‘Pior do que as denúncias de corrupção foi a recaída delirante. Devassidão e imoralidade têm remédio, as torneiras do erário podem ser fechadas com a mesma rapidez com que são abertas. Mas a máquina do confronto, embora acionada por um breve período, revelou a existência de certos instintos que se supunham desaparecidos.
A improbidade é endêmica, está entranhada, tomou conta do sistema administrativo e político mas pode ser atalhada através de um ataque fulminante às suas causas. São conhecidas as terapias para estancar a sangria dos recursos públicos para os bolsos privados. Uma reforma política para exterminar efetivamente a praga das legendas de aluguel combinada à drástica diminuição da Esplanada dos Ministérios e ao enxugamento dos cargos de confiança poderiam reverter a rapinagem ora em curso. A vontade de sanear, a partir do momento em que é anunciada, já funciona como dissuasão.
O ensaio de baderna é mais preocupante porque foi orquestrado para servir de antídoto à perplexidade que tomou conta do país em seguida às sucessivas revelações de corrupção. Ao invés de emitir uma mensagem para animar uma nação vexada pelo espetáculo da imoralidade, preferiu-se rosnar e mostrar os dentes. Se a intenção era intimidar as elites assanhadas, o resultado foi inverso: aumentou a indignação popular. Para desarmar os espíritos não se recomenda a retórica das ‘companheiras de armas’ como o fez o ex-ministro José Dirceu ao saudar a sucessora.
A convocação na quarta-feira da tropa de choque dos ‘movimentos sociais’ para uma reunião formal no Palácio do Planalto enquanto os assessores preparavam o sereno pronunciamento presidencial do dia seguinte não é contradição, é tática de morder e soprar, assustar e acalmar. Se a intenção do governo era advertir os grupos radicais para respeitar o Estado de Direito não precisava conferir-lhes status de interlocutores privilegiados.
A histeria de altos dirigentes do PT na semana anterior, na qual incluí-se a estabanada rentrée do ex-ministro José Dirceu no plenário da Câmara, não foi casual. Em situações-limite não há coincidências. O ataque à equipe da TV-Globo em S.Paulo não foi obra de arruaceiros diletantes, é coisa de desordeiros profissionais.
A nação brasileira está abatida por uma crise moral, a tentativa de assustá-la com uma crise política que facilmente se converteria numa crise institucional, é obra de desastrados aprendizes de feitiçaria. Os mesmos que em dois anos e meio não conseguiram sequer estabelecer os mais comezinhos procedimentos operacionais.
A breve exibição de vale-tudo serviu para ressaltar uma divisão ainda mais grave do que a mencionada habitualmente: o país tem dois governos trabalhando em direções opostas. O governo da retórica, enrodilhado nas mutretas políticas, está reunido em assembléia permanente para decidir coisa nenhuma. Não faz nem desfaz, discursa.
Este é o governo dos trapalhões que antes de exibir sua obra-prima, o mensalão, conseguiu levar o impagável Severino Cavalcanti à presidência da Câmara. Na desastrada busca de uma base de sustentação parlamentar produziu a mais fragmentada maioria da história recente, colcha de retalhos de minorias, facções e bandos que fazem acordos e se apunhalam, proclamam a ética e deixam roubar.
Há um outro governo que atua, faz, decide – mesmo que certas decisões sejam discutíveis. Sem ele estaríamos no buraco. Com ele, temos que nos contentar com a beira do abismo. A ministra Dilma Roussef tem, entre outras missões, a de re-equilibrar os pratos da balança. Por isso enfatizou o caráter político do cargo. Chegou a hora de anunciar o enterro da politicagem. Junto virá a aposentadoria dos carbonários.
Mair Pena Neto
‘Entre sinais de trânsito e padarias’, copyright Direto da Redação (http://www.diretodaredacao.com/), 25/06/05
‘A imprensa brasileira deveria pôr um freio de arrumação na cobertura da crise política ou assumir definitivamente um caráter desestabilizador. Desde o início do governo Lula, sempre se tentou criar uma crise, com coisas pequenas, como desvios pontuais no Bolsa Família, mas agora, no calor das denúncias do deputado Roberto Jefferson, cujas práticas políticas heterodoxas são notórias, passou a vigorar um vale-tudo. Microfones e páginas estão abertos para qualquer um dizer qualquer coisa sem nenhuma prova e nenhum trabalho de apuração por parte da imprensa.
