Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Adam Pasick

‘Um canal de TV britânico está preparando a exibição de ‘Guantanamo Guidebook’ (manual Guantánamo), um programa que vai testar a eficácia de técnicas de interrogatório tais como a privação de sono, que, segundo prisioneiros libertados, eram utilizadas pelos militares americanos na base de Guantánamo, em Cuba.

A emissora Channel Four filmou sete voluntários sendo submetidos a temperaturas extremas, ao mesmo tempo em que eram mantidos acordados por longos períodos.

As técnicas são baseadas em informações obtidas de documentos do governo americano que foram trazidos a público. Elas foram aplicadas por interrogadores americanos especializados, informou um representante da Channel Four.

O representante disse que os voluntários passaram por testes minuciosos antes de serem aceitos e que receberam atendimento médico e psicológico intensivo antes e durante as gravações.

Os médicos tiraram um dos participantes do programa depois de ele sofrer hipotermia.

O programa, que deve ir ao ar em meados de março, vai acompanhar os efeitos das técnicas de interrogatório ao longo de um prazo de 48 horas, tendo sido filmado num armazém de Londres. ‘Guantanamo Guidebook’ integra uma série em quatro partes sobre tortura apresentada por Jon Snow.

De acordo com Steve Crawshaw, diretor da sucursal de Londres da organização Human Rights Watch, o programa pode ser uma maneira útil de mostrar aos telespectadores que técnicas aparentemente inócuas, tais como a privação de sono, podem exercer efeitos devastadores.

A Human Rights Watch atuou como consultora da Channel Four em algumas partes da série sobre tortura. ‘O governo americano traçou uma definição muito restrita de tortura e evitou usar outra frase-chave, que é ‘tratamento cruel, desumano ou degradante’, disse ele.

‘Sem ter assistido ao programa da Channel Four, minha interpretação dele é que ele mostra claramente que mesmo uma quantidade muito pequena desse tipo de tratamento pode ser seriamente danosa.’

A emissora Channel Four, de propriedade pública, é conhecida por sua programação polêmica. Na semana passada, ela foi criticada pelo governo russo por ter posto no ar uma entrevista com o líder rebelde tchetcheno Shamil Basayev, autor intelectual do atentado terrorista a uma escola em Beslan, que matou 330 pessoas, boa parte crianças.

O Channel Four exibe também o ‘Big Brother’ e o ‘Celebrity Big Brother’ -deste último participou a escritora feminista Germaine Greer, e ela acusou seus responsáveis de tortura, dizendo ter sido sujeita a privação sensorial e tratada de maneira dominadora e desrespeitosa.

Na semana passada, a ONU criticou os EUA por manterem prisioneiros em Guantánamo por quase três anos sem acompanhamento jurídico nem informações sobre o tempo pelo qual iriam permanecer encarcerados.

Grupos de direitos humanos também já fizeram críticas ao campo, onde Washington mantém detentos sem aplicar a eles os termos das Convenções de Genebra sobre prisioneiros de guerra. Tradução de Clara Allain’



Jacques Steinberg

‘TV dos EUA oferecerá tratamento médico’, copyright Folha de S. Paulo / The New York Times, 9/02/2005

‘O canal de televisão norte-americano ABC, que alcançou altos índices de audiência nos EUA nos últimos anos com ‘reality shows’ que envolviam alterações na aparência física das pessoas e em seus lares, vai aplicar a mesma fórmula na saúde em 2005.

No fim da última semana, a rede concordou em fazer uma série inicial de seis episódios do programa batizado ‘Miracle Workers’ (operadores de milagres, em português). Na atração, uma equipe de médicos vai atender a pessoas que precisam de tratamento de saúde urgente, mas não têm recursos para obtê-lo.

‘Miracle Workers’, que pode estrear ainda no próximo verão americano, está sendo produzido em conjunto com a DreamWorks Television e a produtora Renegade 83 Entertainment, criadora do ‘Blind Date’ (encontro às escuras), que segue casais desde o momento em que se conhecem.

