Toda a imprensa se ocupou fartamente com a carta de Fernando Henrique Cardoso
a respeito dos erros do partido. Houve editoriais contra, a favor, parcialmente
a favor; houve reportagens sobre a repercussão da carta entre os tucanos e os
petistas. Mas faltou uma pergunta: por que só agora?
O envolvimento do senador Eduardo Azeredo com Marcos Valério e o mensalão foi
revelado faz tempo, muito tempo. Fernando Henrique, como ex-presidente da
República, como patriarca do PSDB, tinha todas as condições para se manifestar
na ocasião, levantando sua voz para exigir que o partido afastasse o político
sob suspeita. Mas Fernando Henrique não falou.
O impeachment de Lula foi muito cogitado, há mais ou menos um ano atrás. O
PSDB e o PFL concluíram que não havia condições políticas para pedir o
afastamento do presidente. Mais: concluíram que seria ótimo para seu candidato
que Lula se mantivesse no cargo, enfraquecido pelo peso das denúncias. Fernando
Henrique, o tucano supremo, e com bons contatos no PFL, todas as condições para
exigir que a oposição se lançasse na luta contra o mandato do presidente. Mas
Fernando Henrique não falou.
Fernando Henrique não falou, nem os jornalistas lhe cobraram. Foi como se
ele, ocupado com seu livro de memórias, só agora tivesse tomado conhecimento do
que se passou. E resta a questão que a imprensa não abordou: o que levou
Fernando Henrique, depois de tanto silêncio, a falar agora?
Os mudos da imprensa
1. Cadê as conseqüências da Operação
Dilúvio, da Polícia Federal? Houve envolvimento de importadores, de grandes
comerciantes de roupas, de grandes joalheiros, de butiques finas. E o noticiário
sumiu. Não se falou mais no assunto. Tudo bem, os veículos de comunicação
costumam pautar-se uns nos outros, mas ninguém estará interessado em saber como
é que está andando o inquérito?
2. Um dia, no meio de uma CPI, sem motivo
aparente, o senador Demóstenes Torres perguntou se alguém conhecia Jeanny Mary
Corner. A imprensa foi atrás e descobriu que a senhora em questão era a
responsável pelo sucesso das melhores festas de Brasília. Jeanny Mary Corner
conhecia como ninguém os bastidores da vida brasiliense fora do plenário. E, de
repente, sumiu do noticiário. Para ela foi ótimo: ficar em evidência com certeza
atrapalhava seus negócios. E os leitores que acompanham nossa vida política,
como é que ficam? Como é que se deixa na obscuridade uma fonte que deve saber
muito mais do que já disse?
Imprensa ameaçada
1. O senador José Sarney, do PMDB do Amapá,
candidato à reeleição, continua perseguindo na Justiça os veículos de
comunicação que ousam se opor a ele. Uma vítima é a Folha do Amapá,
proibida até de publicar que boa parte da equipe de campanha de Sarney é
maranhense. Outra vítima é Alcinéa Cavalcanti, jornalista que publica um blog
que o critica. O blog vem sofrendo seguidos processos, a ponto de sair do ar e
ter de voltar em outro provedor. Alcinéa hoje está no iG. E, prevenindo-se para novas pressões,
conseguiu um endereço no exterior.
2. A Afropress, Agência Afroétnica de Notícias,
está sendo mais uma vez atacada por grupos racistas. A intensidade dos ataques
eletrônicos, movidas por grupos que se proclamam defensores da superioridade
branca, do nazismo e da luta (“até a destruição”) contra negros, judeus e
nordestinos, fez com que o site da agência saísse do ar na quarta-feira (7/9) –
sim, no Dia da Independência. A Afropress, revela seu editor Dojival Vieira,
passou a ser sistematicamente atacada desde que revelou o nome do primeiro
acusado de crime de racismo na internet, o estudante Marcelo Valle Silveira
Mello, da UnB. O próprio Mello, no interrogatório policial, disse que seus
amigos atacam a Afropress para agradá-lo. Há, além dos ataques virtuais, ameaças
aos jornalistas da Afropress.
Vida de insetos
A informação é divulgada pelo próprio Ministério da Agricultura: “Guedes
participa de simpósio internacional sobre moscas”. Refrescando a memória: Guedes
é o ministro da Agricultura. E o caro colega não precisa se preocupar com
insetos soltos, espalhando doenças: no simpósio, só há moscas mortas.
Mensalão na rede
O jornalista Ivo Patarra acaba de lançar um livro-blog sobre o mensalão –
completo, de leitura gratuita, com um total de 650 laudas. O livro é encontrado aqui. Patarra,
jornalista de larga experiência, foi militante do PT e dirigiu a assessoria de
imprensa da prefeita paulistana Luiza Erundina (1989-1992).
E eu com isso?
Circula na internet uma pergunta: como conseguimos sobreviver? Por muitos
anos, andamos em carros sem cinto de segurança, comemos alimentos sem
informações nutricionais no rótulo, nem sabíamos o que era gordura trans.
Acontece que o ser humano é altamente adaptável. O ser humano é resistente e
capaz de suportar terríveis martírios. Até agora, por exemplo, conseguimos
sobreviver sem informações absolutamente essenciais, que mudam a vida de cada
um. A internet é a grande massificadora das notícias sem as quais não sabemos
como seria possível viver; mas também há maravilhas nos veículos impressos, no
rádio, na TV e, especialmente, em revistas. Veja:
1. Mariana Ximenes posa com decote para
capa de revista
2. Hilary Swank começa a namorar seu
agente
3. Carolina Dieckmann ‘assusta’ vendedoras
de shopping
Há coisas curiosas neste mundo. Se a Carolina Dieckman “assusta” vendedoras
de shopping, como é que a Heloísa Helena compra aquelas blusinhas dela?
4. “Vanity
Fair” mostra primeiras fotos da filha de Tom Cruise
5. TV americana mostra primeiras fotos da
filha de Tom Cruise
A propósito, as duas notícias saíram praticamente ao mesmo tempo, em dois
grandes portais da internet. Este colunista ficou maluco: para onde correria,
para ser um dos primeiros a ver as fotos da filha de Tom Cruise?
6. Astro pop inglês diz que lava as
próprias roupas.
Complementando a notícia: o pão-duro em questão é James Cullum.
Decifra-me
Contavam os gregos que Édipo, filho de Jocasta, chegando às portas de Tebas,
foi interceptado pela Esfinge, um medonho monstro que protegia a cidade. A
Esfinge fazia uma pergunta a quem chegava, informando: “Decifra-me ou serás
comido”.
Édipo decifrou o enigma e entrou tranquilamente em Tebas. Hoje, porém,
teríamos a propor-lhe um enigma que, com muitas probabilidades, o deixaria nas
garras da Esfinge. Olhe só a notícia:
casamento
Elizabeth Hurley é aquela atriz inglesa, altamente decorativa, cujo casamento
com o também ator Hugh Grant terminou quando seu esposo foi preso na rua com uma
prostituta feinha, feinha, chamada Divine Brown. Agora, Elizabeth Hurley vai
casar de novo. Mas surge a pergunta: como é que vai fazer para usar 13 vestidos
na cerimônia? Em Irma Vap, pelo menos, os atores estavam num teatro e
tinham bastidores. Mas numa cerimônia de casamento?
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados