Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Laura M. Holson

‘Quando a indústria cinematográfica se reunir para brindar os vencedores e derrotados no Globo de Ouro, domingo à noite, no Beverly Hilton, o drama mais comentado de Hollywood talvez seja a separação entre Bob e Harvey Weinstein, co-fundadores da Miramax, e a Walt Disney.

Executivos da Disney e representantes da Miramax, controlada pela empresa sediada em Burbank, devem se reunir esta semana ou na semana que vem para discutir que projetos criativos os irmãos Weinstein poderiam levar quando saírem da Disney.

Harvey Weinstein pediu para manter os projetos que envolvem cineastas mais próximos dele, segundo três negociadores envolvidos nas discussões: um filme ainda sem título de Quentin Tarantino e um projeto adaptado por Anthony Minghella.

As duas partes reconheceram que os filmes a serem dirigidos por cineastas leais aos Weinstein talvez não sejam produzidos na Disney caso Harvey Weinstein não esteja envolvido. A Disney parece disposta a vender esses projetos aos Weinstein, disseram os negociadores. Resta determinar o preço, e se a Disney manterá participação nos projetos.

As discussões não se limitam aos numerosos filmes já concluídos e roteiros em produção, mas incluem livros, programas de televisão e peças que interessam aos Weinstein. ‘Talvez seja um divórcio, mas é um divórcio com filhos’, disse um dos negociadores.

Representantes da Disney e da Miramax se recusaram a comentar a separação. Matthew Hiltzok, porta-voz da Miramax, disse que ‘o foco dos Weinstein é continuar maximizando a lucratividade de seus filmes e chegar a uma solução amigável com a Disney’.

As duas partes estão negociando há mais de um ano para resolver sua disputa quanto à prorrogação dos contratos dos Weinstein, pela Disney, para além de setembro de 2005. A Disney adquiriu a Miramax dos irmãos em 1993, por US$ 80 milhões. A subsidiária, no passado conhecida por filmes pequenos e independentes, vem desde então produzindo projetos recheados de astros e ganhadores do Oscar como ‘Shakespeare Apaixonado’, bem como material de grande popularidade como a série ‘SpyKids’, realizada pela Dimension Films, uma unidade do grupo.

Diversas alternativas de parceria entre Disney e Miramax foram exploradas, incluindo um plano, depois abandonado, sob o qual Bob Weinstein, irmão de Harvey e responsável pela bem-sucedida Dimension Films, ficaria na Disney enquanto o irmão sairia para formar empresa separada.

Em novembro, a Disney estava inclinada a uma separação, enquanto preparava documentos para apresentação às autoridades financeiras sobre a composição da companhia. Mas nos documentos apresentados em dezembro, não havia menção a uma possível separação, ainda que a Disney afirmasse que seu investimento na Miramax não continuaria ‘no mesmo nível’ depois que os contratos dos Weinstein expirassem. A Miramax pós-Weinstein teria orçamento da ordem de quase US$ 300 milhões, segundo executivos da Disney.

Alguns dos envolvidos estimam que a Disney pagaria aos Weinstein mais de US$ 100 milhões, incluindo bônus, no final de seus contratos. A Disney, disseram os negociadores, não exigirá que eles assinem uma cláusula que os proibiria de concorrer com ela, algo que os estúdios de cinema muitas vezes exigem quando liberam executivos antes do fim do contrato. Mas quem fica com o nome Miramax, derivado dos nomes dos pais dos Weinstein, Miriam e Max? Os dois negociadores alegam que as partes haviam concordado em não discutir se os Weinstein poderiam comprar o nome de volta antes que todos os itens tivessem sido acertados. (Tradução de Paulo Migliacci)’



OSCAR
Artur Xexéu

‘Meu palpite para o Oscar’, copyright O Globo, 16/1/05

‘Pode anotar. O Oscar deste ano vai para um destes quatro filmes: ‘Sideways – Entre umas e outras’, de Alexander Payne; ‘O aviador’, de Martins Scorsese; ‘Menina de ouro’, de Clint Eastwood; e ‘Em busca da Terra do Nunca’, de Marc Foster.

