Comecemos com uma informação: ruiu um poço das obras de extensão do Metrô de São Paulo. Ao contrário do que a TV informa a cada instante, o Metrô paulistano não caiu: continua funcionando direitinho. O que não funcionou foi a turma contratada para executar a obra.
Até agora, caro colega, o Metrô de São Paulo não se dignou a publicar uma nota oficial com sua posição sobre a cratera. As empreiteiras, todas com amplo currículo, excelentes equipes de comunicação e, supõe-se, farta experiência de engenharia e construção, levaram uma semana para se manifestar. Neste intervalo, era como se não fosse com elas.
Na falta de sua voz, proliferaram as vozes-piratas. Pessoas não-identificadas, exceto pelas imponentes credenciais que dizem ostentar, se deram ao direito de fazer críticas à condução da obra – isto antes de qualquer laudo, de qualquer análise, sem que sequer a cratera tenha sido esvaziada. Alguns criticaram o sistema adotado; outros garantiram que o acidente se deveu à economia de material. Um garantiu que a parede era fina, outro que o túnel deveria ser feito mais para baixo. Identificar-se, para dar credibilidade às críticas? Isso não, que ninguém é bobo. Imagine se o laudo pericial o desmoraliza em público!
Nem nós, jornalistas, devemos ser bobos. Críticas, restrições, análises são bem-vindas, mas não podem ser anônimas. Uma boa fonte pode dar informações em sigilo, mas essas informações devem servir como base para uma reportagem. Publicá-las a seco é fácil demais; e errado. Alguns dos defeitos que as vozes-piratas apontam na obra são criminosos. Não é correto apontar uma conduta criminosa sem estar pronto para defender tecnicamente sua posição.
Que houve erros, houve; a tarefa agora é encontrá-los. Mas de maneira técnica, jornalística; nada de ouvir vozes de fantasmas só para preencher espaços.
No olho do furacão
O jornalista Arturo Alcorta mora pertinho do local da tragédia; estava lá no momento em que a cratera se abriu (e se aproximou muito, muito, do prédio em que está seu apartamento). Arturo Alcorta viu tudo, porque estava lá. E faz uma análise da cobertura de imprensa a que assistiu, especialmente nos primeiros momentos, do olho do furacão:
‘O ponto mais crítico da cobertura foi que as notícias foram geradas no padrão NP – Notícias Populares. O sangue é o foco do fato. Parecia necessário encontrar culpados e criticar erros bobos cometidos por quem estava no meio da operação de resgate.
‘Uma situação ridícula foi quando Congonhas fez o pedido para que todos os helicópteros deixassem a área, para que os bombeiros pudessem ouvir possíveis sobreviventes. A maioria se manteve sobre a área. Mesmo as TVs que transmitiram o pedido de Congonhas mantiveram seus helicópteros no local, um pouco distanciados, mas ainda assim muito barulhentos.
‘Participei ativamente dos fatos nos primeiros 30 ou 40 minutos e ninguém se deu conta de que o trânsito parou no entorno e que as equipes de resgate e outras importantes tiveram problemas sérios para alcançar o local. Não adiantou sequer avisar para olhassem o que estava acontecendo nas próprias costas.
‘Passados alguns dias, o foco continuou muito centrado no fato em si, sem um olhar mais detalhada do entorno. Jornalistas alertados de algumas situações só faziam perguntar se poderiam gravar o depoimento. Um deles entrou em forte discussão comigo e só calou quando lembrei-lhe que era jornalista e sabia a importância de buscar fatos, notícias, e que se eu não queria dar depoimento gravado era dever dele buscar outros que o dessem.
‘A não-interdição da rua Eugênio de Medeiros, que pela lógica deveria ter sido declarada área de emergência, só passou a despertar o devido interesse quando as notícias focadas no sangue começaram a minguar. Aí todos se tornaram mais acessíveis.
‘O acidente do Metrô ainda tem de gerar muita notícia, porque é claro que não temos um planejamento prévio para situações de emergência como esta ou outras muito mais simples. Basta pensar que a cidade não consegue pensar na sua Maratona sem tomar o assunto como um grave problema para a fluidez do trânsito. Falta um coordenador de emergências que tenha treinamento e seja o responsável direto pela logística da situação. Falta uma equipe para trabalhar com ele. Falta equipamento. Falta tentar dar um tom que seja menos uma opereta trágica. É necessário humanizar o processo.
‘Não é a cobertura 24 horas que faz a boa notícia, mas a capacidade de dar uma visão universal da situação. E como universal digo neutra, consistente, sólida. Gerar culpados é muito fácil. Entender de fato o que aconteceu é dificílimo. E o que estamos vendo é fogo fátuo – corpo morto que iluminará a escuridão por uns segundos e se perderá para o sempre.’
Pêlo em ovo
É ofensiva a mais leve insinuação de que o respeitadíssimo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo) talvez seja suspeito para investigar a cratera do Metrô, por já ter prestado serviços à obra. O IPT, até hoje, demonstrou alta competência técnica e jamais teve apontado qualquer deslize ético. Até prova em contrário, o IPT é neutro e sabe o que fala.
