O ministro da Cultura, Gilberto Gil, anunciou em 14/9 que o governo federal criará, até o final deste ano, um fórum inédito para debater uma política nacional para as TVs públicas, atendendo à antiga demanda do setor. O modelo de sustentação e financiamento e saídas econômicas para a transição dos canais para o sinal digital são alguns questionamentos das entidades de TVs públicas. O discurso de Gilberto Gil sinaliza uma preocupação do MinC em relação às necessidades das televisões que complementam o sistema de comunicação do Brasil ao lado das redes privadas.
Em seu discurso de abertura do 1º Seminário Internacional de TV Pública, promovido em São Paulo pela TV Cultura, com apoio da BBC e da Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), Gil não deixou definida uma data para o estabelecimento do novo espaço público.
O fortalecimento da produção de conteúdos brasileiros, a produção audiovisual independente e regional, a formação de talentos e de público, a infra-estrutura tecnológica e o financiamento das TVs públicas serão algumas temas que entrarão em debate. O Fórum seria uma iniciativa conjunta da Secretaria do Audiovisual, da Casa Civil e da Presidência da República e é anunciado poucas semanas depois do Ministério das Comunicações ter garantido que a sociedade civil não faria parte da transição da televisão digital.
O discurso de Gilberto Gil sinaliza uma possibilidade de saída e representa a preocupação do Ministério em relação às necessidades das TVs públicas. Nos dias 19 a 21/9, será realizado um encontro preliminar no Ministério da Cultura para desenhar o funcionamento do Fórum e discutir que temas entrarão em pauta.
Setor comemora
Entidades como a Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCom), a Associação Brasileira de TVs Legislativas (Astral), a Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU) e a Abepec esperam ser atendidas em suas reivindicações. “É uma grande notícia”, comemora Gabriel Priolli, presidente da ABTU. “É algo histórico. O anúncio é recebido com grande satisfação e esperança pelo segmento.” Priolli destaca que é a primeira vez que o governo federal decide estabelecer políticas públicas para a área da radiodifusão pública. “A iniciativa do governo atende uma velha reclamação do setor, que não tem o mesmo nível de interlocução com o governo como os canais privados”, explica o dirigente da entidade associada ao FNDC.
Um exemplo desta diferença de tratamento está no Decreto 5.820/06, de 29/6/06, que instituiu o Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre (SBTVD-T) e estabeleceu a transição dos sistemas de transmissão analógica para o digital. O documento previu a criação de um Fórum do Sistema, para tratar das questões técnicas do SBTVD-T. Atualmente, este fórum é composto somente por representantes do setor de radiodifusão, do setor industrial e da comunidade científica e tecnológica.
Ao mesmo tempo, o decreto prevê a consignação de pelo menos quatro canais para exploração da União. Mas não deixa claro se os mesmos se a operação dos mesmos seria compartilhada com entidades da sociedade civil que não tenham origem nas emissoras estatais e educativas. Entidades cujos representantes participaram do Comitê Consultivo do SBTVD, extinto pelo Ministério das Comunicações. O texto da norma só define que passará a existir um canal do Poder Executivo, um de Educação, um de Cultura e o quarto chamado de “Canal de Cidadania”. Por sinal, o anúncio de Gil não especifica se entidades da sociedade civil terão assento neste Fórum, que também pode ser visto como uma espécie de ‘consolo’ para os ‘primos pobres’ da radiodifusão privada-comercial e uma distinção defiitiva entre os dois segmentos, previstos como complementares pela Constituição Federal.
Realidade preocupante
A criação dos canais digitais públicos não será tarefa fácil para as emissoras, visto que a transição para o sistema digital implica em custos elevados em equipamentos. “O Fórum deverá discutir um modelo de financiamento e sustentação para os canais do campo público”, reflete Priolli. ABTU, ABCCom, Abepec e Astral trabalham em conjunto na mobilização do setor. “A televisão pública não se define em oposição à televisão privada, nem contesta a opção prioritária desta por conteúdos de entretenimento, embora privilegie os conteúdos de formação e informação. Entende que a complementaridade – e não a competição – dos sistemas de televisão público, estatal e privado, tal como define o Artigo 223 da Constituição Federal, é uma meta estratégica para o desenvolvimento sócio-cultural do país e para o avanço da democracia entre os brasileiros”, informa um manifesto assinado pelas quatro entidades no ano passado.
No início da semana, antes do anúncio de Gilberto Gil, a reportagem do e-Fórum havia entrevistado representantes dessas entidades, além de tentar obter informações com o Ministério da Cultura e com a Casa Civil. A falta de interlocução com o governo foi uma reclamação de Rodrigo Barreto de Lucena, presidente da Astral, para quem não havia informações sobre como se dará a transição para a tecnologia digital. “Não entendemos de que forma esses canais vão atender a todas emissoras do setor.” Lucena ponderou também sobre a necessidade da discussão mais ampla sobre um marco regulatório para a área das comunicações.
Paulo Miranda, dirigente da ABCCom, afirmou em 11/9 que o Fórum teria que ser realizado se há interesse do governo pela sobrevivência das TVs públicas. “As emissoras desse setor podem gerar muito emprego e renda”, expõe Miranda. O campo público da televisão aberta é formado por 140 estações geradoras de programação (cerca de um terço do total de emissoras em operação no Brasil) e cerca de duas mil retransmissoras e repetidoras em todo o território nacional.
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Da Redação FNDC