A Câmara dos Deputados começa 2013 ainda na pendência da votação do Marco Civil. É como se 2012 ainda não tivesse acabado. E com a demora do Legislativo, a polêmica sobre a regulação da internet pode se instalar no Supremo Tribunal Federal, com o julgamento da responsabilidade civil dos provedores.
No caso específico, uma professora entendeu que a repercussão da comunidade no Orkut chamada “Eu Odeio a Aliandra” lhe causou prejuízo moral e profissional. Pediu uma indenização porque não foi atendida ao pedir a exclusão da comunidade. Nas instâncias anteriores o Google foi condenado. Agora cabe ao STF analisar o processo e dizer se o prestador do serviço deve fiscalizar o conteúdo ofensivo publicado pelos usuários e retirá-lo do ar, mesmo antes que seja proferida uma decisão judicial.
O caso não pode ser reduzido à disputa entre a professora e o Google. Estão em jogo a censura prévia, a liberdade de expressão, o direito de informação e o princípio de que apenas o Judiciário tem a atribuição de julgar se um conteúdo é lícito ou não. Por isso o debate ultrapassa os interesses pessoais envolvidos na causa: a mesma decisão será aplicada em outros casos.
Velhos interesses
O ideal seria que o Legislativo traçasse esse limite. E a proposta do Marco Civil garante a não responsabilização por conteúdo de terceiro. Com isso, afasta-se o perigo do vigilantismo e vale a presunção de inocência. Não há motivo para erguer uma nuvem de suspeita sobre toda a internet e imaginar que multinacionais como Google, Facebook e Apple possam garantir nossos direitos fundamentais. Afinal, se forem postas na parede, as empresas vigiarão seus usuários sempre para evitar prejuízos econômicos.
E da mesma forma que houve mobilização social sobre o trabalho dos deputados, agora caberá nova pressão sobre o STF. Algumas entidades já se inscreveram como “amicus curiae” e poderão apresentar argumentos. É necessário informar devidamente a corte sobre os aspectos negativos da tese de que as empresas respondem objetivamente pelo que fizerem seus usuários.
Não se pode aceitar que, para garantir uma indenização, os intermediários sejam colocados no papel de vigias das comunicações e a liberdade de expressão seja limitada pela capacidade de vigilância. Todos os direitos pessoais e morais merecem respeito, mas apenas os culpados devem ser responsabilizados.
Infelizmente, a urgência dessa e de outras questões civis fundamentais não superou os velhos interesses que dominam a política nacional. Até quando o Brasil ficará sem elas?
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[Paulo Rená é mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília]