Leia abaixo os textos de quarta-feira selecionados para a seção Entre Aspas. ************ Folha de S. Paulo
Quarta-feira, 17 de janeiro de 2007
CRATERA EM SP
O apagão das empreiteiras
‘DEPOIS DO apagão das companhias aéreas, veio o apagão das empreiteiras. As cinco maiores construtoras de obras públicas do país desmoronaram às margens do rio Pinheiros, em São Paulo. Como no caso dos aeroportos, desmoronou a capacidade das empresas de falar sério e de manter uma relação respeitosa com a população.
O consórcio da obra do metrô paulista é formado por cinco empresas de engenharia que juntas faturam anualmente US$ 3,5 bilhões. São gente grande: Odebrecht, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e OAS. Demoraram um dia inteiro para falar do desastre e, quando o fizeram, passaram a responsabilidade às chuvas do Padre Eterno.
Ofendendo a inteligência alheia, disseram também o seguinte:
‘O Consórcio Via Amarela lembra que, apesar da qualidade do projeto e dos cuidados na execução da obra, trata-se de atividade classificada no grau de risco 4, o mais alto na escala de risco do Ministério do Trabalho’.
Só um dos mortos no desmoronamento tinha relações trabalhistas com as empreiteiras. Os demais eram transeuntes que, de acordo com qualquer escala de perigo, deveriam correr risco zero ao andar numa rua da cidade. Se um diretor da Odebrecht (líder do consórcio) estivesse a caminho do psiquiatra na rua Capri e terminasse seus dias na cratera da Via Amarela, ele não estaria numa área de grau 4. Assim como não estava a aposentada Abigail Rossi de Azevedo, que ia ao médico.
O tom pedagógico da nota é impertinente. Poderia ser refraseado assim: ‘O Consórcio Via Amarela deveria ter lembrado que sua obra colocara no nível 4 de risco as pessoas que passavam por perto’. Eram cidadãos que não faziam a menor idéia do perigo que corriam. Se fizessem, tomariam outro caminho.
A primeira informação de que havia uma van no escombros surgiu três horas depois do desabamento. A cooperativa de transportes que perdera o rastro do seu veículo informou que um sinal de rádio localizava-o naquela cratera, a 28 metros de profundidade. Durante cerca de seis horas, tanto o consórcio como os poderes do Estado e do município fizeram acrobacias para soterrar o tamanho do desastre, como se tivessem poderes para isso. Preferiam discutir o cumprimento do prazo da obra. Do lado do consórcio, nenhum grão-empreiteiro, daqueles que jantam no Alvorada e almoçam no BNDES, botou o rosto na vitrine.
É possível que nada houvesse a fazer para salvar as vítimas. Apesar disso, muito poderia ter sido feito para amparar suas famílias. Esse descaso não teve nada a ver com a chuva ou com a geologia.
Durante todo o fim de semana, a principal assistência a essas pessoas veio da cooperativa cuja van estava perdida. Ela mandou para o local um microônibus, refeições e 20 funcionários. Havia parentes desesperados e é natural que, nessa situação, as pessoas se descontrolem. Não é natural que sejam tratados como descontrolados.
Dormiram num estacionamento próximo e em colchonetes colocados na calçada. Usaram os banheiros dos bares da vizinhança. Vagavam sem informações, mas viam a circulação de viaturas do Instituto Médico Legal. Na segunda-feira os empreiteiros voltaram a se pronunciar, informando que montaram um acampamento e colocaram uma equipe de assistentes sociais para assistir as famílias dos mortos. Fizeram pouco, tarde.’
INTERNET
Criadores do Skype agora investem em TV pela internet
‘Os criadores do Skype, o serviço de telefonia pela internet, deram ontem novos detalhes de seu novo projeto: um programa para assistir televisão pela rede. Até então chamado de The Venice Project (Projeto Veneza), o software agora atende pelo nome de Joost.
Segundo Niklas Zennstrom e Janus Friis, o propósito do Joost é permitir que as pessoas possam ver TV no computador de forma mais fácil e agradável.
Pelo programa, que está em fase de testes e não tem data de lançamento, o usuário poderá ver canais de TV e clipes. Zennstrom e Friis disseram que já fizeram acordos sobre direitos autorais com empresas como Warner Music e Endemol.
Os dois venderam o Skype para o eBay por US$ 2,6 bilhões em 2005.
