Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Crítica interna

05/01/07

A manchete da Folha – e de todos os jornais que vi – é fraca. Falta de notícia e falta de investimentos próprios.

Folha – ‘Anac vai exigir que aéreas tenham aviões de reserva’. A agência ainda vai exigir, em fevereiro, e a medida só deve valer, se de fato for baixada, para daqui a seis meses. Qual o impacto disso para o leitor? Ninguém sabe. Parece balão de ensaio para sentir a reação das empresas de aviação. Será que o jornal não tinha outro assunto mais relevante e de interesse mais geral para os seus leitores? A notícia de que o ‘Exército pára distribuição de água no Nordeste por falta de verba’ é mais importante do que a medida que está sendo estudada pela Anac e ainda é de aplicação incerta.

‘Estado’ – Manchete tímida, em duas colunas, como indicando que também não tinha notícia que merecesse destaque: ‘Argentina põe em risco reunião do Mercosul’.

O ‘Globo’ manteve o foco nos problemas do Rio e segue acompanhando os primeiros passos do novo governador: ‘Estado diz que vai implantar tolerância zero em hospitais’. Pelo menos tem o mérito de dar visibilidade para um problema sério do Estado e da cidade.

Folha e ‘Estado’ noticiaram a participação das Forças Armadas na segurança do Rio com enfoques distintos. Na Folha, na Edição SP, ‘Lula manda que Forças Armadas ajudem a conter violência no RJ’. O jornal ressalta a participação dos militares no grupo que traçará estratégias contra a violência. No ‘Estado’, ‘Lula não atende a pedido de tropas feito por Cabral’. No entendimento do jornal, o mais importante é que os militares não farão o policiamento nas proximidades dos quartéis, como queria Sérgio Cabral, apenas reforçarão a vigilância dos próprios quartéis.

China e Índia

Os bastidores dos investimentos anunciados ontem pela Ford para o presidente Lula estão na coluna ‘Mercado Aberto’ (‘Ford investe preocupada com a China’, B2), e não na reportagem principal (‘Ford investe R$ 2,2 bilhões no país e compra a Troller’, B6). Para que o leitor melhor compreendesse o anúncio da montadora, o jornal deveria ter feito uma remissão.

Argentina

Manchete de ontem do ‘Valor’, a iniciativa da Argentina de recorrer à Organização Mundial do Comércio contra o Brasil não mereceu muita atenção da Folha (‘Por resina de PET, Argentina entra na OMC contra Brasil’, B6).

No ‘Estado’, o assunto foi a manchete da Primeira Página e ganhou a capa do caderno de economia

– ‘Argentina denuncia Brasil e ameaça cúpula do Mercosul’.

Rio

O título e a abertura da reportagem sobre a ajuda do governo federal ao combate à criminalidade no Rio na Edição SP perdeu o tom crítico, a meu ver acertado, da Edição Nacional. O jornal começou a rodar com uma boa reportagem sobre as impossibilidades de o governo federal atender às promessas feitas por ele mesmo em várias ocasiões de explosão de violência no Rio e em São Paulo – ‘União diz faltar verba para envio da Força’ (capa do caderno ‘Cotidiano’).

Na Edição SP, a notícia mais quente (a decisão do governo federal de ajudar o Rio) acabou editada sem o mesmo senso crítico: ‘Lula determina que Exército ajude o Rio’. Como a própria reportagem informa, ainda não se sabe como se dará esta ajuda. Mais: os policiais enviados ao Rio não participarão de ações nas favelas (não estão preparados, é a explicação, a mesma que tem sido usada para justificar a ausência de militares nestas áreas); e os militares, segundo entendimento do ‘Estado’, só reforçarão o policiamento de seus próprios quartéis.

O problema da segurança pública no Rio vem sendo explorado pelo jornal até agora em seu aspecto nacional – o pedido de ajuda a Brasília e as iniciativas de integração entre os quatro governos do Sudeste – e de acordo com a pauta do novo governador do Estado. E a polícia do Rio? No frigir dos ovos, é ela a responsável pela execução da nova política de segurança. Nos últimos doze anos grande parte dela esteve envolvida com crimes e foi responsável pela situação de insegurança que dominou o Estado. Como está se comportando agora? O que já mudou internamente? Se não houver mudanças na polícia do Rio (PM e Polícia Civil) de nada adiantarão as ajudas federais e a integração com outros Estados.