Sem desmerecer as qualidades de píton do colunista (custei, mas achei o masculino de pitonisa), não é muito difícil chegar a esta conclusão. Não vi nenhum dos quatro filmes. Portanto, não estou pensando na qualidade deles quando aposto em seu favoritismo. É uma questão de probabilidades. Estes são os filmes candidatos a melhor do ano pela Associação Americana de Cineastas, a Directors Guild of America (DGA). E nos últimos 56 anos, o filme eleito pela DGA coincidiu 50 vezes com o filme escolhido pelos eleitores da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.

Na verdade, assim como no Oscar, são cinco os filmes indicados pela DGA. Mas o quinto filme é um desenho animado – ou filme de animação, como dizem os cinéfilos de hoje – ‘Os Incríveis’. E embora, todo ano, há quem acredite que uma produção do gênero disputará o Oscar de melhor filme, isso nunca acontece. ‘Os Incríveis’ é a barbada para a categoria de melhor desenho animado de longa-metragem. Portanto, sobram quatro mesmo.

Até quase o fim de novembro, a corrida ao Oscar parecia não ter favoritos. Por falta de opções, falava-se muito no musical ‘O fantasma da ópera’, que, até agora, não apareceu em nenhuma lista de premiados ou de candidatos a prêmios. Quando o primeiro prêmio foi anunciado – o da associação de críticos de Nova York – surgiu o primeiro favorito: ‘Em busca da Terra do Nunca’. Com um elenco de ouro – Johnny Depp, Kate Winslet, Dustin Hoffman e Julie Christie – o filme é uma biografia de J.M. Barrie, o autor de ‘Peter Pan’. Mas este favoritismo não se manteve nos anúncios que se seguiram ao da crítica nova-iorquina. De um momento para o outro, ‘Sideways’ tornou-se o único filme que importa.

Um filme ‘pequeno’, de pouca repercussão, ‘Sideways’ (um road-movie que se passa nas vinícolas da Califórnia) entrou em todas as listas de melhores do ano, quase sempre em primeiro lugar. No Globo de Ouro, foi o filme que obteve maior número de indicações – sete ao todo. Mas, como dizem os comentaristas do Oscar pela televisão, só a indicação já pode ser considerada como um prêmio. Tudo indica que ‘Sideways’ vá ser o ‘Seabiscuit’ deste ano. Em 2003, a história de um cavalo-de-corridas-fenômeno agradou a meio mundo, era muito simpático, sentimental, levou várias indicações para o Oscar, mas não ganhou uma estatueta sequer.

A disputa deve ficar entre ‘O aviador’ e ‘Menina de ouro’. O primeiro é a biografia de Howard Hughes; o segundo, um drama de box (gênero que parecia extinto), com a peculiaridade de ser estrelado por uma mulher, Hilary Swank. Eastwood já ganhou um Oscar recuperando outro gênero, o western, com ‘Os imperdoáveis’.

Pode levar o de melhor filme outra vez, mas não o de melhor diretor. Neste 2005, como resistir à nova candidatura de Martin Scorsese? Seria sua quinta indicação. Ele já perdeu em 81 com ‘Touro indomável’; em 89 com ‘A última tentação de Cristo’; em 91 com ‘Os bons companheiros’; e em 2002 com ‘Gangues de Nova York’. Um dos maiores cineastas vivos em atividade não tem um só Oscar na prateleira. Se não ganhar em 2005, nem que seja pelo conjunto da obra, é melhor desistir de vez.’



GLOBO DE OURO
Jaime Biaggio

‘Duelo final elo ouro’, copyright O Globo, 18/1/05

‘Aparentemente, está definida a final do Oscar: Martin Scorsese contra Clint Eastwood. Ao menos no Globo de Ouro, o mais festejado dos prêmios preliminares, cuja 62 edição ocorreu na noite de domingo, a impressão que ficou foi de que está tudo empatado: dois cineastas reconhecidos como autores, dois veteranos de filmografias sólidas, um deles até hoje não oscarizado , o outro a bordo daquele que é, aparentemente, seu melhor filme. Briga de cachorro grande.

