Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Alberto Dines

‘O governador Geraldo Alckmin denuncia uma crise institucional, o presidente
Lula jura que não venderá a alma ao Diabo por causa da reeleição, mas não foi
ouvido pelos aliados empenhados em impedir a instalação da CPI dos Correios.


Enquanto o colunista Clovis Rossi (‘Folha’) investe contra a incompetência do
governo federal, Merval Pereira (‘O Globo’) identifica o descontrole, Teresa
Cruvinel (idem) registra o fim do veranico de Maio sem arrefecimento da
temperatura política e Dora Kramer (‘Estadão’) alerta para os perigos de se
fazer política com o fígado.


O Partido Verde rompe com o governo mas o ministro-menestrel Gilberto Gil
mantém-se em Cannes para garantir uma base aliada internacional. Severino, o
falastrão, andou calado (sinal de que empregou mais meia-dúzia de afilhados) e
para melhorar a imagem escreveu uma diatribe contra o sistema partidário: na
Câmara, em três anos 157 colegas seus trocaram 257 vezes de partido.
Infatigável, o casal Garotinho aposta numa nova terapia contra a obesidade –
engolir desaforos.


O papa Bento XVI aponta o relativismo moral como o grande pecado
contemporâneo, mas uma emérita lingüista da USP acha que o problema brasileiro
começa com a palavra. Está certa, no princípio é o verbo. Ou o advérbio, dá no
mesmo.


Com um vocabulário político tão restrito e um elenco de políticos incapaz de
manejá-lo com propriedade, as palavras são abusadas, truncadas, estupradas.
Desgastam-se, perdem valor, significado deixam de funcionar como sistema de
trocas. O gigante brasileiro, um dos G-4, G-17 e G-49,5 está enredado nas
palavras. As ditas, malditas e as sufocadas.


Se a culpa é das palavras, imperioso colocá-las no banco dos réus e em
seguida despachá-las para o xilindró. Com este ideal na cabeça e uma tesoura nas
mãos um dos utopistas federais resolveu purificar o idioma para saneá-lo das
perversidades. Criou um dicionário às avessas – aquele que não pode ser
usado.


Na mesma linha, uma juíza de Salvador, há dias, condenou a três meses de
prisão um radialista (o ex-prefeito Mário Kertesz) porque referiu-se a um amigo
do senador ACM como ‘gordinho’ e usou a expressão ‘se segura, malandro’.


A coisa está ficando feia. Feia é uma palavra que, dentro em breve, pode dar
cadeia. Exatamente por isso o Ubaldo está ficando furioso. E quando gente como o
Ubaldo começa a enfurecer-se, não há base de apoio que resista, tremem os
seguranças dos palácios e os corruptos até sorriem para as mini-câmeras que
gravam suas patifarias.


Os poderosos não conhecem o Ubaldo, não avaliam o seu poder, sua capacidade,
sua capacidade de multiplicação, a força do seu humor combinado ao mau-humor.
Ocupados com as suas mumunhas, enrolados pelas próprias declarações para a
posteridade, os políticos não percebem o alcance deste levante.


João Ubaldo Ribeiro, o celebrado autor de ‘Viva o Povo Brasileiro’, foi o
primeiro a esbravejar contra o glossário politicamente correto engendrado nos
laboratórios lingüísticos do governo. Não escreveu um artigo, apenas mandou um
gozadissimo e-mail para o seu círculo de amigos. Teve efeito parecido com a
manchete de Emile Zola, ‘J’Accuse’ ou um tsunami no Planalto Central.


O governo deveria preocupar-se com o Ubaldo. Com o Ubaldo e os seus e-mails.
Com o Ubaldo e os outros Ubaldos. Esta indignação digital, surda, contagiosa e
incontrolável não leva o povo às ruas, não produz passeatas, nem marchas sobre
Brasília. As gargalhadas provocadas pelos pasquins parisienses não derrubaram a
Bastilha, tão somente desmoralizaram o poder.


Esta revolta do Ubaldo, aparentemente quieta e até hilariante, pode parecer
inofensiva. Não se iludam: é arrasadora. Não chama a atenção do mago do
marketing, o conterrâneo Duda Mendonça, não acionou a luz amarela na ABIN, não
foi cogitada na última reunião do COPOM, não está na pauta do Conselho de
Desenvolvimento Social, não afeta o risco-país, não foi incluída na pauta da
Cúpula árabe-América do Sul nem consta da agenda das conversas de Lula com o
premiê Koizumi.