Questionados sobre ‘Miracle Workers’, as assessorias de imprensa da ABC e da Renegade preferem não comentar oficialmente, mantêm o conteúdo dos programas sob sigilo e o valor que a rede de TV pagou pelo novo show também não foi divulgado.

Uma pessoa ligada ao acordo disse que ‘Miracle Worker’ não envolveria jogos ou outro tipo de competição e que procuraria ajudar pelo menos uma família a cada episódio.

Por exemplo, o ‘dream team’ de médicos do programa, que serão personagens recorrentes, pode fazer um procedimento cardíaco em um membro de uma família criticamente doente, enquanto também assegura tratamento psicológico para a mulher e o filho da pessoa.

As famílias devem ser filmadas durante várias semanas, o que possibilita que cada episódio inclua cenas de seqüências.

O fato de os produtores do programa pretenderem levar tratamento médico aos doentes levantou questões sobre quem seria o responsável pelo pagamento dos procedimentos e quem ficaria responsável no caso de falhas. Esses detalhes, incluindo documentos de desistência que os participantes deveriam assinar, ainda devem ser resolvidos.

Ao comprar ‘Miracle Workers’, ABC espera ter novamente o sucesso de três ‘reality shows’ da rede que abordaram temas parecidos: ‘Extreme Makeover’, em que participantes mudavam sua aparência, muitas vezes com cirurgia plástica; ‘Extreme Makeover: Home Edition’, em que a casa dos participantes, geralmente decrépitas, são transformadas; e ‘Extreme Makeover: Home Edition – How’d They Do That?’, que mostra aos telespectadores como é feita a produção do programa original.’



TV PAGA
Daniel Castro

‘Assinante ainda paga para ver TV aberta’, copyright Folha de S. Paulo, 10/02/2005

‘O assinante de TV paga passou 60% do tempo que dedicou diariamente ao televisor em 2004 vendo canais abertos (3h35min). Ou seja, só viu a TV que realmente paga em 40% do tempo total (2h09min).

Mas o resultado, compilado pela Globosat com dados do Ibope, animou o setor de TV por assinatura. É que houve um crescimento de 12% no total de tempo dedicado aos canais pagos, embora o tempo gasto vendo TV aberta também tenha crescido _só 2%. Em 2004, o assinante ficou 14 minutos a mais por dia vendo TV paga do que em 2003.

Além disso, há quatro anos, quando o Ibope começou a medir audiência da TV por assinatura, os canais pagos atraíam o assinante durante apenas 30% do tempo que dedicava à TV.

O crescimento da audiência da TV paga se deve ao aumento do consumo de TV como um todo, a novos assinantes, às Olimpíadas e ao horário eleitoral na TV aberta.

Os dados mostram que os homens vêem mais TV paga do que as mulheres. Por faixa etária, os campeões de TV paga são as crianças: elas já dedicam metade do tempo a canais como Cartoon Network, Nickelodeon, Discovery Kids e Jetix.

Os dados oficiais do Ibope confirmam os da Globosat, embora com pequena variação. Segundo o Ibope, das 5h02min que o assinante dedicou à TV em 2004, 2h01 foram para a TV paga.

OUTRO CANAL

Filme B O SBT confirma em entrevista coletiva na próxima quarta-feira a criação do SBT Filmes, em parceria com a multinacional Warner. O modelo de negócio será semelhante ao da Globo Filmes: o SBT entra com a divulgação, a Warner, com a distribuição, e uma produtora independente, com a captação de patrocínio via leis de incentivo fiscal.

Elenco B O primeiro longa do SBT Filmes será ‘Coisa de Mulher’, da Diler & Associados (a mesma produtora dos filmes de Xuxa), com direção de Eliana Fonseca (a mesma de ‘Eliana em o Segredo dos Golfinhos’). Os atores são Adriane Galisteu, Evandro Mesquita, o grupo Grelo Falante (humoristas cariocas) e Hebe Camargo.

