“Onde e quando se fizer uma homenagem a Audálio Dantas, sempre uma voz haverá de dizer em alto e bom som: ele conduziu os jornalistas que estavam de joelhos a caminhar eretos novamente.” (Juca Kfouri, na edição especial do Jornalistas & Companhia, em homenagem aos 80 anos de Audálio Dantas)
Acabaram-se as controvérsias. O jornalista Audálio Ferreira Dantas, bravo e honrado cidadão brasileiro, completou 80 anos, oficialmente, neste domingo, 8 de julho. Na época em que ele nasceu, no município de Tanque D’Arca, interior das Alagoas, levava muito tempo e muitas léguas para o pai fazer o registro e, por isso, como tantos conterrâneos, Audálio tinha duas datas de nascimento – uma confusão danada que já foi tema deste Balaio e causou muita polêmica entre os amigos.
Em qualquer profissão, é muito raro alguém chegar aos 80 anos em plena atividade profissional, pleno de saúde, admirado e respeitado pelos colegas, sempre na batalha pelas boas causas. No jornalismo, é mais difícil ainda.
No caso de Audálio, o que menos importa é a idade, até porque, sempre disposto a enfrentar novos desafios, ele não a aparenta. Tem alma de menino. Com mais de seis décadas de serviço no lombo, continua trabalhando por gosto e por precisão. Neste tempo todo, só conseguiu juntar de bens materiais o apartamento onde mora, nas Perdizes, um velho Corsa e um terreno em Vinhedo, no interior paulista. Em compensação, pode se orgulhar de tudo o que fez para o jornalismo e pela democracia nos muitos papéis que exerceu na vida.
Uma coluna
Agora mesmo, está para lançar dois novos livros (um de reportagem e outro sobre Vladimir Herzog), tem uma agenda cheia de palestras e outros compromissos, entre eles o de dirigir a redação da revista Negócios da Comunicação.
Por isso mesmo, e com justa razão, o amigo está recebendo uma série de homenagens, como a edição especial do Jornalistas & Cia., do Eduardo Ribeiro, que conta a sua vida em prosa e verso, de trás para frente e de frente para trás, trazendo os depoimentos de muita gente famosa no ofício e fora dele.
Dele já se falou de tudo, menos de um detalhe com o qual não me conformo: desde os anos 1970, Audálio Dantas está fora do mainstream da grande imprensa e nunca mais publicou as grandes reportagens que o tornaram um dos ícones da profissão.
Por um período, Audálio ficou fora das redações, primeiro ao liderar o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo na denúncia do assassinato do nosso colega Vladimir Herzog e, em seguida, ao ser eleito deputado federal. Em 1982, 30 anos atrás, portanto, quando terminou seu mandato parlamentar e ele não se reelegeu, o velho mestre poderia estar de volta ao mercado, como se costuma dizer.
Suas célebres reportagens nas revistas O Cruzeiro e Realidade, no entanto, algumas delas reunidas no livro que vai lançar no próximo dia 17, no restaurante Jacaré, em São Paulo, não animaram nenhum editor a convidá-lo para voltar às redações. Por esse motivo, talvez, tenha ocupado cargos no serviço público e em conselhos de instituições, fazendo de tudo um pouco para pagar suas contas e sustentar a numerosa família, sem nunca abandonar as lutas coletivas.
Eleito presidente da Federação Nacional dos Jornalistas e vice-presidente da Associação Brasileira de Imprensa, Audálio só voltaria a escrever na grande imprensa entre 1997 e 2001, quando lhe ofereceram uma coluna no jornal Diário Popular, onde também colaborei, na época de Josemar Gimenez na chefia de redação.
Com a palavra
Mesmo não sendo enviado especial de nenhum jornal ou revista, Audálio nunca deixou de viajar pelas terras da sua grande paixão: o Brasil. Em alguns destes destinos, eu o encontrei participando de debates sindicais, feiras de livro e eventos vários na longa jornada pela redemocratização do país. Quase sempre, estava acompanhado de sua valente Vanira e, às vezes, das filhas mais novas, Juliana, também jornalista, que trabalha na redação da Record News, e Mariana.
Uma única vez nos encontramos a passeio: foi no Carnaval de Salvador, alguns anos atrás, junto com os inacreditáveis irmãos Alves Pinto (Ziraldo, Zélio e Ziralzi), todos numa farra de adolescentes viajando sem os pais, pulando dia e noite. Além de tudo, Audálio é um grande amigo, um cara leal e animado, que nunca se deixa abater com as dificuldades e está sempre pronto para encarar uma festa.
Só de uma coisa eu sei e gostaria de dizer antes de concluir esta singela homenagem: o jornalismo brasileiro não pode se dar ao luxo de ficar sem as reportagens e o conhecimento de um sujeito chamado Audálio Dantas.
Com a palavra, os excelentíssimos senhores editores da nossa grande imprensa, que ficaria maior ainda.
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[Ricardo Kotscho é jornalista]