Mas, atenção quando um sujeito pacato e sensível como o Ubaldo põe para fora
a sua indignação, quando homens de espírito deixam de dizer coisas espirituosas
para desnudar as farsas, a coisa pode ficar preta. Ou vermelha. Ou
amarela.’



GOVERNO ALCKMIN
Rogério Gentile


‘A vitrine bagunçada de Geraldo Alckmin’, copyright Folha de S. Paulo,
22/05/2005


‘O governador paulista, Geraldo Alckmin, é um político discreto e
arrumadinho. Desses que acordam cedo, dormem tarde e anotam tudo o que parece
importante num cadernão universitário. Sempre fala baixo, evita as bobagens e os
improvisos e tem um monte de números na cabeça.


Seu sonho? Tornar-se em 2006 uma alternativa, digamos, menos emocional ao
Luiz Inácio falastrão e deslumbrado que governa o país como se estivesse ouvindo
um bolero.


O problema é que o tucano tem demonstrado, especialmente na Febem, uma
capacidade gerencial e administrativa que não difere muito da de Lula. Na
esteira de Mário Covas, Alckmin tenta há anos resolver o imbróglio da fundação,
mas, dia sim, dia não, toma um baile dos internos.


Somente neste ano já houve 28 rebeliões e mais de mil jovens conseguiram
escapar da instituição, alguns saindo de Kombi pelo portão, outros, a nado pelo
Tietê. Edifícios foram destruídos, monitoras, vítimas de violência sexual, e até
um revólver parou na mão de infrator. Sem contar os celulares, largamente usados
pelos internos.


O que mais constrange, no entanto, é a série de trapalhadas administrativas
do governo tucano, para usarmos termos delicados. Alguns casos:


1- Após demitir 1.751 monitores com o propósito de acabar com a chamada banda
podre, a Febem recontratou dezenas de funcionários investigados por suspeita de
agressão a internos. Alegou que, em razão da urgência, não teve tempo para
analisar a ficha dos readmitidos. Uma piada.


2- Internos com bom comportamento, atletas de um time de futebol da
instituição que disputavam um campeonato, foram transferidos indiscriminadamente
para uma penitenciária, atrapalhando o projeto educativo. Alguns estavam sendo
observados por empresários do esporte.


3- Para acompanhar jovens infratores em visitas aos pais, em atendimento
médico e em atividades educativas, o governo escalou policiais civis
especializados em seqüestros, retirando-os de suas investigações. Afinal, esse é
um crime que não assusta ninguém mesmo em São Paulo.


Obviamente, o problema da Febem não é novo, e Alckmin não é o único
responsável. Mas, no mínimo, a propalada descentralização da entidade, medida
que o tucano qualifica como o caminho certo e que realmente assim parece ser,
podia estar mais adiantada.


De 2001 a 2004, o governador reduziu em 10,5% o gasto per capita na fundação,
embora Mário Covas tenha dito em 1999 que arrumaria os recursos para a Febem
mesmo que tivesse ‘de tirar de trás da orelha’.


De tal modo foi a redução que Alckmin conseguiu em 2004 entregar apenas uma
unidade. Agora ele promete construir 41.


Em tempo, o outro presidenciável tucano na ativa em São Paulo também já dá
munição aos adversários. José Serra ainda nem conseguiu montar direito sua
equipe na prefeitura. Desde a posse, quatro secretários já caíram. De concreto
mesmo, aumento na tarifa de ônibus, corte nas despesas e queda na
popularidade.


Para quem pretende fazer da eficiência um motivo de campanha contra a bagunça
petista, São Paulo -Estado e capital- não é uma boa vitrine.’



GAROTINHOS INELEGÍVEIS
Renato Lessa


‘Democracia pela bagatela de 1 real. Quer comprar?’, copyright O Estado de
S. Paulo
, 22/05/2005


‘A corajosa sentença da juíza eleitoral Denise Appolinária determinou o
afastamento da vida pública, por três anos, de Garotinho e Rosinha, o casal
governante do Rio de Janeiro. A ser confirmada pelo Tribunal Regional Eleitoral,
desfazem-se os projetos políticos imediatos dos Garotinhos e desenha-se o
término de uma singular forma de governo que se abateu sobre o Rio: a duarquia
familiar. A sentença, ao que tudo indica, é exemplar na tipificação dos delitos
e na apresentação de evidências, em uma combinação na qual as conseqüências
penais possuem o sabor de um corolário.


