Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

José Paulo Lanyi

‘Um amigo meu, jornalista respeitado, sério, cujo nascedouro é a mídia impressa, estava dizendo outro dia que não costumava andar de carro em São Paulo. ‘Sabe por quê?’. Arrisquei: ‘Para ler’. Ele concordou, em parte. É prático mesmo, basta pegar uma mochila e recheá-la com bons livros. Dirigindo é mais difícil, mas não impossível, vai-se lendo a cada semáforo fechado (farol, sinal, sinaleira…), ou no engarrafamento- no mesmo (que pode durar uma hora e dezenas de páginas), ou numa sucessão deles.

Mas essa não é a resposta certa. O rapaz gosta mesmo é de ir aonde o povo está. Pretensões políticas? Trabalho de campo antropológico? Jornalismo. É no ônibus e no metrô que ele vive e observa o cotidiano de um universo expressivo da população.

‘Você sabe que outro dia o Eduardo Ribeiro escreveu sobre um jornalista do Mato Grosso do Sul que faz a mesma coisa?’. O meu camarada não sabia da atitude idêntica de Cláudio Amaral, diretor de Redação de O Estado MS cuja rotina fora descrita pelo meu companheiro do Comunique-se: ‘Ele próprio assumiu essa postura, ao abdicar, por exemplo, do automóvel a que tinha direito com o cargo assumido, para andar de ônibus e, com isso, ter contato direto com as pessoas da rua, com a cidade, com seus dramas e encantos.

Claro que fazer isso em Campo Grande é relativamente mais fácil do que em São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília, mas ainda assim mesmo nos grandes centros o contato com a população e com os problemas é fundamental para não se descolar da realidade. Cláudio, aliás, freqüenta os lugares populares tanto quanto as festas importantes, de olho numa boa história’.

O simples exercício de ir e vir, pela terra, pela água ou pelo ar, é pouco para garantir a colheita. O bom repórter sabe que a notícia está nos detalhes. Os pauteiros, editores e colunistas afiados buscam grandes histórias nas notinhas dos jornais e das revistas. Assim é nas ruas.

Veja só este exemplo besta. O cronista aqui já andou mais de metrô. Mais, muito mais. Foi no tempo em que morava em Guarulhos e pegava seis conduções por dia, ida e volta, para morar, estudar na Cásper e trabalhar na TV Bandeirantes. Com todo esse know-how, foi incapaz de racionalizar uma obviedade, pincelada pelo seu colega de chope: ‘No metrô, as pessoas ‘desabam’.

Sim, no ônibus, talvez de tanto sacolejar, mas, sobretudo, por causa dos estímulos visuais, muito mais ricos, os passageiros ficam ‘ligados’- e se não ficarem ainda podem descer no ponto errado. No metrô, não. Muitos ostentam aquela cara de ‘Ai, a minha vida é um saco’, ou ‘Pena não ser uma pedra para não ter que pensar…’. Já notaram como, nos trens, várias pessoas, notadamente as que estão sentadas, parecem ter o monopólio do tédio e do cansaço existencial? Não rende uma pauta de comportamento?

Mas sem demagogia, hein… Andar de carro dá ótimas matérias. Um dia fui entrevistar dois jornalistas. Deixei o carro na Joaquim Eugênio de Lima, uma alameda de bons botecos, e, quando voltei, só encontrei um cavalete: ‘Operação Guincho’. Louco da vida, falei com uma operadora da companhia de tráfego, que explicou: eu tinha estacionado em um local proibido. Estrilei, pois não havia nada que indicasse a condição. Resumindo: haviam furtado a placa, e a prefeitura, tirado a grana deste pobre contribuinte. Dias depois, o poder público endossou a lambança ao ignorar as fotografias que eu enviara com o recurso. Má intenção, boa matéria.

A pé, de carro, charrete ou ônibus espacial, certo mesmo é não ficar enfiado numa Redação. Nesta há boas histórias também. Mas o chefe não deixa contar.’



PUBLICIDADE INFANTIL
O Estado de S. Paulo

‘Anúncio influencia mal o comportamento infantil’, copyright O Estado de S. Paulo, 4/2/05

‘O Observatório da Imagem das Crianças da Itália apresentou nesta semana um estudo mostrando que os anúncios de televisão para esse público são 40% do total e, em sua maioria, de produtos alimentícios que influenciam de maneira perigosa a conduta infantil. A responsável pelo estudo, Maria D´Alessio, chamou a atenção para o perigo de determinadas mensagens dirigidas às crianças por considerar que elas podem provocar, nos anos seguintes, transtornos na conduta alimentícia, como bulimia, anorexia e obesidade.’



SÃO PAULO EM REVISTA
João Luiz Sampaio

‘São Paulo em contos, histórias e imagens’, copyright O Estado de S. Paulo, 6/2/05

‘São Paulo, 451 anos. Sob esse tema foi organizada a nova edição da Abaco, revista de cultura e ciências sociais editada na Espanha, São Paulo: Ciudad sin Retrato. Logo de cara, um artigo de Víctor García Guerrero relembra para o leitor europeu a história da cidade, vai de Anchieta ao que chama de ‘formação do maior centro industrial, financeiro e acadêmico do Brasil’. Fala de crime, violência, degradação, mas defende a idéia de que fatoss como esses não podem limitar a visão que se faz de um lugar. Uma cidade, escreve, também é sua história. E, no resgate da memória de prédios hoje machucados, depredados, está a saída para a construção de um novo futuro. Está, assim, colocado o fio condutor da revista: caminho aberto para um time de paulistanos, de nascimento ou adoção, abordar uma série de temas relacionados à cidade.

Quem começa é o escritor Fernando Bonassi. ‘José era trabalhador e, por isso, conseguiu o que queria: carro, casa, mulher, filhos, negócio próprio, assistência médica, amigos… Como azar nunca vem de pouco – e pra encurtar de uma vez essa história, que tem tudo pra encher o saco – posso dizer o seguinte: primeiro o carro se acabou num poste de luz (…)’, escreve ele em um dos 30 pequenos contos selecionados para a Abaco. Divertidos ou violentos, eles não parecem manter relação entre si, não têm início meio e fim e, por isso mesmo, escreve Guerrero, ‘são como a própria cidade que os presencia ou gera’.

A urbanista Raquel Rolnik é a próxima e discute, em São Paulo no Fio da Navalha, o crescimento desenfreado da cidade. Para ela, vivemos próximos a um abismo e o caos que isso gera é fruto direto da ação de ‘pessoas ou grupo de pessoas’- as mesmas que poderiam inverter o processo. Ela mostra também como o tamanho e a amplitude da cidade são símbolos da sua heterogeneidade. ‘Cidade de mil povos, capital financeira, cidade conectada ao mundo virtual e real, potência econômica, berço de movimentos sociais e lideranças políticas. Ao mesmo tempo, é uma cidade partida, embutida em muros visíveis e invisíveis que a dividem em guetos e fortalezas, sitiando-a e transformando seus espaços públicos em territórios de guerra.’

O historiador Marco Antonio Cabral, em seguida, detém-se na questão da criminalidade. Dois temas aparecem com mais freqüência, o espetáculo midiático que surge a partir do crime e a violência policial, resultando em um conto sobre armas, prisões, medo, direitos humanos, questões raciais, a idéia de uma geografia da violência. No fim, propostas de soluções, entre elas a polícia de base comunitária.

HISTÓRIA CULTURAL

‘O drama da modernização das cidades latino-americanas se constitui precisamente no choque coletivo que interrompe o fluxo das experiências tradicionais’, escreve o historiador Elias Thomé Saliba em Una Ciudad Descarrilada. Nesse contexto, há um ‘processo de esquecimento’ que deixa ‘um vazio de tempo social’ e fez com que a ‘identidade de São Paulo se fizesse a partir de um ofuscamento da memória’. Em seu texto, Saliba relembra os cronistas de São Paulo, autores que, lidos hoje, podem nos oferecer visões privilegiadas sobre nosso passado. O mesmo resgate é proposto pelo historiador Fábio Franzini, que revê os primeiros tempos do futebol na cidade. Toda a edição é acompanhada por imagens de Eduardo Duwe. Mais informações podem ser obtidas no site www.revista-abaco.com ou pelo e-mail revabaco@telecable.es.’