Tenho o maior respeito e admiração pelo Salão de Humor de Piracicaba e
em especial pelos organizadores e jurados desta internacionalmente conhecida
exposição, onde idéias e conceitos são apresentadas de forma livre e
democrática . Sou cartunista e há anos exponho nesse
magnífico fórum de humor, tendo sido agraciado com o
primeiro lugar em 2003 na categoria cartum, e agora, em 2006, concorro
com quatro trabalhos.
Entretanto, não posso deixar de externar minha perplexidade e
consternação diante de fatos ocorridos na edição deste ano. No meu
entender, como judeu e cartunista, houve aparente parcialidade na escolha
dos trabalhos selecionados, quanto aos desenhos que retratavam o recente
conflito no Oriente Médio, mais especificadamente, a guerra no Líbano entre
Israel e Hezbollah.
Ficou indisfarçada a visão do Estado de Israel como o
grande vilão nesse conflito. Não se trata de justificar ou
proteger qualquer um dos lados envolvidos, muito menos criticar os
colegas pelos desenhos contra Israel, o que, aliás, é de se esperar e
respeitar numa sociedade aberta e democrática em que vivemos. Porem,
me confesso decepcionado pelo fato de, dentre todos os
trabalhos , não há um único que defenda a posição israelense no
conflito, levando o visitante desavisado a adotar postura parcial diante
desse triste episódio que vitimou ambas as partes.
Garanto que pelo menos um trabalho foi enviado. O meu. Pode até ter sido
considerado ruim, não à altura do salão. Mas ainda assim, o júri acabou, talvez
de forma involuntária, por privilegiar apenas um dos lados, o
que, no mínimo, depõe contra o caráter de fórum aberto do Salão –
exatamente criado com a proposta de fomentar o debate sobre a nossa sociedade e
o mundo como um todo. O espectador acaba por adotar uma posição parcial,
uma vez que não ter uma visão completa dos fatos.
A caricatura do rabino
Como todos devem saber, o rabino Henry Sobel é o presidente do rabinato da
Congregação Israelita Paulista e um dos membros da sociedade brasileira que mais
se dedica à luta pela integração racial e religiosa neste país. Sempre defendeu
a causa palestina e o diálogo entre judeus e muçulmanos no estabelecimento de
uma paz duradoura e sólida.
A caricatura do rabino o representa de uma forma cômica e graficamente
perfeita . Até aí, normal. No entanto, acima dele, voando, uma
pomba defeca sobre sua cabeça. A partir daí, o desenho desvia-se para o
ofensivo.
Acredito que, algo semelhante, contra um líder do Islã, e teríamos
o Salão incendiado por radicais.
Meu manifesto é contra a seleção desse desenho pela comissão julgadora,
desenho este que gostaria ver retirado. Reafirmo que não se trata de um
cerceamento da liberdade de expressão e sim um questionamento sobre a
escolha deste trabalho.
Como entender que um líder e pacifista seja ridicularizado de
forma tão incisiva, num momento como este e principalmente num país
onde as colônias libanesa e judaica convivem de forma harmoniosa? E, ainda,
seria apenas coincidência a aparente origem árabe do sobrenome do
autor?
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Designer e caricaturista