Nesse artigo precisamos compreender um pouco mais sobre algumas noções de linguagem no campo virtual. Portanto, seguirá no primeiro tópico um breve esclarecimento sobre isso e na sequência os tópicos explorarão os textos do site Twitter para demonstrar a ocorrência dos fenômenos.
Internet web e hipertextualidade
No mundo contemporâneo o uso da internet se tornou indispensável. Para que possamos entender com excelência a aplicação do fenômeno, que estudaremos, aplicado ao site de relacionamento Twitter, devemos antes ter uma noção básica sobre os termos internet, web e hipertextualidade. Na internet podemos perceber que existem várias ferramentas de comunicação, é o que Júlio César Araújo e Bernardete Biasi-Rodrigues definem no artigo ‘A Natureza Hipertextual do Gênero Chat Aberto’ como ‘Distinção entre internet e Web’, em que os autores dizem que a internet foi criada em 1969 nos Estados Unidos com o intuito de interligar os laboratórios de pesquisas, antes era conhecida como ARPAnet e só passou a ser conhecida como internet quando houve uma ampliação do sistema para conectar outras redes, tais como universidades e em seguida instituições diversas pelo mundo inteiro. Hoje já existem mais de 40 mil redes espalhadas no planeta e com a ajuda do protocolo TCP/IP (Transmission Control Protocol/ Internet Protocol) elas podem se comunicar entre si. Mas, a mais popular e a que mais cresce no mundo é a Web, a qual é responsável pela popularização da internet. Criada em 1991 na Suíça, por Tim Berners-Lee, com a ideia original de fazer a conexão entre os computadores das instituições de pesquisa para dinamizar e facilitar o acesso dos pesquisadores aos diversos estudos através do hiperlink [ARAÚJO, Júlio César. BIASI-RODRIGUES, Bernadete. Internet & Ensino: Novos Gêneros, Outros Desafios. Cap.: Questão de Estilo no Gênero CHAT Aberto].
Demétrio (2001) define a Web como um “serviço baseado nos gráficos e no hipertexto, permitindo haver a troca entre os recursos de multimídia, formados por sons, imagens e textos” (p.35), além disso, a Web funciona com o seu próprio protocolo de transferência o HTTP da expressão Hipertext Transfer Protocol ou Protocolo de Transferência de Hipertexto. Assim, fica claro que a Web funciona, tão plenamente, através da dinamicidade do Hipertexto (DEMÉTRIO 2001, p.35). Para Xavier (2002) o hipertexto vai além das imagens e sons, concluindo que estes não apenas completam ou ornamentam o texto de cunho verbal, mas, são nesse campo hipertextual parte integrante texto verbal .² Partindo desta analise apresentada pelos autores, Araújo e Biasi-Rodrigues, vemos ainda que no chat aberto o uso de abreviações e mecanismos de pontuação se fazem valer devido a dinamicidade que o usuário tem de criar para manter uma conversa linear com diversos usuários ao mesmo tempo, dessa mesma forma acontece no site de relacionamento Twitter, esse em que o objeto de estudo será aplicado, porém se analisarmos o sistema que o Twitter dispõe aos seus usuários veremos que a diferença que há dessa ferramenta para a primeira é a de que na segunda a cada ideia exposta só se tem disponível 140 caracteres, mesmo que seja permitido no sistema o uso de uma sequência continua de textos sobre o mesmo assunto, o ideal é que você consiga expor sua ideia apenas no espaço disponível para não fugir da proposta, assim os usuários que te acompanham, os seguidores, o quer também, simplesmente porque eles acompanham diversos outros usuários ao mesmo tempo, com isso o que desejam é ter acesso a textos curtos, mas completos. Diante isso conseguimos entender em alguns casos como pessoas famosas tem dificuldade de conquistar mais seguidores, quando algumas pessoas anônimas conseguem com maestria essa conquista. Isso acontece devido ao uso de um fenômeno linguístico chamado Marcador de Pressuposição. Como esse fenômeno pode ser tão importante na conquista de seguidores? Antes disso teremos que entender um pouco do que se trata esse fenômeno linguístico, mas para isso antes, ainda, temos que saber do que se trata os Operadores Argumentativos.