Aliás, o que existe de concreto até agora é um ex-chefe de departamento dos Correios, ligado ao partido de Roberto Jefferson, recebendo R$ 3 mil. E no que se refere à investigação séria, levada a cabo pelo Ministério Público, quem está em maus lençóis é o deputado federal José Janene, do PP, que já responde a 19 inquéritos no STF. A imprensa deve fazer a sua investigação e trazer novas evidências, mas não pode ser irresponsável, ameaçando a estabilidade de um governo sem maiores apurações.
Se a primeira entrevista de Roberto Jefferson, da maneira como foi publicada, já foi um ‘primor’ de jornalismo, o que se viu a seguir e continua em prática é uma avalanche de denúncias de pessoas anônimas ou de pouca credibilidade, que são apresentadas como grandes interessadas na moralidade pública. Na sexta-feira, 17 de junho, o Estadão publicou em primeira página, em título de três linhas e corpo de manchete, que o ‘PPS recebeu oferta de R$ 4 milhões para apoiar Marta’. A fonte era uma testemunha anônima que contava que a proposta teria sido feita numa padaria, na esquina das ruas Haddock Lobo e Estados Unidos. Até a ex-juíza Denise Frossard entrou na história, dizendo ter ouvido que o dinheiro ‘da mala preta do PT’ sairia de uma conta do Trade Link Bank, de Miami, numa operação da qual participaria o Banco Rural. Ora, se sabia de um esquema desses, envolvendo corrupção e operações financeiras suspeitas, porque a deputada, com seus conhecimentos jurídicos, não veio a público antes fazer a denúncia? Seu oportunismo só contribuiu para uma matéria que não se sustentou e foi rebatida pela própria direção do PPS.
No domingo seguinte, 19 de junho, o programa Fantástico, da TV Globo, colocou no ar entrevista da ex-mulher do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, acusando, entre outras coisas, o ex-marido e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, de terem negociado doação de US$ 2 milhões em dinheiro, do governo de Taiwan, para a campanha de Lula à presidência, em 2002. As acusações foram reproduzidas pelo Globo Online com a mesma falta de apuração do Fantástico.
Se tal doação tivesse existido, seria uma flagrante ingerência externa na política nacional e um problema diplomático da maior gravidade. Este, sim, seria um verdadeiro escândalo. Mas ninguém foi ouvir os governos de Taiwan e do Brasil sobre a questão. Ninguém questionou qual seria o interesse de Taiwan numa eventual vitória de Lula sobre o PSDB. Ninguém apontou qualquer movimento de aproximação do governo Lula, depois de sua posse, com o governo de Taiwan. Pelo que sabemos, Lula visitou a China, que considera Taiwan uma província rebelde, reforçou os laços com o país, reconheceu-o como economia de mercado e nem chegou perto da ilha de Formosa. Mas ficou o dito pelo não dito e mais uma acusação no ar.
Agora, foi a vez do Jornal Nacional dar a palavra, ‘com exclusividade’, à ex-secretária do publicitário Marcos Valério, processada pelo ex-chefe há um ano, por extorsão. A ex-secretária, que já fizera acusações e negara tudo em depoimento à Polícia Federal, conta que recuou por ter sido ameaçada em frente a um sinal de trânsito, cuja imagem a TV Globo exibiu como se representasse alguma prova. Com bastante tempo para falar, a secretária fez acusações imprecisas, envolveu novos nomes e, em nenhum momento, foi interpelada pelo repórter sobre qualquer afirmação.
Assim, entre ex-mulheres, ex-secretárias, fontes de pouco crédito, padarias e sinais de trânsito, segue a ‘investigação’ midiática, que parece muito mais interessada em ‘dar sangue aos chacais’, como prometeu Roberto Jefferson, do que esclarecer a população.’
Milton Coelho da Graça
‘Em qual das Genis você prefere mirar?’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 23/06/05
‘Duas importantes revistas de informação – ÉPOCA e ISTOÉ – foram acusadas de publicar material publicitário como se fosse editorial.
O dono de IstoÉ, Domingo Alzugaray, e o diretor de Época, Aluízio Falcão Filho, apresentaram retumbantes desmentidos, mas o publicitário que ‘comprou’ as matérias em nome da Schincariol reconheceu o erro e manifestou-se arrependido.