O banco da Mãe Joana
O jornalista Leonardo Sakamoto comenta com alta precisão, em seu blog, a campanha publicitária em que o Banco do Brasil assume o nome de seus clientes. Cita uma frase da campanha: ‘O BB oferece soluções em produtos e serviços e atendimento que são melhores e mais adequadas às necessidades de cada cliente’. E completa:
‘Sinceramente, se o banco fosse meu, da Maria, do João, não cobraríamos de nós mesmos taxas de cheque especial de 142,47% ao ano. Isso, além de não ser ‘adequado a nossas necessidades’, é também uma distorção da realidade’.
Pode ou não pode?
O Instituto Fernando Henrique Cardoso recebeu doação de 500 mil reais da Sabesp, a estatal de saneamento básico de São Paulo. O governo paulista é controlado pelo PSDB, o mesmo partido de Fernando Henrique.
Esquisito, né? Mas não é isso que vamos debater neste portal jornalístico. A notícia foi publicada de acordo com aqueles parâmetros confortabilíssimos, simplesmente declaratórios, em que a reportagem não é acionada: o instituto diz que a doação é legal, os adversários de Fernando Henrique dizem que o fundo não pode receber doação de uma estatal, ainda mais ligada ao governo tucano.
Daria mais trabalho, mas seria muito melhor, verificar se o caso é legal ou não, e esclarecer este fato na reportagem. Ficaria em debate apenas a questão moral, ética – que, aí sim, depende muito da opinião de cada depoente.
Los hermanos
O Mercosul se reúne e a imprensa cobre os fatos diversos: se Chávez recebeu ou não a condecoração, quem veio e quem faltou, essas coisas.
Faltou noticiar a grave crise do bloco econômico regional: Tabaré Vasquez, o presidente uruguaio eleito com apoio de Lula, político tradicionalmente de esquerda, está pronto a assinar acordo bilateral com os Estados Unidos (quando o Mercosul, por definição, só pode assinar acordos em bloco com países de fora). Vasquez e o argentino Néstor Kirchner brigam por uma fábrica de celulose no rio que divide os dois países. Lula foi chamado pelo uruguaio a mediar a crise, mas sabe como é: era a campanha, eram as festas, eram as férias, são as viagens, e mediação, mesmo, nada. Kirchner briga com o Brasil fora do bloco (na Organização Mundial do Comércio) por causa de uma fábrica de plásticos para garrafas de refrigerantes.
Tudo bem no Mercosul – tudo bem enquanto não funcionar. A cada vez que se tenta botar o bloco em funcionamento, emperra tudo – inclusive a imprensa.
E eu com isso?
Este colunista vive implicando com informações irrelevantes que se espalham pelos meios de comunicação. Paris Hilton, por exemplo, vira notícia sempre que troca de calcinha – isso quando há calcinha para trocar. Artistas da Globo, então, são divulgados quando passeiam na praia, quando vão ao cinema, quando não vão ao cinema, quando tomam sorvete.
Mas, se as informações são irrelevantes, são também compreensíveis.
Agora a coisa se complica:
1.
‘Com decote, Preta Gil senta no chão e canta temas de novela’Como diria o grande Ancelmo Góis, lá na minha terra não é com decote que a gente senta, não.
2.
‘Uma comemoração do dia de Martin Luther King sem sua viúva’Ainda bem: Coretta King, que como o marido foi símbolo da luta contra o racismo, morreu no ano passado.
3.
‘Editora inglesa Gloria Books restitui Juca Kfouri’Alguém sabia que Juca Kfouri tinha sido seqüestrado? E aquele rapaz simpático, que comenta futebol com grande conhecimento, será apenas um clone do nosso companheiro de trabalho?
4.
‘Patrícia de Sabrit reaparece grávida de seu primeiro filho’Patrícia de Sabrit já teria aparecido grávida de seu primeiro filho, para poder, agora, reaparecer?
5.
‘Bolsas para afrodescendentes podem ser concedidas a alunos’Se não fossem concedidas a alunos, para quem mais iriam as bolsas de estudos?
6.
‘Comitê estuda alerta contra tubarões nas estradas de PE’Não, não seja maldoso: trata-se dos tubarões terrestres. Dos que devoram polpudíssimos pedágios, dos que mordem taxas cada vez maiores dos proprietários de veículos sem aplicá-las nas rodovias. E, especialmente, dos mais ferozes de todos, os insaciáveis tubarões cobradores de impostos.
Como é mesmo?
A moda dos títulos flexíveis (você escolhe o final) está se espalhando. Nesta semana, temos alguns exemplos maravilhosos:
1.
‘Filhos a mais, um bônus para a economia, mas insuficiente para as’2.
‘Cruzeiro de luxo com turistas brasileiros a bordo ainda encalhado no Rio da’Uma novidade: títulos contraditórios, um logo depois do outro.
Ping – Comprar pontos em carteira de habilitação é crime
Pong – Vender pontos em carteira de habilitação é crime
Os grandes títulos
Este colunista ficou em dúvida entre dois magníficos exemplares. Alguém, com certeza, deve saber o que querem dizer.
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‘Rádio de concurso por Wii que acabou em morte demite equipe’**
‘(Fulano) é o novo vice-presidente da APC, fornecedora de sistemas de alta disponibilidade para infra-estrutura física para redes críticas’******
Jornalista, diretor da Brickmann&Associados