‘O aviador’, a cinebiografia do magnata Howard Hughes dirigida por Scorsese, levou o Globo de melhor filme (drama); Eastwood levou o de direção, por ‘Menina de ouro’, seu relato da trajetória de uma jovem boxeadora. Hilary Swank (‘Meninos não choram’), que faz o papel, foi eleita melhor atriz em drama; Leonardo DiCaprio, que vive Howard Hughes em ‘O aviador’, foi o melhor ator na mesma categoria. ‘O aviador’ saiu da cerimônia com um prêmio a mais, mas em função de uma categoria secundária (melhor trilha sonora, composta por Howard Shore, o mesmo da trilogia ‘O Senhor dos Anéis’).

Favorito de primeira hora, ‘Sideways’ encolhe

E ‘Diários de motocicleta’, como previa seu diretor, Walter Salles, não levou o prêmio de filme em língua estrangeira. O vencedor, como ele especulara que seria provável, foi o espanhol ‘Mar adentro’, de Alejandro Amenábar (‘Os outros’), sobre a luta de um tetraplégico desiludido com a vida por seu direito de cometer suicídio.

Apesar de ter ganho o prêmio de melhor filme (musical/comédia) e ainda o de roteiro, ‘Sideways: Entre umas e outras’, de Alexander Payne, o grande papa-prêmios da temporada até o momento, certamente saiu do Globo de Ouro menor do que entrou. Se por nenhuma outra razão, só pela polarização que se estabeleceu entre os pesos pesados Scorsese e Eastwood, que tende a não deixar espaços para mais ninguém na briga diária pelos holofotes que ocorrerá até 27 de fevereiro, dia da entrega do Oscar. Mas não foi apenas por isso.

Já se esperava que, encerrada a fase das entregas de prêmios de críticos, a cota do filme começasse a diminuir. Por pura e simples questão de perfil: em tese (e a julgar pelo trabalho anterior do diretor Alexander Payne, o mesmo de ‘Ruth em questão’, ‘Eleição’ e ‘As confissões de Schmidt’), é um filme que teria mais apelo junto a platéias de gosto menos convencional. Os votantes do Globo de Ouro, um grupo de cerca de 90 pessoas de sensibilidades mais ou menos afinadas com as dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, meio que comprovaram a tese. Com todo o disse-me-disse prévio, os dois prêmios ganhos por ‘Sideways’ se configuravam como inevitáveis. Mas também os dois prêmios de interpretação para coadjuvantes pareciam certos para Thomas Haden Church e Virginia Madsen e, contudo, os envelopes revelaram os nomes de Clive Owen e Natalie Portman, de ‘Closer – Perto demais’, drama de matriz teatral dirigido por Mike Nichols. Categorias referentes a coadjuvantes podem ser, por definição, secundárias, mas prêmios (ou ausência deles) nelas são um ótimo termômetro do grau de simpatia por esse ou aquele filme.

Outros filmes que, em tese, estavam na disputa parecem ter morrido na praia. Casos de ‘Em busca da Terra do Nunca’, ‘Kinsey’, ‘Hotel Ruanda’, ‘O fantasma da Ópera’ e ‘Brilho eterno de uma mente sem lembranças’, que saíram sem prêmios dos Globos.’



MACHUCA
Ubiratan Brasil

‘Filme reabre feridas da ditadura chilena’, copyright O Estado de S. Paulo, 14/1/05

‘O cineasta chileno Andrés Wood não tinha mais que 7 anos quando acompanhou, pela televisão, o golpe militar liderado por Augusto Pinochet que derrubou o socialista Salvador Allende. Ele ainda guarda na memória alguns flashes daquele penoso 11 de setembro de 1973, que são reproduzidos em uma cena de seu novo filme, Machuca, que estréia hoje em São Paulo e no Rio, com 12 cópias. ‘Eu não tinha nenhuma consciência política, mas senti duramente os efeitos do golpe, como a escassez de alimentos que logo tomou conta do país’, contou Wood ao Estado, durante sua rápida passagem pela capital paulista, na segunda-feira.