Aviação

Há dois trechos incompreensíveis no box ‘Companhias prevêem menos promoções’ que acompanha a reportagem sobre a intenção da Anac de exigir aviões de reserva das companhias aéreas (C3 na Edição Nacional e capa da Edição SP de ‘Cotidiano’).

O texto não explica como uma ‘menor integração de suas malhas viárias’ ajudará as companhias a resolver o problema de falta de aeronaves para substituir as que dão problema.

E não dá para entender por que ‘a concorrência com a Gol’ é um dos fatores que explicam a falta de aeronaves de reserva. Gostaria de entender.



04/01/07

A Folha dá crédito às medidas anunciadas pelos novos governadores: ‘19 governadores decidem cortar gastos’. No ‘Estado’, o assunto não é manchete, mas ocupa o segundo destaque da capa: ‘Governadores iniciam mandato cortando gastos’. A leitura das coberturas indica que os jornais quiseram acreditar que as medidas são para valer e que resultarão realmente em cortes de despesas, embora não tenham se preocupado em analisá-las com profundidade. A ver.

O ‘Estado’ continua a acompanhar, também crédulo, as providências tomadas pelo governo fluminense e pelo governo federal para enfrentar a violência e a criminalidade no Estado do Rio: ‘Força Nacional vai vigiar acessos ao Rio’. Na Folha, a notícia é a segunda mais importante e se diferencia por um tom (quase imperceptível) crítico: ‘Sem data de início, Força Nacional vai vigiar divisas do RJ’. Poderia ter sido mais crítica. A leitura das coberturas indica que o governo federal não tem como entregar o que vem prometendo nos últimos dois anos ao Estado. A Força Nacional, como ficou claro, é mais virtual do que real.

O ‘Globo’ mudou de assunto: ‘Sérgio Cabral diz que o Rio comete genocídio em hospital’.

Corte de gastos

A Folha elege, acertadamente, como principal reportagem da edição de hoje, as primeiras medidas de contenção de gastos tomadas pelos recém empossados governadores estaduais. Há um problema sério, no entanto, no levantamento publicado na página A6 (‘Governadores estréiam com corte de gastos’): o jornal não distingue, entre as medidas anunciadas, as demagógicas ou apenas simbólicas das efetivas, aquelas que vão resultar em economia de fato.

O jornal não se preocupa em analisar as medidas, apenas as reproduz. Um corte no número de secretarias, por exemplo, pode ser apenas simbólico, sem qualquer impacto no orçamento do Estado.

Apenas uma das reportagens, entre as quatro que relatam as primeiras medidas de 18 governadores, tem a preocupação de calcular o valor dos cortes: a que trata do Rio _’Pacote de Cabral tenta cortar até R$ 3 bilhões’. A leitura das outras reportagens não permite qualquer conclusão. O parágrafo sobre o Ceará informa que a economia prevista será de R$ 900 milhões, mas não fornece o valor do orçamento do Estado.

Para poder comparar, como pretendeu, com a inércia do governo federal (‘O ‘efeito tesoura’ nos Estados destoa das primeiras medidas do governo federal’, diz o lidão que abre a página), o jornal deveria ter sido mais exigente no levantamento dos dados. Desde sempre todos os governos recém empossados prometem austeridade e cortes. Sem uma análise mais completa, a reportagem da Folha soa ingênua.

Além do texto do Rio, se salva o tom (não o levantamento, também incompleto) que a reportagem da Agência Folha tentou imprimir no texto ‘Cortes feitos por governadores têm efeito temporário’, na Edição Nacional (na Edição SP este texto foi editado junto com o noticiário do DF). Como o próprio título indica, o texto deixa claro em vários trechos que algumas medidas não terão efeito duradouro, são apenas para impressionar a imprensa e os (e)leitores.

Não entendi a mudança feita na Edição SP. O relato (incompleto, sem avaliação dos cortes) das medidas anunciadas por José Serra tiveram mais destaque na Edição Nacional do que na Edição SP. Não deveria ser o contrário? O resultado é que o jornal, nas duas edições, dá mais espaço para o mal estar entre os tucanos (‘Medidas de Serra abalam relação com Alckmin’, A8) do que para a avaliação das tais medidas anunciadas por Serra. Elas terão algum efeito prático? Se forem implementadas, o que significam em reais? É muito ou pouco? Se o Estado já licitava por pregão eletrônico, qual a necessidade de novo decreto? Que economia o Estado fará ao não preencher 15% dos cargos de confiança? Os tucanos, que governam o Estado desde 1995, não sabem o valor e o perfil da dívida estadual?

