Pelo voto de desempate de seu Presidente, Desembargador Moacir Pessoa, e adotando o voto do relator, Desembargador Carmine Savino Filho, a 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro determinou hoje o trancamento da ação penal instaurada contra Ancelmo Gois. A denúncia contra o jornalista deveu-se à divulgação, em sua coluna no Globo, do resultado de um julgamento em que um desembargador foi condenado por dano moral a uma juíza de Direito a quem dera voz de prisão e acusara de crime de prevaricação.
Por dois votos a um, foi vencido o Desembargador Luiz Leite de Araújo, que votou pela continuação da ação penal por entender que o mérito do processo não podia ser examinado no âmbito de um pedido de habeas corpus. A 6ª Câmara Criminal, porém, entendeu que o processo contrariava o Inciso 4º do Artigo 5º da Constituição da República, que assegura aos jornalistas o direito de preservar suas fontes de informação.
A defesa de Ancelmo Gois foi feita por Alcyone Vieira Pinto Barretto. Este declarou na abertura de sua intervenção que, mais do que defender o jornalista, estava defendendo a liberdade de imprensa, gravemente ofendida pela denúncia contra seu cliente. O advogado ressaltou que várias anomalias marcaram a tramitação do processo, como o sumiço nos autos do texto de um dos dois depoimentos prestados pelo jornalista durante a investigação policial e o fato de ter ocorrido em segredo de Justiça, com violação das disposições legais, o que foi corrigido em segunda instância pelo Desembargador Fonseca Passos, que revogou o tratamento sigiloso.
Direito assegurado
A representante do Ministério Público, Rosangela Canellas, manifestou-se pela mudança de habeas corpus para trancamento da ação penal, apresentando, entre outros motivos, o fato de que o litígio entre o desembargador e a juíza, ainda que tivesse tramitado inicialmente em segredo de Justiça, era conhecido por todos os freqüentadores habituais do Tribunal. Ancelmo Gois, portanto, não havia cometido qualquer violação de sigilo funcional, uma vez que a informação divulgada em sua coluna era pública e notória.
O Desembargador Moacir Pessoa, que proferiu o voto de desempate, discordou do colega Luiz Leite de Araújo em sua invocação da recente condenação da jornalista norte-americana que não revelou a fonte de informação. Moacir Pessoa disse não conhecer a legislação dos Estados Unidos acerca da questão, certamente divergente do Direito brasileiro nesse ponto: ‘A Constituição Federal’, afirmou, ‘assegura aos jornalistas o direito de não revelar suas fontes.’
O julgamento foi acompanhado pelo Presidente da ABI, Maurício Azêdo, e o Assessor-Chefe de Comunicação Social do Tribunal de Justiça, jornalista José Carlos Tedesco.
Denúncia descabida
Em resposta ao expediente que lhe foi enviado pela ABI, o Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Marfan Martins Vieira, considerou descabida a denúncia contra o jornalista Ancelmo Gois, por divulgar o resultado de uma ação judicial em que eram partes adversas um desembargador e uma juíza de direito, e informou que o Ministério Público estadual se manifestará nos autos do processo – que será julgado amanhã, às 15h, pela 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça – pelo arquivamento do feito e trancamento da ação penal proposta.
Tal como sustentou a ABI, em declaração emitida em 30 de junho, e também o advogado de Ancelmo, Alcyone Vieira Pinto Barreto, o Procurador-Geral Marfan Martins Vieira considera que faltou fundamento jurídico para o enquadramento do jornalista no Artigo 325, Parágrafo 2º do Código Penal, que pune violação de sigilo profissional, uma vez que o jornalista não é funcionário público e, portanto, não poderia ser denunciado como se o fosse.
O Procurador Marfan assinalou também que Ancelmo foi enquadrado como co-autor do delito alegado, sem que a investigação policial tivesse identificado o serventuário da Justiça que teria sido o principal agente da ação criminosa.
Além da ABI, expressaram sua solidariedade a Ancelmo Gois o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que denunciaram o caráter inconstitucional do processo movido contra ele.