Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Ulisses Mattos

‘Esta semana, no tenebroso mundo da TV aberta, o tema principal foi a demissão de Clodovil da RedeTV!, onde apresentava o programa A casa é sua. O motivo para a casa deixar de ser dele foi que o ex-costureiro andou falando mal publicamente das colegas de emissora Luisa Mell e Luciana Gimenez. Fosse meses atrás, as ofensas de Clodovil talvez nem tivessem sido ouvidas. Mas ultimamente o apresentador vinha ganhando muita atenção da mídia. Tudo porque virou alvo de zombaria do pessoal do Pânico na TV, também da Rede TV! (os corredores da emissora devem ser lotados de seguranças). A perseguição dos humoristas a Clodovil, a quem pediam que calçasse as ‘sandálias da humildade’, em muito lembrou outro caso da peculiar história de nossa TV. A ressurreição de Supla.

Há muito já esquecido e praticamente abandonado pelo público, os pregos e parafusos das roupas de Supla voltaram a brilhar quando o sujeito passou a ser ridicularizado por Marcos Mion no programa Os piores clipes do mundo, da MTV. Mion, então vivendo o curto clímax de sua carreira, arrancava risos ao mostrar todo o humor involuntário do filho de Marta e Eduardo Suplicy nos clipes que gravou para suas músicas, que também não eram lá encaradas com muita seriedade. Em vez de meter um processo em Mion, Supla aproveitou a retomada do interesse por seu nome. Chegou até a aparecer na MTV para dar entrevistas e tudo mais. Em evidência, foi chamado para a Casa dos artistas, do SBT, onde foi finalista e uma das principais atrações. Supla deixou de ser apenas um cantor ignorado para virar um legítimo personagem de TV, sendo convidado até hoje de vários canais.

O artista deveria agora dar uma mão a Marcos Mion – que atualmente anda por baixo-, promovendo, quem sabe, um show beneficente no qual mostrasse o rapaz como um VJ passando por necessidades. Mion talvez agradecesse a suposta humilhação. Isso porque, por mais estranho que pareça, deve saber muito bem que é da ridicularização que uma celebridade televisiva pode se reerguer. Assim aconteceu com Supla. Assim acontecerá com Clodovil, se o estilista não errar a mão.

Clodovil é o nome do momento. Até um vídeo em que William Bonner, mais jovem – ainda sem os cabelos grisalhos que caem tão bem a um apresentador do Jornal nacional -, aparece imitando o ex-costureiro resolveu dar as caras na internet. Durante a semana, Clodovil foi ao programa de Tom Cavalcante na Record e elevou a audiência da atração. Há quem diga que ele até ganhará um emprego na emissora do bispo mais cedo ou mais tarde. Mas se a Síndrome de Supla estiver mesmo se repetindo, Clodovil pode ansiar por mais. Os momentos de glória do extinto TV mulher, da Globo, e do Clô para os íntimos, da finada Manchete – onde o apresentador eternizou a frase ‘olhe para a câmera da verdade’ – serão fichinha perto do futuro do sujeito. Basta que Clodovil invista tudo na sua veia de polemista. A TV brasileira adora polemistas.

Já imaginaram um programa de debates reunindo Clodovil, Fernanda Young, Diogo Mainardi, Jorge Kajuru e Arnaldo Jabor? De quebra, como mediador, um médium incorporando Paulo Francis. É claro que todos deveriam ficar amarrados em suas cadeiras, para que um não avançasse sobre os outros. Sabe-se lá. Nunca testaram um formato desses em laboratório.’



BAIXARIA NA TV
Janete Lemos

‘Campanha contra a baixaria na TV divulga o VIII ranking no Fórum Social Mundial’, copyright Assessoria de Imprensa Campanha Que Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, 20/1/05

‘A Campanha quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, uma iniciativa da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e cerca de 60 entidades da sociedade civil, participa do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, com o objetivo de discutir a Ética e o Controle Social da Programação Televisiva. O debate acontece dia 29 de janeiro, das 15h30 às 17h30, sala 201, na oficina do Gasômetro, sob a coordenação do professor Edgar Rebouças, representante da Campanha no Rio Grande do Sul. Durante o painel, será divulgado o VIII ranking dos cinco programas que mais desrespeitam os direitos humanos na televisão. E pela primeira vez, desde que foi criada há 2 anos, a Campanha tornará público o nomes das empresas que anunciam nos programas denunciados pela sociedade.

