Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Redação sem jornalismo

Caro Tuffani, nesta discussão sobre dividir ou não os assessores de imprensa e jornalistas em categorias diferentes, gostaria que me esclarecessem se continuariam sendo considerados jornalistas (só para citar alguns casos): 1) os colegas que fazem colunismo social nos jornais; 2) os que fazem matérias encomendadas pelo departamento comercial das empresas jornalísticas (as famosas matérias 500); 3) os que fazem viagens para fazer matérias de turismo a convite das agências de turismo; 4) os que viajam a convite de governos em viagens oficiais; 5) os que infringem a ética jornalística, como no caso mais recente e de grande repercussão, da matéria sobre o ex-deputado Ibsen Pinheiro.

Também não sei como seria enquadrada na categoria ‘jornalismo’ a prática de alguns jornais que mantêm listas negras de pessoas que não podem ser citadas em matérias do jornal. São questões a serem resolvidas nesta discussão em que só se fala na necessidade de assessores de imprensa devolverem a carteira de jornalistas, como se nas redações se fizesse jornalismo 24 horas por dia. Quem já trabalhou em redação sabe que não é bem assim.

Carlos Scomazzon, jornalista (ainda) e assessor de imprensa, Porto Alegre



Cantilena do OI

O texto assinado pelo jornalista Maurício Tuffani segue a mesma cantilena dos outros artigos publicados anteriormente neste OI. Vai da manipulação grosseira ao sofisma, em poucas linhas. Senão, vejamos:

‘Apesar de não dispor do poderio dos donos da mídia, a Fenaj foi tão manipuladora quanto eles, ou talvez muito mais do que eles’. Ora, uma simples visita ao sítio da Fenaj indica o contrário: ninguém mais que a direção daquela entidade se empenhou em debater o assunto com a sociedade, assumindo publicamente as contribuições de entidades como a OAB e tantas outras. A informação sobre a agenda dos dirigentes da Fenaj, participando de debates do Oiapoque ao Chuí, está disponível. Erro de informação de Tuffani ou manipulação grosseira?

Assessor de imprensa x jornalista: aqui o sentido do sofisma se faz presente. Diz Tuffani: ‘O Conferp tocou o dedo numa ferida que nunca cicatriza, mas tem sido escondida por décadas no curral de opiniões domesticadas do jornalismo brasileiro: fazer assessoria de imprensa não é fazer jornalismo’. Um simples olhar na realidade do exercício profissional de jornalismo, hoje inclusive objeto de reflexão e pesquisa dos cursos superiores, indica que a figura do antigo AI mudou profundamente, nos últimos 10 anos. A própria categoria se organizou, nacionalmente, para discutir a prática profissional em assessoria de comunicação (muito mais ampla que a função do AI) e tem farta produção a respeito através dos Encontros Nacionais dos Jornalistas em Assessoria de Comunicação). Não é possível que Tuffani desconheça esse debate e se arvore o direito de ‘decretar’ que jornalista não pode exercer o papel de AI (é fonte, jamais será repórter).

No mais, a referência ao regime militar para ‘contaminar o debate’ é um exercício de retórica banal. Por último, recomendo ao Sr. Tuffani a leitura do artigo do professor Venício Lima, no OI, que sucintamente explica a virulência verbal sua e de tantos outros ‘eminentes jornalistas’ que se julgam mandatados por algum Deus, a falar e ditar normas para a categoria e a sociedade. Sucintamente escreve Lima: ‘A virulência da reação de colunistas, editoriais, dirigentes e entidades a um projeto de lei enviado ao Congresso e a um pré-projeto em discussão no MinC confirma uma realidade histórica, já do conhecimento de todos aqueles que estudam a mídia no Brasil: esse é um setor de atividade em nossa sociedade que se considera acima do bem e do mal, e, ao contrário de qualquer outro, se julga isento de toda e qualquer forma de regulação. As tentativas nesse sentido – independentemente de seu mérito – são automaticamente estigmatizadas no seu nascedouro como censura, e por isso dificilmente avançam.’

No fim de seu artigo, porém, Tuffani revela sua grande motivação. O pano de fundo parece ser a obrigatoriedade do ensino superior para o exercício da profissão, proposta da qual ele é um histórico opositor. Deveria ter explicitado isso aos leitores, caro jornalista, em nome da ética e da transparência.

Samuel Lima, jornalista, Joinville, SC



Maurício Tuffani responde

Em atenção às pertinentes questões do jornalista Carlos Scomazzon, que exerce a função de assessor de imprensa, faço inicialmente um pequeno reparo: não se trata de separar jornalistas de não-jornalistas, mas de separar as diferentes atividades da comunicação. O profissional pode ter formação jornalística, mas atuar temporária ou definitivamente como assessor de imprensa, relações-públicas, publicitário etc.

Assessor de imprensa é fonte. Muitas vezes seu trabalho, na forma de releases, é de qualidade superior às matérias que dele se originam. Não estou defendendo a mera transcrição de releases, mas muitas vezes isso teria sido muito mais útil para o leitor do que as matérias preparadas a partir deles nas redações. Mesmo assim, o trabalho do assessor é um trabalho que se propõe como fonte junto à imprensa. Por mais que o assessor de imprensa consiga enquadrar seu chefe e impor o respeito ao interesse público e a política de transparência, seu trabalho não é jornalismo.

