor do PT ao regime das liberdades e dos direitos civis, ao denunciar: ‘O PT nasceu e se formou com o propósito de criação e estruturação de um novo poder, revolucionário (na esteira do fracasso das guerrilhas), para substituir a democracia representativa por uma espécie de democracia direta de massas…’ (A economia fortalece o projetão, 6/9, B2).

Aqui o veterano e perspicaz homem de imprensa pega o pássaro no ar. Pois a proposta da democracia direta de massas constitui o eixo, a coluna vertebral do projeto de poder do PT. Nada de democracia representativa, com tantos partidos, rotatividade no poder, livre iniciativa, liberdade de imprensa, soberania do Judiciário e outras baboseiras de gênese burguesa. O que importa, o mais urgente é o povo no poder, governando o País segundo o modelo do orçamento participativo.

Permitindo-me completar o pensamento de Marco Antonio, acrescento algo que é o mais inquietante: toda democracia direta de massas adota como ferramenta principal a ação direta (no lugar da ação compartilhada com o Congresso, a lei, o Judiciário, etc.). Ora, a ação direta é ‘direta’ porque não conta com mais ninguém, não respeita o adversário nem as normas de convivência legal e social, em suma, a ação direta reveste-se de um autoritarismo que, com freqüência, resvala para a violência.

Distinga-se entre autoridade e autoritarismo. Autoridade é o mando segundo consenso. Nenhum poder se exerce sem autoridade. O autoritarismo é o mando sem base em consenso, o mando unilateral, arbitrário e, talvez, violento. JK tinha autoridade, Jânio e Collor eram personalidades autoritárias. Franklin Roosevelt tinha autoridade, George W. Bush não passa de um autoritário de alta periculosidade. E Lula, o nosso ‘Lulinha paz e amor’, está engrossando a voz, a fala e os modos, transpirando o mandonismo típico do caudilho sul-americano. Consenso é a lei, o Congresso, a Justiça, o respeito aos contratos e ao pacto entre o povo e os governantes nas urnas.

Gaudêncio Torquato, em artigo que mereceria mais atenção, enumera um a um os passos do PT na rota de seu famigerado plano de poder. Primeiro, transformar-se o PT em partido hegemônico. Segundo, ocupar toda a estrutura do Estado. Terceiro, montar dossiês sobre adversários e figuras importantes.

Quarto, ampliar o arco de apoios. Quinto, desenvolver a tática da persuasão social mediante a espetacularização das atitudes. Sexto, monitorar o pensamento social, graças aos códigos de controle, como o Conselho Federal de Jornalismo e a Agência de Cinema e Audiovisual. Sétimo, cimentar a legitimidade social pela via das urnas, ganhando eleições em todos os níveis. Oitavo, consolidar os instrumentos implantados pela reeleição de Lula (Por trás das barricadas, 15/8, A2).

Em suma, o PT sonha ficar 30 anos no poder com o propósito de radicalizar e ampliar a democracia, ignorando que o extremismo democrático degenera no contrário da democracia, constituindo-se na tirania esmagadora da maioria sobre as minorias e a liberdade individual. ‘Summum jus, summa injuria’, o maior direito é a maior injustiça, diziam os juristas latinos. Outro tanto se diga da democracia levada ao extremo e aplicada indiscriminadamente a todas as situações, enforcando a democracia representativa e fulminando o Estado de direito com a crueza e a brutalidade da ação direta, aquela que só visa os resultados, sem considerar os trâmites, as instâncias intermediárias, o direito do outro, o consenso. Gilberto de Mello Kujawski, jornalista e escritor, é autor, entre outros, dos ensaios Idéia do Brasil, a Arquitetura Imperfeita e Império e Terror E-mail: gmkuj@terra.com.br’



James Allen

‘Sarney enterra projeto do conselho de jornalismo’, copyright O Estado de S. Paulo, 18/09/04

‘O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), sepultou politicamente o projeto de lei que institui o Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) ao afirmar ontem que a proposta não tem ‘nenhuma chance de prosperar’.