A Folha demonstra mais uma vez que dá pouca atenção para as questões de São Paulo.

Força Nacional

Não é bem o governador do Rio, Sérgio Cabral, que ‘fracassou’ na tentativa de trazer a Força Nacional de Segurança Pública para atuar no Rio, como está na abertura do texto principal da capa de ‘Cotidiano’ (‘Gestão Lula não enviará Força ao Rio agora’). Cabral está no seu papel, de pedir. Quem fracassou, na verdade, foi o governo federal, que há anos vem prometendo, a cada crise, enviar tropas e que, quando a oferta é aceita, deixa claro que não tem como atender. Mesmo a ocupação das divisas entre os Estados não tem data nem efetivo definidos.



03/01/07

Os últimos dias foram marcados, em termos de notícias, pelo enforcamento de Saddam Hussein e pelo novo surto de violência no Rio. As manchetes da Folha e do ‘Globo’ de hoje destacam as primeiras iniciativas (ainda discursos e promessas) dos governos para enfrentar a criminalidade.

Folha – ‘Cabral quer Forças Armadas nas ruas’.

‘Globo’ – ‘Governo: policiamento nas vias expressas vai aumentar’.

Como a Folha decidiu destacar a questão da violência na manchete da Primeira Página, deveria ter incluído no texto a proposta do presidente da República de criação de leis mais rígidas para o combate à criminalidade. É uma discussão que sempre volta nestas horas, mas agora impulsionada pelo presidente.

O ‘Estado’ apontou para a falta de coerência do governo federal: ‘Lula muda de idéia e veta corte de despesas’.

Fotos

A foto que ilustra a página A4 não tem nada a ver com a reportagem ‘Dividas de 2006 ameaçam investimentos neste ano’. A fotografia do presidente deveria vir acompanhada pelo menos de uma legenda que explicasse do que se tratava: quando ocorreu? Onde? Que programa ele festejava? Que marca alcançou? As informações (parciais) estão no meio de outra reportagem, duas páginas depois: ‘Governo elabora pacote de medidas para a área social’, A6.

A foto que ilustra a reportagem ‘Vestido de Marisa Letícia na posse, feito por 25 rendeiras, custou R$ 2.000’ (A8) deveria informar, no crédito, a data em que foi feita.

Discurso

O discurso de José Serra não teve uma ‘ênfase nacionalista’, como menciona a reportagem que analisa os discursos dos governadores de São Paulo e Minas (‘Serra e Aécio confrontam estilos para 2010’, A9). É provável que o texto quisesse se referir à omissão também apontada por Janio de Freitas (A5): ‘São Paulo pouco foi lembrado no discurso de posse do seu novo governador’. Ou seja, Serra enfatizou a questão nacional, e não a estadual. Isso não é nacionalismo.

O governador José Serra voltou ontem a criticar, em entrevista, a política econômica do governo Lula e a cobrar crescimento. Como o jornal decidiu investir no assunto e analisar os discursos das posses, deveria ter publicado as novas críticas junto com a reportagem da página A9, em Brasil, e não no pé da reportagem ‘Serra desconfia de ‘fantasmas’ em SP’, em ‘Cotidiano’. É um erro de edição.

Terrorismo

O presidente Lula definiu como terrorismo as ações de violência no Rio. O uso do termo, aparentemente mera retórica, provocou uma discussão (a Folha levou para a página D3 do caderno ‘Esporte’) que tem um aspecto acadêmico, mas tem também conseqüências práticas que o jornal apenas menciona, mas não explora. Segundo a Folha (capa de ‘Cotidiano’, na Edição Nacional, e C3 na Ed. SP), ‘o governo tenta há três anos definir, em uma nova lei, o crime de terrorismo no Brasil, em que haveria penas mais duras’. O que diz o projeto de lei que o governo tenta aprovar? O incêndio do ônibus no Rio em que morreram várias pessoas seria considerado ato terrorista pela nova legislação? E quais seriam as penas alteradas?

Mapa

Na Edição Nacional, há erro no mapa que compõe o infográfico ‘Como foi a explosão’ (‘Explosão em quartel da PM mata sargento’, C4). É Vila Maria, e não Vila Mariana, o bairro onde ocorreu a explosão.

Aliás, o mapa do ‘Estado’, que mostra a Marginal Tietê e o rio Tietê, é melhor do que o da Folha. Onde houve a explosão é um trecho onde a Marginal se afasta do rio, e isso não fica claro nas ilustrações da Folha.’