Vem aí Por enquanto, ‘Laços de Família’ e ‘Porto dos Milagres’ são as novelas favoritas da Globo para substituir ‘Deus nos Acuda’ na sessão ‘Vale a Pena Ver de Novo’. Mas ‘Laços de Família’ tem um problema: decisão judicial impede sua exibição às 14h30, e a Globo ainda não conseguiu revertê-la no Superior Tribunal de Justiça.

Interesse Pela primeira vez, a Globo investiu na transmissão da apuração do grupo de Acesso do Carnaval de São Paulo, de olho na audiência corintiana (Gaviões da Fiel). E acertou: marcou 22 pontos das 9h24 às 12h17 de anteontem, praticamente o dobro do que registra no horário.’



TELEDRAMATURGIA
Antonio Brasil

‘A ditadura das telenovelas’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 11/02/2005

‘Ainda na série ‘revisitando a televisão brasileira’, gostaria de acrescentar um breve ‘capítulo’ sobre as nossas telenovelas. Insisto que deveríamos parar e discutir essa tal ‘indiscutível qualidade’ da televisão brasileira. Podemos estar diante de mais um dos inúmeros ‘mitos’ nacionais que tendem a distorcer e subverter os nossos valores e a nossa própria realidade.

Confesso que adoro televisão, mas detesto telenovelas. Não tenho muita paciência para ficar assistindo durante meses à mesmíssima história de sempre. Talvez seja porque gosto muito de cinema. Novela na TV é o anticinema. Não existe nada menos cinematográfico do que novelas. A linguagem cinematográfica está baseada em uma narrativa de ação e fluxo constante de imagens. A nossa telenovela tem origem na linguagem radiofônica. Insiste em um excesso de diálogos, planos e contra-planos, enquadramentos visuais óbvios em narrativas ainda mais óbvias e repetitivas. Com raras exceções, preferem o caminho fácil do folhetim romântico.

Droga televisiva

Mas como justificar o sucesso? Assim como o telejornalismo, provavelmente, existe uma falta de opções. Por outro lado, se televisão causa dependência, a telenovela é a própria essência da ‘droga’ televisiva. A narrativa fragmentada em centenas de capítulos não exige qualquer tipo de conclusão lógica. Tudo se repete de uma forma segura e a audiência é mantida com doses homeopáticas de uma trama sem qualquer surpresa. Em um país onde a realidade reserva um excesso de surpresas, em sua grande maioria surpresas desagradáveis e violentas, a previsivilidade e o marasmo da narrativa de uma telenovela se tornam um porto seguro para milhares de telespectadores. Pelo menos em algum lugar do Brasil, sabe-se o que vai acontecer no dia seguinte e isso nos causa um grande conforto. A apatia do telespectador dentro da rotina diária das telenovelas ameniza a verdadeira montanha-russa de tantas más notícias. Se gastam milhões em cenários bonitos, atores talentosos e técnica apurada para não se dizer absolutamente nada. As histórias se repetem sempre. A desculpa é sempre a mesma: ‘folhetim é assim mesmo e telenovela é folhetim eletrônico’.

Telenovelas disfarçadas

E dá-lhe novelas o dia inteiro.

Em nenhum outro país no mundo existem tantas telenovelas diárias como no Brasil. A programação ‘acomodada’, preguiçosa e segura reserva horários diversos para todos os tipos de novelas. Temos velhas novelas requentadas no horário vespertino como o nome de ‘vale a pena ver de novo’. Mas aqui entre nós, será que vale tudo mesmo?