O debate contará com a participação do coordenador da Campanha, deputado federal Orlando Fantazzini (PT/SP), que vai discorrer sobre os objetivos e experiências da Campanha. Também participarão do evento, como expositores, Ela Wiecko Volkmer de Castilhos, procuradora dos Direitos dos Cidadãos com o tema ações do Ministério Público Federal contra as violações de direitos humanos na programação da TV brasileira; o professor de comunicação da USP, Laurindo Leal, vai relatar às experiências internacionais no controle social da televisão. O painel contará com a presença internacional da canadense Monique Simard, produtora de documentários da Virage Productions, no Canadá. O deputado Fantazzini enfatizou que a Campanha terá, a partir de agora, um novo perfil. ‘Nossa pretensão é continuar insistindo em criar, por meio de lei, um controle social e um instrumento que assegure a defesa do telespectador frente à programação de televisão, conforme já está disposto na Constituição’.

O próximo passo da Campanha será a mobilização em torno da aprovação do projeto de lei 1600/03, que cria o Código de Ética e o Conselho de Acompanhamento da Programação, de autoria do deputado Orlando Fantazzini, propõe criar também a Comissão Nacional pela Ética na Televisão.’



WARNER TV
O Estado de S. Paulo

‘Canal tem gerente para América Latina’, copyright O Estado de S. Paulo, 20/1/05

‘Com mais de 20 anos de experiência, Michael Spinelle acaba de ser nomeado gerente geral do canal a cabo Warner para toda América Latina. Antes, foi vice-presidente sênior da HBO Internacional em Londres e atuou como vice-presidente executivo de Administração e Finanças da HBO na Ásia. Também foi vice-presidente de Administração de Operações Financeiras para a HBO de Nova York.’



SP, 451
Nelson Ascher

‘A cidade universal’, copyright Folha de S. Paulo, 24/1/05

‘Poucas gerações atrás as pessoas viviam preponderantemente no campo. Hoje a maioria vive em cidades. Estas atraem gente não apenas devido às oportunidades de trabalho que oferecem, mas igualmente graças ao fato de que são, de certa forma, concentrações gigantescas de ‘hardware’, centros de informação, comunicação, transportes. A cidade é uma teia ou um emaranhado complexo e denso de inter-relações. Por isso, a vida urbana é mais densa e complexa, ao menos até o momento em que seus empecilhos eclipsem as vantagens.

São Paulo não é exceção. Pode-se achar de tudo, ou quase, aqui. O primeiro shopping center local foi construído no final dos anos 60. Hoje há dezenas nas mais diversas regiões e bairros. Nos anos 80, havia três ou quatro lugares para jantar depois da meia-noite, e comida em domicílio era uma raridade. Paris, por exemplo, dispõe de duas farmácias abertas 24h, o que não a torna convidativa para hipocondríacos de plantão. Bom, só na avenida Angélica se acha uma meia dúzia. E os fumantes parisienses (não exatamente uma espécie em extinção) têm de comprar seus cigarros antes das 2h.

Recuando no tempo, chegamos a uma época, nem tão remota, na qual as paulistanas elegantes faziam suas compras nas butiques do Rio de Janeiro, e era lá também que se encontravam os melhores restaurantes (pois em São Paulo existiam apenas churrascarias e cantinas), livrarias, teatros e os primeiros ‘cinemas de arte’. O Rio manteve, em termos de civilização, sua primazia por cerca de 20 anos após deixar de ser a capital federal. Aliás, uma das grandes tragédias nacionais (que, infelizmente, tampouco foi narrada em romances ou filmes, como mereceria) é sua decadência. Perdeu-se uma metrópole topográfica, arquitetural e historicamente fascinante que conseguira, ademais, desenvolver sua ‘joie de vivre’ peculiar.