O Wood adulto pouco lembra o roliço e sardento menino Gonzalo Infante, um dos personagens principais do filme, que é seu alter ego. Na história, ele é um garoto de família rica cuja rotina é alterada quando o colégio em que estuda, comandado por um padre inglês, recebe garotos pobres, moradores de uma favela próxima. Entre eles, Pedro Machuca com quem Gonzalo vai desenvolver uma afinidade, apesar do enorme abismo social que os separa.

‘A semelhança está na vivência, pois, na mesma época, eu estudava em um colégio de Santiago onde foram colocados meninos da periferia, o que me fez perder vários medos sociais’, conta o diretor, que reproduz no filme momentos tocantes, como a amizade entre os garotos, a descoberta da sexualidade e a infeliz certeza de que a posição econômica define o grau de liberdade de cada um. Wood lembra ter entrevistado antigos moradores da favela onde se passa a história, além de um padre que visivelmente inspira o inglês McEnroe, o cura que acaba deposto pelos militares. Uma das cenas, aliás, em que McEnroe come todas as hóstias do altar, pois não considera mais santo aquele espaço, foi detalhadamente narrada por esse padre.

A decisão de contar a história de uma amizade não seguiu apenas os desejos de rememorar o passado – Wood aproveitou o fio condutor para tocar em um tema ainda controverso no Chile, a deposição de Allende e a ditadura Pinochet. ‘Mesmo depois da redemocratização do país, a política não era um assunto abordado pelo cinema, pois se acreditava que não levaria ninguém às salas de exibição. Outro motivo, muito importante, é a divisão entre aqueles que são a favor e os que são contra Pinochet, aqueles que sabem que houve tortura e os que a negam’, explica.

Assim, com os fatos históricos ocupando o fundo do enredo, Machuca tornou-se um enorme sucesso no Chile (700 mil espectadores em 25 semanas), estendendo-se para diversos países europeus e latino-americanos. Wood desconversa, mas não consegue esconder sua enorme expectativa em relação aos indicados para o Oscar, cuja lista de finalistas será divulgada no dia 25. ‘Imaginar o filme entre os relacionados de melhor língua estrangeira seria uma quimera, mas mantemos as expectativas.’

Seria não apenas a comprovação de que o cinema chileno, no rastro do brasileiro e argentino, vive também sua fase de retomada, mas confirmaria ainda a vitalidade da nueva onda, termo com que a crítica internacional identifica o surgimento de uma nova leva de realizadores latino-americanos.

Machuca reúne, de fato, todas as principais características. Os garotos, que não eram atores, foram cuidadosamente ensaiados durante sete meses para que, durante os outros dois meses em que duraram as filmagens, respondessem em cena com naturalidade. Também a computação gráfica permitiu que fosse reproduzida com exatidão a Santiago de 1973, eliminando fios e postes que existem hoje.’



SOBRE CAFÉ E CIGARROS
Jaime Biaggio

‘Sobre Jarmusch’, copyright O Globo, 16/1/05

‘Jim Jarmusch não é um sujeito com quem discutir assuntos importantes. Nem a melhor pessoa para contextualizar seus filmes. Numa conversa com ele, assim como nas conversas de que são compostos os 11 curtas-metragens de que é composto ‘Sobre café e cigarros’, filme seu em cartaz em quatro cinemas do Rio, fala-se de bobagens aleatórias, muda-se de assunto do nada para voltar ao trilho lá adiante e, nesse fluxo sossegado, as características que tiverem que sobressair surgirão a seu tempo. Ele, que em dado momento se diz o cineasta mais lento do mundo, não tem a menor pressa (a entrevista deveria ter durado 20 minutos; durou mais de 40, e isso porque bateu um simancol no repórter).