Operadores de argumentação
O termo Operadores Argumentativos foi criado por O.Ducrot, criador da Semântica Argumentativa (ou Semântica de Enunciação), para que pudesse ser indicado na gramática de uma língua alguns elementos que têm a função de 'mostrar' a forma argumentativa dos enunciados, cercar o enunciado mostrando um sentido, indicando uma direção a qual apontam ³. Esclarecendo o sentido através de um argumento introduzido na frase.
Para Ducrot nos especificar esses argumentos ele utiliza de duas noções básicas: a de escala argumentativa e a de classe argumentativa. A classe argumentativa é constituída de um conjunto de enunciados, os quais servem de argumento para uma mesma conclusão, denominada R ³. Veja um exemplo já aplicado à um texto de um dos usuários do site Twitter:
1. Tudo que aprendi nessa vida foi antes de ter um Twitter. (conclusão R)
arg. 1. – É viciado em ficar online no site Twitter.
arg. 2. – Não consegue se dedicar a suas tarefas cotidianas com mais atenção, por dedicar muito tempo ao site.
arg. 3. – Não estuda ou lê por ficar muito tempo online no site.
Todos os argumentos têm o mesmo peso para a conclusão R. Trazendo o humor devidamente a frase, o que pode ajudar a conquistar a atenção do seguidor da sua conta. Já a escala argumentativa ocorre quando dois ou mais enunciados de uma mesma classe se apresentam em força crescente a uma mesma conclusão. Veja o exemplo:
2. Na casa dos outros não dá para escolher o canal… (conlusão R)
p'' arg. 1. – Está na casa de alguém entediado com o programa que estão assistindo, envergonhado para pedir que troquem o canal.
p' arg. 2. – Está na casa de alguém no horário do seu programa de T.V. favorito e a T.V. não está no canal do programa.
p arg. 3. – Não vai à casa de alguém para assistir a algum programa de T.V. tendo em vista que nem sempre se sentirá à vontade para trocar o canal.
Já aqui, os argumentos são gradativos, com importâncias diferenciadas e podendo ampliar a suposição de quem o ler, no caso do Twitter, os seguidores, assim o proprietário da conta pode criar ambiguidades em suas publicações causando um efeito informativo (quanto a sua vida, nesse caso) e humorístico ao mesmo tempo.
Conteúdos semânticos adicionais
Caso essa frase estivesse de modo afirmativo, inverteria-se o gráfico quanto as importâncias:
2. Na casa dos outros dá para se escolher o canal… (Conclusão R)
p'' arg. 1. – Vai à casa de alguém para assistir a algum programa de T.V. com a pessoa.
p' arg. 2. – Está na casa de alguém no horário do seu programa de T.V. favorito e o convenceu a trocar para o canal do programa.
p arg. 3. – Está na casa de alguém feliz com o programa que estão assistindo, devido ao seu pedido para que trocassem o canal.
Existem alguns tipos de operadores argumentativos, considerados mais importantes, que foram pontuados por Ingedore Villaça Koch no livro A Inter-Ação Pela Linguagem, tais exemplos estão expressos aqui para uma melhor compreensão. E todos os exemplos estão aplicados a textos retirados do site de relacionamento Twitter:
A) Operadores como: até, até mesmo, inclusive. Assinalam o argumento mais forte, de escala orientada, no sentido de uma conclusão que será determinada. Veja o exemplo de um texto de um usuário em um dia em que não estava bem:
1. Saindo aqui… Valeu pela distração Twitter, até esqueci que ia me matar hoje!
arg. – O Twitter foi tão bom que até a fez esquecer sobre algo muito ruim, até mesmo se matar.
Ainda tem argumentos de escala orientada que deixam subentendida a existência de uma escala com outros argumentos mais fortes: ao menos, pelo menos, no mínimo. Exemplo:
2. Queria um amor, no mínimo de Xvideos.
arg. – Almeja por um romance tão desesperadamente, que não se importa que seja puramente sexual (Inferindo, levando-se em consideração, o conteúdo pornográfico do site Xvideos.)
B) Operadores como: e, também, ainda, nem (ou não), não só… mas também, tanto… como, além de, além disso, a par de etc. Somam argumentos a favor de uma mesma conclusão.
3. E nem só de sextas a vida é feita.
arg. – Nas nossas vidas não existem só dias como as Sextas-Ferias existem outros dias, os quais devemos trabalhar e arcar com nossas responsabilidades.
Existe um operador que introduz um argumento adicional de maneira sutil, parece que apenas ornamenta a frase, quando na verdade é um dos operadores mais decisivos em uma conclusão R. [KOCH, Ingedore Villaça. A Inter-Ação Pela Linguagem. (p. 34)] Trata-se do operador Aliás.