Para além das implicações jurídicas e políticas da sentença, importa
considerá-la como uma peça de cognição, por ser admiravelmente esclarecedora.
Mas o mais notável é que tal esclarecimento venha de uma representante do Poder
Judiciário, e não dos politólogos, freqüentemente aprisionados pela observação
dos jogos estritamente institucionais.


De que esclarecimento se trata? Ou, para incluir o problema inverso e
complementar, de que insensibilidade analítica se trata? Vamos por partes.


A sentença, além do casal governante, atingiu os atuais prefeito e
vice-prefeito da cidade de Campos, adversários políticos do casal governante. O
candidato derrotado a vice-prefeito, do partido da família Garotinho, atende
pelo nome de Claudecir das Ambulâncias, que por si só vale como completo
esclarecimento a respeito do tipo de relação entre público e privado, entre
eleitores e representantes, que compõe parte significativa dos fundamentos da
chamada democracia representativa entre nós.


Pois bem, o que a sentença revela são os modos de conexão entre o mundo das
instituições – o governo e seus programas de ação – e o mundo exterior,
percebido pelos operadores do primeiro como lugar no qual se estabelece a
‘conexão eleitoral’, para usarmos a expressão do politólogo norte-americano
David Mayhew. Lugar da ‘captação de sufrágios’, tal como definida pela Lei
Eleitoral vigente. Mais do que indicar o caráter ilícito dessa captação, importa
considerar seus significados políticos e culturais.


No Estado do Rio de Janeiro implantou-se nos últimos anos a crença de que
problemas e carências sociais podem ser tratados por programas que vendem
benefícios pelo preço de 1 real. Um dos programas – designado como Morar Feliz
por R$ 1 – realizou, de acordo com a sentença, 3.389 cadastros entre os dias 18
e 21 de outubro de 2004, a poucos dias do segundo turno na cidade de Campos.
Outros programas, tais como Cheque Cidadão e Jovens pela Paz, foram fortemente
ativados em função do calendário eleitoral. O primeiro deles não realizou
nenhuma nova inscrição entre junho e setembro de 2004, apresentando ‘notável
acréscimo de cadastrados’ no mês eleitoral de outubro. A mais interessante das
ações governamentais foi a distribuição de cerca de 43 mil ‘kits escolares’, na
mesma cidade, a dois meses do encerramento do ano letivo.


Para além dos efeitos eleitorais imediatos pretendidos, a sentença revela um
modo peculiar de praticar a democracia representativa, por meio da ‘captação de
sufrágio’. Nesse sentido, ela nos obriga a associar a avaliação do que se passa
na chamada ‘arena legislativa’ e no desempenho dos poderes Executivos a uma
funda atenção nos modos de captura de eleitores.


Nesse sentido, a sentença vale como boa peça de sociologia política, com
tinturas de descrição etnográfica. Se não abandonarmos de todo a idéia de que a
inteligibilidade da política depende de seu vínculo com a vida social, e não de
suas relações autárquicas e internas, a sentença é peça incontornável para uma
avaliação da prática do regime representativo no País. Imagino que a leitura de
outras sentenças, de zonas e tribunais eleitorais por todo o país – ocultas nos
arquivos judiciários – seria proveitosa.


Mais do que a sentença, algumas reações dos atingidos também possuem efeitos
de esclarecimento. O ex-governador Anthony Matheus declarou ao vivo em
entrevista televisionada sua tranqüilidade e sua certeza de que o Tribunal
Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, ‘por unanimidade’, anularia a sentença de
primeira instância. Se optarmos por uma forma não ingênua de observação da fala
dos humanos, devemos considerar que nossos juízos – emitidos por atos de fala –
são portadores de teorias, ou ao menos presunções, a respeito do funcionamento
do mundo. Temo que o ex-governador seja adepto de uma teoria, digamos, pouco
republicana e indeclinável a respeito das suas relações políticas e pessoais com
o Poder Judiciário em geral, e com o Tribunal Eleitoral em particular. O que
posso dizer, para o momento, é que a decisão do TRE ao recurso, qualquer que ela
seja, terá impacto sobre a imagem que fazemos da nossa capacidade de
autocorreção institucional.