Por mais que seu trabalho exija conhecimento jornalístico e que seja melhor realizado quando é feito por quem tem larga experiência jornalística, um assessor de imprensa jamais deverá ter sua atuação cobrada nos termos da ética jornalística, e muito menos por um comitê de ética jornalística. Não se pode cobrar de um release que ele contemple os diversos lados do tema que ele aborda. Esse é um dos pontos práticos da diferenciação da atividade, e não do profissional, que hoje está em uma função e amanhã poderá estar em outra.

Como disse anteriormente, Scomazzon apresenta questões pertinentes que também são dedos na ferida. De fato, diversas formas de colunismo, como o social, não têm demonstrado ser atividade jornalística, assim como as de astrologia, aconselhamento sentimental e coisas do tipo, por mais que estejam entre as seções mais lidas de um veículo. De minha parte, muitas dessas atividades não justificariam o registro como jornalista.

Quanto a fazer matérias de interesse comercial da empresa jornalística, minha OPINIÃO é a seguinte: não se pode é fazer matéria comprada (ou vendida). Fazem isso, e não deveria ser feito. Deveria ser objeto de punição. Nada contra matérias relacionadas a campanhas comerciais serem feitas por jornalistas, desde que o produto final revele a vinculação com o patrocinador, que os entrevistados sejam informados sobre esse vínculo e que não haja imposição nem restrição de fontes. Já editei revistas que tiveram parte da tiragem comprada por empresas de agrotóxicos, e a matéria de capa era sobre denúncia contra agrotóxicos, com desenho de caveira e tudo mais.

Enfim, precisa dizer quem está pagando, ouvir todos os lados e publicar o que foi apurado, doa a quem doer. O mesmo se aplica a viagens patrocinadas por empresas, ONGs e governos. Já viajei a convite de empresas, revelei esse convite na matérias e critiquei os patrocinadores. Eles não gostaram, mas continuam me convidando.

Mas a bandalheira corre solta. Não faltam eventos milionários de lançamento de produtos e coleguinhas dispostos a ser, digamos, ‘simpáticos’ com os anfitriões. Isso é infração ética. Na minha OPINIÃO, isso deveria ter punição e, na reincidência, dar no mínimo suspensão do registro. Acho que isso dá uma longa e boa discussão.

Agradeço ao jornalista Carlos Scomazzon pela oportunidade de responder, sem a pretensão de esgotá-las, a questões procedentes levantadas de forma civilizada, e que contribuem para o debate. Quanto à manifestação do outro missivista, prefiro deixá-la de lado, pois seria perda de tempo solicitar sua atenção crítica aos documentos e registros por ele já desprezados. (M.T.)


Leia também

Jornalistas, assessores e o CFJ – Maurício Tuffani

Lições de um debate inconcluso – Venício A. de Lima



DESPEDIDA DO CCS
Desfalque no debate

Deixamos de usufruir, com a despedida do Sr. Alberto Dines do Conselho de Comunicação Social (CCS), de um dos intelectos respeitáveis nos debates sobre a comunicação do país. Um desfalque, particularmente, para estudos sobre a mídia nacional. Mas, congratulo-me com o representante da sociedade civil no CCS pelos subsídios levados àqueles debates.

Vanilce Helena de Santi, estudante de Jornalismo, Araraquara, SP

Troca de guarda no CCS – Alberto Dines



BAIXARIA NA TV
Outra cena melancólica

Fiquei estupefato ao ver mais uma cena melancólica da televisão brasileira no domingo dia 17. A invasão de um homem armado à TV Bandeirantes, no programa da Márcia Goldschmidt é no mínimo um insulto ao bom senso e revela, salvo melhor juízo, a que ponto as TVs no Brasil estão reféns dos factóides e das jogadas de marketing para auto-promoção. Por ironia do destino, o fato aconteceu no Dia Nacional Contra a Baixaria na TV.

Até que se apure o fato com maior rigor, e me provem o contrário, ninguém me convence de que tudo que aconteceu foi real. Afinal, somos campeões (os brasileiros) em criar espetáculos melodramáticos em frente às câmeras. Basta voltar um pouco a fita de nossa memória para lembrar o episódio envolvendo o apresentador Gugu Liberato, do SBT, e a farsa montada pelos tais integrantes do ‘PCC’, que desfiaram falsas ameaças a nomes famosos. (…) Seria cômico se não fosse triste ligar a TV no dia seguinte e ver os desdobramentos do ‘caso Márcia’. Entrevistas, debates e a repetição constante da invasão do estúdio deram o tom da cobertura da emissora durante todo o dia.

É preciso que fatos desta natureza sejam investigados com rigor, inclusive com o acompanhamento de perto do Ministério Público. Não esqueçamos que as emissora de TV só funcionam por concessão pública, e que devem, no mínimo, uma satisfação à sociedade.

Concordo com o que afirma Eugênio Bucci, pesquisador e hoje presidente da Radiobrás, no livro Brasil em tempo de TV: ‘O telejornalismo no Brasil é muito mais dramático do que factual. Organiza-se como ficção primária’.

Em que pese serem os programas aqui citados chamados de ‘entretenimento’, sabe-se que eles tentam, muitas vezes, misturar os gêneros para ganhar credibilidade e por isso o raciocínio se aplica também a estes. É hora de dar um basta neste tipo de programa. Isso se aplica a todos nós, telespectadores, anunciantes, cidadãos.

Adalberto Melo, jornalista