Com agências internacionais’
FOTOGRAFIA
Revolucionário da imagem
‘‘A fotografia de Geraldo de Barros se rege por um estatuto da ruptura.’ A avaliação do crítico de arte e curador Paulo Herkenhoff resume a decisiva obra de Geraldo de Barros (1923-1998), que, finalmente, ganha uma publicação que mostra toda a importância dele para as artes brasileiras.
A caixa que reúne duas de suas principais séries fotográficas, ‘Fotoformas’ e a inédita em livro ‘Sobras’, chega às livrarias nesta semana em lançamento da editora Cosacnaify.
As imagens de ‘Fotoformas’ foram feitas entre 1948 e 1952 e representam um dos momentos de subversão da linguagem fotográfica da época no Brasil, dominada então pelo pictorialismo, que se pautava por regras da pintura clássica. Teve nomes como Thomaz Farkas, 82, e German Lorca, 84, como parceiros dessa renovação.
‘Acho que a série é o primeiro grande momento consistente da modernidade na fotografia brasileira, ainda que tardia’, afirma o crítico de fotografia Rubens Fernandes Junior, organizador dos dois livros. ‘Naquele momento, ela se descola do seu habitat, que é o mundo visível. Essa produção e as ‘Sobras’ podem ser vistas agora como marcos históricos.’
‘Ele tinha uma grande vontade de inovar, era radical mesmo’, conta Farkas, companheiro dele no Foto Cine Clube Bandeirante e no laboratório de fotografia instalado em 1949 pelos dois no Masp (Museu de Arte de São Paulo), quando ainda estava na rua Sete de Abril, no centro da cidade.
Barros diferencia-se de outros pioneiros modernos por ver a fotografia como um processo, que ultrapassava o momento do clique da imagem. Assim, fazia intervenções no negativo, aplicava tintas e criava sobreposições, entre diversas outras experiências.
‘O real era só um ponto de partida. Ele acrescentava nanquim e guache, usava ponta-seca no negativo, cartões perfurados. Ao contrário dos seus colegas, ele fazia do negativo uma matriz, como se fosse uma gravura’, avalia Fernandes Junior.
A série ‘Fotoformas’ foi exposta inicialmente no Masp em 1950. Depois de redescoberta nos arquivos por sua filha Fabiana de Barros, ganhou mostra na Suíça em 1993, no Musée de L’Elysée, e no ano seguinte foi exibida no MIS (Museu da Imagem e do Som), onde teve catálogo desenhado pelo próprio artista. Esgotado, foi reproduzido integralmente no livro atual, que acrescenta textos de críticos como Herkenhoff, Pietro Maria Bardi (1900-1999) e Radhá Abramo, entre outros.
Mas Geraldo de Barros, lembram seus contemporâneos, era um revolucionário cordial. ‘Era uma pessoa muito afável. Não deixava de ser crítico, tínhamos produções diferentes, mas nos ajudávamos muito. Ele me faz muita falta’, diz Farkas.
‘Acompanhei diversas experimentações das ‘Fotoformas’, nelas ele mostrava muita criatividade’, conta Lorca.
‘Sobras’
O conjunto ‘Sobras’, com mais de 300 imagens, é reunido agora em livro após ser exibido na mostra ‘A(s)simetrias’, na galeria Brito Cimino, em São Paulo. A exposição foi premiada em 2006 na categoria fotografia pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte).
A série, a última do artista, foi realizada a partir de registros familiares de Barros, feitos em temporadas de férias e em viagens com amigos. Nos anos 90, debilitado por sucessivas isquemias, tem a ajuda de uma assistente, Ana Moraes, para retrabalhar as imagens. ‘Ele parte de fotografias mais intimistas e, inserindo zonas brancas e negras ou recortando contornos, cria obras muito sofisticadas’, diz Fernandes.
A multiplicidade e o caráter inquieto de Barros também podem ser percebidos nas produções dele como designer e pintor. Nos anos 50 e 60 ele estava à frente da Unilabor, uma cooperativa que fabricava móveis, até hoje lembrada como exemplo de autogestão. ‘A radicalidade da obra de Geraldo se refletiu na gestão comunitária de processos produtivos e nos seus produtos seriados’, diz o arquiteto Mauro Claro.’
************
O Estado de S. Paulo
Quarta-feira, 17 de janeiro de 2007
MÍDIA & RELIGIÃO
Os telepastores e o artigo 171
‘Além de serem réus em vários processos por crimes de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e estelionato na Justiça paulista, que já acolheu o pedido de prisão preventiva encaminhado pelo Ministério Público (MP) estadual, os fundadores da Igreja Renascer em Cristo, o ‘apóstolo’ Estevam Hernandes Filho e a ‘bispa’ Sônia Haddad Hernandes, agora estão às voltas com a Justiça americana, acusados de crime de falsidade ideológica e contrabando de papel-moeda. Os dois foram detidos no Aeroporto de Miami com US$ 56 mil escondidos na bagagem, após terem afirmado às autoridades aduaneiras que levavam menos de US$ 10 mil.
A prisão foi noticiada pelas redes mundiais de tevê, como a CNN, a Fox e a CBS, e pelos principais jornais americanos, como The New York Times e o Los Angeles Times. Este último descreveu a Renascer como ‘uma dessas igrejas que existem para enriquecer seus donos’, oferecendo ‘promessas vagas de salvação e fé’. A ‘bispa’ e o ‘apóstolo’ se encontram em celas separadas numa prisão da Flórida. Se a denúncia-crime for acolhida pela Justiça e forem considerados culpados, no julgamento de mérito, poderão ficar presos por até cinco anos. Eles também podem ser extraditados para o Brasil, onde terão de aguardar na cadeia o julgamento da Justiça paulista e, também, o da Justiça Federal, pois o MP federal irá processá-los por crime de evasão de divisas.
A trajetória de Estevam Hernandes e da Renascer em Cristo em nada difere de outros empreendimentos do gênero, como as igrejas Universal do Reino de Deus, do ‘bispo’ Edir Macedo, e a Internacional da Graça de Deus, fundada por seu cunhado, o ‘bispo’ Romildo Soares. As três estão organizadas em moldes empresariais e cresceram recorrendo a técnicas de marketing, utilizando em larga escala o rádio e a televisão. O ‘apóstolo’ Estevam foi funcionário da área de marketing de grandes empresas e, a exemplo de Macedo e Soares, também se apresenta como ‘televangelista’.
A Renascer, dos Hernandes, é proprietária da Rede Gospel e de uma torre de transmissão em São Paulo. Macedo é dono da TV Record. E Soares, que ocupa boa parte do horário nobre da TV Bandeirantes, é proprietário da Rede Internacional de Televisão, com 35 retransmissoras, e está preparando o lançamento de uma tevê paga por satélite com canais evangélicos. Além de levarem uma vida faustosa, oposta ao que pregam, os três telepastores têm em comum o objetivo de expandir suas atividades no exterior. A Universal atua na África e na Europa. A Graça de Deus tem templos no Japão e negocia a transmissão do Show da Fé com emissoras árabes. E Hernandes vinha investindo nos EUA.
‘Catequizando’ pessoas ingênuas e de boa-fé à procura de apoio moral para enfrentar as agruras da vida, as igrejas ‘evangélicas’ exploram seus prosélitos angariando valores milionários em troca de todo tipo de promessa. Registradas como entidades filantrópicas e sem fins lucrativos, não pagam Imposto de Renda e operam por meio de empresas criadas com o objetivo de transferir para ‘laranjas’ e paraísos fiscais a receita do dízimo. Em 2005, a Polícia Federal apreendeu, no Aeroporto de Brasília, caixas com dinheiro vivo num jatinho da Universal. Em reportagem publicada pelo Estado, a mãe de um piloto de helicóptero que serviu aos Hernandes e morreu na noite do Natal de 2005, após levá-los a uma festa, contou que o filho era coagido a transportar de madrugada malotes de dinheiro trazidos por carros blindados, sem poder observar as normas de segurança de vôo.
Os mercadejadores da fé há muito tempo incorrem em vários artigos do Código Penal, a começar pelo 171, que classifica como estelionatário quem induz ‘alguém em erro, mediante artifício, ardil ou outro meio fraudulento’. Mas, embora o MP já tenha feito dezenas de denúncias contra os telepastores, até hoje eles continuam ocupando livremente o horário nobre da tevê para explorar a boa-fé de seus seguidores, praticando o estelionato de modo acintoso.
