A emissora CBS e seu âncora Dan Rather admitiram que os documentos apresentados no programa 60 Minutes – como evidência de que George W. Bush, no começo da década de 1970, recebeu tratamento diferenciado quando serviu na Guarda Nacional – não são de autenticidade comprovável. Eles vinham defendendo que os papéis, supostamente escritos pelo então chefe de Bush, o tenente-coronel Jerry Killian, já morto, eram verdadeiros.
Após entrevistar aquele que entregou os papéis à produção do programa – o tenente-coronel aposentado Bill Burkett –, Rather resolveu vir a público para declarar que não deveria ter feito a matéria (levada ao ar na quarta-feira, 8/9) do modo como foi feita. Burkett admitiu que mentiu ao 60 Minutes sobre a origem do material para proteger sua verdadeira fonte. Ele afirmara que o havia obtido com um colega da Guarda Nacional. Na semana passada, o âncora já havia conversado com a ex-secretária de Killian, Marian Carr Knox, que disse que os memorandos eram falsos, embora refletissem a opinião de seu chefe na época.
Nem Rather nem a CBS, que publicaram comunicados separados na segunda-feira (20/9), afirmam que os documentos não são de fato verdadeiros.
‘A CBS News não pode provar que os documentos são autênticos, o que é o único padrão jornalístico aceitável para justificar seu uso numa reportagem. Não deveríamos tê-los usado. Foi um erro que lamentamos profundamente’, diz a mensagem da rede.
‘Após longas entrevistas adicionais, não tenho mais a confiança nestes documentos que nos permitiriam continuar endossando-os jornalisticamente’, afirma Rather. ‘Cometemos um erro de julgamento e sinto por isto. No entanto, foi um erro cometido de boa-fé e no espírito de tentar manter a tradição de reportagem investigativa, sem medo, nem favoritismo, da CBS News.’
Rather e a CBS vinham sofrendo pressão cada vez maior para revelar onde conseguiram os tais documentos ou, ao menos, para admitir que poderiam ser forjados. Poucas horas após os papéis serem apresentados na TV, blogueiros conservadores questionaram sua autenticidade e grandes veículos, como o Washington Post, acolheram a dúvida, entrevistando especialistas que confirmaram que havia alguns detalhes que causavam estranheza – como um número ordinal com terminação sobrescrita, algo que máquinas de escrever do começo da década de 1970 não poderiam grafar.
Duas experts ouvidas pelo Post [15/9/04] declararam que alertaram a emissora desses problemas antes da exibição da reportagem, mas que foram ignoradas. ‘Se vocês levarem o programa ao ar na quarta-feira, na quinta-feira terão centenas de examinadores de documentos levantando as mesmas questões’, teria avisado uma delas, Emily Will, a um produtor do 60 Minutes.
O jornal conservador The Wall Street Journal [16/9/04] publicou editorial celebrando o episódio como um divisor de águas na imprensa americana e recordando o crescimento da voz conservadora nos meios de comunicação. Segundo o texto, ‘o establishment liberal da mídia deixou de definir a agenda política dos EUA’.
‘Este é potencialmente um grande momento político. Por décadas, as elites da mídia liberal puderam definir os debates correntes jogando todos na mesma direção (…). Durante o último mês, no entanto, aumentaram as rachaduras que têm se desenvolvido há algum tempo neste monopólio de mídia’, prossegue o artigo.
A revista Editor & Publisher [15/9/04] destacou a importância dos blogs políticos no questionamento da autenticidade do material conseguido por Rather. Editores ouvidos pela publicação discordam com relação a qual é o limite de credibilidade que esses sítios ainda poderão alcançar, mas são unânimes em admitir que a grande imprensa não pode mais ignorá-los.