Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Regina Lima

“É muito comum chegarem à ouvidoria correspondências de leitores alertando sobre erros de informações e falta de precisão em notícias publicadas na Agência Brasil. Mas são menos frequentes manifestações de leitores reclamando de desencontro de informações entre o que é anunciado no título e o que é dito no corpo das notícias.

É exatamente esse o teor da manifestação da leitora Tatiana Tenuto, do Distrito Federal (DF), que reclamou à ouvidoria, no dia 14 de agosto, que o título Brasília não terá VLT e vai construir rodovia para a Copa de 2014 não condiz com os fatos apresentados na própria matéria. Segundo ela, no terceiro parágrafo, informa-se que o vice-governador do DF ‘disse que para construir o VLT será feita uma nova licitação’. Mais adiante, a reportagem aponta que ‘apesar de não contar com o VLT para a Copa, o vice-governador disse que ele será muito importante para a cidade, 'pois não há mais como estruturar o transporte de Brasília sem esse meio de transporte'‘. Então, em algum momento, Brasília terá o VLT, certo? A meu ver, não é essa a ideia que o título passa, mas a de que o projeto do VLT será cancelado pra sempre. Seria melhor Brasília vai construir rodovia em vez de VLT para Copa de 2014, ou algo do tipo.

A Diretoria de Jornalismo respondeu: ‘A leitora tem razão, pois não se pode afirmar que Brasília não terá VLT. O que deveria ser dito é que Brasília não terá VLT a tempo da Copa de 2014. A manchete da matéria já foi corrigida’. Depois de corrigido, o título ficou: ‘Brasília não terá VLT para a Copa de 2014, mas vai construir rodovia’.

Entre janeiro e setembro de 2012, a ouvidoria recebeu nove demandas nas quais os leitores reclamaram dos títulos das matérias. Essas demandas podem ser classificadas de acordo com as funções que os títulos deixaram de cumprir, na opinião dos leitores. No caso citado acima, por exemplo, houve uma falha nas informações transmitidas no título e desmentidas no texto da matéria.

Dessas demandas, destacamos duas em que os títulos foram questionados pela utilização de termos considerados inadequados. Nos dois casos, os títulos alterados:

Quem usa aeroporto de Brasília espera melhoria dos serviços com a privatização. Um leitor questionou: ‘Esse título não está errado? O que houve, pelo que entendo, foi CONCESSÃO. Privatização foi o que o FHC fez com a Vale’. Embora os dois termos não sejam sinônimos – pode haver privatização sem concessão e vice-versa – há muitos elementos comuns aos dois procedimentos e ambos são aplicáveis às mudanças na administração dos aeroportos, como às transformações anteriores na gestão das rodovias e das empresas de telefonia. No entanto, são termos que adquiriram conotações político-ideológicas. Defensores do governo atual preferem o termo ‘concessão’ para distinguir suas ações das ‘privatizações’ dos seus predecessores. A ABr agradeceu o alerta do leitor e fez a correção, colocando concessão em lugar de privatização no título, além de substituir o termo em três lugares no texto, deixando o termo ‘privatização’ e seus cognatos inalterados em quatro.

Marconi Perillo lamenta queda de helicóptero que matou policiais e suspeito de chacina em Goiás. Um leitor escreveu: ‘A manchete Marconi Perillo lamenta queda de helicóptero que matou policiais e suspeito de chacina em Goiás é de uma falta de sensibilidade impressionante. Dá ao leitor a impressão de que o governador está preocupado com a perda do helicóptero e não com a morte dos policiais’. A ABr agradeceu ao leitor e mudou o título para Marconi Perillo lamenta a morte de policiais, em decorrência do acidente com o helicóptero da Polícia Civil. Esse caso lembra outro desiderato nos títulos, segundo uma dica das jornalistas Dad Squarisi e Arlete Salvador no livro A Arte de Escrever Bem, de que ‘ao definir o título, se deve sempre priorizar a humanização da matéria. Para que o resultado não seja um título frio, distante das pessoas e da sociedade. Assim, o que poderia transmitir a impressão de uma informação burocrática, toma forma de uma história mais próxima da realidade do leitor’.

Temos ainda um caso de título julgado falho pelos leitores por não transmitirem informações corretas. Em ambos, os títulos também foram alterados: Ipea estima que PIB brasileiro de 2011 seja muito abaixo do registrado no ano anterior foi alterado para Ipea estima que crescimento do PIB brasileiro em 2011 será menor que o do ano anterior depois de um leitor chamar atenção à diferença entre uma redução no PIB e uma redução no crescimento do PIB. O mesmo erro aparecia no texto da matéria e também foi corrigido.

Portaria define tipos de documentos considerados secretos foi alterado para Portaria define documentos do ITI considerados secretos em conformidade com a Lei de Acesso à Informação depois de um leitor reclamar que a portaria se limitou ao Instituto Nacional de Tecnologia da Informação. A ABr também substituiu o texto da matéria e publicou uma errata.

É como diz o teórico francês Maurice Mouillaud, especialista em análise de notícias de jornais impressos, o título não representa simplesmente uma variedade de enunciado em um corpus linguístico, nem um item no fluxo das informações, mas a inscrição do jornal por excelência (1). Quando os títulos aparecem nas páginas de um veículo da mídia impressa ou na capa de um site da mídia virtual, eles, juntamente com os demais elementos do layout (subtítulos, fotos, legendas, fontes tipográficas, disposição das colunas e a logomarca da empresa), são responsáveis pelo impacto estético do veículo.

Os títulos, em verdade, funcionam para as notícias como as vitrines funcionam para a loja, ou seja, expor os seus melhores produtos, com objetivo de atrair o consumidor. Os títulos, além de representarem a síntese do que vamos desenvolver na reportagem, tem, dentre suas funções, o objetivo de despertar o interesse do leitor, sintetizando o conteúdo da matéria e transmitindo informações corretas. Logo, sob hipótese alguma, pode divergir da informação e, ainda que as informações estejam corretas, deve conter termos precisos que não dão margem a interpretações erradas. Quando isso não acontece, a melhor forma é corrigir como fez a Agência Brasil.

Boa leitura.

1- Mouillaud, Maurice. O jornal:da forma ao sentido. Sergio Dayrell Porto, Adriano Duarte Rodrigues. Tradução: Sérgio Grossi Porto. Brasília: Paralelo 15, 1997.”