Temos novelas para jovens alienados e estereotipados que nos convidam a uma eterna e repetitiva vida que privilegia uma atitude de ‘malhação’. Mas essa tal ‘malhação’ não é um convite à crítica ou reflexão de valores ou mesmo de educação. Não se malha nada sério nessa novela para adolescentes. Muito pelo contrário. O verdadeiro objetivo é educar o público jovem a continuar ‘dependente’ do ‘pior’ da TV. A polêmica leve disfarça uma preocupação efetiva de transformar o público jovem em consumidor de produtos e atitudes da moda. A moda é muito importante para uma telenovela.

Mas também tem novela em horário nobre. O pobre do telejornal vira simplesmente um ‘apêndice’, um rápido intervalo de realidade entre duas novelas. A ficção, o sonho, o irreal e a total alienação predominam em uma programação que privilegia as novelas em detrimento de qualquer outra coisa. Pior ou melhor? Tanto faz. As telenovelas na televisão brasileira dominam a programação de qualquer maneira.

Mas também temos telenovelas ‘disfarçadas’. Reality shows como o Big Brother Brasil ou Casa de Artistas não passam de novelas diárias. A única diferença é quem conseguem ser mais baratas e ainda piores. Em uma linguagem televisiva semelhante às novelas, esses programas oferecem a mesma trama arrastada e previsível, mas são produzidos com atores amadores. Eles representam os mesmos personagens estereotipados das telenovelas com uma grande vantagem para as emissoras de tv brasileiras: eles dispensam os roteiristas. A narrativa dos reality também ‘vicia’, causa dependência, cria mitos e garante uma audiência cativa com investimentos mínimos. A ‘rainha’ da televisão brasileira ainda é o lucro fácil e rápido garantido por uma audiência passiva e conformada. Afinal, poderia ser pior. Poderia haver mais programas de auditório.

Quer mais? No Brasil, também temos telenovelas disfarçadas de minisséries. Perseguindo a mesma fórmula de investimento mínimo em busca de grandes resultados, cria-se uma cultura de novelas para todos, inclusive para as elites. Ninguém pode escapar da ‘ditadura das telenovelas’. Assisti a alguns capítulos dessa revolucionária mininovela psicodélica ‘Hoje é dia de Maria’ e confesso que não entendi nada. Era o próprio samba do ‘folclorista’ doido. Uma espécie de Magico de Oz sertanejo com uma enxurrada de personagens que falavam uma língua estranha onde nada fazia muito sentido. Mas para quem gosta de drogas e alienação, deve ter sido uma ‘obra-prima’. Não entendi nada e fiquei meio tonto com tantas alegorias. Mininovela com objetivos culturais consegue ser ainda mais chata do que novela de verdade.

Líder em baixaria

Mas e o futuro? Será que tem gente no Brasil que não percebe essa tal ditadura das telenovelas no Brasil? Será que tem gente que não percebe que tem muita baixaria com nome ingênuo de ‘telenovela’.

Segundo dados divulgados pela campanha ‘Quem financia a baixaria é contra a cidadania’, organizada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados com o apoio de 60 entidades da sociedade civil, a telenovela não é só líder de audiência, também é líder em baixaria.

A novela das oito, Senhora do Destino, por exemplo, ficou em primeiro lugar no último ranking. E olha que não faltam ‘concorrentes de peso’ nesse ranking como os programas do apresentador João Kleber, Ratinho, Gugu e tantos outros ‘experts’ em baixarias em nosso país. Esses apresentadores e o excesso de novelas medíocres, sem dúvida, promovem mitos nacionais perigosos como o tal mito da ‘indiscutível’ qualidade da televisão brasileira. Na hora de cobrar apoio do governo ou exigir ‘independência’, as mesmas emissoras brasileiras que só produzem baixarias com o nome de telenovelas fazem questão de dizer que pelo menos produzem ‘baixarias’ nacionais.

No Brasil, em termos de televisão, somos reféns de uma linguagem televisiva única. Somos reféns da ‘ditadura das telenovelas’.’