Mesmo assim, a Associação Brasileira de Revistas até agora está caladinha, mesmo diante de óbvias violações de seu Código de Ética. A Associação Brasileira de Agências de Publicidade também não abriu o bico. E o silêncio de ambas demonstra como a auto-regulamentação tão defendida pelas empresas de comunicação e agências de publicidade é pura bobagem e não dá à cidadania nenhuma garantia de comportamento ético no mundo da informação. E não custa mencionar que o Conselho Nacional de Comunicação também achou melhor silenciar.
O sr. Alzugaray, como todos sabem, contratou um ‘especialista’ na venda de ‘reportagens’, tanto ao governo como a empresas.
Esse ‘especialista’ – José Nunes – deitou e rolou nos tempos da ditadura usando carteirinha do SNI e, certa vez, com carteirinha e tudo, foi expulso da sala de Cláudio Humberto, então secretário de Comunicação do governo de Alagoas, segundo descrição que me foi feita pelo próprio Cláudio.
Mas Aluízio é jornalista profissional e fica difícil entender por que se apressou tanto em defender o indefensável.
Para arrematar, uma coincidência curiosa: segundo corre na Internet, Lew, da agência de publicidade Lew, Lara, que reconhece ter pago às duas revistas para falarem bem da Schincariol, é Jacques Lewkovicz, o gênio publicitário que inventou a Lei de Gerson, lembram? ‘Gosto de levar vantagem em tudo’. A Lew, Lara, no primeiro ano do governo Lula, aumentou 60% seu faturamento e continuou aumentando em 2004, tornando-se a quinta maior agência do país. No seu listão de clientes, está lá a Secom, graças ao ‘corretor’ Márcio Valério, o homem das malas cheias de grana, segundo a secretária Fernanda Karina.’
Eleno Mendonça
‘Cortinas de fumaça’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 20/06/05
‘A saída de José Dirceu do governo deve elevar o nível das críticas em relação à política econômica. Disposto a tentar fazer de sua saída uma enorme cortina de fumaça, o ex-ministro já fez discurso para a militância, na tentativa de resgatar sua imagem de homem de esquerda. Vai processar seu algoz Roberto Jefferson e, como parte da estratégia, deverá, num segundo momento, tentar desviar as atenções criticando Palocci e sua política de juros altos.
Em outros tempos, isso pareceria até normal, mas nesse contexto soará como tentativa desesperada de sair do olho do furacão. Mais que isso, Dirceu quer livrar a imagem do presidente, que graças às suas trapalhadas está muito prejudicada. Embora ainda não apareça isso nas pesquisas, deve se levar em conta que também não se apurou nada e também não há campanha na rua, quando tudo isso, e mais o que ainda está para ser apurado, vir à tona.
No momento, o governo tinha uma unha encravada que infeccionou gravemente. Sem um remédio a mão, usou do radicalismo, cortou o dedo. Agora está numa situação dúbia, perdeu um membro importante, tem dúvidas sobre a cicatrização e sobre a contenção da infecção. Pior, sabe que a medida, de cortar literalmente na própria carne, pode até piorar ainda mais as coisas.
O avanço das investigações vai mostrar o rumo do governo. O importante, em tudo isso, e que a economia sofra o menos possível. Fazer essa blindagem é uma das tarefas mais difíceis e, com a credibilidade ferida de morte, faz desse gesto quase um milagre.
Na semana passada, para não mostrar-se refém da crise, o BC – que poderia sim baixar o juro e ajudar o clima para o Planalto – decidiu manter a taxa. Esse tipo de decisão parece demonstrar isenção e independência, evita a crítica de que a máquina pode atuar em favor da racionalidade (já que todo mundo pedia redução do juro). O ambiente até era favorável, pois se está registrando ate deflação. Sobre tudo isso terá de pensar o governo daqui para a frente, se é que terá tempo para fazer isso e se defender. O dia para o presidente, com, certeza, será curto nos próximos meses.’
Leonardo Souza
‘Patrimônio de Valério dobra no 1º ano de Lula’, copyright Folha de S. Paulo, 26/06/05
‘Acusado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser um dos operadores do ‘mensalão’, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza dobrou de patrimônio no primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Entre aplicações financeiras, imóveis, participações em empresas e carros de luxo, detinha em 2002 cerca de R$ 3,8 milhões. Em 2003, seu patrimônio saltou para R$ 6,7 milhões, de acordo com dados bancários, cartoriais e informações prestadas ao Detran, aos quais a Folha teve acesso.
