Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

PMDB quer quebrar sigilo de repórteres

A coligação Paraná Forte, do governador licenciado Roberto Requião (PMDB), encaminhou à Corregedoria-Geral do Ministério Público do Paraná um pedido de quebra do sigilo telefônico dos jornalistas Caio Castro Lima, Karlos Kohlbach e Celso Nascimento, da Gazeta do Povo, e Mari Tortato, da Folha de S. Paulo – profissionais da imprensa que têm acompanhado e assinado reportagens a respeito dos grampos telefônicos feitos pelo policial civil Délcio Rasera, ex-funcionário da Casa Civil e que se apresentava como assessor do governador. (Leia também: Opinião: Quebra viola proteção da fonte)


A solicitação de quebra do sigilo telefônico dos jornalistas consta em um pedido de providências protocolado no MP sobre as investigações do esquema de escutas telefônicas clandestinas, que vêm sendo realizadas pela Promotoria de Investigações Criminais (PIC). O mesmo documento também foi anexado a um pedido de liminar, protocolado no sábado, pela coligação no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE) contra a Folha de S. Paulo. Na representação, o grupo de Requião tentava impedir a publicação de uma reportagem a respeito do caso pela Folha. Mas o TRE negou a liminar.


Apesar disso, o pedido de providências ainda não foi avaliado pelo Ministério Público. No documento, a coligação alega que as investigações do caso Rasera deveriam seguir em ‘absoluto sigilo’, o que não estaria ocorrendo, já que a imprensa tem publicado reportagens sobre o assunto. A coligação ainda solicita a responsabilização criminal e administrativa, além da quebra dos sigilos telefônicos de todos os envolvidos na investigação (supostamente os promotores e os jornalistas). A chapa de Requião pede que a solicitação seja encaminhada à Corregedoria da Polícia Civil e ao procurador-geral de Justiça, Milton Riquelme.


‘Tendo em vista a gravidade dos fatos noticiados, o interesse público impõe que se processe a quebra, a partir de agosto de 2006, dos sigilos telefônicos de todos os envolvidos’, diz o documento do PMDB.


O juiz eleitoral Munir Abagge, que negou a liminar ao PMDB, alegou que ‘o deferimento da liminar postulada equivaleria à gritante censura prévia, o que não mais se admite nos dias atuais’. Ele ainda lembrou que a ‘Constituição Federal estabelece direito à liberdade de imprensa sem censura de qualquer natureza’. E diz ainda: ‘A matéria em questão – a prisão do policial Délcio Rasera – está na pauta de toda a imprensa. É um fato da maior relevância, do maior interesse público, cuja divulgação não pode ser de qualquer modo coibida’.


A presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor), Aniela Almeida, classificou como ‘antidemocrático e exagerado’ o pedido de quebra do sigilo telefônico. Para ela, que é funcionária licenciada da Gazeta do Povo, a atitude da coligação é uma tentativa de cerceamento da liberdade de imprensa e uma ameaça velada aos quatro jornalistas, que apenas estavam desempenhando sua obrigação profissional.


Aniela ainda afirmou que a imprensa tem a obrigação de apurar casos como o dos grampos. Para ela, mesmo que o caso corra em sigilo de Justiça, é legítimo que os profissionais da imprensa tentem obter dados para repassá-las aos leitores, sobretudo em um momento eleitoral. ‘Acho que é imprescindível que a população tenha acesso a esse tipo de informação’, afirmou a presidente do Sindijor. Aniela também lamentou mais uma atitude ‘truculenta’ do grupo político do governador Roberto Requião, que tem se caracterizado por relações conflituosas com a imprensa. A Gazeta do Povo ainda procurou a Folha de S. Paulo, que preferiu deixar para se pronunciar sobre o caso somente nesta segunda-feira.


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‘A gente quer preservar os jornalistas’


O advogado da coligação Paraná Forte Cezar Ziliotto, que assina o pedido de providências ao Ministério Público e a representação contra a Folha de S. Paulo, disse neste domingo que o interesse dos representados é averiguar se os jornalistas utilizaram procedimentos lícitos ou se houve quebra de sigilo das investigações do caso Rasera. ‘Nós entendemos que o caso corre em segredo de Justiça. Se, eventualmente, documentos foram revelados não se sabe por quem, pede-se uma investigação. E essa investigação passa pela quebra de sigilo de algumas pessoas.’


Segundo Ziliotto, o pedido de quebra de sigilo telefônico imputa culpa a nenhum jornalista nem a nenhum promotor ou advogado. ‘É fato público e notório que os jornalistas que assinaram as matérias tiveram acesso a alguns documentos. Alguém pode estar cometendo atos ilícitos envolvendo os jornalistas ‘, explicou. Segundo ele, o MP pode considerar necessária a quebra do sigilo telefônico ou arquivar o pedido de providências. ‘Na verdade a gente quer preservar os jornalistas, e as reputações de quem está sendo envolvido sem ter nada a ver com a história.’


Em relação à representação contra a Folha para evitar publicação de reportagem sobre o caso, Ziliotto foi enfático ao dizer que não se trata de censura prévia. ‘O que a gente pede não é que a Folha seja proibida de fazer matérias sobre o Rasera. Mas sim que não sejam publicados documentos obtidos de maneira ilícita no nosso entendimento.’ Segundo ele, ‘a liberdade de imprensa não é absoluta’, pois envolve outro valor fundamental, que é o do sigilo e da reputação.

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Jornalistas da Gazeta do Povo (Curitiba, PR)