Descortina-se para a nova mídia um 2013 que pode oscilar do maravilhoso ao vergonhoso. Enquanto da imprensa tradicional não se deve esperar mudança, com oposição ao governo federal e blindagem ao governo paulista, dos veículos surgidos nos últimos anos é de se imaginar que, enfim, consigam se mostrar mais inteligentes e independentes que os antecessores – e do que proclamam a si próprios.
O início da gestão de Fernando Haddad em São Paulo é a chance até agora inédita de passar do simples contraponto à mídia tradicional à construção de uma pauta própria, marcada pela crítica prudente, verdadeiramente voltada aos interesses da cidadania. Nascidos e multiplicados na era da internet, os novos meios de comunicação têm, em geral, uma característica original: a necessidade de propagar informação alternativa àquela divulgada pelos veículos existentes antes do início da nova era.
Coincide que o início da nova era foi acompanhado por uma mudança importante no plano federal da política, quando, com a chegada de um trabalhador nordestino à Presidência da República, a imprensa tradicional fincou bandeira na trincheira da oposição – não na oposição de ideias, da crítica programática, mas da oposição de projetos, capaz de balizar a agenda nacional de acordo com seus interesses e de seus representados, perdendo completamente de vista as verdadeiras necessidades dos cidadãos.
Polo opositor
Com isso, em seus primeiros anos a nova mídia sentiu-se empurrada à construção de um muro de contenção cuja função primordial era oferecer o contraponto às informações divulgadas pelos meios de comunicação mais antigos. Com uma tenacidade que, a bem da verdade, foi em muito fortalecida pela distribuição de verbas de publicidade do governo federal – que ainda parecem ter muito mais a determinação de jogo de mútua chantagem que uma intenção de democratização da comunicação, bastando, para isso, notar como ainda estão concentradas nos grandes grupos (Globo, Abril, Folha, Estado). Além da afinidade ideológica e da fragilidade financeira, a distância da maioria destes veículos em relação à capital, Brasília, pode servir como uma explicação extra, de importância menor, na relação afável entre os novos veículos e o governo federal.
Agora, no entanto, surge um teste inadiável para os verdadeiros esforços da nova mídia. A gestão do PT em São Paulo é a hora H para definir se sites e blogues que representam forças novidadeiras, sediados em boa parte na cidade, contentam-se apenas em oferecer contraponto àqueles que enxergam como adversários de ideias ou se podem se mostrar melhores. Não basta se dizer mais inteligente, mais criativo, mais ético e mais crítico: é preciso sê-lo.
Embora ainda em sua alvorada, a nova mídia tem a chance de autopromover uma expansão cerebral que representa a chegada à maioridade. Revelar que sabe fazer críticas construtivas, voltadas aos interesses do cidadão, é a tarefa que precisa ser colocada a partir deste momento de transição e até que se encerre a administração de Fernando Haddad – que aliás, até agora, tem demonstrado ser um político capaz de lidar com a diversidade e um apreciador da possibilidade de crescer com propostas apresentadas por outras pessoas. Aquele que só afaga simplesmente contribui para a cegueira de quem é afagado, afastando-o das verdadeiras necessidades do exercício da função pública. Aquele que critica com inteligência, por outro lado, cumpre o verdadeiro papel reservado à imprensa na sociedade contemporânea, ou seja, a promoção do interesse público.
As tentações pela frente serão grandes. Uma parte das (no geral) pequenas redações da nova mídia é formada por profissionais alinhados ideologicamente com os propósitos originais do PT – embora exista uma outra parte, talvez a maioria, que encontrou nestes veículos um espaço mais arejado e simpático que aquele existente na mídia tradicional, com visão estreita de mundo e mais intolerante à diversidade a partir das duas últimas décadas. O papel de opositor seguirá sendo exercido pelos grupos de comunicação mais antigos, e será preciso paciência para não cair no velho jogo do contraponto. Ainda que não se consiga eliminar por completo esta prática, será preciso superá-la para se tornar um veículo realmente relevante para a sociedade, capaz de falar não apenas com os “convertidos” a este ideário, mas com os cidadãos como um todo.
Mais veículos
Outra pedra no meio do caminho é o fascínio do poder. Se foram comuns as críticas que se derreteram à luz da mera troca de olhares com figuras do governo federal, a proximidade geográfica não tornará mais fácil a correlação de forças entre alguns profissionais da área e políticos. A possibilidade de que alguns dos cabeças de redações da nova mídia acabem convocados a exercer cargos públicos é concreta.
Soma-se a isso a ainda mais concreta redistribuição das verbas públicas, historicamente concentradas em São Paulo nos veículos da mídia tradicional. É de se esperar que a gestão Haddad comece a descentralizar a distribuição dos recursos de comunicação. Oxalá o faça com a intenção de viabilizar a existência de mais veículos e a consequente circulação de mais e diferentes ideias, e não com o propósito de comprar silêncios. Ou a hora H se transformará na Hora de Haddad.
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[João Peres é editor da Rede Brasil Atual]