O salto de seus bens de um ano para o outro se deve em grande medida aos ganhos que suas empresas lhe renderam. Em 2002, recebeu das agências de publicidade (e coligadas) das quais é sócio R$ 504 mil a título de lucros e dividendos. No ano seguinte, foram R$ 2,95 milhões. Ou seja, o retorno que suas empresas lhe proporcionaram no primeiro ano do governo Lula foi quase seis vezes maior do que em 2002.
O governo federal é um dos principais clientes das agências de propaganda de Marcos Valério. São cinco importantes contas: Banco do Brasil, Correios, ministérios do Trabalho e dos Esportes e a estatal Eletronorte. A imagem da Câmara dos Deputados também está sob a responsabilidade do empresário -o contrato de publicidade foi fechado na gestão do ex-presidente da Casa João Paulo Cunha (PT-SP) em 2003.
Marcos Valério atua no ramo da propaganda, mas não é publicitário por formação. Graduou-se em engenharia. Poucos anos atrás, encaixava-se no perfil de classe média, pelo menos de acordo com sua declaração de renda referente a 1997, quando seu patrimônio declarado era de R$ 233.323, formado por R$ 115 mil de cotas da empresa de publicidade SMPB e R$ 118.323 aplicados na caderneta de poupança do banco BCN.
A Folha teve acesso a esse dado por meio de documentos que estão no STF (Supremo Tribunal Federal), por causa de um processo por improbidade administrativa no qual Marcos Valério é um dos réus. Em ação cautelar, o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, pediu a quebra dos sigilos bancário, fiscal e contábil da SMPB Comunicação Ltda.
Marcos Valério e sua mulher, Renilda Santiago, levam vida condizente com a riqueza de que desfrutam. São muitos imóveis e carros caros, como dois Pajeros Sport avaliados em mais de R$ 120 mil cada um. Em fundos de investimentos, CDBs (Certificados de Depósito Bancário), contas correntes e cadernetas de poupança, ao todo, eram mais de R$ 4,56 milhões em 2003.
É preciso ressaltar que Marcos Valério já era um homem rico antes do governo petista, com patrimônio de R$ 3,8 milhões segundo dados de 2002. Antes da chegada do PT ao poder, ele mantinha bons contatos com políticos mineiros de outros partidos.
O processo que corre no STF, por exemplo, é fruto de investigação do Ministério Público de Minas Gerais por conta de contrato de patrocínio fechado pelas estatais mineiras Copasa e Comig com a SMPB, em 1998, no valor de R$ 3 milhões.
De acordo com o procurador-geral da República, o ex-governador do Estado naquela época, senador Eduardo Azeredo (PSDB), e o atual vice-governador de Minas, Clésio Andrade (eleito pelo PFL, mas hoje no PL), teriam se beneficiado do contrato com a SMPB nas eleições daquele ano.
Clésio foi sócio de Marcos Valério nas agências de publicidade. Só deixou a SMPB para se candidatar a vice-governador na chapa de Azeredo à reeleição, três semanas antes de a empresa receber os R$ 3 milhões das estatais.
Enriquecimento
Marcos Valério se torna realmente um homem de posses de 1998 a 2002, período que abrange o último ano do governo Azeredo e a gestão de seu sucessor, o peemedebista Itamar Franco.
Apesar do enriquecimento anterior à administração do presidente Lula, chama a atenção como a fortuna de Marcos Valério aumenta rapidamente em 2003. Em 2001, seu patrimônio era de R$ 3,3 milhões. No ano seguinte, sobe para R$ 3,8 milhões, um crescimento de 15%. De 2002 para 2003, a variação é de 76%.
Há também uma curiosidade na forma como Marcos Valério lida com seus recursos. Praticamente todo o seu dinheiro e os seus bens estão em nome de sua mulher ou de seus filhos.
De acordo com os dados bancários aos quais a Folha teve acesso, dos R$ 4,56 milhões de que o casal dispõe em aplicações financeiras, R$ 4,18 milhões estão em nome de Renilda.’
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‘Assessoria culpa PF e não comenta’, copyright Folha de S. Paulo, 26/06/05
‘A assessoria do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza informou à Folha que não poderia comentar os dados sobre sua evolução patrimonial por estar impossibilitada devido à ação da Polícia Federal no escritório de contabilidade que presta serviços ao publicitário.
