Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Manuel Pinto

‘Será o Partido Comunista Português (PCP) discriminado e prejudicado pelo Jornal de Notícias? Dito por outras palavras haverá, neste diário, uma atitude deliberada de silenciar esta força política ou a coligação na qual concorre habitualmente a eleições?

Nos últimos meses, têm sido várias as queixas vindas deste sector do espectro político-partidário, que dão conta de descontentamento com o modo como o JN o trata nas suas páginas, seja na cobertura noticiosa, seja no terreno da opinião.

Em 16 de Dezembro último, a Direcção da Organização Regional do Porto (DORP) do PCP deu a conhecer ao provedor cópia de cartas enviadas ao director do JN em Setembro e também em Dezembro, sobre a parte da opinião.

(Abro aqui um parêntesis para esclarecer que, não fazendo a matéria opinativa parte da esfera de competências do provedor, a decidi tratar aqui por razões que se prendem com o teor das considerações feitas pelos dirigentes comunistas).

Recordava a carta da DORP que ‘durante mais de uma década, o Dr. João Amaral, na qualidade de militante e como dirigente e deputado do PCP, foi responsável por uma crónica semanal’ neste jornal. Após a sua morte, foi convidado como colunista o engº Edgar Correia, ‘já então em linha de colisão com o PCP, Partido de que viria a ser expulso’, refere a carta. Depois de observar que ‘não existe em qualquer órgão de imprensa portuguesa outro exemplo de um comentador que tão ofensiva, continuada e tantas vezes caluniosamente ataque um único Partido’, a DORP propõe que, ‘retomando o espírito inicial, o JN abra, novamente, um espaço semanal que permita a uma personalidade indicada pelo PCP, exprimir, de forma independente, a sua própria visão dos problemas do nosso tempo’. ‘O facto de haver militantes do PCP que escrevem no JN não invalida o que é dito, pela sua diferente periodicidade e modelo de colaboração’ – acrescenta a missiva que lembra as ‘tradições pluralistas’ que ao JN ‘granjearam prestígio e popularidade’.

O Director de Redacção, José Leite Pereira, instado pelo provedor a comentar a posição da Direcção, esclareceu ‘Tivemos, em tempos, com grande gosto nosso, João Amaral como colunista. Quando ele morreu, convidámos Edgar Correia e, desde então, de tempos a tempos chegam protestos do lado comunista. Estamos, na Direcção, pouco preocupados com a filiação partidária das pessoas, embora não desconheçamos o seu alinhamento. E, relativamente ao PCP, Honório Novo escreve frequentemente no jornal’.

Digamos que o JN continua a ser predominantemente um jornal de …notícias. Basta ver que, ao contrário de outros diários, a sua zona específica de opinião surge, por regra, relativamente longe das primeiras páginas. Mas isso não tira que a questão da opinião seja importante, do ponto de vista editorial. Este jornal, tanto pela tiragem como sobretudo pela circulação e audiência, é lido diariamente por largas centenas de milhar de pessoas.

A existência de um leque de colunistas que se pronunciem sobre a actualidade a partir de horizontes de experiência e pontos de vista diversificados é medida de elementar bom senso, visto que desse modo mais leitores se sentem identificados com o serviço que o jornal lhes presta e motivados para sua leitura. Mas é essencial que tais espaços não se transformem numa espécie de ‘tribuna partidária’ (como também concorda José Leite Pereira). De resto, esse seria o caminho mais directo para afastar leitores. Mais importante do que ter colunistas que se assumem como ‘porta-vozes’ de instituições da sociedade civil e do Estado será porventura ter pessoas qualificadas que, de forma regular ou circunstancial, contribuam para analisar os significados do que se passa no mundo, assim habilitando o exercício de uma cidadania mais esclarecida. (A este propósito, não deixa de ser preocupante que, salvo uma ou duas excepções, este jornal praticamente não tenha mulheres entre os seus mais de 30 colunistas).

Mas há um ponto da carta da DORP do PCP que parece ao provedor não ser aceitável num jornal que se quer independente dos vários poderes é aquele em que é proposto à Direcção deste jornal que seja o PCP a indicar um eventual colaborador regular. O Director de Redacção diz desconhecer ter havido qualquer prática desse tipo no passado. Mas seria motivo de preocupação que alguma vez o jornal tivesse adoptado ou viesse a adoptar uma prática desse tipo. Para o PCP ou para qualquer outra organização. É ao JN que cabe escolher o naipe de colaboradores que pretende ter a escrever nas suas páginas (incluindo o próprio provedor).

Em resumo, aceitando como desejável que o jornal tenha entre os seus colunistas personalidades de todos os quadrantes (incluindo, naturalmente, do PCP), julgo que o critério primeiro não deve residir na orientação ideológica ou partidária, mas na riqueza e independência da leitura dos fenómenos de actualidade. Que também não é – ou não tem de ser – contraditório com tal filiação. Do ponto de vista dos leitores é aí que bate o ponto. Mas reconheço que o assunto tem ‘pano para mangas’.

São necessários colunistas que ajudem a ler o mundo.

Provedores do leitor em auto-retrato

Os provedores do leitor do Diário de Notícias, do Jornal de Notícias e do Público encontram-se na terça-feira, às 18 horas, em Lisboa, para debater o exercício da função e fazer um balanço da experiência desenvolvida. O motivo é a apresentação do livro ‘Em Nome do Leitor – As colunas do provedor do Público’, de Joaquim Fidalgo (Edições Minerva – Coimbra), livro que será apresentado por Fernando Correia, da instituição anfitriã, a Universidade Lusófona.

A fase seguinte depois da catástrofe

É mais difícil à imprensa do que à televisão continuar a manter viva e destacada a cobertura da catástrofe do sudeste asiático. Depois de algum atraso no envio de jornalistas seus para o terreno, o JN tem tido, desde há mais de uma semana, um extenso trabalho de reportagem, através da enviada Ivete Carneiro ao Sri Lanka, e desde há dias, de um segundo enviado, agora em Aceh, na Indonésia – o editor executivo Domingos Andrade.

À enormidade e excepcionalidade do desastre tem correspondido uma movimentação também ela excepcional, que, no entanto, pode ser ainda resultado do efeito de choque. Daí que o seguimento do assunto seja decisivo. A par da acção humanitária e das pequenas-grandes histórias que nos dão notícia das grandezas e misérias que em tais conjunturas sempre emergem, importa não perder de vista a iniciativa organizada, à escala local, nacional e internacional, as operações que estão a ser montadas pela ONU, os problemas político-diplomáticos a vencer, as questões culturais e económicas envolvidas, a investigação científica, as políticas de prevenção, etc. Enfim um assunto a manter no topo da agenda mediática.’