Estou em Nova York ouvindo Johann Sebastian Bach (1685-1750) e relendo Herbert Marshall McLuhan (1911-1980). Coisas que já fazia décadas atrás, quando tudo era novo para mim. No mundo da tecnologia (e em outros mundos também), o novo é um valor supremo. Um rei. Um deus. Precisa ser adotado rapidamente, sob o risco de parecer “ultrapassado” ou “velho”.
Depois que entendi que estava sofrendo com sintomas de um mal bem contemporâneo, que nos EUA ganhou o nome de IAD (Internet Addiction Disorder), comecei a pensar este tipo de coisa: o velho é ruim? A resposta é óbvia, mas precisa ser dita de novo. É claro que o velho não é ruim. O ruim é ruim. E o bom é bom. O velho pode ser ruim ou bom, assim como o novo. Outro dia, serva voluntária da internet, num gesto mecânico atualizei o aplicativo de um dicionário. Para quê? Perdi tempo e ganhei um monte de propaganda invasiva, prejudicando o uso do dicionário. Claro que resolveram “monetizar” o produto, como se diz nas corporações. Está bem. É justo. Mas piorar subitamente a vida do público é um pecado que as empresas não deveriam cometer, se alguma coisa além do dinheiro rápido interessar.
Tem jeitos e jeitos de monetizar produtos. Tem jeitos e jeitos de fazer publicidade, branding e comércio. Não é preciso irritar o consumidor. É preciso servi-lo. De preferência encantá-lo. É por isso que a Apple cresceu tanto. Ela sabe encantar. Só que a Apple, depois do iPhone e do iPad, ficou grande demais. E perdeu seu timoneiro, Steve Jobs (1955-2011), que preferia a perfeição ao dinheiro rápido. O fato é que hoje meu iPhone 4 às vezes trava e preciso apelar à tática que antes usava com a Microsoft: desliga e liga de novo.
A vaidade de parecer “antenado”
Também tenho notado erros frequentes de sincronização de dados, já que uso vários aparelhos. Nomes da minha agenda foram duplicados, triplicados, quadruplicados à minha revelia, depois que adotei o serviço de “nuvem” da Apple: primeiro o MobileMe (aquele que fez Jobs demitir um executivo de forma humilhante) e depois o iCloud.
Sou do ramo. Sei como é difícil trabalhar na vanguarda da tecnologia. Mas as empresas precisam entender que o público não é apenas um número, uma estatística, um bem a ser explorado e esfolado. O público merece respeito. Outro dia, meu marido foi à Vivo em São Paulo abrir um plano familiar. Quando questionou o estratosférico valor da conta de nosso filho, o atendente falou candidamente: se ele tivesse reclamado, teríamos baixado o preço. Que beleza. A culpa é nossa! O custo varia conforme a raiva do consumidor. Ameaçou cancelar, a empresa amacia. Quanto tempo e saúde perdemos com esse tipo de raiva?
Justo por ser viciada em internet e profissional do ramo há tantos anos, digo com tranquilidade: o velho pode ser melhor que o novo. Geralmente não há por que ter pressa. A não ser que a vaidade de parecer “antenado” ou “moderno” fale mais alto. Olha só que termos velhos eu usei. Foi de propósito!
#prontofalei
Quando troquei o iPhone 3 pelo 3S, fiquei decepcionada com a mínima diferença. Quando troquei o primeiro iPad pelo iPad 2, também fiquei um pouco decepcionada. Veio com câmera, que pouco uso, mas é mais espesso e a capa nova desmontava fácil, além de não proteger a parte de trás. OK, troquei a capa, só que ele ficou mais espesso ainda.
Quando veio o iPad 3, chamado apenas de “novo” iPad, fiquei com preguiça. Não senti que precisava de um novo iPad. Aí ouvi de quem comprou que agora precisava também trocar o computador porque se acostumou com a tela de maior definição.
O Retina é o melhor computador já feito na história? Lindo. Mas não vem com leitor de DVD. E a Netflix não transmite online certos filmes que preciso ver. Mas pode mandar o DVD. E o YouTube também não tem os filmes porque o cinema americano sabe defender seus direitos. E eu não estou a fim de baixar pirata nem de tentar outros serviços porque estou ocupada. Como se diz no Twitter, #prontofalei.
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[Marion Strecker é jornalista, cofundadora e correspondente do UOL em San Francisco]