Custa crer que as autoridades até hoje nada tenham feito para tirá-los do ar, pois rádio e televisão são concessões públicas.’
PUBLICIDADE INFELIZ
Red Bull faz marketing na tragédia
‘Jornalistas, loucos, curiosos e… Red Bull. A cratera no canteiro de obras do Metrô em Pinheiros tem atraído gente de tudo que é tipo. Desempregado que fica ali para ver o corre-corre, fãs de repórteres de televisão, a imprensa em massa, pessoas em busca de minutos de fama e até quem queira fazer um pouco mais de marketing de seu produto.
Com 90 latas da bebida energética Red Bull em mochilas térmicas, três moças apareceram ontem nas imediações da cratera para divulgar o produto. Por volta das 13 horas, ultrapassaram o cordão de isolamento, que tem sido extremamente rigoroso para não permitir a chegada da imprensa e de pedestres perto do buraco, e saíram distribuindo as latas.
Policiais militares, funcionários da Cooperativa de Trabalho dos Profissionais no Transporte de Passageiros em Geral da Região Sudeste (Transcooper) e engenheiros receberam a bebida. ‘A gente veio mostrar o lado funcional dela’, disse Maitê Camargo, de 20 anos, uma das promotoras de vendas. O ‘lado funcional’ é manter a pessoa acordada e ajudar a combater o cansaço.
‘A gente sabe que é uma situação complicada’, disse a promotora Fernanda Souza, de 22 anos, questionada sobre a exploração da tragédia. Mesmo assim, ela e as duas colegas, que distribuem amostras para a empresa, permaneceram dentro do cordão de isolamento, na Rua Capri, por 15 minutos.
Segundo a Assessoria de Imprensa da Red Bull, o objetivo da iniciativa era mostrar o ‘benefício energético’ para os bombeiros. ‘E todo mundo começou a pedir. De forma alguma tinha intenção de divulgar a marca.’
A assessoria reafirmou que o trabalho das garotas, que também distribuíram a bebida para famílias de possíveis vítimas e jornalistas, é focado em procurar caminhoneiros, médicos em plantões, esportistas e outras pessoas ‘em situação de cansaço físico e mental’.
Além de usarem bonés com a marca do produto, as meninas, bonitas e maquiadas, tiraram fotos de divulgação do trabalho. A assessoria da Red Bull garantiu que as três não são modelos, mas profissionais da empresa.’
TELEVISÃO
Ugly Betty é a melhor comédia
‘Ugly Betty foi a grande vencedora do Globo de Ouro, realizado anteontem, em Los Angeles, no quesito TV. Ganhou os prêmios de melhor série e de melhor atriz na categoria comédia em seu ano de estréia. A atração é uma versão americana da novela colombiana Betty, a Feia, que foi sucesso no Brasil (RedeTV!). Atualmente está no ar no País A Feia Mais Bela (SBT), a edição mexicana. Por enquanto, nenhum canal nacional anunciou a compra de Ugly Betty.
A atriz America Ferrera emocionou veteranas na platéia. E Salma Hayek – que, depois de batalhar para levar Frida Khalo aos cinemas, apostou em Betty – estava orgulhosa do trabalho bem realizado.
O melhor ator em comédia foi Alec Baldwin por 30 Rock (Sony), uma espécie de The Office misturado com Newsradio.
Na categoria série dramática, Grey’s Anatomy (Sony) foi a vencedora. O prêmio era esperado no ano passado, mas Lost (AXN) desbancou os médicos. Este ano, Lost está mal e os produtores já falam abertamente em um final. No tapete vermelho, a indicada para o Globo de Ouro, Evangeline Lilly, falou que a equipe está definindo quantas temporadas Lost ainda terá. A preocupação do criador da série Damon Lindelof é que Lost se torne um Arquivo X e se estenda além do que deve.
Apesar de Grey’s ter sua merecida vitória, seus protagonistas – Ellen Pompeo e Patrick Dempsey – saíram sem prêmios. O melhor ator em série dramática foi Hugh Laurie. É a segunda vez consecutiva que o ator inglês leva o Globo de Ouro pelo, até agora imbatível, House (Universal Channel).
A surpresa da noite foi o prêmio para Kyra Sedgwick por The Closer (TNT). Ela interpreta uma detetive que resolve os crimes mais difíceis e ainda sofre para conquistar o respeito de sua equipe.’
************