– Ganhei um trem elétrico de Natal do Neil Young – conta ele, entusiasmado. – Neil é um dos donos da Lionel Trains (líder no mercado americano de trens de brinquedo) . O Ben, filho dele, tem paralisia cerebral. Ele inventou um jeito de fazer o garoto operar o trenzinho com a cabeça.

‘Minhas histórias são como canções’

E agora, para lembrar como o papo chegou a Neil Young? Bem, os dois são amigos. Jarmusch fez um filme sobre a turnê de Young com sua banda, Crazy Horse, em 1996 (‘Year of the horse’). Young fez a trilha de ‘Dead man’, polêmico western macambúzio de 1995 dirigido por Jarmusch e protagonizado por Johnny Depp. Ah, sim, ele disse que um dos prazeres desses 25 anos em que vem fazendo cinema (seu primeiro filme, ‘Permanent vacation’, é de 1980) é ter conquistado a amizade de músicos que sempre admirou, como os já falecidos Screamin’ Jay Hawkins, Joey Ramone e Joe Strummer e os vivos Tom Waits e Iggy Pop, que protagonizam um dos curtas de ‘Sobre café e cigarros’. Curta esse que é de 1993, por sinal. O que abre o filme, com Roberto Benigni, é de 1986, e chegou a ser exibido na TV brasileira na época.

– Fiz o primeiro meio que de farra. Aí, uns três anos depois, rodei o segundo (com Steve Buscemi e os irmãos de Spike Lee, Cinqué e Joie) . Fiz o terceiro, com Iggy e Tom. Chegou uma hora em que comecei a pensar que, já que estava me dedicando tanto a isso, poderia fazer mais alguns e extrair dali um longa-metragem. Sabe quando um cara tem umas seis canções e quer lançá-las, mas não dá para ele fazer um disco só com seis, aí faz mais algumas? Foi um pouco por aí.

As analogias musicais, como se vê, percorreram o papo na mesma medida em que percorrem o trabalho de Jarmusch, até quando esse trabalho parece dar uma guinada. Caso de ‘Ghost dog’, seu último longa-metragem propriamente dito, de 1999, protagonizado por Forest Whitaker, um filme esteticamente diferente do trabalho anterior de Jarmusch (ele admite que neste e em ‘Dead man’, tentou estabelecer mais subtemas e camadas de leitura do que faz normalmente). Whitaker vive um matador profissional adepto da filosofia dos samurais, interagindo com um universo mais próximo da barra-pesada exposta em muitas letras de hip hop. Mas, estruturalmente, a base do filme é… jazz.

– A estrutura daquele filme se inspira num típico tema de bebop, onde você estabelece linhas básicas, depois sai delas a gosto, improvisa e, mais à frente, retorna ao trilho que havia estabelecido. Foi nisso que me inspirei. Todas as formas de arte e de expressão me interessam. Mas minha forma de contar histórias tem a ver com canções.

Foi daí que se chegou ao Neil Young! Jarmusch está montando aquele que será seu próximo longa-metragem, e corria o boato (errado) de que era baseado numa canção de Young. Não é (há um personagem-citação a uma canção de Young). Mas é verdade que Bill Murray é o protagonista, vivendo um homem que sai atrás das mulheres que passaram por sua vida.

Seis anos depois, um novo longa

Jim Jarmusch gosta de atores que improvisem em cima do seu texto. Há muita improvisação nos curtas de ‘Sobre café e cigarros’, quase todos rodados num dia (aquele com Cate Blanchett, que vive duas primas nada gêmeas, era mais complexo e levou dois dias). Bill Murray, o rei da improvisação, contudo, não improvisou nada no set do novo filme, ainda sem título. Limitou-se a seguir o roteiro.

– Ele veio com uma paixão tal pelo texto que quis se ater a ele – conta o diretor. – Mesmo assim, a cada take , sem mudar uma vírgula, ele me dava uma cena inteiramente diferente.

Jarmusch fica por aí em relação ao filme novo. Não gosta de falar de algo que ainda está inacabado. Mas também não queria dar entrevistas sobre o filme velho, para ele uma página virada. Topou porque era para o Brasil.