A declaração foi feita no dia seguinte à promessa do presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), de que não serão aprovados projetos que ameacem a liberdade de expressão. Segundo Sarney, a intenção do governo ‘não foi um momento de felicidade’ e, por ser jornalista, sua atitude tem sido sempre a de defender a imprensa.

O senador falou aos jornalistas logo depois de fazer uma exposição no seminário Parlamento Brasileiro: Passado, Presente e Futuro, do Instituto Interlegis, onde defendeu uma ampla reforma política, com a instituição do voto distrital misto, e uma reforma administrativa. Sarney criticou a iniciativa do Palácio do Planalto de enviar ao Congresso o projeto de criação do conselho de jornalismo que, segundo ele, teria o intuito de tentar controlar a imprensa. ‘É uma tentativa que sempre ocorre ciclicamente de se tentar exercer controles sobre mecanismos da imprensa’, salientou.

João Paulo dissera na quinta-feira passada, a jornalistas iniciantes, que o governo errou ao fazer a proposta sem discuti-la com as lideranças legislativas. Embora admita uma ampla discussão a partir do ano que vem, na Câmara, o deputado garantiu que não terão êxito na Casa projetos que ameacem a liberdade de expressão. ‘Jornalismo só pode ser exercido com total liberdade.’

Anuidades – O projeto chegou à Câmara no dia 2 de agosto e propõe a criação de um conselho federal e de conselhos estaduais, mantidos com anuidades pagas pelos jornalistas.

O conselho federal teria a função de supervisionar a fiscalização do exercício da profissão, fazer o controle disciplinar, podendo até impedir o jornalista de exercer a atividade.’



Leonencio Nossa

‘Gushiken demite jornalista por erro em entrevista de Gil’, copyright O Estado de S. Paulo, 18/09/04

‘A Secretaria de Comunicação do Governo e Gestão Estratégica (Secom) decidiu ‘encerrar’ o episódio da edição deturpada de uma entrevista do ministro da Cultura, Gilberto Gil, publicada no site do órgão no último fim de semana, demitindo a jornalista responsável pelo site. Os demais funcionários envolvidos no boletim eletrônico Em Questão não sofrerão punições. Embora soubesse que até funcionários da Cultura tenham participação mesmo indireta no erro, o ministro da Secom, Luiz Gushiken, avaliou que a editora do site era a responsável mais ‘ativa’ pelo veículo, segundo assessores do governo. Geralmente, as declarações divulgadas pelo boletim são revisadas e avaliadas pelos assessores das autoridades responsáveis. Um funcionário da Secom disse que os assessores de Gil não se preocuparam em avaliar a entrevista.

A assessoria de imprensa do Ministério da Cultura ressaltou que não tinha responsabilidade em avaliar o conteúdo da entrevista, tarefa que caberia exclusivamente à Secom. A pedido do ministro, um assessor especial da pasta fez várias ‘gestões’ para que a jornalista não fosse demitida. Na avaliação de Gil, erros jornalísticos acontecem em todos os veículos. A assessoria de imprensa da Secom informou que Gushiken pediu desculpas aos leitores e a Gil e avaliou que o caso está encerrado.

No fim de semana passado, o Em Questão divulgou um texto em que Gil declara que a criação da Agência Nacional de Cinema e Audiovisual (Ancinav) seria benéfica para a sociedade, pois ‘seus setores estratégicos estarão mais livres do fascismo das grandes corporações’. Essa frase foi retirada de uma palestra proferida por Gil, no dia 10 de agosto, na USP, em que ele comenta atitudes fascistas em diversos setores da sociedade.

Em entrevista ao Estado, a jornalista, que pediu para não ter o nome divulgado, admitiu ter cometido o erro. Ela colocou o cargo à disposição terça-feira. Anteontem, Gushiken pediu a uma chefe da jornalista que a exonerasse, segundo fontes da pasta. A jornalista considerou a decisão ‘pesada’. ‘O ministro da Cultura foi muito correto comigo, não fez nenhuma pressão.’ Ela contou que, no momento do erro, avaliou que o ‘conceito de Gil estava ali (na palestra)’. ‘Tenho 28 anos de jornalismo, o que ocorreu foi uma falta de atenção.’’