Na quinta-feira passada, a Polícia Federal cumpriu mandado de busca e apreensão no escritório de contabilidade Prata e Castro Consultores Associados Ltda., de onde levou documentos fiscais da agência SMPB Comunicação, da qual Marcos Valério é sócio.
A equipe da Polícia Federal saiu do escritório de contabilidade, em Belo Horizonte, com quatro grandes caixas cheias de documentos fiscais e 20 discos rígidos de computadores.
Ocultação de provas
Segundo a assessoria da Justiça, a Polícia Federal requisitou o mandado na última quarta-feira com o argumento de que poderia estar ocorrendo tentativa de ocultação de provas. O pedido feito abrangia também a sede da SMPB Comunicação e a casa de Valério.
Após consultar a Procuradoria, o juiz Jorge Gustavo Serra de Macedo, da 4ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte, só autorizou a busca no escritório de contabilidade.
Após as buscas, o delegado encarregado da ação, Cláudio Ribeiro Santana, disse apenas que se tratava de apreensão de documentos fiscais de Marcos Valério e da SMPB e que as investigações estão correndo sob sigilo.
Copasa e Comig
Na semana passada, quando a Folha noticiou a ação do Ministério Público Federal por ato de improbidade administrativa contra o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), ele disse à reportagem que houve ‘um erro primário’ por parte da Procuradoria no caso, que teria confundido patrocínio com publicidade. Azeredo, ex-governador de Minas Gerais, afirmou que a contratação da SMPB pelas estatais Copasa e Comig foi absolutamente legal.
‘Foram duas estatais que compraram cotas de patrocínio de três eventos esportivos. Isso foi tudo feito corretamente pelas empresas. Foi tudo feito pela SMPB porque era a empresa responsável pelo evento já por muitos anos, mesmo antes de meu governo’, afirmou o tucano.
O evento a que ele se referiu é a competição de motocicletas Enduro da Independência. Pelo patrocínio no enduro, a Comig e Copasa pagaram à SMPB R$ 3 milhões.
Segundo Azeredo, a SMPB já era responsável pela promoção da corrida mesmo antes da entrada na agência do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza.’
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‘Publicitário diz que dinheiro era para gado’, copyright Folha de S. Paulo, 26/06/05
‘O publicitário mineiro Marcos Valério Fernandes de Souza afirmou à revista ‘Veja’ ter feito altos saques em dinheiro para comprar gado. ‘Reconheço que já fiz vultosas movimentações financeiras no Banco Rural. Tenho fazendas, compro animais. Lido com gado. Há fazendeiros que simplesmente não aceitam cheque’, afirmou o publicitário.
Segundo a revista ‘Veja’ desta semana, técnicos do Banco Central em Belo Horizonte detectaram diversos saques em dinheiro, de ‘valores vultosos’, de contas de Valério e empresas suas, no Banco Rural, na capital mineira.
Reportagem da revista ‘IstoÉ’ reproduz papéis que mostram saques das empresas do publicitário no total de R$ 20,9 milhões, entre julho de 2003 e maio de 2005, nos caixas do mesmo Banco Rural. De acordo com a ‘IstoÉ’, os documentos foram entregues ao Ministério Público Federal de São Paulo e ao Ministério Público Estadual de Minas Gerais, que investigam supostas irregularidades nas movimentações.
Valério disse também ter visitado a assessora-chefe da Casa Civil, Sandra Cabral, na ante-sala do então ministro da Casa Civil José Dirceu, ‘quatro ou cinco vezes’.
Segundo o empresário, eles discutiam a possibilidade de Delúbio Soares, tesoureiro do PT, ser candidato a deputado federal pelo Estado de Goiás. ‘A Sandra é amiga do Delúbio e estava preocupada com a campanha dele’, disse à revista ‘Veja’.
O publicitário afirmou não ser amigo de José Dirceu. ‘No período em que foi ministro, [estive com ele] três ou quatro vezes, no máximo. Por telefone, devo ter falado duas vezes, logo no início do governo.’ Segundo ele, os encontros aconteceram ‘por acaso’. ‘O Zé é professor de Deus, um cara muito formal. Temos um relacionamento esparso’, disse.
Ministros e BC
Valério afirmou à ‘Veja’ que freqüentou o Banco Central. ‘O Rural [banco] é meu cliente e eu fiz um favor a ele’, disse. Segundo Valério, existiam alguns títulos de interesse do Banco Rural no BC.
Ele disse ainda que visitou os gabinetes do ex-ministro dos Transportes, Anderson Adauto, e de Humberto Costa, da Saúde, para ‘discutir política’.
‘Uma única vez, [estive] com o ministro Humberto Costa. Discutimos a política em Pernambuco. Todo mundo sabe que ele quer ser candidato a governador.’
Ao explicar porque foi 13 vezes à sede do PT em Brasília, Valério disse: ‘Fui tomar cafezinho com meu amigo Delúbio. Discutíamos futilidades e um pouco de política’. ‘Nunca neguei que sou muito, mas muito amigo mesmo do Delúbio. Eu sou do interior, bicho do mato. O Delúbio é goiano, bicho do mato também.’
Em nota oficial enviada ontem à imprensa, a assessoria de Valério diz que esclarecimentos relativos ‘à movimentação financeira e patrimonial’ serão feitos na próxima quarta-feira, em depoimento à comissão de sindicância da Câmara, em Brasília.
Leia a íntegra da nota:
‘A propósito das notícias publicadas, neste fim de semana, em veículos de comunicação, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza informa que todos os esclarecimentos relativos à movimentação financeira e patrimonial -dele e das empresas das quais ele participa- serão prestados nos foros adequados, entre os quais a Comissão de Sindicância, instalada pela Corregedoria da Câmara Federal, em Brasília, onde deporá na próxima quarta-feira.’’
Paulo Peixoto
‘Empresas criaram filiais virtuais’, copyright Folha de S. Paulo, 26/06/05
‘No auge da guerra fiscal municipal envolvendo o ISSqN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza), a SMPB Comunicação, DNA Propaganda e Multi Action Entretenimentos criaram filiais virtuais em Rio Acima, na região metropolitana de Belo Horizonte, para fugir das alíquotas mais elevadas na capital mineira. São firmas em que Marcos Valério Fernandes de Souza é um dos sócios.
Marcos Valério foi acusado pelo deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser um dos operadores do chamado ‘mensalão’, propina que seria paga mensalmente por petistas para parlamentares do PP e do PL.
A DNA e a SMPB detêm cinco contas de publicidade do governo federal e a Multi Action promove eventos para algumas estatais, como o Banco do Brasil e os Correios, sendo alguns de grandes proporções, como o Agrishow do BB, um dos três maiores eventos da agroindústria no mundo, segundo a própria Multi Action.
Apesar do trabalho com empresas públicas e privadas que realizam, elas compõem o grupo das ‘empresas fantasmas’, nome dado pela população de Rio Acima às firmas virtuais. Não há ilegalidade na operação, mas as empresas não têm sede física na cidade. Elas se beneficiaram da guerra de alíquotas entre os municípios, especialmente os das regiões metropolitanas, que viram nisso uma forma de elevar a arrecadação.
Uma lei federal de julho de 2003, que entrou em vigor em 2004, instituiu alíquota máxima do ISS em 5%, sendo que a alíquota mínima, estipulada por emenda constitucional, é 2%. Antes, Rio Acima cobrava 1%, enquanto a alíquota para serviços de publicidade em Belo Horizonte era de 3%.
Por isso, de acordo com o último cadastro de empresas do IBGE, lançado no ano passado, Rio Acima tinha 2.625 empresas em 2002 -para uma população estimada em 8.000 habitantes.
A SMPB chegou lá em 2000. Nem sede física possuía. Usava o endereço da prefeitura, como dezenas de outras empresas. O que a identificava era o ‘Box 579’, também virtual. Depois mudou para a rua Quinze, 115, sala 05.
Era na mesma rua em que havia uma filial da DNA, no número 103, loja 103. A Folha esteve lá em novembro passado, e a pequena loja estava fechada. Segundo vizinhos, nunca ninguém foi visto lá.
A DNA já encerrou essa filial, e a da SMPB foi fechada em 5 de abril deste ano, segundo a Junta Comercial mineira. Restam duas filiais da Multi Action instaladas no mesmo endereço onde estava a DNA em Rio Acima, que cobra agora 2% de ISS para serviços de entretenimento, enquanto na capital mineira varia de 2% a 5%.
O advogado das agências, Rogério Tolentino, disse que as empresas agem assim de acordo com a conveniência fiscal e cita como exemplo montadoras de automóveis: ‘Todo prestador de serviço se beneficiou com essa guerra fiscal. São essas conveniências fiscais utilizadas no Brasil todo’.’