Praticamente todos os setores do serviço público federal ou estão em greve, ou realizando operações padrão com paradas periódicas, a fim de demonstrar ao Poder Executivo sua plena insatisfação não só com salários, como também com condições de trabalho. A grande imprensa, que podia amenizar essa situação ouvindo os servidores e informando o público sobre as razões que os levaram a recorrer à greve, que é uma medida extrema, ao invés de exercer esse papel procura jogar a população e o governo contra os servidores.
A imprensa dá a entender que o servidor público é o grande vilão. Todavia, se existe um vilão este é o governo, que se mostra incapaz de resolver a situação, esforçando-se por atender às reivindicações justas do funcionalismo, como melhoria de condições de trabalho, fim da contribuição previdenciária dos aposentados e correção dos salários de acordo com a inflação. O governo simplesmente cruza os braços e nada faz. Se o governo tivesse se adiantado, calculando como, quando e onde poderia atender às reivindicações dos servidores sem estourar o orçamento e sem comprometer seus programas, as greves teriam sido evitadas, mas nesse particular a imprensa se omite, fingindo que apoia a presidente Dilma Rousseff quando se trata de fustigar os servidores.
O pior é que efetua comparações com base em dados irreais para afirmar que o setor público paga melhor do que o privado. Trata-se de uma meia verdade bastante prejudicial ao correto entendimento da questão salarial. Realmente, nos cargos iniciais de carreiras de nível superior, e nos cargos de nível básico ou médio, os salários são maiores do que na iniciativa privada, mas quando de trata dos cargos finais das carreiras de nível superior, a remuneração é muito mais baixa do que na iniciativa privada, o que resulta em total falta de estímulo. Se, por exemplo, o Adicional de Tempo de Serviço não tivesse sido eliminado, durante o governo do PSDB, a defasagem nas carreiras de nível superior não estaria ocorrendo.
Que a imprensa jogue limpo
Reparem que as greves só começaram a pipocar depois que vários direitos do funcionário público foram suprimidos, como o Adicional de Tempo de Serviço, o direito de receber em dinheiro 10% do valor da remuneração de férias, o direito à licença especial de três meses de cinco em cindo anos, o direito à aposentadoria integral, que foi eliminado recentemente por iniciativa da presidente, sem falar na absurda exposição da privacidade dos servidores com publicação de seus nomes e salários.
Que os salários sejam divulgados, isso é salutar e obedece ao Princípio da Publicidade que deve reger a administração pública, porém que os dados da vida particular do servidor sejam levados ao conhecimento de qualquer um, isso é invasão de privacidade condenada pela Constituição.
É uma falácia afirmar que o servidor goza de estabilidade, como justificativa para intimidar a presidente a não conceder os reajustes salariais imprescindíveis. Esse direito já não existe mais, pois atualmente o servidor pode ser demitido unilateralmente, se apresentar insuficiência de desempenho durante determinado período e, ao ser demitido, não fará jus ao aviso prévio, ou ao fundo de garantia por tempo de serviço, ou seja, deixará o serviço público com uma mão na frente e outra atrás.
Se a grande imprensa resolveu eleger o servidor público como Judas, ao menos jogue limpo e fale a verdade.
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[Lucia Reis é advogada, Rio de Janeiro, RJ]