ENTREVISTA / JOSÉ WILKER
Eliane Lobato

‘Nada de antes porém’, copyright IstoÉ, 16/02/2005

‘Wilker aposta no Brasil, acha o Big Brother uma indigência e diz que ator não precisa ser celebridade

ISTOé – Por que você virou ator?

José Wilker – Eu morava no Rio e era o teatro que pagava o café da manhã, almoço e jantar e, eventualmente, dava até para pagar o aluguel. Morei em vários lugares quando vim para o Rio, inclusive na praia e no ônibus da linha Grajaú-Leblon. Eu deitava no banco de trás do ônibus, ia de um ponto a outro e depois voltava. Aí amanhecia. Eu nunca achei nada demais nisso. As pessoas contam esse tipo de experiência como prova de sofrimento, mas eu não sofri. Para mim nunca foi trauma, me diverti. Morei em apartamentos que eram metade da minha sala com mais de dez pessoas e achando que era a coisa mais normal do mundo. Acho que, de algum modo, estava testando a minha vocação para alguma coisa.

ISTOé – Você recebe muitos roteiros para analisar? Que tal ser um ator que pode escolher o trabalho?

Wilker – Recebo pelo menos um por mês, às vezes um por semana. Este ano já recebi seis e estamos em fevereiro. Acho ótimo poder escolher, mas minha mãe falava que eu sou do tipo pobre-soberbo. Eu já disse ‘não’ na miséria e ‘sim’ para muita merda. O dedinho podre foi lá e escolheu coisas que eu nego que fiz. Mas meu critério de escolha é, principalmente, pela companhia, pelas pessoas envolvidas. Sou um ator esquisito. Nunca tive aspiração de fazer esse ou aquele personagem, de montar a própria carreira em função dos papéis. Essa coisa saudável e inteligente eu não tenho. Já fiz teatro, cinema e tevê e odiei porque não estava gostando do ambiente da coxia ou dos bastidores. Eu não gosto mais de teatro, de cinema ou de televisão. Eu gosto de pessoas.

ISTOé – Dá para ser ator no Brasil sem estar na Globo?

Wilker – Depende do que se quer. A televisão criou essa coisa, o Big Brother, que fabrica um suposto carisma de uma suposta celebridade. Então, televisão passou a ser uma aspiração. As pessoas não vão estudar teatro, elas querem se preparar para fazer uma novela. Hoje ser celebridade está interessando mais do que ter talento e competência. O preço é que se precisa estar empregado na televisão, é fundamental participar do baile de debutantes, estar no comercial, ser convidado para o lançamento de um sabão novo, estar nos camarotes VIPs. Mas isso não tem nada a ver com ser ator. Na verdade, é um círculo vicioso. A revista Caras, por exemplo, inventou a pessoa famosa e agora publica a pessoa famosa. Mas isso não tem nada a ver com ser ator, com representar. Um ator pode, sim, viver sem a televisão. Agora, o ator em que nós nos transformamos hoje, não. O ator que não vive sem televisão não pode mais ficar se preparando seis meses para fazer um personagem num filme. Não pode ter um tipo de aspiração que um ator deveria ter, sob pena de ser considerado marginal.

ISTOé – Como você lida com o assédio à celebridade?

Wilker – Minha vida pessoal nunca foi de domínio público. Não estou falando mal de quem exibe a vida pessoal, só estou registrando. As pessoas fazem um pequeno comércio da vida pessoal. Tem gente que casa porque vai conseguir mídia. Isso não é bom nem ruim, é um sistema que a gente está vivendo hoje. Tampouco foi criado no Brasil, foi importado. Eu lido bem porque não faço esses pequenos varejos. é o caso de saber usar o veículo: se estou com uma peça de teatro em cartaz e preciso de visibilidade, faço algumas matérias que não faria em outras circunstâncias. Agora, mostrar minha casa, posar na banheira, fazer como aquela moça que põe um biquíni e declara: ‘Estou pronta para Shakespeare’? é ridículo. é que eu sou muito careta com essas coisas. Acho que a gente já invade gravemente a privacidade das pessoas trabalhando em televisão – e se expõe também. é uma coisa doida. Mas é diferente das pessoas que fazem tudo o que é possível para pagar um mico e depois ficam putas porque publicaram o mico.