4. E nem só de sextas a vida é feita. Aliás, existem as tardes de domingo.
arg. – O operador ratifica que não existem só sextas na vida. Demonstrando, ainda, que existem dias piores que os outros.
C) Operadores como: portanto, logo, por conseguinte, pois, em decorrência, consequentemente. São operadores que introduzem uma conclusão R à argumentos apresentados anteriormente.
5. Salário é como amor de Carnaval, acaba rápido, portanto a gente não pode se apegar.
D) Operadores como: ou, ou então, quer…quer, seja…seja. Introduzem argumentos alternativos que levam a conclusões diferentes ou mesmo opostas.
6. Dica para os japoneses: Nesse terremoto ou vocês abrem os olhos, ou a casa cai.
E) Operadores como: mais que, menos que, tão…como etc. Estabelecem relações de comparação entre elementos, para levar a conclusão.
7. A vida tá tão chata quanto a segunda-feira.
Podemos perceber que embora a vida esteja chata tanto quanto a Segunda-Feira, em escala gradativa percebemos que a Segunda-Feira ainda é 'pior', mais chata (nessa ideia), por servir de parâmetro na comparação do que é chato.
F) Operadores como: Porque, que, já que, pois etc. Introduzem uma justificativa ou explicação relativa ao enunciado anterior.
8. Frio é tão bom que deveria vir com botão de Curtir.
G) Operadores como: Mas (porém, contudo, todavia, no entanto etc.), Embora (Ainda que, posto que, apesar de (que) etc). Contrapõe argumentos orientados para conclusões contrárias.
Semanticamente os operadores Mas e Embora funcionam de forma semelhante: Mas é usado após uma conclusão R para contradizê-la e expor a ideia conclusiva, a qual o foco é direcionado durante o discurso, criando uma conclusão não-R, esta que é a conclusão principal na sentença. E Embora, introduz uma conclusão R deixando claro logo no começo da sentença que a defesa do discurso está na conclusão não-R [KOCH, Ingedore Villaça. A Inter-Ação Pela Linguagem (p.37)].
9. Quero felicidade natural, mas só encontro tarja preta.
10. Embora eu seja brasileira, eu odeio futebol.
H) Operadores como: já, ainda, agora etc. Introduzem conteúdos pressupostos. Se eu disser:
11. Minha vida se resume em perda de dinheiro e ganho de calorias.
O verbo está marcando um pressuposto que neste momento a vida dessa pessoa se resume a essa conclusão. Mas se eu digo:
12. Minha vida ainda se resume em perda de dinheiro e ganho de calorias.
Introduziu-se aí o pressuposto de que a vida dele se resume a isso há algum tempo. E ainda se eu digo:
13. Minha vida agora se resume em perda de dinheiro e ganho de calorias.
O pressuposto introduzido é de que essa vida entrou nessa fase ruim há pouco tempo. Esses são operadores excelentes no uso do Twitter, pois deixam claro suas introduções economizando caracteres.
I) Operadores como: pouco, um pouco, Apenas (só, somente), quase etc. Introduzem pressupostos com afirmação total ou negação total.
14. Quase não morri de calor. (Pressupõe-se que morreu de calor, claro inferindo-se aí um humor, tendo em vista que se está escrevendo é porque não morreu, foi um exagero para expressar o quanto estava calor.)
15. Pouco me importa se estou perdendo seguidores (Mais ainda assim o importa.)
Esses são alguns exemplos dos operadores argumentativos, vimos, através de todos os exemplos extraídos do site Twitter, que esses operadores introduzem conteúdos semânticos adicionais, tais conteúdos demonstram argumentos diversos, deixando aberturas para interpretações pressupostas, no caso do Twitter, essas pressuposições são necessárias para a aquisição de novos seguidores, afinal, sendo anônimos, a maioria dos Twitteiros precisam desses operadores para demonstrar, com humor ou frases de impacto, o que se passa em suas vidas usando apenas 140 caracteres que o site permite.
Marcadores de pressuposição
Como vimos: os Operadores Argumentativos introduzem no enunciado conteúdos semânticos adicionais, que nos permitem fazer pressuposições diversas em uma sentença. Mas, e quando temos conteúdos que ficam a margem da discussão chamamos de pressupostos e às marcas que os introduzem, Marcadores de Pressuposição?
