O Globo dá em manchete, na edição de terça-feira (31/7), a obstrução da Via Dutra por caminhoneiros, na segunda. O tom é o habitual do jornal: pede rigor contra “baderneiros”. A Folha de S.Paulo não adota esse discurso de “lei e ordem”. Mas, como o Globo, dramatiza consequências da interrupção.
O Valor apresenta um dos argumentos dos grevistas, que se insurgem contra uma lei em vigor desde junho: a obrigação de descansar entre e durante jornadas de trabalho. Seria um problema dos autônomos, mas o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes, João Eustasia, diz no Estado de S.Paulo que há influência de empresários no movimento. Segundo ele, a lei não se aplica a autônomos e obrigará as empresas a contratar mais e a aumentar suas frotas.
Existem outros aspectos da lei questionados por caminhoneiros. A obrigatoriedade de uso de um “cartão frete”, que tornaria mais caros produtos comprados na estrada, e uma brecha que permitiu a entrada no mercado de 600 mil veículos de carga, o que representaria concorrência desleal.
Em resumo, cada jornal diz uma coisa diferente. E a paralisação não foi feita numa estrada longínqua.
Só o Globo apresenta a questão que, numa sociedade civilizada, seria mais relevante: especialistas calculam que o cumprimento integral da lei reduziria pela metade o número de acidentes nas estradas. Trinta e quatro por cento dos acidentes são causados por caminhões.
Mas no Brasil a vida humana não vem em primeiro lugar. Nem em segundo, nem em terceiro. E cada indivíduo, ou grupo, puxa a corda para seu lado. Existe um esgarçamento dos laços sociais.
Métodos mafiosos
A denúncia feita pelo juiz Rocha Santos a respeito de chantagem que a mulher de Carlos Cachoeira teria tentado lhe impor indica que métodos clássicos da máfia podem estar se tornando correntes no Brasil. O juiz é substituto de um colega que se disse vítima de ameaças de morte.
Andressa Mendonça teria feito grave acusação a um órgão de imprensa, a Veja. Segundo Andressa, caso Cachoeira não fosse inocentado e solto, a revista publicaria uma reportagem acusando o juiz de ter feito contatos espúrios. A Veja anunciou que vai processar Andressa. No tiroteio, ela teria feito ameaças também à senadora Kátia Abreu.
Esse é um lado muito grave da crise, mas está sendo ofuscado pelo mensalão.
Europa vai muito além do euro
O noticiário sobre a crise financeira europeia só incidentalmente capta a dimensão histórica das questões econômicas da Europa. Dia após dia, jornais e outras mídias relatam mais os sintomas do que as causas profundas.
A vontade dos europeus de se livrar do peso do passado, após a Segunda Guerra Mundial, foi uma tentativa de amenizar os traumas do fascismo, do nazismo e da guerra. De dar espaço à esperança. Mas não se pode guardar do passado apenas o que foi positivo. Não se pode eliminar da memória o que foi ruim e esperar que acabe se desintegrando como lixo deixado à ação do tempo.
Se os meios de comunicação seguem a crise com a visão presa ao imediato e ao primeiro plano, também abrem espaço para análises que levam em conta o contexto mais amplo e a perspectiva histórica.
Foi o que fez na sexta-feira (27/7), na Folha de S. Paulo, o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros. Primeiro, apontou a irracionalidade de investimentos em títulos dos Tesouros americano e alemão que rendem menos do que a inflação. Atribuiu essa opção ilógica ao comportamento de manada. Em seguida, saiu do terreno especializado. Disse que a União Europeia é o estágio final de uma longa marcha de mais de 60 anos. Teria sido mais prudente dizer “estágio atual”.
Mas isso não prejudica o argumento. Mendonça de Barros fala da guerra e do sofrimento que a ela se seguiu. E chega ao ponto mais agudo de sua crítica:
“Essa realidade é sofisticada demais para a comunidade financeira, formada na sua grande maioria por indivíduos de limitada visão política e que não conseguem enxergar o mundo fora de sua perspectiva individualista e restrita a ganhos especulativos.”
Não se trata apenas, portanto, de miopia dos jornalistas, mas principalmente de estreiteza mental de suas fontes.
Na terça-feira (31/7), o Estado de S. Paulo publica artigo de Paul Krugman na mesma linha. Krugman argumenta:
“O fracasso do euro não provocaria apenas perturbações econômicas; seria também um gigantesco golpe contra o projeto europeu mais amplo, que trouxe paz e democracia a um continente dono de uma história trágica.”