ISTOé – Você tem fama de sedutor, charmoso, conquistador…

Wilker – Eu fiz teatro durante dez anos no Rio, não tinha conta em banco ou mordomias. Era até razoavelmente respeitado na comunidade de teatro,

ganhava prêmios, mas era um ilustre desconhecido. Aí fiz uma novela,

Bandeira 2, e depois de três capítulos no ar as coisas mudaram. Passei a ter conta bancária e até direito de furar fila. As pessoas me olhavam diferente. Em pouco mais de um ano, eu me sentia com cinco metros de altura, com direito a tudo. Até eu me tocar de que não era por aí, né? E dei uma baixada de bola legal. Sedutor? Fui casado três vezes. A primeira durou oito anos (com Renée de Vielmond), a segunda 12 anos (com Mônica Torres), e estou com a Guilhermina (Guinle, também atriz) há cinco. Sou uma pessoa casadoira. Claro que me sinto muito bem em saber que desperto interesse em algumas pessoas, que para elas sou atraente. Sou vaidoso e acho que a vaidade é uma coisa boa.

ISTOé – Vê boas perspectivas futuras para o Brasil?

Wilker – Acho o Brasil de hoje absolutamente sensacional. Há muitos escândalos? Sim, mas as pessoas estão sendo denunciadas, algumas até processadas e outras até cumprindo pena. Há o crime? De fato, está gravíssimo, mas acho que as possibilidades de se resolver questões como essas são maiores do que há dez, 15 anos. Não tenho nenhum saudosismo de um país maravilhoso. A Copacabana dos anos 60 era linda e virou um mafuá, mas tudo mudou mesmo. Eu tinha dificuldade de compreender o fax: como é que o cara põe um papel em Nova York e eu recebo aqui? Comprei um e não tinha para quem mandar, então comprei outro e dei de presente para o Miguel (Falabella) só para ter para quem mandar fax. Sou otimista. Nossas chances de resolver os problemas hoje são bem maiores porque a população tem se mostrado disposta a encarar esse tipo de problema, de não jogar para baixo do tapete, de questionar. E a eleição do Lula é também um passo formidável para o País, transpôs um longo período de oligarquia.

ISTOé – O programa Big Brother Brasil costuma ser apontado como de baixa qualidade. Você concorda?

Wilker – Não vi esse que está no ar, mas vi pedaços de outros. Eu separo esse negócio em dois níveis. O primeiro deles é o das personagens, que são indigentes. O que elas têm a dizer é absolutamente inútil – a filosofia, a cultura, o português, é tudo inútil. Elas são inúteis. Acho que qualquer grupo de pessoas que possa ser dispensado de uma atividade produtiva durante três meses sem fazer falta não deve ser muito útil, não é? Agora, como programa de televisão, vejo todo o mérito do Boninho (José Bonifácio de Oliveira, diretor). Ele é um gênio. O que vi de corte, de inserção musical, edição, é tudo muito bem feito, ele sabe fazer bem.

ISTOé – Você acompanha a polêmica do projeto da Ancinav?

Wilker – Não sei se é bom ou ruim, não me interessa entrar nesse mérito. Só proponho, antes, a pergunta: o Brasil está satisfeito em receber 90% do audiovisual que consome de um só país? Se está, não há o que discutir. é bom isso para nossa economia, formação cultural, cidadania? Se a gente compreende que vale a pena ganhar um pouquinho mais do que 5% do nosso mercado audiovisual para nossa produção, então vale a pena discutir uma lei para isso. Audiovisual é estratégico para um país em uma época em que a informação é o poder.’