Esses marcadores são elementos linguísticos distintos aos elementos dos Operadores [KOCH, Ingedore Villaça. A Inter-Ação Pela Linguagem (p.46)]. Vejamos alguns exemplos a seguir de outros elementos que marcam a pressuposição, os verbos:
J) Ficar, começar a, passar a, deixar de, continuar, permanecer, tornar-se, etc. São verbos que indicam mudança ou permanência de estado. Assim, podem marcar pressupostos, veja o exemplo:
16. Vocês não merecem ficar comigo nem com meu xarope.
– Para quem já é usuário do Twitter, além da inferência, contextualizando a frase, feita com a reestruturação da frase já famosa, tweettadapela apresentadora Xuxa Meneguel. Ainda com o verbo 'ficar' marcando a frase, pressupomos que ninguém merece continuar lendo suas atualizações pessimistas, pois ele está em um dia ruim, provavelmente devido ao seu resfriado, já que com o argumento 'nem' ele introduz uma conclusão R junto a, também, inferência da palavra xarope.
L) Lamentar, lastimar, sentir, saber, etc. De modo geral são verbos de estado psicológico. São denominados 'factivos', são completados pela enunciação de um fato. Exemplo:
17. Sinto muito a baleiesa do twitter.
Sabendo que 'baleiar', na linguagem do site Twitter, é quando o site está pesado ou em manutenção e dificulta, ou mesmo não permite o uso do site por um tempo indeterminado, perceberemos que o usuário marcou um pressuposto em 'sinto', para que na verdade ele diga de maneira mais eufêmica que não está satisfeito com os serviços do site.
Tanto no tópico dos Operadores Argumentativos, quanto no tópico dos Marcadores de Pressuposição estamos falando apenas das marcas linguísticas. Os textos que não se apresentam com qualquer tipo de marca são classificados como subentendidos, pressuposições em sentido amplo ou simplesmente classifica-se como inferência [KOCH, Ingedore Villaça. A Inter-Ação Pela Linguagem (p. 48)]. A inferência é simplesmente quando uma palavra nos faz associar um elemento fora de um texto e contextualizá-lo, provocando um sentido mais amplo dentro do texto:
18. Misturei Activia com Johnnie Walker e estou cagando e andando.
Tendo o conhecimento de que Activia ajuda na flora intestinal e que Johnnie Walker é um uísque, infere-se (subentende-se) que a mistura de algo laxante com álcool pode provocar uma diarréia e ainda com o uso da expressão popular 'cagando e andado', que refere-se a indiferença quanto a um fato, a autora da frase, a cantora Preta Gil, provocou uma ambiguidade, a qual provocou humor, e só é compreendida através de conhecimentos externos que são contextualizados. Assim, o ideal é reservar o termo pressuposto apenas para marcas linguísticas (KOCH 2007).
Considerações Finais
Com os argumentos apresentados e os exemplos expostos nos tópicos acima, pudemos perceber que diante de um site que te oferece apenas 140 caracteres para a exposição das suas ideias, o uso devido dessas marcações linguísticas, tanto os Operadores Argumentativos, quanto os Marcadores de Pressuposição, além da inferência, podem influenciar no sucesso e na conquista de novos seguidores. Assim, podemos observar que, alguns famosos, mesmo com milhares ou milhões de seguidores não chegam a ser um exemplo de influência e sucesso no Twitter, mesmo tendo a inferência à favor, considerando que suas vidas estão expostas à vasto público pelos meios de comunicação, maior parte deles se abstêm dessas marcas, as quais ajudam a economizar caracteres e produzir pressuposições divertidas, em quanto alguns anônimos que bem utilizam essas marcas exercem o humor nas publicações mais cotidianas, assim, mesmo sem a fama e a vasta inferência, como os famosos, acabam ganhando notoriedade na rede.
Referências
ARAÚJO, Júlio César, BIASI-RODRIGUES, Bernadete. Internet & Ensino: Novos Gêneros, Outros Desafios. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna; 2007.
KOCH, Ingedore Villaça. A Inter-Ação Pela Linguagem. 10ª ed., 1ª – São Paulo: Contexto, 2007.
Twitter – http://www.twitter.com
***
[Hugo Dalmon é graduando em Licenciatura em Letras pelo Centro Universitário Geraldo Di Biase – Campus de Volta Redonda]