Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Todos os lados da verdade

No jornalismo, como na vida, o equilíbrio pode ser algo incontestavelmente bom. Porém, enquanto o equilíbrio pode ser necessário para mediar uma discussão entre irmãos adolescentes, um outro tipo de equilíbrio – algumas pessoas o chamam “falsa equivalência” – vem sendo cada vez mais contestado. O pelotão de fuzilamento é o público: os leitores e telespectadores que confiam numa notícia correta para torná-los cidadãos informados, comenta, em sua coluna [15/9/12], a ombudsman do New York Times, Margaret Sullivan.

Resumindo, o falso equilíbrio é a prática jornalística de dar igual peso aos dois lados da história, sem considerar a verdade comprovada de um dos lados. E muita gente está cansada disso. Não querem ouvir mentiras, ou meias-verdades, ganhando crédito de um dos lados e demolindo o outro. Querem respostas de verdade. “Recentemente, vêm sendo feitas pressões para que haja mais agressividade na verificação dos fatos e no esclarecimento da verdade”, disse Richard Stevenson, editor de política do NYTimes. “É uma das tendências mais positivas no jornalismo de que me lembro.”

Isso faz parte de um movimento – que resultou, em parte, de um público mais exigente, estimulado por críticos da mídia, blogueiros e frequentadores do mundo das mídias sociais – para mostrar a verdade, e não apenas argumentos contraditórios que levam à confusão. Você tem o direito a ter opinião, mas não a ter os fatos, como diz Patrick Moynihan, novamente citado no blog Press Think por Jay Rosen, da Universidade de Nova York, um crítico da mídia que faz pressão com o argumento da verificação dos fatos.

Responsabilidade pelo que não é verdade

A solução, é claro, é determinar os fatos, identificar e estabelecer a verdade. Editores e repórteres dizem que isso nem sempre é fácil. Às vezes, os leitores que exigem “apenas os fatos” estão, na verdade, exigindo sua versão dos fatos. “Há uma tentação em dizer que existem fatos objetivos e opiniões e nós deveríamos usar apenas fatos objetivos”, disse David Leonhardt, diretor do NYTimes em Washington. “Mas o espectro é grande. Temos que fazer juízos analíticos sobre a veracidade de todo tipo de informação.”

Além do mais, repórteres e editores muitas vezes têm que fazer essas verificações em prazos muito curtos, como ocorreu após o discurso de Paul Ryan no mês passado, na convenção do Partido Republicano que continha algumas afirmações que posteriormente mostraram ser ambíguas. Outros discursos, em ambas as convenções políticas, tornaram-se pontos críticos para a discussão sobre verificação dos fatos e falso equilíbrio.

Em particular nesta época intensamente política, leitores e críticos de mídia querem que os jornalistas assumam maior responsabilidade pelo que é verdade e pelo que não é. E os leitores ainda querem que isso seja feito de imediato, e não em artigos de suíte, dias depois. “Compreendo o ponto de vista deles, mas temos que ter muito cuidado, em especial com os prazos de fechamento”, disse Leonhardt.

“Não cabe a nós discutir o assunto no jornal”

Os leitores são rápidos em citar exemplos. Vários dos que escreveram a Margaret pensavam que havia um elemento de falso equilíbrio num recente artigo de primeira página do NYTimes sobre as batalhas legais referentes a alegações de fraude eleitoral e restrições ao voto – tópicos importantes que podem afetar a corrida presidencial.

Em seu artigo de segunda-feira, o repórter Ethan Bronner esforçou-se em mostrar equilíbrio. Alguns leitores dizem que ao fazê-lo, a matéria sugeria, equivocadamente, que havia um potencial de fraudes eleitorais que justificaria exigências mais rigorosas na identificação do eleitor – normas que alguns membros do Partido Democrata acreditam equivaler a restrição de voto. Ben Somberg, do Centro por Reformas Progressivas, disse que o próprio NYTimes estabelecera, em inúmeras matérias, que existiam poucas provas de fraude eleitoral. “Espero que não seja política do NYTimes levar este assunto de volta para o campo do ‘ele disse que ela disse’”, escreveu.

Sam Sifton, editor da seção de notícias nacionais, refutou o argumento. “Há muitas discordâncias razoáveis de ambos os lados”, disse. Um dos lados diz que a fraude eleitoral não é significativa; o outro diz que a restrição ao voto não é significativa. “Não cabe a nós discutir o assunto no jornal”, reforçou Sifton. “Temos que publicar o que cada lado diz.” Bronner concordou. “Ambos os lados ficaram com raiva e com suspeitas um do outro”, alegou. “O objetivo da matéria é dar um passo atrás e olhar para os dois lados.” Embora concordasse que não havia provas concretas de fraude eleitoral pessoal, o repórter afirmou que esse não era a questão fundamental no caso.

Ajudar o leitor

Em outros temas, o NYTimes fez claros progressos, evitando o falso equilíbrio. A questão frequentemente aparece relacionada a matérias científicas, em particular as que envolvem mudanças climáticas. O jornalão frequentemente assume o discurso de que há provas, cada vez mais nítidas, que indicam que o fator humano causa as mudanças climáticas, porém não rejeita as posições céticas. De modo semelhante, o falso equilíbrio tornou-se um tema durante a discussão sobre ensinar o “desenho inteligente” (ou seja, o argumento de que certas características do universo e dos seres vivos são mais bem explicadas por uma causa inteligente, e não por um processo não-direcionado como a seleção natural) vs. teoria da evolução. O jornal abordou o assunto com a seguinte abordagem: “Não há um desafio científico com crédito à teoria da evolução como explicação para a complexidade e diversidade de vida na Terra. Tribunais determinaram, por várias vezes, que o criacionismo e o desenho inteligente são doutrinas religiosas, e não teorias científicas.”

O editor assistente Philip B. Corbett resumiu a questão da seguinte forma: “Acho que os editores e os repórteres estão atualmente mais dispostos do que no passado a averiguar reivindicações e afirmações, na política e em outras áreas, e tentar realmente ajudar os leitores a resolver questões controvertidas.” O jornal não tem orientações por escrito para os repórteres sobre o falso equilíbrio. “E como seria possível, se cada situação é diferente?”, disse Corbett.

Os jornalistas devem fazer todos os esforços no sentido de superar a confusão e ajudar os leitores a saberem no que acreditar, ajudá-los a superar assuntos complicados e conflitantes. Quanto mais as organizações jornalísticas estabelecerem as verdades, e as apoiarem, tanto melhor será para os leitores – e para a democracia.