‘A diferença entre os votos apurados nas eleições no município de São Paulo e a pesquisa de boca de urna realizada pelo Ibope foi de 8%, duas vezes superior a possibilidade de erro na metodologia do levantamento estatístico. O Ibope falhou ou houve fraude no processo eleitoral eletrônico utilizado? Nunca saberemos. O sistema informatizado adotado pelo TSE é uma caixa preta tecnológica que não permite a confirmação posterior da apuração. Não há contraprova para tanto, embora isso fosse possível de se providenciar. Mas assim não se quis e assim se procedeu. Só não acho estranho que a grande imprensa brasileira tenha baixado a cabeça e aceitado passivamente esse estado de coisas. Levando em considerando o histórico manipulador de informações e o envolvimento conspiratório das grandes corporações de mídia nacionais com grupos políticos organizados para a conquista e manutenção do poder, isto até era de se esperar.
Se em 1996, quando surgiram as primeiras urnas eletrônicas, além do registro magnético, havia a impressão em papel, isso foi abolido em 1998. Simplesmente se impediu o eleitor de conferir o próprio voto e também tornou impossível qualquer fiscalização independente ao TSE. Embora, nos meios técnicos científicos isso seja inquestionável, a grande imprensa sistematicamente ignorou as denúncias dos especialistas em informática e endossou esse estado de coisas. Agora, com certeza, manipularão informações para jogar toda a responsabilidade no Ibope sobre o que ocorreu em São Paulo, desviando a opinião pública de qualquer possibilidade de fraude.
Como, simplesmente, não dá para auditar as urnas eletrônicas, já que elas não emitem documentos para tanto, será mais fácil questionar a validade da pesquisa de boca de urna, usando, para tanto, divergências de resultados de eleições anteriores. Como desde 1998 tem sido inconteste a confiança no placar eletrônico, a falha, mais uma vez, será creditada ao instituto de pesquisa. Nunca saberemos quem errou realmente.
Os ‘testes’ a que as urnas são submetidas pouco antes da eleição, na frente dos fiscais dos partidos, são pura ilusão de ótica, porque o programa de ‘teste’ não é o mesmo que será usado na eleição. Como a urna identifica o eleitor no mesmo ambiente magnético em que o eleitor deposita o seu voto Como também não passível de auditoria externa ao TSE, não há a maior segurança no resultado. O fato de aparecer na tela da máquina o nome, o número e a foto de determinado candidato na hora confirmar o voto do eleitor, não significa que ao teclar essa intenção será traduzida fielmente pela máquina. Um software fraudado pode remeter o voto para outro candidato e, ao mesmo tempo, mostrar na tela o político que o eleitor escolheu. Não há limite para o que possa ser feito no campo da fraude eletrônica.
Apontei o problema aqui no Comunique-se no ‘Eu Grito I’, artigo publicado no ‘Em Pauta’ antes de aprovada a lei da urna eletrônica pelo Congresso Nacional, em 2003. Voltei com o ‘Eu Grito II’ depois que o legislativo, numa manobra considerada recordista para todos os padrões de comportamento dos parlamentares, fez o processo transitar por todas as comissões e o aprovou numa única sessão de votação. Na semana passada, coloquei aqui o artigo ‘Domingo teremos a vitória da fraude’. Não estou, portanto, nem um pouco surpreendido com a alarmante divergência entre o resultado das ‘urnas’ eletrônicas, que de urna não tem nada (urna é o local onde se deposita algo), e a pesquisa de boca de urna.
O próprio especialista que desenvolveu o software das urnas eletrônicas fabricadas pela IBM, Márcio Teixeira, admite a falta de segurança das mesmas. Ele aponta três possibilidades de interferência no resultado. A primeira seria através de fraude interna, causada deliberadamente por alguém envolvido no processo, para prejudicar a instituição. Em segundo, aponta.a quebra externa de segurança promovida por alguém ou algum grupo não ligado ao TSE que altere o funcionamento ou o resultado de determinada urna eletrônica. Em terceiro lugar, ele considera, inclusive, a possibilidade de ocorrerem erros de programação não intencionais, mas com condição de alterar os resultados. Sem contraprova, nada disso poderá jamais ser comprovado.
Como cada urna só dispõe do espelho do que foi gravado no disquete da totalização, mais nada, não há como apurar, agora, a enorme divergência apontada pela pesquisa de boca de urna. O próprio disquete pode conter um programa oculto de troca de votos. A posteriori, depois da totalização, uma auditoria no programa da urna, com certeza, não leva a nada, até porque a interferência fraudadora pode ser auto-destrutível. Simplesmente desaparecer do programa após executar determinada operação. Acontece que ninguém sabe o que pode estar nos chips usados pela urna, informação que só as pessoas que a criaram e fabricaram detém.
A máquina administrativa reconhecidamente corrupta desse país, aliada a estelionatários da iniciativa privada que se locupletam com recursos públicos, umas poucas famílias que concentram a renda e o poder político no Brasil, poderá perpetuar-se no poder através da fraude sem que nada possa ser provado. Como essa estrutura poderosa controla a maioria do cargos de assessoria de imprensa do governo e estatais, para os quais jamais serão realizados concursos públicos, embora a Constituição o exija, nenhum jornalista ousará indispor-se contra a orientação patronal para ‘esquecer’ o assunto. Absurda teoria conspiratória? Leiam ‘1964 – A Conquista do Poder’, do Dreyfus, e se deliciem com os detalhes da integração das forças golpistas com a imprensa brasileira, sejam patrões ou meros jornalistas. O silencio em torno da possibilidade de fraude nas urnas eletrônicas só confirma que certas alianças ainda funcionam. Alguém tem dúvidas? (*) Jornalista’
Rafael Cariello
‘Serra deixa festa da MTV após cantor apoiar Marta’, copyright Folha de S. Paulo, 6/10/04
‘Diante de uma platéia de músicos e artistas, sentados, e de uma molecada em pé, o cantor pernambucano Otto sobe no palco e grita: ‘A periferia está certa. O centro não’.