– Estive no Rio duas vezes no mesmo ano e depois nunca mais, mas adoro e está na hora de voltar. Mika Kaurismaki (diretor finlandês, irmão do mais celebrado Aki Kaurismaki, cineasta-gêmeo de Jarmusch) já mora aí e agora Jonathan Shaw, um dos meus melhores amigos, que viveu no Rio nos anos 70, se mudou para aí em definitivo. Tenho lugares onde ficar.

E, de resto, Jarmusch? O que você conta? Ainda fuma muito? Ainda toma muito café?

– Só tomo chá agora. Fumo dez cigarros por dia. Eu fumava um maço e meio nos anos 80, até que fiz uma experiência e cortei café, cigarros, carne vermelha, açúcar, drogas, álcool, tudo de uma vez. Queria ver o que voltaria naturalmente.

E…?

– Nunca mais comi carne ou tomei drogas pesadas. Fumo maconha. Cogumelos de vez em quando, cada vez menos. Cigarro voltou. Cafeína voltou, mas na forma de chá. É engraçado como nós não pensamos em metade dessas coisas como drogas. Mas tente cortar todo o açúcar da sua vida de uma vez! Açúcar é uma droga poderosa. Por isso é que tem tanto apelo para as crianças.’



CINE DF
Helena Mader

‘Concurso estimula cinema no DF’, copyright Jornal do Brasil, 12/1/05

‘Produzir e finalizar um filme é um desafio que exige muita persistência e recursos financeiros. Mas a Secretaria de Cultura colocou à disposição dos novos e veteranos cineastas da cidade o edital de um concurso, que vai oferecer R$ 1,1 milhão para a finalização e lançamento de filmes produzidos no Distrito Federal. O governo pretende assim financiar cinco curtas em 16mm, cinco curtas em 35mm, além de sete longas-metragem em 35mm.

Para participar do concurso, a Secretaria de Cultura estipulou uma série de exigências: os filmes concorrentes devem ser inéditos e os produtores precisam morar no Distrito Federal há pelo menos três anos. Os filmes selecionados precisam também contar com pré-estréia ou exibição especial em Brasília.

As inscrições devem ser feitas no Pólo de Cinema e Vídeo Grande Otelo, até o dia 5 de fevereiro. Quem tem uma idéia na cabeça mas não tem dinheiro para viabilizar o projeto pode encontrar recursos para concluir o filme.

Depois de quatro anos debruçado sobre o roteiro de um curta-metragem, William Allves resolveu participar do concurso da Secretaria em 2003. Ele recebeu R$ 80 mil e pôde concluir o filme Teodoro Freire – o guardião do rito, sobre o conhecido maranhense que disseminou o bumba-meu-boi na capital e hoje é uma personagem de Brasília. Ele garante que os recursos foram essenciais para a realização do projeto – orçado em cerca de R$ 85 mil.

– O fomento à produção cultural é muito importante para a construção da identidade cultural da cidade. Ele é a mola propulsora para a criação de um mercado cinematográfico e acaba estimulando também a produção independente – garante William Allves. O curta sobre a vida de Teodoro, produzido em parceria com a cineasta Nôga Ribeiro, foi exibido na 36ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2003.

De acordo com a Secretaria de Cultura, o GDF investiu cerca de R$ 2 milhões na produção de filmes no ano passado. Mais de 30 filmes estão em fase de produção e finalização na cidade. Na programação da última edição do Festival de Brasília, 19 filmes eram produções candangas. A capital é atualmente o terceiro maior pólo de cinema do País, perdendo apenas para Rio de Janeiro e para São Paulo.

O diretor do Pólo de Cinema e Vídeo Grande Otelo, Fernando Adolfo, garante que o investimento de R$ 600 mil para a produção de curtas é o mais alto do País.

– A política cultural desenvolvida no DF está em sintonia com as ações tomadas pelo governo federal. Estamos trabalhando para incentivar novos talentos e assim formar as próximas gerações de cineastas – explica Fernando Adolfo.

