Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Guerra cibernética já começou

Um dos principais especialistas em segurança cibernética dos Estados Unidos, Richard Clarke, que trabalhou nos governos Bill Clinton e George W. Bush, disse ao Valor que o mundo já vive o que se pode chamar de guerra cibernética, envolvendo tanto governos quanto empresas. O especialista veio ao Brasil para se reunir com empresários e autoridades, na semana passada, a convite da empresa brasileira Módulo, especializada em segurança cibernética.

Para as companhias, a maior ameaça é o roubo de informações sigilosas, por meio de espionagem industrial. Segundo Clarke, as ameaças vêm de gangues de hackers de países como Romênia, Bielorrússia, China e Rússia.

Clarke acusa as empresas chinesas de serem as que mais financiam essas organizações, com o objetivo de obter informações de concorrentes do mundo todo.

Para ele, mesmo as companhias brasileiras não estão imunes. “Tudo pode ser valioso, desde informações sobre fusões e aquisições, até número de clientes ou quanto uma empresa vai oferecer por uma área de exploração de óleo em outro país, por exemplo”, disse o especialista. “Quanto mais desenvolvido o país, maior o risco.” As empresas mais vulneráveis são bancos, companhias de petróleo e gás, além de indústrias farmacêuticas e químicas.

Já houve casos notórios de espionagem industrial via internet. Clarke acusa uma petroleira estatal chinesa de ter se valido de hackers para descobrir quanto as concorrentes ofereceriam por áreas de exploração de petróleo no Iraque. “Empresas chinesas contratam esses cartéis para ajudá-las. Em alguns casos, o próprio governo faz isso”, disse Clarke, que foi chefe de cibersegurança no mandato de Bush, tendo abandonado o governo por não concordar com a invasão do Iraque em 2003.

Para o executivo, que hoje trabalha em uma consultoria de segurança, as empresas não estão gastando quanto poderiam para se proteger de ataques cibernéticos. “Mas não basta gastar dinheiro, é necessário ter uma estratégia, entender o risco e proteger o que importa”, disse. “Os tempos em que dava para proteger toda a rede ficaram para trás”, afirmou.

Bilhões por ano

O Brasil é um dos países emergentes mais desenvolvidos tecnologicamente, segundo Sérgio Thompson Flores, presidente da Módulo. “Apesar de o Brasil usar muito TI, nossas empresas estão começando agora a investir em segurança cibernética, enquanto as empresas americanas o fizeram uma década atrás”, afirmou Flores.

Além das questões envolvendo as empresas mundiais, Clarke vê a escalada de uma guerra cibernética envolvendo os Estados Unidos e Israel, de um lado, e o Irã de outro. Segundo ele, o governo americano já “promoveu sabotagem” contra as instalações nucleares iranianas. Ele se refere ao caso Stuxnet, vírus usado contra usinas nucleares de Natanz dois anos atrás. O governo americano não confirma nem nega ter sido o autor desse ataque.

“Os Estados Unidos e Israel estão planejando uma guerra camuflada contra o Irã, e o Irã está respondendo. Acho que isso pode fugir do controle”, alertou.

Nas últimas semanas, grandes instituições financeiras dos Estados Unidos sofreram ataques de hackers que tiraram seus sites do ar. Para Clarke, tratou-se de uma retaliação iraniana. “Os ataques cibernéticos podem ser tão graves quanto ataques militares. É possível descarrilar trens, explodir tubulações de gás, sem estar no país, só usando um computador”, afirmou.

Os críticos aos teóricos da segurança na internet alegam que existe certo exagero quando se fala em guerra cibernética, e que essas teses têm como único objetivo ampliar o controle da rede. Questionado sobre isso, Clarke se declarou como um defensor da liberdade na internet. “Mas não acho que exista liberdade sem segurança”, afirmou. “Conheço 23 países que criaram centros militares de proteção cibernética. Só o centro americano tem cerca de 25 mil pessoas trabalhando. Os Estados Unidos gastam bilhões nesse setor todos os anos. Quem quiser acreditar que não é um grande problema, corra o risco”, provocou.

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[Luciana Bruno, do Valor Econômico]