São Paulo não é nem será jamais o Rio de outrora. Nossa desmemória característica (associada a uma população relativamente jovem) nos induz, contudo, a esquecermos quanto a cidade mudou desde os anos 60. No início da ditadura militar, ela era, a rigor, uma aldeia hipertrofiada, provinciana e tranqüila. Crianças brincavam com marrecos na praça da República, o bonde parava para que os pedestres atravessassem a avenida São João, as avenidas Rebouças e Brasil eram alamedas arborizadas e a Cidade Universitária, uma várzea lamacenta com alguns barracões nos confins do universo conhecido. Se, por um lado, era possível passear, sem medo, em toda parte e a qualquer hora, por outro, a revolução sexual chegou aqui dez anos depois de ter alcançado o Rio cosmopolita, onde hambúrgueres, cachorros-quentes e lanchonetes em geral também se popularizaram antes.

O crescimento rápido de São Paulo não permitiu que seus habitantes gerassem algum tipo coerente de identidade. O paulistano, como tal, inexiste. Enquanto o país era governado do Rio, mineiros, gaúchos ou maranhenses se mudavam para lá e se convertiam imediatamente em cariocas. Ser paulistano, porém, o que é? é tão somente morar na cidade. Culturalmente (embora de modo infinitamente mais atenuado do que os europeus), amazonenses e paranaenses, pernambucanos e baianos prezam suas respectivas especificidades. Os paulistas em geral e os paulistanos em particular, muito menos. Eles se sentem, sobretudo, brasileiros. Daí que, quando, em suas novelas, a Rede Globo -com meio século de atraso- os retrata arrastando um sotaque italianizado, tal tentativa de tornar facilmente reconhecível uma população heterogênea se revele sempre ridícula.

Uma de suas minisséries mais inteligentes, ‘Avenida Paulista’ (1982), não caiu nessa caricatura. Até certo ponto, porém, sua trama contrapunha paulistas originais (‘quatrocentões’ ou algo semelhante) aos ‘recém-chegados’. Não é assim que São Paulo funciona. Esta cidade não é a Nova York dos conflitos entre ‘nativos’ e imigrantes irlandeses que Martin Scorsese descreveu em ‘Gangues de Nova York’ (2002). Em outras palavras: os requisitos dramáticos da ação levaram a melhor sobre uma realidade empiricamente verificável.

Pensando bem, se há um enredo que se aplicaria nesta urbe, rendendo resultados surpreendentes, seria o de ‘Um Dia de Fúria’ (‘Falling Down’, 1993), filme no qual William Foster (Michael Douglas), um executivo desempregado, quer visitar o filho no dia do aniversário. O garoto vive com a mãe, da qual Foster está separado, no extremo oposto de Los Angeles, e, preso num congestionamento matinal, o protagonista abandona o carro e se dirige a pé rumo à casa da ex-mulher. Seu trajeto acidentado descortina uma megalópole tão variada quanto o próprio planeta. Um sujeito que caminhasse num dia comum, digamos, do Jabaquara ao Alto de Pinheiros não se depararia com menos diversidade.

Um dos prazeres que São Paulo oferece é precisamente o de acompanhar sua mutabilidade. Quem passa alguns meses fora retorna a um lugar diferente e, no entanto, absolutamente familiar. O estranho seria voltar a uma paisagem urbana inalterada. Ninguém se banha duas vezes no mesmo Tietê, e isso não apenas porque quem não fosse um mutante, dificilmente sobreviveria ao primeiro mergulho. Conviver com suas metamorfoses aceleradas não é para principiantes e aqueles que venham de localidades pacatas não se adaptam com facilidade, nem necessariamente as apreciam. São Paulo é, porém, o que o Brasil tem de mais universal e seus cidadãos, tipicamente, se identificam não tanto com a cidade, como com seus bairros e, ao mesmo tempo, sem contradição, com o país inteiro.’