No primeiro intervalo após a intervenção política na festa da MTV de premiação da música brasileira, o candidato à Prefeitura de São Paulo José Serra (PSDB) se levantou e foi embora.
A prefeita e adversária Marta Suplicy (PT) também estava lá. Numa eleição que polarizou a cidade em regiões de classes sociais, ela levou a periferia pobre, e Serra, o centro rico e de classe média.
Otto se explicou à reportagem da Folha: ‘Como eleitor e cidadão brasileiro, eu acredito no governo Marta, no governo Lula’.
Ele disse, no entanto, que achava a presença dos dois candidatos no evento um fato ‘democraticamente lindo’. ‘Eles querem escutar posições. A minha é essa.’
Ao lado de seu filho Supla, a prefeita comentou a manifestação de Otto: ‘Meu coração bate na cidade toda, e mais na periferia’.
Enquanto Marta respondia, Supla pediu licença ao repórter para apresentar amigos à mãe. ‘Posso, meu?’, perguntou. Quando quis voltar ao assunto, a reportagem da Folha ouviu o seguinte da prefeita: ‘Chega, vai. Me poupa’.
Do lado de fora do teatro, o deputado estadual Turco Loco (PSDB), que acompanhava Serra desde o início da noite, disse que o ex-ministro da Saúde tinha saído para fazer umas ligações e não sabia se voltaria ou não.
Ele afirmou concordar com Otto. ‘Também acho que é isso. A periferia está certa. E o Serra também acha’, disse o deputado.
‘A periferia fala: ‘Quem é feliz em ver seu filho nascer da barriga da miséria?’. O governo do Estado faz muito pela periferia. E ela não é só da Marta. Ela vota dividida.’
O senhor vai continuar aí? ‘Vou esperar por ele aqui’, disse.
Cinco minutos depois, o deputado volta sozinho para a sala do evento. Serra foi embora? ‘Foi.’
Disse por que? ‘Não. Só disse que precisava ir embora.’
Na entrada
Marta chegou ao VMB (Vídeo Music Brasil) pela entrada dos fundos, com Supla, às 21h15. Foi apresentada pelo filho à banda gaúcha Cachorro Grande. Ao saber que a banda havia se mudado para São Paulo, deu as boas-vindas. Sobre se foi ao VMB como prefeita ou candidata, disse: ‘Eu sempre vim como prefeita. Sempre considerei importante participar do VMB e já vim várias vezes, afinal, sou mãe de roqueiro’.
Serra chegou pela porta da frente às 20h50. Disse que foi à festa como candidato e amante da música. ‘Acho fantástico esse tipo de premiação, e ela é importante porque atinge parte do eleitorado’. Ainda na entrada, o grupo ‘Pânico’ ofereceu ao tucano o troféu ‘Careca do Ano’. Colaborou THIAGO NEY, da Redação’
Clóvis Rossi
‘Falta do que fazer/dizer’, copyright Folha de S. Paulo, 8/10/04
‘O governo Lula deve estar tendo um desempenho excepcional se tudo o que a oposição tem a criticar nele é o uso político do Palácio do Planalto por meio da reunião com os prefeitos já eleitos pelo PT.
Ou então é pura falta do que fazer. Desde que se inventaram palácios, os seus ocupantes os utilizam para fazer política, sejam de direita, de esquerda, de centro, do Brasil ou de qualquer país, de hoje, de ontem ou de anteontem.
Fazer política, de resto, é parte inerente à atividade do governante. Só quem considera a política uma atividade suja é capaz de torcer o nariz quando um presidente pratica cenas explícitas de política no palácio em que despacha.
É bom lembrar que a política se torna de fato suja em reuniões de que ninguém toma conhecimento a não ser os trambiqueiros diretamente envolvidos e, às vezes, meses ou anos mais tarde, algum investigador do Ministério Público ou do Congresso ou dos meios de comunicação.
Não há, portanto, nada de mais em o presidente reunir-se com gente de seu partido e oferecer sugestões sobre como conquistar votos para que seu partido ganhe a eleição em São Paulo ou em qualquer outro lugar.
O eleitor está suficientemente informado para decidir se quer ou não votar nos correligionários do presidente. O de São Paulo (capital), por exemplo, não deu a menor bola para a atividade político-eleitoral do presidente no primeiro turno, tanto que votou majoritariamente por outros candidatos.
Já o presidente se especializa em falta do que dizer. Anteontem, produziu a seguinte pérola sobre as perspectivas de o Brasil deixar de ser um país em desenvolvimento:
‘É preciso apenas consertar o que falta ser consertado para que as coisas entrem no eixo’.
Madame Natasha, aquela amiga do Elio Gaspari que se esforça para entender o português enrolado (ou oco, como no caso), acha que o presidente quis dizer que, se o Brasil tivesse resolvido seus problemas, o Brasil não teria problemas.’