Ao dizer que a sentença produz efeitos de esclarecimento, referi-me ao fato
de que ela introduz um novo e qualificado observador da vida política no País.
Um observador que desloca nossos regimes de evidência acadêmicos. A ênfase
institucionalista da análise política brasileira, associada a um jornalismo
político colado aos movimentos e jogos da elite política, tem descurado de uma
questão crucial, a saber: quais os vínculos e nexos entre nosso sistema político
e a vida social ou, em outros termos, em que medida a prática do regime
representativo tem significado a ‘captação do sufrágio’ a qualquer preço.


O artigo 41-A da Lei Eleitoral, no qual teriam incorrido os acusados, tem
como foco exatamente o que designa como ‘captação de sufrágio’, uma forma de
captura eleitoral que faz do eleitor um cliente e alguém que opera na
perspectiva da obtenção de vantagens. Uma das dificuldades da análise política
voltada para as instituições é que ela diz professar uma ‘teoria da democracia’
fundada precisamente na competição pela captura de sufrágios.


Nesse cenário, eleitores são como consumidores no mercado que elegem seus
produtos com base em preferências individuais racionais. Os políticos são
empresários que oferecem tais produtos e, para isso, desenvolvem estratégias de
captação de consumidores. A idéia de democracia que disso resulta é a de um jogo
competitivo no qual o que se requer é a presença de um número expressivo de
produtos em disputa, para que os cidadãos/consumidores estabeleçam suas escolhas
livres e racionais. Nada de errado, pois, com a ‘captação do sufrágio’.


Alguns a isso chamam de ‘teoria descritiva da democracia’, expressão bizarra,
pois não percebo o que significa a idéia mais geral de uma ‘teoria descritiva’.
Teorias não são feitas para descrever, mas para interpretar e imaginar.


Temo que uma orientação teórica dessa natureza, assim como a crença de que o
âmbito da política é definido pelo que se passa na arena institucional, nos
conduza à incapacidade de discriminar o que é aceitável e o que não o é no
exercício da competição eleitoral, já que o que interessa é a eficiência da
conexão, e não seus efeitos políticos e culturais.


A sentença de Denise Appolinária vem, neste sentido, em boa hora. Senão pelos
seus efeitos legais e punitivos, ao menos pelo convite a alargar nossos hábitos
mentais e nosso campo de observação. (Renato Lessa é cientista é cientista
político e professor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro
(Iuperj))’



ISTOÉ vs. IURD
Último Segundo


‘Crivella nega corrupção e critica matéria da IstoÉ’, copyright Último
Segundo (www.ultimosegundo.com.br)
, 21/05/2005


‘O senador Marcelo Crivella (PL-RJ), bispo da Igreja Universal, criticou em
entrevista à rádio CBN a matéria publicada na edição desta semana da revista
IstoÉ, que o acusa de ser responsável por empresas que lavam dinheiro em
paraísos fiscais. Crivella afirmou que os documentos apresentados pela revista
são falsos, e disse que não foi procurado pelo jornalista, que teria feito a
reportagem apenas para destruir sua imagem.


‘Não sou acionista da empresa, nem nunca tive conta bancária no exterior. Só
tive uma conta-salário quando fui missionário da Universal na África do Sul’,
afirma Marcelo Crivella.


De acordo com a IstoÉ, que chegou hoje às bancas, mas já havia publicado a
reportagem ontem o portal Terra, o bispo estaria por trás das empresas
Cableinvest e Investholding, que enviaram dinheiro por meio de operações
irregulares para a conta bancária de membros da Universal.


As empresas, com sede no paraíso fiscal das Ilhas Cayman, no Caribe, teriam
depositado cerca de US$ 18 milhões para operações da Universal no País, segundo
documentos da Receita Federal. Há indícios de que o esquema foi utilizado para a
compra da TV Record do Rio, em 1992, e de outras emissoras.


‘Essa reportagem (da IstoÉ) foi feita com base em denúncia anônima, e com
documentos em folha de papel sem timbre, e que nem ao menos contavam com minha
assinatura’, acusa Crivella. ‘É indício leviano, estou sendo vítima de uma
campanha de difamação, assim como já havia acontecido na eleição para a
prefeitura do Rio, em 1992’, diz.


Crivella diz que não teve a chance de se defender com o jornalista, que não o
teria procurado durante a reportagem. ‘Se eu tivesse tido acesso a estes
documentos, teria provado que são falsos. Em nenhum ponto o repórter deixa claro
que tentou me entrevistar. Isso é prática de reportagem vendida, fraudulenta’,
aponta o bispo.’