Serviço

As inscrições devem ser feitas no Pólo de Cinema e Vídeo. Telefones: 387-2325 ou 487-3184′



INTEIRA OU MEIA?
Renata Caldas

‘Produtor critica benefício’, copyright Correio Braziliense, 11/1/05

‘Inteira ou meia? A pergunta é freqüente nas bilheterias de cinema e casas de espetáculos. Quem tem o benefício aproveita para enriquecer a vida cultural, pagando 50% do valor do ingresso. Quem não possui esse direito arca com o valor integral ou aproveita ‘promoções’ – como doações de alimento ou agasalho – para obter o desconto. Com o benefício estendido a mais uma categoria, o debate acerca da política implantada diante da obrigatoriedade da meia entrada volta à tona. Na prática, produtores de eventos culturais calculam custos e lucros com base no valor da meia, mas se queixam da ampliação do desconto.

Embora admita que o valor das produções seja calculado com base no preço da meia entrada, o produtor Carlos Henrique Rocha critica a concessão do desconto, que irá beneficiar mais de 55 mil professores. ‘Daqui a pouco, advogados e médicos vão dizer que também querem pagar meia. Ninguém paga meio livro ou meio CD. As produções são muito caras e fica difícil precisar quantas meias e quantas inteiras serão vendidas’, reclama.

Carlos Henrique Rocha espera rigor para emissão de documentos que garantam meia aos educadores. ‘Não existe rigor para emissão das carteirinhas de estudante. Espero que haja fiscalização com o comprovante dos professores’, sugere o produtor.

Na opinião de Alaôr Rosa, da Arte Viva Produções, o preço do ingresso deve aumentar. ‘Deveria existir mais diálogo entre deputados e produtores. Esse benefício sai de alguém. O produtor é quem vai arcar com a despesa, mas se for lei, iremos cumprir. A princípio, o impacto da lei é negativo porque pode encarecer ainda mais o preço do ingresso’, prevê. Para Alaôr Rosa, o governo deveria criar linha de crédito como maneira de baratear produções culturais, tornando os ingressos mais acessíveis à população.

Contrário à medida, Fernando Toledo, da Bravo Produções, aponta como conseqüência mais grave desse tipo de lei a provável elevação nos preços dos ingressos que, aqui em Brasília, já são sempre mais altos. ‘Sou um empresário como outro qualquer. Pago meus impostos. Estão fazendo média e quem concede o desconto não tem qualquer benefício. O ideal seria debater com a categoria antes de definir tais medidas.’

Quem paga meia?

De modo geral, os benefícios para estender a meia entrada ficam a critério de cada produtor. Além das categorias obrigatórias (estudantes e idosos), há outras que levam o desconto. Mesmo sem saber da lei que assegura meia a educadores, a produtora e diretora de teatro Miriam Virna concede o benefício a professores na temporada do espetáculo A loura e o detetive, em cartaz no Teatro Goldoni. ‘É uma forma de prestigiar uma classe tão desvalorizada. O ideal seria que os professores ganhassem bem para pagar o valor integral, afinal, formam cidadãos, mas a realidade é outra. Professores ganham pouco’, lamenta a diretora, professora da Faculdade de Artes Dulcina de Moraes.

Curiosamente, Miriam Virna amplia o desconto de 50% a outras categorias. ‘O importante é encher o teatro, fazer com que as pessoas assistam. Por escolha pessoal, pagam meia no espetáculo assistentes sociais, detetives e ‘louras falsificadas’, convida a diretora.

No Teatro dos Bancários, que pertence ao sindicato da categoria, o benefício se estende a bancários sindicalizados, que podem comprar até dois ingressos com valor de meia. No mesmo local, mais de 7 mil sócios do fã-clube da Cia de Comédia Os Melhores do Mundo têm o mesmo desconto válido para estudantes para ver peças do repertório do grupo.

Para assistir a espetáculos de música, teatro e dança no Conjunto Cultural da Caixa, funcionários e pensionistas da Caixa Econômica Federal pagam meia entrada. Já o Centro Cultural Banco do Brasil cobra inteira de funcionários do banco.’