Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quem rouba mais, eles ou nós?

O petista gaúcho Raul Pont, ex-prefeito de Porto Alegre, diz que a imprensa é parcial porque dá mais ênfase à compra do dossiê do que a seu conteúdo. Em outras palavras, acredita, os meios de comunicação deveriam verificar principalmente se as informações do dossiê são verdadeiras; e, num cantinho de página, a lambança de compra e venda de auxiliares próximos do presidente Lula.


O professor Pont está enganado: a imprensa não está cuidando da venda do dossiê. O que se noticia, na verdade, é o pagamento pela montagem de um dossiê falsificado. O próprio Vedoin, que receberia uma boa quantia para acusar o PSDB, disse que o tucano Serra não tinha nada com a história.


De qualquer forma, entretanto, o dossiê deve ser investigado, sim. As declarações de Vedoin, contra ou a favor, não passam de declarações (e o próprio Vedoin já deixou claro que podem variar conforme o comprador). Acontece que a imprensa, como tem sido muito comum, não está investigando: está acompanhando as investigações da Polícia Federal. Se a Polícia Federal vai em marcha lenta, a imprensa também vai em marcha lenta, atrás.


O pior é que a marcha lenta domina as investigações da Polícia Federal. Não se sabe ainda, por exemplo, de que contas foi sacado o dinheiro apreendido na Operação Tabajara. Não é difícil apurar – e um órgão do governo, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), existe exatamente para acompanhar instante a instante as grandes movimentações de dinheiro. Alguém era dono daquele dinheiro – quem? Este tipo de dado a imprensa não pode apurar sozinha. O que pode fazer é cobrar as autoridades.




Dos outros – 1


James Akel, em seu blog (24/9), comenta:




“Pra descobrir os 25 mil reais depositados na conta do caseiro Francenildo, demoraram menos de seis horas. Agora, pra descobrir quem sacou um milhão e cem mil reais, estão há dias e não dizem nada. Eficiência governamental é isso.”




Dos outros – 2


Jorge Taleb, em seu blog (23/9), pergunta:




“Sobre o dossiê que pretendia atingir José Serra, ficam algumas perguntas:


1) Por que a demora na identificação dos responsáveis pela internação no Brasil dos dólares apreendidos?


2) Por que nada se fala sobre cenas captadas pelo circuito interno do Hotel onde foram presos os petistas com mais R$ 1,7 milhão, o que poderia identificar a participação de outras pessoas?


3) Por que o ministro Márcio Thomaz Bastos insiste em dizer que não haverá pressa nas investigações?”





Do colunista


Por que tão pouca eficiência governamental, James Akel? Por que não haverá pressa alguma, Jorge Taleb? Porque as eleições se realizam daqui a poucos dias. E a pressa é inimiga da vitória na eleição.




O outro lado


Muita gente está malhando a IstoÉ por ter publicado informações que constavam no dossiê. Mas é justo elogiar a revista pela informação desta semana: foi quem deu, em capa, o nome do empresário Abel Pereira, que a Polícia Federal começa a investigar. Pereira é ligado a Barjas Negri, atual prefeito de Piracicaba e antigo auxiliar de Serra. Pereira é também um dos acusados por Vedoin.




Dúvida


Um dos acusados no caso do dossiê desempenhava, na campanha da reeleição de Lula, a função de “assessor de risco e mídia”. Que é um “assessor de risco”?




Novidade


Perdida no meio do noticiário sobre Freud, o assessor do presidente Lula envolvido no caso do dossiê, uma frase fantástica:




“Cercado por jornalistas, ele caminhou a pé até o veículo (…)”.


Existirá algum outro jeito de caminhar que não seja a pé?




A verdade nua


É preciso encarar o caso Daniela Cicarelli com bom humor e sem preconceitos. Ela, embora estivesse em lugar público, não se expôs – tanto que foi filmada a mais de cem metros de distância. Apesar de ser facílimo deduzir o que ela e o namorado fizeram dentro d’água, estavam dentro d’água, e nada se viu. Qualquer novela das oito revela mais do corpo de algumas atrizes do que a aventura à milanesa de Daniela. Quanto aos carinhos preliminares, a Revista da Folha foi fundo: quem nunca fez alguma coisa parecida, em algum lugar arriscado?


Quanto a processos, também não há o que fazer. Daniela e o namorado não se expuseram, mas estavam em lugar público, onde filmá-los não é invasão de privacidade. Pessoas famosas correm certos riscos – Chico Buarque que o diga! – e isso faz parte das desvantagens de ser famosas.


Que não haja briga, portanto. Cada um tem suas razões. E, cá entre nós, as imagens divertiram muita gente. É melhor ver coisas desse tipo do que ouvir os graúdos explicarem que não sabiam de nada.




O massacre dos negros


Uma excelente jornalista que atua na Bahia, Denis Rivera, escreve para comentar a nota dessa coluna sobre a falta de protestos na imprensa contra o massacre de Darfur, no Sudão – onde uma milícia muçulmana branca, apoiada pelo governo, já matou algumas centenas de milhares de pessoas pelo duplo crime de religião (são cristãos ou animistas, mas não muçulmanos) e de cor de pele (são negros). Os dados mais confiáveis falam em 200 mil mortos; mas há estimativas que atingem 500 mil pessoas.


Denis garante que, dentro em breve, o massacre de Darfur será um must no noticiário. Acontece que Páginas da Vida, a principal novela da Globo, mostrará cenas gravadas lá, com Marcos Paulo.


Darfur, o maior massacre deste início de século, precisa ser noticiado.




E eu com isso?


Tem gente que, em vez de ler esta coluna a partir do princípio, vem direto a este intertítulo, em busca de notícias sem as quais não se pode viver em paz. Uma pergunta: o caro colega já ouviu falar de Alana de la Garza? Deve ser famosa, já que apareceu naquelas páginas de notícias de gente famosa.


Este colunista não tinha, não. Mas já leu uma notícia de suma importância sobre suas atividades:


** “Atriz abusa no decote em evento beneficente”


Aliás, cá entre nós, era um decote razoável, mas apenas razoável. Não dava nem a chance de tentar olhar por dentro. Quem escreveu o título, pelo jeito, jamais compareceu a eventos noturnos numa grande capital brasileira.


Mas tem mais. Veja só:


** Prestes a dar à luz, Adriana Esteves caminha na praia”


Como diria o anúncio da Folha de S.Paulo, não dá pra não ler. Claro que a notícia não é integralmente verdadeira. Adriana Esteves caminhava na praia, sim. Mas o “prestes a dar à luz” é um pouco de exagero: ela está grávida de sete meses.


E esta outra? É a chave de ouro:


** “Karina Bacchi brinca de ser mãe com boneca em evento”




Como é mesmo?


Este colunista, que não é gordo, e sim baixo (com o peso que tem, deveria ter a altura de 2m44), naturalmente não se preocupou com a notícia que vem a seguir. Mas nossos colegas de maior porte físico certamente estarão preocupados:


** “Receita eleva imposto sobre máquina de lavar grande”


E este colunista, que nunca soube que o Clóvis Rossi ou o Roberto Godoy tivessem máquinas especiais para tomar banho!


Outro título notável, que este colunista não conseguiu decifrar:


** “Jovem baleia noiva”


O campeão dos campeões, entretanto, vem da área teatral. Quem conseguir traduzi-lo ganha uma Fanta Uva, sem gelo:


** “Preto velho comanda ‘Cafundó’, estréia de Paulo Betti na direção”

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados